Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0284/09.9BECTB 0517/17
Data do Acordão:11/21/2019
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:JOSÉ GOMES CORREIA
Descritores:IRS
MAIS VALIAS
VALOR DE REALIZAÇÃO
VALOR DE AQUISIÇÃO
Sumário:I - De acordo com o artº 10º, nº 1, alínea a) do CIRS “Constituem mais-valias os ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos empresariais e profissionais, de capitais ou prediais, resultem de: a) Alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis e afectação de quaisquer bens do património particular a actividade empresarial e profissional exercida em nome individual pelo seu proprietário”.
II - Para a determinação dos ganhos sujeitos a IRS, considera-se valor de realização: a) No caso de troca, o valor atribuído no contrato aos bens ou direitos recebidos, ou o valor de mercado, quando aquele não exista ou este for superior, acrescidos ou diminuídos, um ou outro, da importância em dinheiro a receber ou a pagar; (…) f) Nos demais casos, o valor da respectiva contraprestação (artº 44º do mesmo diploma).
III - Por sua vez, o valor de aquisição, de acordo com os artºs 45º e 46º, ainda do CIRS, no caso de bens ou direitos adquiridos a título oneroso, considera-se valor de aquisição o que tiver servido para efeitos de liquidação da sisa.
IV - No caso dos autos, tratando-se de permuta, existe uma regra bem distinta da que vigora para efeitos de tributação em sede de IMT, em que o valor tributável é dado pela diferença declarada de valores (do imóvel adquirido e do imóvel alienado) ou a diferença entre os valores patrimoniais tributários (desses imóveis) quando superior, não havendo que confundir a tributação do rendimento com a tributação do património.
V - Para apuramento de mais- valias pelos ganhos obtidos por um determinado alienante, releva o valor que em procedimento de avaliação venha a ser atribuído ao bem por si cedido na permuta o qual poderá relevar para efeitos de apuramento de mais-valias na esfera patrimonial do outro permutante, aqui não impugnante.
VI - A lei não só não impõe a comparação dos valores dos dois bens, como não prevê a avaliação dos mesmos para efeitos de apuramento do valor de realização.
VII - O n.°2 do art.°44° do CIRS não obriga a avaliar os bens ou a comparar valores dos bens recebidos com os dos cedidos, fazendo exclusivamente referência aos bens recebidos por não relevar para quantificar a contraprestação. E as normas do IMT apenas relevarão para a definição do valor que nos termos do n.°2 do art.°44.° do CIRS deve ser comparado com o da alínea a) do seu n.°1, para apurar qual vai prevalecer sempre em relação ao bem recebido na permuta.
Nº Convencional:JSTA000P25190
Nº do Documento:SA2201911210284/09
Data de Entrada:05/10/2017
Recorrente:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A.......................
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1. O Representante da Fazenda Pública interpôs recurso da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco, de 29/11/2016, que julgou procedente a impugnação intentada por A………………, com os sinais dos autos, no âmbito de liquidação de IRS, de 2004, emitida na sequência de correcções respeitantes a mais-valias obtidas com a venda de um imóvel adquirido por permuta.

