Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0481/18
Data do Acordão:06/06/2018
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ASCENSÃO LOPES
Descritores:OPOSIÇÃO
REVISÃO
SENTENÇA
SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO
Sumário:I - Nos termos dos artigos 169º nº 1 do CPPT e 52º nºs 1 e 2 da LGT a execução fiscal fica suspensa até à decisão do pleito, desde logo, se for apresentada oposição que tenha por objecto a cobrança da dívida exequenda, desde que tenha sido constituída garantia nos termos do artigo 195.º ou prestada nos termos do artigo 199.º ou a penhora garanta a totalidade da quantia exequenda.
II - No caso do processo de oposição a execução deve prosseguir os seus termos logo que transitada em julgado a sentença no processo de oposição cuja revisão foi requerida.
III - Este prosseguimento resulta directamente dos normativos do CPPT não sendo necessário fazer apelo ao disposto no nº 3 do artº 699º do novo CPC sendo que o estatuído no artº 702º deste mesmo compêndio normativo não tem aplicação no caso dos autos.
IV - Compreendem-se melhor as proposições supra enunciadas, se atentarmos na natureza do processo de revisão de sentença, pois este configura-se como um processo novo e não um prolongamento da oposição transitada em julgado, como vem sendo afirmado uniformemente pela jurisprudência deste STA.
Nº Convencional:JSTA000P23385
Nº do Documento:SA2201806060481
Data de Entrada:05/09/2018
Recorrente:A... LDA
Recorrido 1:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em conferência, nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1 - RELATÓRIO

A………. Ldª, melhor identificada nos autos, vem recorrer para este Supremo Tribunal da decisão do Tribunal Administrativo do Porto que julgou improcedente a reclamação por ela apresentada contra o indeferimento do pedido de suspensão da venda do bem penhorado no âmbito do processo executivo fiscal nº 1783201001026038.

