Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0299/18
Data do Acordão:06/28/2018
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:TERESA DE SOUSA
Descritores:PROCEDIMENTO DISCIPLINAR
REGULAMENTO DISCIPLINAR DA POLÍCIA DE SEGURANÇA PÚBLICA
PRAZO DE PRESCRIÇÃO
CÓDIGO PENAL
Sumário:I - Nos termos do disposto no nº 1 do art. 55º do RDPSP, é de 3 anos o prazo de prescrição do direito de instaurar o procedimento disciplinar no regime especial desse Regulamento Disciplinar, a contar da data em que a infracção tiver sido cometida, prescrevendo, igualmente a responsabilidade disciplinar se, conhecida a infracção pela entidade competente disciplinar, não for instaurado o procedimento no prazo de 3 meses.
II - No presente caso, estando em causa factos integradores de crime de violência doméstica, que é punível em abstracto com pena de prisão até 5 anos, nos termos das disposições conjugadas do art. 152º, nºs 1, alíneas a), c) e d) e nº 2 do art. 152º do Código Penal, o prazo da prescrição do procedimento criminal a ter em conta é o prazo de 10 anos, previsto no art. 118º, nº 1, alínea b) do Código Penal.
III - Embora o art. 55º do RDPSP tenha praticamente reproduzido o art. 4º do ED84 então vigente, no que respeita ao respectivo nº 2 acrescentou, relevantemente a expressão «termos» a que se segue «prazos estabelecidos na lei penal» comum a ambos [cfr. nº 3 do art. 4º].
IV - O acrescento de tal expressão, apenas pode significar, que, no que se refere às situações previstas no mencionado nº 2 do art. 55º do RDPSP, o regime de prescrição é idêntico ao do Código Penal, sendo-lhe, como tal directamente aplicável o nº 3 do art. 121º deste último diploma, segundo o qual, “(…), a prescrição do procedimento criminal tem sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo normal de prescrição acrescido de metade.”, no caso, 15 anos.
V - O Estatuto Disciplinar, aprovado pela Lei nº 58/2008 (e revogado pela Lei nº 35/2014, de 20/6 que aprovou a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas - LGTFP), introduziu no que respeita à prescrição, alterações importantes relativamente ao regime do ED, aprovado pelo DL nº 24/84, estabelecendo no nº 6 do art. 6º, um prazo de prescrição do procedimento autonomizado relativamente ao prazo para instauração do procedimento disciplinar.
VI – De acordo com o art. 1º, nº 3 do Estatuto Disciplinar de 2008, este não é aplicável ao pessoal com funções policiais dos quadros da PSP por este estar submetido a um regime disciplinar especial.
VII - O disposto no art. 66º do RDPSP é um regime de aplicação subsidiária de normas processuais quer do estatuto disciplinar vigente para os funcionários e agentes da administração central, quer das normas de processo penal. O que não é o caso do instituto da prescrição, que tem carácter substantivo.
VIII - Mesmo a entender-se que a aplicação subsidiária, prevista no art. 66º do RDPSP, no regime da prescrição, era admissível, no caso nunca haveria lugar a ela, uma vez que o regime especial aplicável – o art. 55º, nº 2 do RDPSP -, prevê expressamente a aplicação do regime do Código Penal, quanto aos termos e prazos de prescrição quanto a infracções que constituam ilícito penal.
Nº Convencional:JSTA000P23475
Nº do Documento:SA1201806280299
Data de Entrada:05/04/2018
Recorrente:A...
Recorrido 1:MAI
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo

1. Relatório

A………… intentou, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, providência cautelar contra o Ministério da Administração Interna (MAl), pedindo a suspensão da execução da pena disciplinar de demissão que lhe foi aplicada, em 11 de Janeiro de 2017, no âmbito do processo disciplinar que lhe foi instaurado.
O TAF de Loulé dicidiu antecipar o juízo sobre a causa principal, nos termos e ao abrigo do art. 121º do CPTA, sendo imputados àquele acto punitivo diversas ilegalidades, pedindo-se a declaração de nulidade ou a anulação do acto, pedindo ainda o A. a condenação da entidade demandada a reconstituir-lhe a carreira que teria se aquela pena não tivesse sido aplicada, o TAF de Loulé por sentença proferida a 5 de Setembro de 2017, e julgou o pedido parcialmente procedente, anulando o acto consubstanciado no despacho de 11 de Janeiro de 2017, da Ministra da Administração Interna, que aplicou ao Autor a pena disciplinar de demissão.