1.1. Rematou as suas alegações com o seguinte quadro conclusivo:

“1. A sentença, ora posta em crise, julgou procedente a presente impugnação, tendo decidido que o valor de realização foi calculado por comparação entre o recebido e o dado troca pelo impugnante, sendo porém esta comparação feita entre o valor do bem recebido depois avaliado e o valor do bem dado, considerado pelo valor atribuído pelas partes, sendo ainda tomado em consideração o valor pago em dinheiro
2. E, ao considerar o atrás referido, considerou a sentença que a AT incorreu num erro de interpretação e aplicação que faz da lei, por não ter levado em conta, no cálculo da mais-valia, o previsto no n.°4 do art.° 44° do CIRS (dizemos nós que a decisão recorrida quereria dizer n.° 2 do art° 44° do CIRS, porquanto aquele n.° 4 não é de todo aplicável ao caso “sub judice”)
3. Mais se decidiu na sentença que o erro da AT foi calcular a mais-valia com base no valor atribuído ao imóvel recebido depois de avaliado, por primeira transmissão, ao abrigo do CIMI, levando porém em conta, para calcular essa mesma mais-valia, apenas o valor pago em dinheiro, sem levar em conta o valor do bem dado na permuta, também depois avaliado nos termos do IMI.
4. Mais se decidiu que é manifestamente contra o dever de boa fé na interpretação da lei, conhecendo o momento histórico da reavaliação do património, aquela que se faça das normas a que a AT lançou mão, levando em consideração apenas o valor pago em dinheiro aquando da permuta como valor a abater ao valor recebido, considerando o valor da realização do bem como o valor do prédio recebido, depois de avaliado, sem fazer acrescer ao valor pago em dinheiro, o valor do bem dado, também depois de avaliado, pois só assim se comparam realidades semelhantes.
5. Decidiu, ainda, considerar a sentença que o impugnante deu um prédio avaliado ao tempo em 5.911,71€, mas importava saber, qual o valor que coube a esse prédio, depois de avaliação do CIMI, para conhecer o valor de cada prestação e contraprestação, e assim poder apurar-se o valor da realização e assim também da mais-valia, dessa forma dando cumprimento ao determinado no art.° 44°, n° 4 do CIRS, que prevê “nos casos das alíneas a), b) e f) do número anterior, tratando-se de direitos reais sobre imóveis, prevalecerão, quando superiores os valores por que os bens houverem sido considerados para efeitos de liquidação de sisa ou, não havendo lugar a esta liquidação, os que devessem ser, caso fosse devida”, sendo assim manifesto, que o valor dos bens a prevalecer, se referem tanto ao valor do que é recebido como do que é dado em troca.
6. Donde sentencia que o cálculo da mais-valia padece de erro e de vício de lei, conforme invoca o impugnante, ainda que de forma imperfeita, mas em temos que são suficientes para permitir a sua interpretação, termos em que decidiu pela procedência da impugnação.
7. Não podemos concordar, porquanto consideramos ter havido errada interpretação e aplicação do direito aos factos dados como provados, houve claramente errada interpretação da lei e por essa via errada aplicação da mesma, pelo que com o sentido em que decidiu foi em violação, nomeadamente, os n.°s 1 e 2 do art.° 44, a al. a) do n.° do art.° 10.º, ambos do CIRS e o n.° 1 do art.° 12° do CIMT, incorrendo em erro de julgamento de direito, com a consequente revogação da sentença.
8. A tributação das mais-valias encontra-se prevista no artigo 10.°, n.° 1 do CIRS, norma que estabelece, para o que ora releva, o seguinte: “Constituem mais-valias os ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos empresariais e profissionais, de capitais ou prediais, resultem de:
a) Alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis e afectação de quaisquer bens do património particular a actividade empresarial e profissional exercida em nome individual pelo seu proprietário”.
9. E, quanto ao valor de realização, o n.° 1 do artigo 44.° do CIRS, na redacção em vigor à data estabelece que: “Para a determinação dos ganhos sujeitos a IRS, considera-se valor da realização:
a) No caso de troca, o valor atribuído no contrato aos bens ou direitos recebidos, ou o valor de mercado, quando aquele não exista ou este for superior, acrescidos ou diminuídos, um outro da importância em dinheiro a receber ou a pagar”;
e no n.° 2 “Nos casos das alíneas a), b) e f) do número anterior, tratando-se de direitos reais sobre bens imóveis, prevalecerão, quando superiores, os valores por que os bens houverem sido considerados para efeitos de liquidação de sisa ou, não havendo lugar a esta liquidação, os que devessem ser, caso fosse devida”.
10. A citada norma legal define o valor a considerar para efeitos de determinação do rendimento tributável no caso de transmissão onerosa de imóveis, determinando que deve ser atendido, para efeitos de liquidação do imposto sobre o rendimento (IRS), o valor que servir de base à liquidação do IMT, o que, atento o disposto no n.° 1 do artigo 12° do CIMT, é o valor patrimonial tributário dos imóveis, definido nos termos do CIMI, quando superior ao valor constante do contrato (cfr., entre outros, Ac. TCAS de 09-04-2013, Proc. 06052/12).
11. No caso em apreço acontece que a transmissão (permuta) do prédio do impugnante, ora recorrido, fica sujeito àquelas regras.
12. Assim, o ganho (mais valia) do impugnante, ora recorrido, é o que ele obteve e que, não sendo considerado rendimentos empresariais e profissionais, de capitais ou prediais, resulta da alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis como dispõe o n.° 1, do art.° 10.º CIRS, ou seja para cálculo da sua situação tributária em sede de mais valias sujeitas a IRS, apenas importa o ganho que ele obtém com o seu imóvel, de que era já proprietário, por aquisição em momento anterior e que aliena com a permuta (art.° 2000, da freguesia de ……………, em Campo Maior) que realiza em 2004.
13. Para efeitos de tributação refere a alínea a) do n.° 4, do art.° 10.° do CIRS que o ganho que é sujeito a IRS é constituído pela diferença entre o valor de realização e o valor de aquisição, ou seja no caso em apreço, a diferença entre o valor pelo qual adquiriu o bem dado em permuta (troca) e o valor pelo qual se considera realizada a alienação no momento da permuta.
14. Não havendo dúvidas quanto à tributação do ganho obtido nem do momento da tributação vejamos o que diz o CIRS quanto ao valor de aquisição e de alienação, que deve ser sempre e apenas na ótica do prédio que o impugnante, ora recorrido, era proprietário, o que linha adquirido 2002 conforme termo de SISA e aliena no momento da permuta, seguindo as regras próprias do IRS.
15. Ora, atenta a redacção da alínea a) do n.° 4, do art.° 10.º do CIRS, importa aferir primeiro o valor de aquisição, e esse é o definido pelo art.° 46.°, que refere que para caso da alínea a) do n.° 1, do art.° 10.º, do CIRS, “se o bem houver sido adquirido a título oneroso, considera-se valor de aquisição o que tiver servido para efeitos de liquidação de SISA” e esse é claro nos autos que foi o declarado no termo de liquidação de 2002-07-11 (€ 5.568,84).
16. Sendo este valor de aquisição corrigido para efeitos de cálculo da mais valia, pela aplicação de coeficiente de desvalorização da moeda para o ano de 2004, relativo ao ano de 2002, que foi de 1,03, em cumprimento do disposto no n.° 1, do art.° 50.º, do CIRS.
17. Estando definido o valor de aquisição passemos a apurar o valor de realização, e é aqui em que a sentença interpreta e aplica erroneamente os respetivos preceitos legais do seu apuramento visando o valor da mais valia, interpretação e aplicação que viola claramente os seus próprios preceitos de apuramento como vamos demonstrar.