Inconformada com o assim decidido, apresentou as respectivas alegações que resumiu nas seguintes conclusões:
«I - A reclamante interpôs recurso de revisão, que é um recurso judicial enquadrável na previsão do nº 1 do artigo 169º do CPPT.
II - Nesse recurso invocou nulidades da notificação da renúncia ao mandato do seu mandatário assim como do despacho que ordenou a deserção do recurso, correndo o processo à sua revelia.
III - Com esse recurso a reclamante visa a apreciação da oposição que, por ter sido julgada deserta, não mereceu qualquer decisão de mérito.
IV - Interposto o recurso, e porque corre, porque a venda do bem penhorado estava marcada a reclamante pediu a suspensão da venda, o que foi indeferido pelo despacho objecto de reclamação.
V - O prosseguimento da execução e da venda, viola interesses legítimos da recorrente (direito propriedade previsto no artigo 62º da Constituição) que corre o risco de ver o seu património ser excutido sem que seja apreciado o recurso de revisão e, eventualmente, o mérito da oposição.
VI - A oposição pode extinguir a obrigação tributária, mas se entretanto o bem for vendido as consequências serão irreparáveis, até porque é do conhecimento geral que a venda nestas circunstâncias ocorre, sempre, por valores inferiores.
VII - A quantia exequenda, mesmo que a venda seja declarada suspensa, estará sempre assegurada pelo valor dos bens penhorados (o que está demonstrado pela documentação junta aos autos pelo serviço de finanças competente) o que por si só já justifica a suspensão, tal como resulta do artigo 169º do C.P.P.T.
VIII - A suspensão da execução e venda não só se justifica como se impõe, atento o princípio da TUTELA JURISDICIONAL EFECTIVA, que resulta do nº 4 do artigo 268º nº4 da CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA, já que não suspendendo perde efeito útil o recurso deduzido e até a oposição.
IX - É certo que a decisão objeto de recurso considera que a execução deve prosseguir atento o disposto no artigo 669º nº3 do C.P.C, aplicável a estes autos subsidiariamente.
X - Acontece que os fundamentos do recurso de revisão do CPPT não são exatamente os mesmos que os previstos no CPC, já que permite sindicar decisão em que ocorra falta ou nulidade da notificação do requerente quando tenha dado causa a que o processo corresse à sua revelia.
XI - O que foi suscitado no recurso de revisão foi a falta de notificação da renúncia do mandato, sendo que a extinção da oposição ocorreu por falta de constituição de novo mandatário e sem que a concreta pretensão fosse decidida.
XII - Ou seja constatado o ocorrido, e o significado dessa omissão, o recorrente interpôs recurso de revisão, não porque tivesse factos novos, mas porque a sua oposição tinha sido julgada deserta (sem julgamento de mérito) por factos que lhe são estranhos e são imputáveis ao tribunal.
XIII - Ora vistas as diferenças entre o disposto no CPC e CPPT sobre esta matéria, impõe-se que se verifique se o disposto no nº 3 do artigo 699º do CPC é aplicável integralmente e sem correções à execução fiscal.
XIV - No regime dos recursos de revisão do CPC compreende-se que assim seja, até porque o mesmo só é impulsionado por factos desconhecidos à data da prolação da sentença.
XV - Porém no caso dos presentes autos está em causa a nulidade cometida no processo de oposição e que determinou a sua deserção por falta de constituição de mandatário.
XVI - As situações são obviamente diferentes o que justifica que a venda não ocorra sem que seja julgado o recurso, evitando-se a ofensa de interesses e direitos constitucionalmente protegidos.
XVII - Nada justifica tal ofensa, o que se alcança até se não ignorarmos o disposto no artigo 702º do C.P.C que impede o pagamento do credor em dinheiro ou bens sem prestar caução.
XVIII - Ora, ao promover a venda através dos próprios meios (a AT é em simultâneo exequente e autoridade para promover a execução), pagar-se-á pelo produto de bens e pagar-se-á logo que ocorra a venda.
XIX - E como é óbvio a AT não prestará caução como resultaria da aplicação subsidiária do artigo 702º do C.P.C.
XX - Se executa, se promove a execução e se recebe e se não presta caução, então atento o disposto no artigo 702º do C.P.C e a sua finalidade, também deve abster-se de promover a venda, o que afinal só depende de si.
XXI - A AT tendo o domínio da marcação da venda, podendo dispor e transmitir do bem não necessita de promover a venda já que o seu crédito está sempre garantido pela penhora e pelo direito de promover a venda.
XXII - E se não necessita de promover a venda para assegurar o seu crédito, não é RAZOÁVEL que a promova sem que o recurso esteja decidido, sendo que o princípio da razoabilidade e da justiça previstos no artigo 8º do Código do Procedimento Administrativo, justificam que não se cometa semelhante imprudência.
XXIII - Ora a resposta adequada e que é conforme a Constituição da República Portuguesa (artigo 62º) é que a venda de um bem em execução não deve ocorrer antes de não haver qualquer possibilidade de revogar a decisão em que se fundamenta a execução.
XXIV - O artigo 699º nº 3 não pode ser interpretado senão em conjunto com o artigo 702º do C.P.C, e correctivamente, por apelo ao principio da justiça e razoabilidade, no sentido que a venda que a venda não deve ser marcada, pois poderá tornar-se acto inútil e passível de produzir danos irreparáveis, sendo certo que a sua promoção dependente da prestação de caução, não produzirá vantagens significativas e que superem a desvantagem enunciada.
XXV - Nestas circunstâncias deve a decisão recorrida ser revogada, decidindo-se que a AT havendo recurso, ainda que de revisão, pendente deve abster-se de promover a venda de bens penhorados.
XXVI - A decisão recorrida viola as seguintes normas:
Artigos 62º e 268º nº4 da C.R.P
Artigos 169º nº1 do CPPT
Artigos 699º nº3 e 702º do CPC.
Assim decidindo V. Exas farão inteira justiça.»

Não foram apresentadas contra alegações.