Inconformado com a referenciada sentença, o Ministério da Administração Interna, recorreu da mesma para o Tribunal Central Administrativo Sul (TCAS) que, concedendo provimento ao recurso, revogou a decisão recorrida.

O Autor, inconformado com o acórdão do TCAS, recorre do mesmo para esta Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo com alegações nas quais formula as seguintes conclusões:
A – O procedimento disciplinar sub judice, ao contrário do entendido no Acórdão recorrido está prescrito nos termos do disposto no Artigo 6.° n.° 6.° do Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que Exercem Funções Públicas, aprovado pelo aprovado pela Lei n.° 58/2008, de 9 de Setembro, aplicável por remissão expressa do Artigo 66.° do Regulamento Disciplinar da Policia de Segurança Pública, aprovado pela Lei n.° 7/90, de 20 de Fevereiro, por estarmos perante uma lacuna, perante uma falta ou omissão deste Regulamento Disciplinar.
B - O Tribunal a quo errou na interpretação e aplicação do Direito quando entendeu não ser aplicável ao processo disciplinar em apreço o Artigo 6.° n.° 6.° do Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que Exercem Funções Públicas, aprovado pelo aprovado pela Lei n.° 58/2008, de 9 de Setembro.
C - O Tribunal Central Administrativo do Sul no douto Acórdão de 16 de Março de 2017 (recurso n.° 999/17.5BESNT), disponível para consulta em www.dgsi.pt, entendeu que “se o Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que Exercem Funções Públicas (Lei n° 58/2008) introduziu uma nova causa de prescrição — a prescrição do procedimento disciplinar — estabelecendo inovatoriamente um prazo máximo para a sua duração (que não existia no anterior regime disciplinar do DL. n° 24/84), prazo com finalidades garantisticas, e se o regime disciplinar próprio do pessoal com funções policiais da Policia de Segurança Pública (PSP) constante da Lei n° 7/90, não afasta (nem afastou, após a aprovação e entrada em vigor da Lei n° 58/2008) tal causa de prescrição, nem prevê prazo especifico distinto daquele, tem que proceder-se à aplicação supletiva daquele normativo, em consonância com o disposto no artigo 66° do RDPSP (Lei n°7/90)”.
D - Entendimento confirmado pelo douto Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 7 de Maio de 2015 disponível para consulta em www.dgsi.pt.
E - Sendo manifesta a total divergência de entendimentos entre os dois supra referidos Acórdãos e o Acórdão recorrido.
F - No Acórdão recorrido confundem-se os conceitos de prescrição da infracção disciplinar com o conceito de prescrição do procedimento disciplinar, aplicando-se inclusive o prazo de prescrição da infracção não às datas dos factos (2006), mas ao início do procedimento disciplinar 31 de Agosto de 2011.
H - O Acórdão recorrido enferma de erro de direito na integração da omissão (lacuna) verificada no Artigo 55.° do RDPSP, aprovado pela Lei n.° 7/90, de 20 de Fevereiro.
I - A prescrição prevista no Artigo 121.° n.° 3 do Código Penal corresponde à prescrição prevista no Artigo 6.° n.° 1 do Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que Exercem Funções Públicas, aprovado pelo aprovado pela Lei n.° 58/2008, de 9 de Setembro (prescrição da infracção)
J - Prescrição que não se confunde com a prescrição do procedimento, mais próxima até do conceito de caducidade e por isso inovadora, do Artigo 6.° n.° 6 do Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que Exercem Funções Públicas, aprovado pelo aprovado pela Lei n.° 58/2008, de 9 de Setembro.
K - A interpretação do n.° 3 do Artigo 1.º do Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que Exercem com Funções Públicas, aprovado pela Lei n.° 58/2008, de 9 de Setembro, expressa no Acórdão recorrido segundo a qual, e sem prejuízo da remissão expressa do Artigo 66.° do EDTEFP, não se aplica a inovação do prazo de prescrição do procedimento prevista no n.° 6 do Artigo 6.° do EDTEFP, sem mais, ao pessoal da PSP com funções policiais, é inconstitucional por violação do Princípio da Igualdade consagrado no Artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa.
L - A interpretação e aplicação da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LGTFP), aprovada pela Lei n.° 35/2014, de 20 de Junho pelo Tribunal recorrido ao processo disciplinar em apreço é inconstitucional por violação do Princípio da irrectroactividade da Lei em matéria penal consagrado no Artigo 29.°, aplicável ex vi n.° 10.º do Artigo 32.°, ambos da Constituição da República portuguesa.
M - A interpretação e aplicação do Regulamento de Disciplina da GNR, na redacção da Lei n.° 66/2014, de 28 de Agosto no Acórdão recorrido configura uma violação quer ao Princípio da Proibição da Analogia em matérias penais, quer ao Princípio da irrectroactividade da Lei em matéria penal, princípios consagrados no Artigo 29.°, aplicável ex vi n.° 10.° do Artigo 32.°, ambos da Constituição da República portuguesa.
N - Mal andou o Tribunal a quo quando revogou a douta Sentença proferida na 1.ª Instância e ordenou a remessa dos Autos ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé para apreciação dos demais vícios invocados pelo ora Recorrente.
O - Mal andou o Tribunal a quo quando condenou o ora Recorrente em custas na instância de recurso, pois este não teve qualquer impulso processual naquela instância.
P - Mal andou o Tribunal a quo quando condenou o ora Recorrente em custas na 1.ª Instância quando reconhece que o julgamento da causa ainda não terminou, tanto que remete os Autos para o Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé para apreciação dos demais vícios invocados pelo ora Recorrente, sendo que o processo cautelar foi convolado em processo principal por Despacho de 27 de Julho de 2017, Despacho que já transitou em julgado.
Nestes termos e nos mais Direito que V Exas. doutamente suprirão deve o presente recurso merecer provimento, devendo o Acórdão recorrido, que padece de erro de interpretação e aplicação de Direito, ser revogado, confirmando-se, em conformidade, a douta Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé de 5 de Setembro de 2017, com as inerentes consequências legais, assim sendo feita JUSTIÇA!”