18. Este valor de realização nos termos da alínea a) do n.° 1, do art.° 44.°, será “o valor atribuído em contrato aos bens ou direitos recebidos, ou o valor de mercado quando aquele não exista ou este seja superior” e como vimos pela escritura o valor atribuído pelo outro permutante ao bem que tinha na sua propriedade e por este contrato transmitiu para o impugnante, ora recorrido, foi de € 30.780,00, (valor igual ao VPT), declarado na escritura, termos em que não há necessidade de se recorrer ao primeiro comparativo previsto na norma o “ou o valor de mercado”. (negrito nosso).
19. Mas para cumprimento da condição prevista na segunda parte da a) do n.° 1, do art.° 44.°, deverá ainda ser diminuído ao valor atribuído (€ 30.780,00) ao bem recebido, a importância de dinheiro a pagar, e essa foi de € 25.131,71, perfazendo um total de € 5.648,29, que constitui o valor de realização calculado nos termos da a) do n.° 1, do art.° 44.° do CIRS.
20. Porém, o n.° 2 do mesmo art.° 44.°, do CIRS, prevê que nos casos das alíneas a), b) e f) do número anterior, tratando-se de direitos reais sobre bens imóveis, prevalecerão, quando superiores, os valores por que os bens houverem sido considerados para efeitos de liquidação de sisa ou, não havendo lugar a esta liquidação, os que devessem ser, caso fosse devida”.
21. Ora, sendo que o “bem imóvel” é o bem cujo valor de realização se pretende apurar e esse, é nos termos da alínea a), o “dos bens recebidos” ou seja, o imóvel adquirido pelo impugnante, ora recorrido, (o do art.° 2968), o valor apurado na alínea a), do n.° 1, tem ainda de ser comparado com o valor por que o bem houver sido considerado para efeitos de SISA, (actualmente IMT que é o que aí se deve ler).
22. Pelo que, tendo sido o valor de avaliação do prédio 2968, para efeitos de IMT de € 273.320,00, e este é claramente “superior” nos termos do n.° 2 do referido no art.° 44° do CIRS, vai prevalecer sobre o valor constante da escritura como esta regra impõe.
23. Temos então que nestes termos se dá, ao contrário do sentenciado, cumprimento à norma legal citada que define o valor a considerar para efeitos de determinação do rendimento tributável no caso de transmissão onerosa de imóveis, determinando que deve ser atendido, para efeitos de liquidação do imposto sobre o rendimento [IRS], o valor que servir de base à liquidação do IMT, ou seja, atento o disposto no n.° 1 do artigo 12° do CIMT, o valor patrimonial tributário dos imóveis, definido nos termos do CIMI, quando superior ao valor constante do contrato.
24. Para os casos de permuta de imóveis, o valor de realização do imóvel alienado obtém-se por consideração de uma regra específica, que dita que será o valor atribuído no contrato aos bens ou direitos recebidos, ou o valor de mercado, quando aquele não exista ou este for superior, acrescidos ou diminuídos, um ou outro, da importância em dinheiro a receber ou a pagar. Note-se que esta é uma regra bem distinta da que vigora para efeitos de tributação em sede de IMT, em que o valor tributável é dado pela diferença declarada de valores (do imóvel adquirido e do imóvel alienado) ou a diferença entre os valores patrimoniais tributários (desses imóveis) quando superior. Não há, pois, que confundir a tributação do rendimento com a tributação do património.
25. Resulta claro das normas enumeradas, que nunca para apuramento de mais- valias pelos ganhos obtidos por um determinado alienante, releva o valor que em procedimento de avaliação venha a ser atribuído ao bem por si cedido na permuta. Esse valor poderá relevar sim mas no eventual apuramento de mais valias na esfera patrimonial do outro permutante, aqui não impugnante.
26. Por isso a sentença enferma de erro de julgamento de direito, é ela que incorre em errada interpretação e aplicação da lei, violando de forma clara, nomeadamente os n.°s 1 e 2 do art.° 44° e a al. a) do n.° 1 do art.° 10°, ambos do CIRS e o n.° 1 do art.° 12° do CIMT, quando ao aplicar o direito refere quanto ao cálculo do valor de realização, que o “valor de realização foi calculado por comparação entre o recebido e o dado em troca pelo impugnante, sendo porém esta comparação feita entre o valor do bem recebido depois de avaliado e o valor do bem dado, considerado pelo valor atribuído pelas partes, sendo ainda tomado em consideração, o valor pago em dinheiro pela impugnante.”
27. Ora o erro é manifesto, porquanto nem são comparados os valores de dois bens nem a lei obriga a essa comparação, tão pouco prevê a avaliação dos dois bens para efeitos de apuramento do valor de realização. A orientação da alínea a) do n.° 1, do art.° 44.°, é no sentido de o valor ser o atribuído no contrato ao(s) bem(ns) recebido(s), não fazendo, qualquer referência ao bem dado ou oferecido. Também a comparação de valores a prevalecer, referido no n.° 2, é com o valor de avaliação do bem referido no n.° 1, alínea a), ou seja o bem recebido.
28. Concluindo, erroneamente, a sentença, então, que o erro da AT na interpretação e aplicação da Lei, decorre “por não ter levado em conta, no cálculo da mais valia, o previsto no n.° 4 (deverá querer referir-se ao n.° 2, pois o n.° 4 não tem aplicação ao caso dos autos) do art.° 44°, do CIRS, tanto para calcular o valor do bem recebido como do bem dado ou cedido”
29. Ora tal interpretação e aplicação viola claramente o n.° 2 do art.° 44° do CIRS, pela simples razão, como já se referiu, o citado n.° 2 não obriga a isso, avaliar os bens, tão pouco comparar valores dos bens recebidos com os dos cedidos, fazendo exclusivamente referência aos bens recebidos por não relevar para quantificar a (contraprestação.
30. Erra, a sentença, na interpretação e aplicação, cometendo novo erro de julgamento de direito aplicável, quando refere que “importava saber, qual o valor que coube a esse prédio, depois da avaliação do CIMI, para conhecer o valor de cada prestação e contraprestação” e “assim poder apurar-se o valor da realização e assim a mais valia”, comete lapso evidente, decerto por confusão com as normas do CIMT, nomeadamente, as da determinação do valor tributável prevista no art.° 12.° - Valor Tributável, quando no seu n.° 1 refere que “o IMT incidirá sobre o valor constante do ato ou do contrato ou sobre o valor patrimonial tributário dos imóveis, consoante o que for maior” que prevê ainda na regra 4.ª do n.° 4 “nas permutas de bens imóveis, toma-se por base da liquidação a diferença declarada de valores, quando superior à diferença entre os valores patrimoniais tributários;”, norma esta que não encontra norma equivalente no Código do IRS e tem aplicação exclusiva às normas de tributação do IMT.
31. Relevando as normas do IMT, apenas, para a definição do valor que nos termos do n.° 2 do art.° 44.° do CIRS, deve ser comparado com o da alínea a) do seu n.° 1, para apurar o qual vai prevalecer tuas sempre em relação ao bem recebido na permuta.
32. Pelo que a sentença errou de direito ao considerar que o cálculo das mais valias padece de erro e vício de lei, a sentença é que padece de erro de julgamento de direito, porquanto decidindo como decidiu violou o direito aplicável, nomeadamente, os n°s 1 e 2 do art.° 44° e a al. a) do n.° 1 do art.° 10°, ambos do CIRS e o n.° 1 do art.° 12° do CIMT.
33. Ora em conclusão, as regras de apuramento do ganho para efeitos de tributação de mais valias em sede de IRS não enferma de deficiente aplicação das normas deste código e a relevância que a sentença faz da avaliação do bem dado na permuta poderá relevar para apuramento de mais valias na esfera patrimonial do outro permutante.
Nestes termos e nos mais de Direito aplicável, deve o presente recurso merecer provimento e ser revogada a sentença recorrida, substituída por outra que julgando a impugnação improcedente, conserve a validade na ordem jurídica da respectiva liquidação, com o que farão Vossas Excelências, Excelentíssimos Juízes Conselheiros, JUSTIÇA.”