O Ministério Público emitiu parecer com o seguinte conteúdo:
«Recurso interposto por A………., Lda., sendo recorrida a Fazenda Pública:
1. Objeto do recurso.
Está em causa o decidido na sentença recorrida, de não suspender a execução com fundamento na apresentação de recurso de revisão do decidido em oposição, com fundamento em ser de corrigir o entendimento tido do art. 169.º do C.P.P.T., bem como do art. 699.º n.º 3 do C.P.C...
Para tal alega serem os fundamentos do dito recurso “nulidades da notificação da renúncia ao mandato do seu mandatário assim como do despacho que ordenou a deserção do recurso, correndo o processo à sua revelia” bem como que o dito art. 699.º do C.P.C. não pode se não ser interpretado em conjunto com o art. 702.º do C.P.C..
Invoca ainda que, estando a quantia exequenda assegurada pelo valor dos bens penhorados, tal interpretação corretiva se impõe, segundo o(s) princípio(s) de razoabilidade e de justiça previstos nos arts. 8.º do C.P.A., bem como ainda do respeito do direito de propriedade nos termos dos arts. 62.º da C.R.P. e da tutela judicial efetiva prevista ainda no art. 268.º n.º 4 da C.P.R..
2. Da posição a adotar.
O art. 169.º do C.P.P.T. abarca um conjunto de procedimentos e processos, entre os quais o de reclamação graciosa, o de impugnação judicial o de recurso judicial que tenham por objeto a legalidade da dívida, o de resolução no quadro de Convenção de Arbitragem e ainda o de oposição relativamente aos quais prevê que seja de suspender a execução, mediante condições no mesmo previstas, entre as quais a de estar garantido o pagamento da respetiva quantia, em que a apresentação de pedido de revisão não se insere.
Aliás, no que respeita à oposição, conforme previsto no n.º 10 desse artigo, ficou expresso o seguinte: “aplica-se o disposto nos n.ºs 1 a 7”.
Ora, conforme previsto no n.º 1 a suspensão só é possível “até à decisão do pleito”.
Conforme se fundamenta na sentença recorrida, tal inciso é compatível com a suspensão só ser de admitir até ao trânsito em julgado da decisão, o qual ocorre logo que esta não seja suscetível de recurso ordinário ou de reclamação, nos termos do art. 628.º do atual C.P.C., subsidiariamente aplicável.
No caso de oposição ter sido já decidida com trânsito em julgado, os seus efeitos, em termos de estar permitida a execução, não são de afastar tal pela apresentação de recurso de revisão ainda que com os referidos fundamentos.
Com efeito, o legislador pretende desde 1961 que seja o caso julgado anterior que deva prevalecer e não a mera pendência de processo, podendo, pois, em face da dita apresentação, ir correndo a execução — tal o que resulta do art. 699.º n.º 3 do C.P.C., conforme explicam Álvaro Lopes Cardoso em Manual dos Recursos em processo civil e laboral, 1988, ed. Livraria Petrony, p. 169 e Cardona Ferreira em Guia de Recursos em processo Civil, 2005, Coimbra Ed., p. 141.
A ressalva de que só pode, entretanto, haver pagamento se o exequente ou credor reclamante prestar caução — assim, ainda no art. 702.º do C.P.C., que é de aceitar ter sido prevista em relação com a dita norma -, resulta no caso da execução fiscal ainda aplicável, havendo créditos a verificar e a graduar, nos termos do previsto no art. 281.º n.º 1 do C.P.P.T..
Por outro lado, o direito de propriedade do recorrente é apenas garantido “nos termos da Constituição”, a qual permite também a cobrança de impostos, como os IMI e IMT dados à execução.
Finalmente, ainda que se admita que a A.T. não tenha de prestar caução, o direito da recorrente relacionado com a prática do ato administrativo da venda em processo de execução fiscal, é sempre assegurado através da responsabilidade civil do Estado, nos termos da Lei n.º 67/2007, de 31/12 e do art. 22.º da C.R.P..
Concluindo:
A apresentação de pedido de revisão do decidido em oposição não se enquadra no art. 169.º n.1 do C.P.P.T., em que se prevê como requisito estar garantido o pagamento da quantia exequenda.
Sendo subsidariamente aplicável o art. 699.º nº 3 do C.P.C., nos termos do art. 2º al. e) do C.P.P.T.,
A dita apresentação não tem por efeitos suspender a execução, pois importa respeitar o caso julgado anterior.
O recurso é de improceder.»