O Ministério da Administração Interna apresentou contra-alegações que terminam com conclusões do seguinte teor:
I. O presente recurso não tem efeito suspensivo, tal como decorre expressamente do disposto no n.° 2 do artigo 143.° do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, onde se estabelece “Os recursos interpostos de intimações para proteção de direitos, liberdades e garantias e de decisões respeitantes à adopção de providências cautelares têm efeito meramente devolutivo (nosso sublinhado);
II. O Recorrente não fundamentou o pedido por referência a estes requisitos;
III. Constitui jurisprudência uniforme do STA que estamos perante uma questão de relevância jurídica de importância fundamental, quando a sua solução envolve a aplicação e ligação de diversos regimes legais e institutos jurídicos ou o seu tratamento tenha suscitado dúvidas sérias, ao nível da jurisprudência ou da doutrina;
IV. O Recorrente não logrou identificar os contornos da questão em apreço nestes termos, porque, efetivamente, não configura especial complexidade, que suscite dúvidas sérias que justifiquem a intervenção excecional de tribunal superior;
V. Como também não esclarece por que razão entendeu tratar-se de questão de relevância social de importância fundamental que, de acordo com a jurisprudência comum do STA, se verifica quando a situação apresente contornos indiciadores de que a solução pode ser um paradigma ou constituir orientação para se apreciarem outros casos, ou quando tenha grande impacto na comunidade;
VI. De facto, reveste contornos muito particulares no contexto factual e jurídico do caso concreto, não sendo previsível que a sua solução tenha ou possa vir a ter repercussão noutras situações, atenta a natureza singular do caso;
VII. Quanto ao requisito de clara necessidade do recurso de revista para uma melhor aplicação do direito, o recorrido entende que a douta decisão do Tribunal Administrativo Central Sul, de 31 de janeiro de 2018, interpretou muito corretamente o Direito aplicável e deu razão a quem a tinha;
VIII. O recurso de revista não deve, portanto, ser admitido;
IX. Sem prescindir, não deixa, porém, o Ministério de impugnar o mérito do recurso, defendendo que não assiste razão ao Recorrente, sendo, ao invés, o Douto Acórdão de 31 de janeiro de 2017, do Tribunal Central Administrativo Sul, inteiramente válido, porquanto conforme à Lei e ao Direito, merecendo a nossa integral adesão;
X. Pelo que, a Entidade Recorrida acolhe inteiramente a fundamentação inserta no Acórdão que o Recorrente coloca em crise, na mesma se louvando;
XI. Ficou inequivocamente demonstrado que o procedimento disciplinar não se encontra prescrito;
XII. Há um princípio vigente no ordenamento jurídico português — fixado no Código Penal (cfr. artigo 121.°, n.° 3, no próprio Estatuto Disciplinar de 2008 (cfr. artigo 6.°, n.ºs 1 e 6) e, depois, na Lei Geral de Trabalho em Funções Públicas, de 2014 (cfr. artigo 178.°, n.°s 1 e 5) e no atual Regulamento de Disciplina da GNR, alterado pela Lei n.° 66/2014 (cfr. artigo 46.°, n.°s 11 e 7) acerca da prescrição dos procedimentos: a prescrição do procedimento disciplinar terá sempre lugar quando desde o seu início, e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo normal da prescrição acrescido de metade;