1.2. O recorrido não apresentou contra-alegações.

1.3. O Exmo. Magistrado do Ministério Público pronunciou-se no sentido de o recurso ser de proceder, mas os autos deverem baixar à 1ª instância para apreciação de outras questões, como a do valor considerado para efeitos de aquisição não ser o correto, a avaliação efectuada não corresponder ao imóvel transmitido, a da ineficácia da escritura de permuta e a de não serem devidos juros compensatórios desde a data considerada, após a fixação da pertinente matéria de facto, nomeadamente, quanto aos valores pagos a título de I.M.T. o que releva ainda para efeitos da eventual aplicação do invocado art. 52.º do C.I.M.T., pelas razões a que no discurso jurídico infra gizado se fará alusão.

1.4. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
*
2. Fundamentação

2.1.- Dos Factos

Na sentença recorrida consta como provada a seguinte factualidade:

a) A 26/06/2008 foi assinada pelo impugnante ordem de serviço nº OI200700244, relativa à sua inspecção em sede de IRS, de âmbito geral, incidente sobre os anos 2004, 2005 e 2006 (cfr. Ordem de Serviço de fls. 339 dos autos);
b) A 11/12/2008 foi fixado como lucro tributável do impugnante, relativamente ao exercício de 2004, o valor de 60.638,10 euros, com fundamento em relatório de inspecção (cfr. despacho de fls. 28 do PAT);
c) A 04/12/2008 foi concluído relatório de inspecção, onde além do mais, se lê (cfr. Relatório de fls. 31 e ss. do PAT):
“II — OBJECTIVOS, ÂMBITO E EXTENSÃO DA ACÇÃO INSPECTIVA
11.1. - CREDENCIAL E PERÍODO EM QUE DECORREU A ACÇÃO
No sentido de dar cumprimento às Ordens de Serviço n.° OI200700244 de 05/07/2007, da Direcção de Finanças de Portalegre (PNAIT 11222000), foi efectuada acção inspectiva de âmbito parcial de IRS, ao Sujeito Passivo A……………., contribuinte n° ………….., com domicílio fiscal na R. ………., n …….. - ……….., Campo Maior, aos exercícios de 2004, 2005 e 2006.
A acção inspectiva iniciou-se em 2008.06.26 e terminou em 2008.11.11
11.2. - MOTIVO DA ACÇÃO, ÂMBITO E INCIDÊNCIA TEMPORAL
A sua programação foi efectuada na sequência de terem sido detectadas transacções de vendas/permuta de imóveis e na falta de entrega de declarações de rendimentos Modelo 3 de IRS.
É uma acção de âmbito parcial de IRS para os exercícios de 2004, 2005 e 2006 classificada como PNAIT 11222000.
III DESCRIÇÃO DOS FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA TRIBUTÁVEL
ANO 2004
Por escritura pública datada de 10 de Setembro de 2004, os sujeitos passivos B……………. (NIF ……………) e A………….. (NIF ……………) celebraram um contrato de permuta com a C…………………., Lda. (NIPC ……….).
O referido contrato de permuta consistiu, em os primeiros (NIF ………….. e ……………..) darem ou cederem um lote de terreno para construção urbana sito na freguesia de …………… em Campo Maior e inscrito na respectiva matriz sob o artigo 2000 com o valor patrimonial de 5.911,71 euros, ao qual atribuíram o valor de 5.911,71€ e os segundos (NIPC ………….) darem ou cederem um prédio urbano destinado à indústria sito na freguesia de …………….. em Campo Maior e inscrito na respectiva matriz sob o artigo 3968 com o valor patrimonial de 30.780,00€, ao qual atribuíram igual valor.
Na escritura consta ainda que “a diferença de valor atribuído aos prédios permutados ascende ao montante de vinte e cinco mil cento e trinta e um euros e setenta e um cêntimos, valor esse que já foi pago” pelos primeiros aos segundos (ver Anexo I).
Como já foi referido o sujeito passivo não entregou Declaração de Rendimentos Modelo 3 de IRS para o ano de 2004.
Há que referir que uma permuta é uma alienação onerosa em que a contrapartida é efectuada total ou parcialmente em bens, assim há que apurar a mais ou menos valia obtida pelo sujeito passivo A…………….. pela permuta da sua metade do imóvel com o Artigo 2000.
Nos termos da alínea a) do número 1 do artigo 9.° do CIRS constituem incrementos patrimoniais, desde que não considerados rendimentos de outras categorias: as mais valias.
A alínea a) do número 1 do artigo 10º do CIRS vem dizer que “constituem mais valias os ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos empresariais e profissionais, de capitais ou prediais, resultem de:
a) Alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis ...”
Nos termos da alínea a) do número 4 do artigo 10º do CIRS “o ganho sujeito a IRS é constituído: pela diferença entre o valor de realização e o valor de aquisição …”
Nos termos do número 1 do artigo 46° do CIRS, “considera-se valor de aquisição o que tiver servido para efeitos de liquidação de SISA”.
Assim o valor de aquisição do imóvel agora transmitido (o Artigo 2000) foi de 5.568,84€, conforme o declarado no Termo de Declaração de SISA de Julho de 2002 em anexo, sendo para o sujeito passivo em causa de 2.784,42€ (5.568,84 12) (ver Anexo II)
Nos termos da alínea a) do número 1 do artigo 44° do CIRS, para a determinação dos ganhos sujeitos a IRS, considera-se valor de realização “No caso de troca, o valor atribuído no contrato aos bens ou direitos recebidos, ou o valor de mercado, quando aquele não exista ou este for superior, acrescidos ou diminuídos, um ou outro, da importância em dinheiro a receber ou a pagar”
Assim pelo conteúdo da escritura temos: valor atribuído ao bem recebido foi de 30.780,00€, importância em dinheiro paga que foi 25.131,71€, o que daria um valor de realização de 5.648,29€ (30.780,00€ - 25.131,71€).
Mas nos termos do número 2 do artigo 44° do CIRS, que diz que “Nos casos das alíneas a), b) e f) do número anterior, tratando-se de direitos reais sobre bens imóveis, prevalecerão, quando superiores, os valores por que os bens houverem sido considerados para efeitos de liquidação de IMI” o que conjugado com o número 1 do artigo 31°. - A do CIRS que diz que “Em caso de transmissão onerosa de direitos reais sobre bens imóveis, sempre que o valor do contrato seja inferior ao valor definitivo que servir de base à liquidação de imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis, ou que serviria no caso de não haver lugar a essa liquidação, é este o valor a considerar para efeitos de determinação do rendimento tributável”.
Conforme podemos verificar o valor que serviu de base à liquidação de IMT do bem recebido (o Artigo 2968) foi nos termos do número 1 do artigo 12° do CIMT o valor patrimonial de 273.420,00€. (ver Anexo III)
Resumindo, nos termos do número 1 e 2 do artigo 44° do CIRS conjugado com o número 1 do artigo 31°-A do CIRS e com o número 1 do artigo 12° do IMT, o valor de realização é de 248.288,29 € (273.420,00 € 25.131,71 €) = (valor patrimonial do bem recebido - importância paga em dinheiro), sendo a parte do Sujeito Passivo A………………. de 124.144,15€ (248.288,29€ /2).
Nos termos do número 1 do artigo 50° do CIRS “o valor de aquisição ou equiparado de direitos reais sobre os bens referidos na alínea a) do n°. 1 do artigo 10° é corrigido pela aplicação de coeficientes para o efeito aprovados mediante portaria do Ministro das Finanças, sempre que tenham decorrido mais de 24 meses entre a data da aquisição e a data de alienação ou afectação”
Nos termos da portaria n° 376/2004, de 14 de Abril, o coeficiente de desvalorização da moeda para o ano de 2004, relativo ao ano de 2002 foi de 1,03.