2 - Fundamentação
O Tribunal a quo deu como provada a seguinte matéria de facto:
1. Foram instaurados contra a reclamante os processos executivos fiscais 31783201001026038 e apensos, no valor global de €98.660,85— cf. certidão de dívida, a fls. 41 e seguintes dos autos, numeração referente ao processo físico;
2. No dia 21 de Outubro de 2011 foi elaborado “Auto de penhora”, respeitante ao “prédio urbano, composto de terreno destinado a construção, sito em ……… […] freguesia de Vilar de Andorinho, concelho de Vila Nova de Gaia, com a área total de terreno de 60.500 m2, inscrito na matriz predial urbana daquela freguesia e concelho sob os artigos 2140 e 2141” — cf. auto de penhora constante de fls. 106 dos autos físicos;
3. Por despacho de 18 de Janeiro de 2012, foi fixado o valor para venda dos bens referidos em 2., no valor de 907.500,00— cf. despacho constante de fls. 115 dos autos físicos;
4. A Reclamante apresentou oposição à execução no serviço de finanças de Vila Nova de Gaia no dia 09 de Janeiro de 2012— cf. “Informação elaborada pelo Serviço de Finanças de Gondomar 1 (art. 208.° do Código de Procedimento e Processo Tributário)”, constante de fls. 118 dos autos físicos;
5. No dia 29 de Fevereiro de 2012 foi elaborado despacho pelo chefe de Finanças de Gondomar 1 com seguinte conteúdo: “Tendo sido apresentada oposição quando já se encontrava penhorado e registo o bem imóvel acima identificado e atendendo a que não obstante a existência de uma hipoteca voluntária, verifica-se que a penhora do bem em causa se mostra suficiente para garantir a totalidade da quantia exequenda e do acrescido, suspenda-se a execução nos termos e para os efeitos previstos no artigo 169.º do CPPT.” — cf. despacho constante de fls. 122 dos autos físicos;
6. No dia 28 de Setembro de 2016 foi registada penhora sobre o prédio urbano inscrito na respectiva matriz predial sob o n° 10401 da União das Freguesias de Pedroso e Seixezelo, cujo valor patrimonial tributário era de €110.580,00— cf. Certidão Permanente e Certidão de teor, constantes de fls. 162 e 165, respectivamente, dos autos físicos;
7. No dia 3 de Outubro de 2017 o Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto recebeu pedido de “REVISÃO DE SENTENÇA”, à ordem do processo 491/1 2.7BEPRT — cf. pedido, a fls. 259 dos autos físicos;
8. No dia 3 de Outubro de 2017, a Reclamante apresentou requerimento no Serviço de Finanças de Gondomar 1, onde pede “a imediata suspensão da execução, suspensão da venda, já que a manter-se causar-se-á à executada prejuízo irreparável” — cf. requerimento, constante de fls. 258 dos autos físicos;
9. O pedido referido em 7. foi indeferido, por despacho de 06 de Outubro de 2017, com fundamento na informação que lhe subjaz e onde consta “Encontra-se arquivado neste Serviço de Finanças o Processo de Oposição que correu termos no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, sob o n° 491/12.7BEPRT (Oposição n° 1783201209000305), no qual foi proferida sentença de extinção da instância por deserção em 24-09-2015, tendo a mesma transitado em julgado em 19-10-2015, não sendo assim susceptível de recurso ordinário ou de reclamação, nos termos do artigo 628.º do Código de Processo Civil, Encontra-se marcada nos presentes autos, para o próximo dia 20 de Outubro de 2017, pelas 11:00 horas, a venda na modalidade de leilão electrónico, do prédio urbano inscrito na respectiva matriz predial sob o n° 10401 da União das freguesias de Pedroso e Seixezelo. Desta forma, sou da opinião, salvo parecer superior, que tendo ocorrido trânsito em julgado da sentença proferida na Oposição apresentada aos presentes autos de execução fiscal, não há motivo para que a execução não prossiga, não podendo assim ser atendida a pretensão do contribuinte de suspensão da venda” — cf. informação e despacho, constantes de fls. 313 dos autos físicos;
3- DO DIREITO:
Fundamentação de direito da sentença recorrida a fls. 351 e seguintes que se apresenta por extracto.
Da subida imediata da reclamação
(…)
Tendo em conta os circunstancialismos do caso concreto, designadamente estar em causa a venda de imóvel da Reclamante, a baixa do processo e a sua posterior subida a final iriam implicar a perda do efeito útil da reclamação — situação reconhecida pelo próprio órgão de execução fiscal — pelo que se conhecerá imediatamente da causa.