XIII. O artigo 55.° do RDPSP, datado de 1990, apresenta uma lacuna em matéria de prescritibilidade do procedimento administrativo;
XIV. O artigo 66.° do RDPSP indica agora - como “direito subsidiário” o Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que Exercem Funções Públicas (EDTEFP), aprovado pela Lei 58/2008, de 9 de Setembro e, a partir de 2014, a Lei Geral de Trabalho em Funções Públicas, aprovada pela Lei 35/2014, de 20 de Junho;
XV. O estatuto disciplinar subsidiário tem uma norma sobre prescritibilidade do procedimento: a norma do artigo 6.°, n.° 6, do Estatuto Disciplinar de 2008 e a norma do artigo 178.°, n.° 5, da Lei Geral de Trabalho em Funções Públicas;
XVI. A integração da lacuna do artigo 55.° do RDPSP não se cumpre mediante uma operação de copiar/colar a norma do artigo 6.°, n.° 6 (e artigo 178.°, n.° 5) do estatuto disciplinar subsidiário;
XVII. A norma do artigo 6.°, n.° 6 (e artigo 178.°, n.° 5) do estatuto disciplinar subsidiário está corretíssima quando inserida no seu próprio contexto: estabelece com a norma do artigo 6.°, n.° 1 (e 178.°, n.° 1) o princípio vigente no ordenamento jurídico português, acima referido;
XVIII. Mas a mesma norma já não estabelece o referido princípio quando conjugada com a norma do artigo 55.°, n.° 1 do RDPSP;
XIX. Significa que não é essa norma aquela que, nos termos do artigo 10.º do Código Civil se mostra adequada a integrar a lacuna detetada no artigo 55.°, do RDPSP. E qual é ela, então?
XX. É a norma que estabeleça com a norma do 55.°, n.° 1, do RDPSP o princípio atrás enunciado. Concretizando;
XXI. É uma norma idêntica à que é prevista no artigo 46.°, n.° 7 do RDGNR, alterado pela Lei n.° 66/2014;
XXII. Significa que o prazo de prescrição do procedimento disciplinar na PSP é de quatro anos e meio;
XXIII. Considerando ainda que no presente caso houve procedimento instaurado pela prática do crime de violência doméstica, o prazo prescricional é de quinze anos, como resulta da aplicação conjunta do art.° 66.° n.° 2, do art.° 55.º, ambos do RDPSP, da alínea c) do n.° 1 do art.° 118.°, do n.° 3 do art.° 121° e do artigo 152.°, n.°s 1, alíneas a), c) e d) e n.° 2, todos do Código Penal (v Parecer de 29.01.2004, PGR - Proc: P001602003 - Fonte: www.gde.mj.pt – N.º Convencional: PGRP000023;
XXIV. Tendo sido instaurado em 31 de agosto de 2011, temos de concluir que, de acordo com o que ficou exposto, não ocorreu a prescrição do presente processo disciplinar;
XXV. Hoje já existe uma jurisprudência significativa, no sentido da inaplicabilidade das normas do Estatuto Disciplinar (ED) de 2008 — e da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LGTFP) — para integrar a lacuna do artigo 55° do RD/PSP no tocante à prescrição do procedimento disciplinar. A título exemplificativo, indica-se o Acórdão do TCA Sul, de 24 de maio de 2017 (Proc. n° 810/16.7BELSB);
XXVI. Pelo exposto, o Douto Acórdão recorrido é insuscetível de censura, merecendo ser confirmado pelo Supremo Tribunal Administrativo, devendo, com o douto suprimento de Vossas Excelências, o presente recurso ser julgado improcedente.