Nos termos do n.° 2 do artigo 43° do CIRS, o saldo apurado de mais valias só é considerado em 50% do valor para efeitos de tributação, ou seja, neste caso só é considerado o valor de 60.638,10€ (121.276,19€ X 50%).
(…)
IX - DIREITO DE AUDIÇÃO – FUNDAMENTAÇÃO
Pelo oficio n.° 6625, de 19.11.2008, foi o sujeito passivo notificado para exercer o direito de audição, nos termos do artigo 60.° da LGT e artigo 60.° do RCPIT, para no prazo de 10 dias se pronunciar acerca do Projecto de Relatório da Inspecção Tributária que lhe foi remetido em anexo.
O sujeito passivo não exerceu o direito de audição, pelo que se mantém a posição assumida no projecto de relatório.”;
d) A 19/11/2008 foi emitido o ofício tendente à notificação do impugnante para o exercício do direito de audição quanto ao projecto de relatório de inspecção (cfr. cópia de oficio de fls. 106 do PAT);
e) A 03/12/2008 foi recebida a missiva a que respeita a alínea anterior (cfr. informação dos CTT, a fls. 104 do PAT);
f) A 19/12/2008 foi emitida a liquidação de IRS n.°20085004715525, relativo ao exercício de 2004, onde se calculou um valor de rendimento global de 60.638,09€, e um valor a pagar de 21.831,04€ (cfr. nota de liquidação de fls. 14 dos autos);
g) A 26/12/2008 foi expedido o envio de demonstração de liquidação — Nota de cobrança de IRS (cfr. informação extraída do sistema electrónico de citações e notificações da AT, de fls. 11 do PAT);
h) A missiva a que respeita a alínea anterior foi recebida a 31/12/2008 (conforme cópia de informação dos CTT, de fls. 12 do PAT);
i) A 30/12/2008 foi ao impugnante, em mão, entregue nota de demonstração de IRS, recusando a assinatura da certidão (conforme certidão de notificação de fls. 21 dos autos, e depoimento das testemunhas arroladas);
j) A 10/09/2004 compareceram perante notário, no Cartório Notarial de Campo Maior, B…………… e A……………….., como primeiros outorgantes, e, D…………….. e E……………….., casados, como segundos outorgantes, em representação da “C…………………, Lda.”, dizendo os primeiros que dão ou cedem à representada pelos segundos, um lote de terreno para construção designado por lote n°209, descrito na Conservatória do Registo Predial de Campo Maior, sob o número mil duzentos e vinte e seis da dita freguesia, inscrito na respectiva matriz sob o artigo 2000, com o valor patrimonial de 5.911,71€, e ao qual atribuem o valor de cinquenta e cinco mil novecentos e onze euros e setenta e um cêntimos, e dizendo os segundos darem ou cederem aos primeiros um prédio urbano composto por rés do chão, inscrito na matriz sob o n°2968 (...) com o valor tributável de 30.780,00€, ao qual atribuem igual valor (...), mais dizendo que que a diferença de valores atribuídos aos prédios permutados ascende aos montante de vinte e cinco mil cento e trinta e um euros e setenta e um cêntimos, valor que foi pago pelos primeiros aos segundos (cfr. anexo 1 ao relatório de inspecção, de fls. 39 e ss. do PAT);
k) A 11/07/2002 foi elaborado termo de declaração do aqui impugnante de Imposto de SISA, relativo ao terreno para construção, prédio inscrito na matriz predial da freguesia de …………….. sob o artigo 2000, pelo valor de 5.568,84€ (cfr. cópia de fls. 44 do PAT);
l) A 12/05/2005 foi elaborada ficha de avaliação (1ª avaliação) relativo ao artigo 2968, concluindo pelo VPT de 273.420,00€. (cfr. ficha de avaliação de fls. 45 e 46 do PAT);
Facto não provado:
1. A 11/11/2008 o impugnante assinou “nota de diligência (artigo 61.° do RCPIT)” NDO 20083726 (apesar de constar de fls. 103 do PAT cópia da nota de diligência a data da assinatura é ilegível).
*