Do indeferimento do pedido de suspensão da execução
Reclamação de Acto do Órgão de Execução Fiscal 2428.17.SBEPRT
O Reclamante principia a sua petição invocando ter apresentado pedido de revisão de sentença, nos termos do artigo 293.º do Código de Procedimento e Processo Tributário, em processo de oposição referente ao Processo de Execução Fiscal 1783201001026038 pelo que, para evitar a lesão de direitos e interesses legítimos da ora reclamante, deverá aquele PEF ficar suspenso, o que foi requerido. Não tendo sido deferido tal pedido, laborou a Autoridade Tributária em ilegalidade, por violação do disposto no artigo 169.° do CPPT, já que está a decorrer recurso judicial e há bens penhorados cujo valor excede o da quantia exequenda (defendendo ainda que, mesmo que não fossem suficientes, deveria a venda igualmente suspender-se).
A Fazenda Pública, por seu turno, defende que o despacho reclamado é legal, porque o pedido não preenche os requisitos do enquadramento legal, uma vez que não há garantia prestada e o processo de oposição já transitou em julgado, não sendo de aplicar o artigo 169.º do CPPT a recursos extraordinários, como é o caso da revisão.
Cumpre apreciar.
O artigo 169.º do Código de Procedimento e Processo Tributário postula, nos seus números 1 e 10, que:
1. “A execução fica suspensa até à decisão do pleito em caso de reclamação graciosa, a impugnação judicial ou recurso judicial que tenham por objecto a legalidade da dívida exequenda, bem como durante os procedimentos de resolução de diferendos no quadro da Convenção de Arbitragem n.º 90/436/CEE, de 23 de Julho, relativa à eliminação da dupla tributação em caso de correcção de lucros entre empresas associadas de diferentes Estados membros, desde que tenha sido constituída garantia nos termos do artigo 195.º ou prestada nos termos do artigo 199.º ou a penhora garanta a totalidade da quantia exequenda e do acrescido, o que será informado no processo pelo funcionário competente.
(…)
10. Se for apresentada oposição à execução, aplica-se o disposto nos nºs 1 a 7.”

Resulta da análise do citado artigo que a apresentação de oposição, cumpridos que estejam os requisitos do número 1, implicará a suspensão da execução — como aliás sucedeu, atentos os factos provados — “até à decisão do pleito”.
Como escreve Jorge Lopes de Sousa [Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado, 6.a edição, 2011, I volume, pág. 208] “Esta suspensão está prevista genericamente no art. 52.º da LGT para os casos de pagamento em prestações, reclamação, recurso, impugnação da liquidação e oposição à execução que tenham por objecto a ilegalidade ou inexigibilidade da divida exequenda. Por isso, é inequívoco que a possibilidade de suspensão aqui prevista não se reduz aos casos em que esteja em discussão a legalidade da divida exequenda, em sentido estrito, como reflexo da ilegalidade da liquidação subjacente à divida exequenda, mas abrangerá todos os casos em que esteja em causa a legalidade da sua cobrança, inclusivamente a legalidade da exigibilidade, seja contra os responsáveis originários seja contra os subsidiários.”
Tal suspensão, no entanto, não é perene, devendo findar com a decisão do pleito, ou como nos diz o sobredito autor [op. cit., pág. 220] “a suspensão só terminará quando não houver possibilidade de impugnação administrativa ou contenciosa da decisão que for proferida nos processos referidos. Isso sucederá, no caso de processos judiciais com o trânsito em julgado da decisão, que ocorre logo que ela não seja susceptível de recurso ordinário, ou de reclamação nos termos dos artigos 668.° e 669.° do CPC (art. 677.° do mesmo Código)” [artigo 628.° do Código de Processo Civil].