2.2.- Do Direito

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos artigos 144º nº 2 e 146º nº 4 do CPTA e dos artigos 5º, 608º nº 2, 635º nºs 4 e 5 e 639º do CPC novo (aprovado pela Lei n.º 41/013, de 26 de Junho) ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA (correspondentes aos artigos 660º nº 2, 664º, 684º nºs 3 e 4 e 690º do CPC antigo).
No caso, em face dos termos em que foram enunciadas as conclusões de recurso pela recorrente ATA, a questão que cumpre decidir subsume-se a saber se na decisão vertida na sentença,
(i) -existe erro na aplicação feita da norma constante do n.º 4 do art. 44.º do C.I.R.S. e, se tendo querido referir-se ao n.º 2 desse art. 44.º a interpretação e aplicação realizada padece de erro, pois o valor de realização se apura pelo valor dos “bens recebidos”, nos termos da al. a) do n.º 1 desse mesmo art. 44.º; e
(ii) - se ocorre erro de julgamento por violação do previsto nos n.ºs 1 e 2 do art. 44.º, al. a) do n.º 1 do art. 10.º do C.I.R.S. e n.º 1 do art. 12.º do C.I.M.T., disposições que defende serem de aplicar.
Aquilatando cada um dos vectores recursórios pela ordem acabada de fixar.
Como emerge dos autos [RIT-al. c) do probatório], a AT calculou a mais-valia de €121.276,19 procedendo à subtração do valor de aquisição do bem alienado (€5.568,84) ao valor de realização, aplicando o coeficiente de actualização previsto na lei, sendo o valor da realização encontrado com base na subtracção do valor pago no acto da escritura ao valor do bem recebido na permuta, depois de avaliado nos termos do IMI.
A esse procedimento assacou o contribuinte e ora recorrido o erro de aplicação efectuada da norma ínsita no n.º 4 do art. 44.º do C.I.R.S..
E o que disse o julgador?
Percorreu o regime legal quanto à permuta compulsando o ordenado no artigo 44.° do CIRS, que, sob a epígrafe “valor de Realização” estabelece:
“1 - Para a determinação dos ganhos sujeitos a IRS, considera-se valor de realização:
a) No caso de troca, o valor atribuído no contrato aos bens ou direitos recebidos, ou o valor de mercado, quando aquele não exista ou este for superior, acrescidos ou diminuídos, um ou outro, da importância em dinheiro a receber ou a pagar.
(…)
4- Nos casos das alíneas a), b) e f) do número anterior, tratando-se de direitos reais sobre bens imóveis, prevalecerão, quando superiores, os valores por que os bens houverem sido considerados para efeitos de liquidação de sisa ou, não havendo lugar a esta liquidação os que devessem ser, caso fosse devida.”
Por referência a tal normação e em vista da sua aplicação ao caso concreto, entendeu o Mº juiz a quo que o valor de realização foi calculado por comparação entre o recebido e o dado em troca pelo impugnante, sendo porém esta comparação feita entre o valor do bem recebido depois de avaliado e o valor do bem dado, considerado pelo valor atribuído pelas partes, sendo ainda tomado em consideração, o valor pago em dinheiro pelo impugnante.
Prosseguindo, ampara o julgador que a AT incorreu num erro na interpretação e aplicação que faz da lei, por não ter levado em conta, no cálculo da mais-valia, o previsto no n°4 do artigo 44.° do CIRS, tanto para calcular o valor do bem recebido como do bem dado ou cedido.
Explicitando, afirma o Mº Juiz que o erro da AT é o de estar a calcular a mais-valia com base no valor atribuído ao imóvel recebido depois de avaliado, por primeira transmissão ao abrigo do CIMI, levando porém em conta, para calcular essa mesma mais-valia, apenas o valor pago em dinheiro, sem levar em conta o valor do bem dado na permuta, também depois de avaliado nos termos do IMI.
Daí que entenda que é notoriamente contra o dever de boa-fé na interpretação da lei, conhecendo o momento histórico da reavaliação do património, aquela que se faça das normas a que a AT lançou mão, levando em consideração apenas o valor pago em dinheiro aquando da permuta como valor a abater ao valor recebido, considerando o valor da realização do bem como o valor do prédio recebido, depois de avaliado, sem fazer acrescer ao valor pago em dinheiro, o valor do bem dado, também depois de avaliado, pois só assim se comparam realidades semelhantes.
Atentemos se esta argumentação tem consistência e é de seguir.
Antes de mais e acima de tudo, atendendo à mera literalidade da norma, dúvidas não sobram de que o julgador incorreu em erro ao confundir (comutar?) o n.º 4 com o nº 2 do art. 44.º do C.I.R.S..
Depois, também se nos afigura não ser de assentir na interpretação seguida na sentença e que aponta para que no cálculo efectuado para efeitos de apuramento da matéria colectável o valor pago em dinheiro se podia abater ao valor do prédio recebido depois de avaliado e que, não se tendo procedido também à avaliação do “bem dado”, ocorreu violação do princípio da boa-fé.
A tributação das mais-valias depara-se prevista no artigo 10.°, n.° 1 do CIRS, que estatui que:
“Constituem mais-valias os ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos empresariais e profissionais, de capitais ou prediais, resultem de:
a) Alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis e afectação de quaisquer bens do património particular a actividade empresarial e profissional exercida em nome individual pelo seu proprietário”.
In casu o ganho (mais valia) do impugnante, ora recorrido, é o que ele obteve e que, não devendo considerar-se rendimentos empresariais e profissionais, de capitais ou prediais pois resulta da alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis por influxo do n.° 1, do art.° 10.º CIRS, o que vale por dizer que para cálculo da sua situação tributária em sede de mais valias sujeitas a IRS, apenas releva o ganho que ele obtém com o seu imóvel, de que era já proprietário, por aquisição em momento anterior e que aliena com a permuta (art.° 2000, da freguesia de ………………., em Campo Maior) que realiza em 2004.
Acresce que, para efeitos de tributação, determina a alínea a) do n.°4, do art.° 10.° do CIRS que o ganho que é sujeito a IRS é constituído pela diferença entre o valor de realização e o valor de aquisição, ou seja no caso em apreço, a diferença entre o valor pelo qual adquiriu o bem dado em permuta (troca) e o valor pelo qual se considera realizada a alienação no momento da permuta.
No tocante ao valor de aquisição e de alienação do prédio de que o impugnante e ora recorrido era proprietário: a sua aquisição ocorreu em 2002 conforme termo de SISA e a sua alienação deu-se no instante da permuta, devendo os valores serem determinados de acordo com as regras próprias do IRS.
Assim, quanto ao valor de aquisição rege a regra ínsita na no art.° 46.°, que estabelece para os efeitos a que alude a alínea a) do n.° 4, do art.° 10.º do CIRS que, “se o bem houver sido adquirido a título oneroso, considera-se valor de aquisição o que tiver servido para efeitos de liquidação de SISA” o qual, como objectivam os autos, foi o declarado no termo de liquidação de 2002-07-11 (€ 5.568,84), valor de aquisição corrigido para efeitos de cálculo da mais valia, mediante a aplicação de coeficiente de desvalorização da moeda para o ano de 2004, relativo ao ano de 2002, que foi de 1,03, em observância do disposto no n.°1, do art.°50.º, do CIRS.
No concernente ao valor de realização, que é o controvertido nos autos, por determinação da alínea a) do n.°1, do art.°44.°, será “o valor atribuído em contrato aos bens ou direitos recebidos, ou o valor de mercado quando aquele não exista ou este seja superior”.
Ora, emerge da escritura que o valor atribuído pelo outro permutante ao bem que tinha na sua propriedade e por este contrato transmitiu para o impugnante, ora recorrido, foi de €30.780,00, (valor igual ao VPT), declarado na escritura, como bem refere a recorrente, não há necessidade de se recorrer ao primeiro comparativo previsto na norma o “ou o valor de mercado”.
Não obstante e na rota da apelante, para observância da condição prevista na segunda parte da a) do n.° 1, do art.° 44.°, deverá ainda ser diminuído ao valor atribuído (€30.780,00) ao bem recebido, a importância de dinheiro a pagar, e essa foi de €25.131,71, perfazendo um total de €5.648,29, que constitui o valor de realização calculado nos termos da a) do n.°1, do art.°44.° do CIRS.
E é neste ponto que radica o pomo da discórdia: o n.° 2 do mesmo art.° 44.°, do CIRS, prevê que “…nos casos das alíneas a), b) e f) do número anterior, tratando-se de direitos reais sobre bens imóveis, prevalecerão, quando superiores, os valores por que os bens houverem sido considerados para efeitos de liquidação de sisa ou, não havendo lugar a esta liquidação, os que devessem ser, caso fosse devida”.
Por assim ser, sendo pacífico que o “bem imóvel” é o bem cujo valor de realização se pretende apurar, ou seja e nos termos da alínea a), o “dos bens recebidos” (o imóvel adquirido pelo impugnante com o art.° 2968), o valor apurado na alínea a), do n.°1, tem ainda de ser comparado com o valor por que o bem houver sido considerado para efeitos de SISA, (hodiernamente IMT).
Aplicando essas regras ao caso posto, uma vez que o valor de avaliação do prédio 2968, para efeitos de IMT foi € 273.320,00, notoriamente superior nos termos do n.° 2 do referido no art.° 44° do CIRS, o mesmo prevalecerá sobre o valor constante da escritura.
Do que vem dito decorre que a sentença errou por não ter considerado que o valor a atender para efeitos de determinação do rendimento tributável no caso de transmissão onerosa de imóveis, será o que serviu de base à liquidação do IMT, vale dizer, o valor patrimonial tributário dos imóveis, definido nos termos do CIMI, quando superior ao valor constante do contrato (cfr. o n.° 1 do artigo 12° do CIMT).
Todavia, in casu ocorreu uma permuta de imóveis, sustentando a recorrente que o valor de realização do imóvel alienado obtém-se por consideração de uma regra específica, que dita que será o valor atribuído no contrato aos bens ou direitos recebidos, ou o valor de mercado, quando aquele não exista ou este for superior, acrescidos ou diminuídos, um ou outro, da importância em dinheiro a receber ou a pagar.
Trilhando e com a devida vénia o percurso analítico empreendido por José Guilherme Xavier de Basto em IRS - Incidência Real e Determinação de Rendimentos Líquidos, ed. Coimbra Ed., 2007, a p. 444, também citado pelo Ministério Público no seu douto Parecer, sobre o sentido e alcance da norma do artº 44º, nº1, do C.I.R.S., “ (...) no caso de troca, rege a alínea a) da citada disposição o valor de realização é então o valor atribuído no contrato aos valores recebidos, ou o valor de mercado, sendo superior (…)”.
Para o caso dos mais-valias prediais, a lei faz prevalecer como valor de realização “os valores por que os bens houverem sido considerados para efeitos de liquidação de sisa (...)”.
É, pois, insofismável que para o apuramento do ganho gerador de mais-valia terá de ser considerado como valor de realização o dos bens recebidos, sendo de considerar uma actualização para o previsto no Código de Imposto Municipal sobre Transacções (C.I.M.T.)., quer quanto ao previsto no n.º 2 do art. 44.º, quer no art. 46.º n.º 1 do C.I.R.S. que se refere já ao valor de aquisição.
Ora, atendendo à data dos factos previa-se ainda ser o valor de aquisição “o que tiver servido para efeitos de liquidação de sisa” apesar de no art. 28.º n.º 2 do Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12/11, se prever já que “todos os textos legais que mencionem” o imposto de sisa fosse entendidos como referidos ao I.M.T., tal não conduzir à desconsideração como valor de aquisição o do imóvel resultante de avaliação efectuada no domínio do Código da Sisa e do Imposto sobre Sucessões e Doações (C.S.I.S.S.D.). Tese acolhida e sustentada no acórdão do S.T.A. de 14-3-2012 proferido no proc. 0107/12, disponível em www.dgsi.pt, embora versando sobre imóvel adquirido a título gratuito sobre que incidia o referido imposto, o qual veio a ser substituído pelo imposto de selo e que é já referido no art. 45.º do CIRS.
Sucede que, em conformidade com o estatuído no art. 50.º do C.I.R.S., esse valor foi ainda sujeito a actualização por coeficientes de correcção monetária, uma vez decorreram mais de 24 meses entre as datas de aquisição e da “alienação”, conceito relativamente ao qual, como menciona o EPGA, não resultam grandes dúvidas que integra o de troca.
E o contrato de troca, tal como vinha definido no artº 1592 do CC de 1867, “É o contrato por que se dá uma coisa por outra, ou uma espécie de moeda por outra espécie dela”. Ou, segundo definição aventada por Cunha Gonçalves, Dos Contratos em Especial, p. 244, é aquele pelo qual uma pessoa permuta coisa sua, por outra presumivelmente de valor igual, pertencente ao outro permutante. No ensinamento dos Profs. Pires de Lima e Antunes Varela, in CC anotado vol. II, p. 180, Coimbra Ed., “O contrato de troca enquadra-se nos contratos onerosos a que são aplicáveis as regras relativas à compra e venda, nos termos do previsto no art. 939.º do Código Civil, só tendo desaparecido a sua regulamentação desse diploma por se ter considerado desnecessário”.
Aqui chegados, há que relevar a distinção feita pela recorrente: no caso de permuta existe uma regra bem distinta da que vigora para efeitos de tributação em sede de IMT, em que o valor tributável é dado pela diferença declarada de valores (do imóvel adquirido e do imóvel alienado) ou a diferença entre os valores patrimoniais tributários (desses imóveis) quando superior, não havendo que confundir a tributação do rendimento com a tributação do património. Dito de outro modo: para apuramento de mais- valias pelos ganhos obtidos por um determinado alienante, releva o valor que em procedimento de avaliação venha a ser atribuído ao bem por si cedido na permuta o qual poderá relevar para efeitos de apuramento de mais valias na esfera patrimonial do outro permutante, aqui não impugnante.
Sendo assim, assiste razão à recorrente visto que a lei não só não impõe a comparação dos valores dos dois bens, como não prevê a avaliação dos mesmos para efeitos de apuramento do valor de realização, tendo a sentença incorrido em erro ao afirmar que a AT errou na interpretação e aplicação da Lei, “por não ter levado em conta, no cálculo da mais-valia, o previsto no n.°4 (como bem denota a recorrente, deverá querer referir-se ao n.°2, pois o n.°4 não tem aplicação ao caso dos autos) do art.°44°, do CIRS, tanto para calcular o valor do bem recebido como do bem dado ou cedido”.