O pedido de revisão de sentença apresentado pela Reclamante surge necessariamente depois de tal momento, já que é requisito de tal revisão que a sentença haja transitado em julgado, nos termos do número 1 do artigo 293.° do Código de Procedimento e Processo Tributário.
Por outro lado, nos termos do número 3 do artigo 699.º do Código de Processo Civil [ex vi artigo 2.° do Código de Procedimento e Processo Tributário], a revisão não tem efeito suspensivo, pelo que “O recebimento do recurso não suspende a execução da decisão recorrida”
Assim, já havia findado o efeito suspensivo da execução decorrente da oposição apresentada, por via do trânsito em julgado, sem que a apresentação do pedido de revisão altere os efeitos de tal decisão. Ou como melhor dito no Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 12 de Janeiro de 2017, proferido no processo 3124/15.6BESNT [que versa sobre uma situação em tudo idêntica à presente]:
“I - O recurso de revisão interposto ao abrigo dos artigos 696° e ss do CPC é um recurso extraordinário que visa a alteração de uma decisão já transitada em julgado, em casos especialmente previstos na lei. Ao contrário dos recursos ordinários, não é um recurso que, por si só, vise impedir o trânsito em julgado.
II - Também assim é no contencioso tributário, pois que, nos termos do artigo 293° do CPPT, sobre a revisão da sentença aí se dispõe que “A decisão transitada em julgado pode ser objecto de revisão no prazo de quatro anos, correndo o respectivo processo por apenso ao processo em que a decisão foi proferida”.
III - Nos termos do artigo 169° do CPPT, a suspensão da execução fiscal, nas condições aí previstas, tem como limite o trânsito em julgado da decisão, como decorre do emprego da expressão “até à decisão do pleito”.
IV - Transitada em julgado a decisão da impugnação judicial em que se discute a legalidade da dívida exequenda, nada justificaria que a AT estivesse obrigada a manter suspensa a execução fiscal por um período de mais 4 anos, por ser este o prazo previsto na lei para a interposição do recurso de revisão.
V - Contrariamente ao defendido pela Recorrente, a interposição de recurso de revisão não obsta ao prosseguimento da execução fiscal, ainda que na pendência deste processo executivo e aliado ao facto de ter sido deduzida impugnação judicial da liquidação correspondente à dívida exequenda, tenha sido prestada garantia com vista a suspender tal processo de execução.”

Quanto à alegada existência de bens penhorados em valor suficiente para determinar a suspensão dos autos executivos, ressalta do probatório que tal corresponde à verdade, o que demandou a suspensão referida no facto provado 5.

Todavia, tal facto, desacompanhado da necessária impugnação administrativa [por via de reclamação graciosa] ou judicial [por via de impugnação, oposição ou recurso], é insuficiente para estribar a peticionada suspensão da execução.

Atento o exposto, inexiste fundamento legal para a suspensão da execução, por via do pedido de revisão de sentença apresentado, pelo que, tendo decidido nesse sentido, não padece o despacho reclamado de qualquer ilegalidade. Improcede, portanto, a pretensão da Reclamante.
Nos termos do artigo 527.º do Código de Processo Civil, aplicável por remissão do artigo 2.° alínea e) do Código de Procedimento e Processo Tributário, será condenada em custas a parte que tiver dado causa à acção (n.º 1), entendendo-se que dá causa às custas a parte vencida (n.º 2).
Vencida nos presentes autos, será a Reclamante responsável pelas custas processuais.

DISPOSITIVO
Em face do exposto, e nos termos das disposições legais supra mencionadas, julgo a presente Reclamação de Acto do Órgão de Execução Fiscal improcedente e, em consequência, absolvo a Fazenda Pública do pedido contra si apresentado.

DECIDINDO NESTE STA
Está em causa, no presente recurso, saber se tendo transitado em julgado a sentença proferida em processo de oposição que pôs fim ao mesmo processo no qual foi julgada extinta a instância por deserção; a circunstância de ter sido interposto, entretanto, recurso de revisão tem a virtualidade de suspender o processo executivo fiscal que se encontrava suspenso durante a pendência daquela oposição, por ter sido efectuada penhora de imóvel, e que após o trânsito daquela sentença prosseguiu os seus termos para venda do bem penhorado.
Defende o reclamante ora recorrente que tal suspensão não só se justifica como se impõe por atenção ao princípio da tutela jurisdicional efectiva e porque se não for suspensa a execução (e se vier a concretizar-se a venda do imóvel) perde efeito útil o recurso de revisão apresentado e até a oposição. E mais sustenta que não sendo os fundamentos da revisão exactamente os mesmos no CPPT e no CPC então não haverá que aplicar o disposto no artº 699º nº 3 do CPC que estipula:
(…) 3 - O recebimento do recurso não suspende a execução da decisão recorrida.
Vejamos:
Cremos que, tal como consta do parecer, supra destacado, do Sr. Procurador Geral Adjunto neste STA, a suspensão da execução só é possível até à decisão do pleito, conforme resulta dos artºs 52º da LGT e nº 1 do artº 169º do CPPT sendo que neste preceito se estabelece:

1 – A execução fica suspensa até à decisão do pleito em caso de reclamação graciosa, a impugnação judicial ou recurso judicial que tenham por objeto a legalidade da dívida exequenda, bem como durante os procedimentos de resolução de diferendos no quadro da Convenção de Arbitragem n.º 90/436/CEE, de 23 de julho, relativa à eliminação da dupla tributação em caso de correção de lucros entre empresas associadas de diferentes Estados membros, desde que tenha sido constituída garantia nos termos do artigo 195.º ou prestada nos termos do artigo 199.º ou a penhora garanta a totalidade da quantia exequenda e do acrescido, o que será informado no processo pelo funcionário competente.

Não carecemos pois, (para sustentar que a execução deve prosseguir os seus termos logo que transitada em julgado a sentença cuja revisão foi requerida), de invocar, subsidiariamente, o nº 3 do artº 699º do CPC pois que como vimos a resposta à questão supra enunciada resulta directamente dos normativos do CPPT.
E tem toda a lógica que assim seja, atenta também a natureza do processo de revisão de sentença. Este processo ou acção é um processo novo e não um prolongamento da oposição transitada em julgado, como vem sendo afirmado uniformemente pela jurisprudência deste STA (vide acs do STA de 14/05/2015 tirado no rec. 0416A/06; de 16/05/2018 tirado no rec. nº 0533/16; de 26 de Novembro de 2014 no rec.01753/13 onde se remete ainda para outros acórdãos: STA, datados de 02/07/2014, recurso n.º 0360/13 e de 20/12/2007, recurso n.º 01438A/03 e o acórdão do STJ, datado de 14/01/2014, recurso n.º 5078-H/1993.L2.S1.).

Ali, em suma, vem sendo afirmado que o recurso de revisão:

“configura um verdadeiro processo novo, que tem essencialmente a natureza de uma acção que visa a mudança da ordem jurídica definida em decisão transitada em julgado.

O recurso de revisão é um recurso extraordinário que visa impugnar uma decisão transitada em julgado, mediante fundamentos taxativamente indicados na lei.

Como vem sendo afirmado pela doutrina, no recurso de revisão destacam-se claramente dois momentos: o juízo rescindente, que visa afastar a decisão impugnada, e tem por objecto o acertamento da existência de qualquer um dos fundamentos previstos na lei; o juízo rescisório, que visa substituir a decisão revogada por uma outra decisão expurgada dos vícios que originaram a revisão (Luís Correia de Mendonça/Henrique Antunes, Dos Recursos, ed. Quid Juris, pag. 354.).

O recurso de revisão é, também, um recurso extraordinário que apresenta estrutura de um processo autónomo, embora na sequência de outro”.

Ora, se a natureza do processo de revisão é a de um processo novo então compreende-se melhor que o processo executivo que se encontra suspenso prossiga o seu andamento normal logo que haja uma decisão do pleito (no caso dos autos, o processo de oposição) e que a interposição de recurso de revisão não tenha a virtualidade de, só por si, poder determinar a manutenção da suspensão do processo executivo renovado/retomado. Ao invés, tal não resulta só dos normativos referidos do CPPT como também a lei subsidiária (artº 699º nº 3 do novo CPC) refere, expressamente, que o recebimento do recurso não suspende a execução da decisão recorrida.

Não ocorrendo dúvida que a possibilidade de suspensão da execução prevista no artº 169º nº 1 do CPPT abrange a todos os casos em que está em causa não só a ilegalidade da dívida mas também a legalidade da sua cobrança contra responsáveis originários ou subsidiários (nesta linha de entendimento vide J. L. Sousa na sua obra CPPT comentado e anotado nota 3 ao artº 169º do CPPT) a verdade é que tal suspensão está dependente da prestação de garantia. Ora, objectivamente, o ora recorrente não tem qualquer oposição em curso enquanto não obtiver procedência no recurso de revisão de sentença que interpôs. Assim podemos concluir que atenta a lei e a natureza do recurso de revisão a interposição e recebimento deste não operam ou sustentam, só por si, a manutenção da suspensão da execução determinada no caso dos autos na pendência de oposição à execução fiscal que entretanto findou por decisão transitada em julgado.