Em suma: o n.° 2 do art.° 44° do CIRS, não obriga a avaliar os bens ou a comparar valores dos bens recebidos com os dos cedidos, fazendo exclusivamente referência aos bens recebidos por não relevar para quantificar a contraprestação. E as normas do IMT apenas relevarão para a definição do valor que nos termos do n.° 2 do art.° 44.° do CIRS deve ser comparado com o da alínea a) do seu n.° 1, para apurar o qual vai prevalecer sempre em relação ao bem recebido na permuta.
Resulta do que vem exposto que, coadjuvando o ponto de vista da recorrente e do EPGA, não se nos afigura que a A.T. haja actuado em violação do princípio da boa-fé, a qual se presume de acordo com o previsto no art. 59.º n.º 2 da L.G.T..
Ocorre, pois, uma errada interpretação e aplicação do direito aos factos dados como provados que se traduz na violação, especialmente, dos n.°s 1 e 2 do art.° 44, a al. a) do n.° do art.° 10.º, ambos do CIRS e do n.°1 do art.° 12° do CIMT, incorrendo a sentença em erro de julgamento de direito a impor a sua revogação por via da procedência do recurso.
*
Todavia e como suscita o EPGA, o impugnante colocara à apreciação do tribunal a quo outras questões, a saber (i) o valor considerado para efeitos de aquisição não ser o correto; (ii) a avaliação efectuada não corresponder ao imóvel transmitido; (iii) a da ineficácia da escritura de permuta e (iv) a de não serem devidos juros compensatórios desde a data considerada.
Impende sobre o julgador o dever prescrito no nº 2 do artº 608º do CPC, e que é o de resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão estiver prejudicada pela solução dada a outras, visto que a sentença acabou apenas por conhecer do fundamento da impugnação atrás dissecado julgando este procedente, e não conheceu da(s) outra(s) causa(s) de pedir cujo conhecimento ficara lógica e implicitamente prejudicado pela procedência do primeiro, agora desaprovada, haverá que conhecer das supra referenciadas causas petitórias.
O Prof. Anselmo de Castro, Direito Processual Civil Declaratório, Vol. III, Apêndice, pág. 409, esclarece que a lei não previne «...a hipótese se procedência ou improcedência do pedido quando dos vários fundamentos ou excepções invocados (...) só alguns e não todos os fundamentos ou excepções tenham sido julgados procedentes ou apreciados (...). Põe-se então a questão de saber se ao tribunal ad quem (...) cabe conhecer oficiosamente da procedência ou improcedência desses fundamentos ou excepções ou se só poderá fazê-lo a instância da parte interessada (...) através da respectiva alegação e as consequentes conclusões.
(...) Na falta de qualquer disposição da nossa lei sobre a matéria, temos certo que ao tribunal ad quem cumpre conhecer oficiosamente (quer o recorrido intervenha ou não no recurso) dos fundamentos ou excepções que foram negadas ao recorrido, ou que, por supérfluas, não chegaram a ser apreciadas pelo tribunal ad quem.».
Mas é de mandar fixar ainda pertinente matéria de facto, nomeadamente, quanto aos valores pagos a título de I.M.T. o que releva ainda para efeitos da eventual aplicação do invocado art. 52.º do C.I.M.T..
Assim, cumpre levar a cabo tais diligências instrutórias na 1ª instância sobre a demarcada matéria de facto, nos pontos necessários, porque do processo não constam todos os elementos necessários para a decisão, pois os carreados pelo recorrente não são decisivos.
Como o tribunal recorrido deixou de apreciar questões de que deverá conhecer e não há no processo elementos bastantes para essa apreciação, o processo terá de baixar àquele tribunal. Referindo-se, então, a conveniência de ter em conta o disposto no art. 13º do CPPT e 99º da LGT, para proceder à produção de prova pois por aqueles preceitos se faz recair sobre os juízes dos tribunais tributários o dever de «realizar ou ordenar todas as diligências que considerarem úteis ao apuramento da verdade».
Ora, é inquestionável a relevância e, por isso, a utilidade da indagação sobre as questões factuais que atrás se apontaram em resultado do acabado de fundamentar e decidir quanto à sorte do recurso no presente acórdão do STA.
Afigura-se-nos, pois, que o Juiz do Tribunal recorrido poderá e deverá indagar daquelas questões diligenciando por obter prova documental (a sugerida e a que as partes sugerirem e o próprio juiz reputar útil e necessária) sobre os factos atinentes pois, mesmo que se considerem como factos instrumentais, nada impede que o Tribunal indague sobre eles, faculdade que era admitida no processo civil já antes da reforma de 1995/1996 (Cfr. Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual, págs. 412 a 417.). Por outro lado, no art. 264.°, n.° 3, do CPC, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.° 180/96, de 25 de Setembro, e passamos a citar Jorge Lopes de Sousa, «ocorreu uma extensão dos poderes de cognição do tribunal em termos de este poder considerar na decisão os factos essenciais à procedência das pretensões formuladas ou das excepções deduzidas que sejam complemento ou concretização de outros que as partes hajam alegado e resultem da instrução e discussão da causa, desde que a parte interessada manifeste vontade de deles se aproveitar e à parte contrária seja sido facultado o exercício do contraditório. Não se trata aqui de factos de conhecimento oficioso, pois o seu conhecimento pelo tribunal depende de uma actuação das partes, o que demonstra que, mesmo no domínio do processo civil as obrigações de alegação impostas às partes e os poderes de requerer a realização de diligências probatórias relativas aos factos alegados não é incompatível com a possibilidade de o tribunal atender a factos não alegados. De qualquer modo, parece que esta última ampliação dos poderes de cognição dos tribunais no domínio do processo civil, não poderá deixar de ser aplicada no domínio do processo judicial tributário, uma vez que os interesses públicos que neste estão em causa justificam, por maioria de razão, poderes de cognição ampliados» (Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado, nota 5 ao art. 13.°, págs. 119/120.). Deverá, pois, o Tribunal Tributário de 1ª Instância de Castelo Branco, ao abrigo dos poderes que lhe eram conferidos pelos artºs. 13º do CPPT e 99º da LGT, indagar a ocorrência dos factos apontados fazendo juntar os pertinentes documentos de suporte e realizar todas as diligências instrutórias e levá-los ao probatório que se impõe que seja elaborado por forma a contemplar todas aquelas questões fácticas em vista da sua subsunção ao regime jurídico aplicável.
Porque tal indagação se nos afigura indispensável à boa decisão da causa, é de mandar baixar os autos, a fim de que se conheça das demais questões colocadas na impugnação, pois é ainda de mandar fixar pertinente matéria de facto quanto à prova de pagamento dos valores devidos a título de I.M.T..

Termos em que, por via da procedência do recurso, se impõe revogar a sentença e ordenar a baixa dos autos à 1ª instância para os fins precisados.


*
3. Decisão:

Em face do exposto, acorda-se nesta secção do contencioso tributário do Supremo Tribunal Administrativo, em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e ordenar a baixa dos autos à 1ª instância, a fim de conhecer das demais questões formuladas na impugnação fixando a pertinente matéria de facto.

Custas pelo recorrido.

*

Lisboa, 21 de Novembro de 2019. – José Gomes Correia (relator) – Joaquim Manuel Charneca Condesso – Ascensão Lopes.