Ora, a reclamação apresentada foi exactamente da decisão do órgão de execução fiscal que determinou o prosseguimento da execução conexa com o referido processo de oposição que findou e em relação ao despacho reclamado que a indeferiu não se patenteia que tenha incorrido em violação de lei pelo que a decisão recorrida que julgou improcedente a reclamação deverá ser confirmada.

Resta acrescentar que não vislumbramos que ocorra violação do artº 62º da CRP- Direito à propriedade privada por a penhora e venda ter balizas e limites previsto legalmente para situações de incumprimento tributário ou do princípio da tutela jurisdicional efectiva, decorrente de a venda poder tornar-se acto inútil e passível de produzir danos irreparáveis, na medida em que o ora recorrente terá sempre ao seu dispor o acervo de meios processuais próprios para defesa dos seus interesses perante a Administração. Finalmente, não é de acolher a ideia/alegação consistente em que o artigo 699º nº 3 do CPC não pode ser interpretado senão em conjunto com o artigo 702º do C.P.C, e correctivamente, por apelo ao principio da justiça e razoabilidade sendo certo que a sua promoção dependente da prestação de caução, não produzirá vantagens significativas e que superem a desvantagem enunciada. É que a Administração Tributária enquanto entidade pública encarregue de arrecadar receita tributária para satisfação das necessidades financeiras do Estado não se pode equiparar a outro credor de entre aqueles os referidos no artº 702º do CPC, quando refere que: “Se estiver pendente ou for promovida a execução da sentença, não pode o exequente ou qualquer credor ser pago em dinheiro ou em quaisquer bens sem prestar caução”. A Fazenda Pública actua com competências próprias definidas no CPPT (titulo IV artº 148º e segs de onde se destaca o artº 152º que estipula que: “Tem legitimidade para promover a execução das dívidas referidas no artigo 148.º o órgão da execução fiscal”. Ou seja: está previsto no CPPT um conjunto de normas especiais para o desenvolvimento do processo de execução e para o arrecadar da receita tributária, mas não está condicionada à prestação por parte da Administração Tributária de qualquer caução o que seria na lógica/filosofia e economia do processo de execução fiscal um absurdo. Aqui chegados, cremos ter evidenciado que o presente recurso não pode lograr provimento sendo de confirmar a sentença recorrida.
Preparando a decisão formulam-se as seguintes proposições:
1 – Nos termos dos artigos 169º nº 1 do CPPT e 52º nºs 1 e 2 da LGT a execução fiscal fica suspensa até à decisão do pleito, desde logo, se for apresentada oposição que tenha por objecto a cobrança da dívida exequenda, desde que tenha sido constituída garantia nos termos do artigo 195.º ou prestada nos termos do artigo 199.º ou a penhora garanta a totalidade da quantia exequenda.
2) No caso do processo de oposição a execução deve prosseguir os seus termos logo que transitada em julgado a sentença no processo de oposição cuja revisão foi requerida.
3) Este prosseguimento resulta directamente dos normativos do CPPT não sendo necessário fazer apelo ao disposto no nº 3 do artº 699º do novo CPC sendo que o estatuído no artº 702º deste mesmo compêndio normativo não tem aplicação no caso dos autos.
4) Compreendem-se melhor as proposições supra enunciadas, se atentarmos na natureza do processo de revisão de sentença, pois este configura-se como um processo novo e não um prolongamento da oposição transitada em julgado, como vem sendo afirmado uniformemente pela jurisprudência deste STA.
4- DECISÃO:
Pelo exposto, acordam os Juízes deste STA em negar provimento ao recurso e em confirmar a decisão recorrida.

Custas a cargo da recorrente.

Lisboa, 6 de Junho de 2018. – Ascensão Lopes (relator) – Ana Paula Lobo – António Pimpão.