A revista foi admitida por acórdão do STA de 12.04.2018, da responsabilidade da formação a que alude o art. 150º, nº 1, do CPTA.

O Exmo. Magistrado do Ministério Público neste STA emitiu parecer a fls. 352 a 356, dos autos, no sentido de não se conceder a revista, salvo no que concerne à questão das custas (Já quanto à condenação em custas parece-se-nos que assiste alguma razão ao ora Recorrente porquanto, como resulta dos autos, o mesmo não produziu contra-alegações no recurso para o TCA Sul não sendo devida, por isso, a correspondente taxa de justiça.)

Sem vistos, vem o processo à conferência, cumprindo decidir.

2. Os Factos
O Tribunal a quo considerou provada a seguinte factualidade:
a) Em 31 de Julho de 2011, foi levantado auto de notícia contra o requerente, na sequência de denúncia apresentada por B…………, por factos imputados ao autor susceptíveis de consubstanciar a prática de um crime de violência doméstica, que foi remetido ao Comando Distrital de Faro da PSP (cfr. fls. 3 a 7 do processo administrativo);
b) Em 24 de Agosto de 2011, o Comando Distrital de Faro da PSP recebeu este auto de notícia (cfr. fls. 2 do processo administrativo);
c) Em 31 de Agosto de 2011, o Comandante do Comando Distrital de Faro, com base neste auto de notícia e na denúncia apresentada, determinou a instauração de processo disciplinar contra o autor e designou o respectivo instrutor (cfr. fls. 2 do processo administrativo);
d) Em 31 de Agosto de 2011, o instrutor fez autuar o despacho de instauração do processo disciplinar e iniciou as diligências de investigação (cfr. fls. 18 e 22 do processo administrativo);
e) Em 7 de Novembro de 2011, foi concedida a prorrogação do prazo de instrução do processo disciplinar (cfr. fls. 2 do processo administrativo);
j) Em 30 de Novembro de 2011, no âmbito do processo-crime com o NUIPC ………., o Ministério Público deduziu acusação contra o requerente, por considerar que existiam indícios suficientes da prática de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo artigo 152.°, n.° 1, alínea a), e n° 2 do Código Penal (cfr. fls.1 a 58 do processo administrativo);
g) Em 7 de Fevereiro de 2012, por despacho do Comandante do Comando Distrital de Faro concordante com a proposta do instrutor, por considerar que “não existem elementos de prova suficientes para deduzir, desde já, acusação” e “atendendo a que o arguido tem processo criminal pendente pelos mesmos factos do processo disciplinar”, foi determinada a suspensão do procedimento disciplinar até que se concluísse este processo criminal pendente (cfr. fls. 43 e 44 do processo administrativo);
h) Em 13 de Abril de 2012, foi proferida sentença no processo-crime n.° ……….., a correr termos no 2.°Juízo Criminal do Tribunal de Família e Menores e de Comarca de Portimão, a qual condenou o requerente pela prática do crime de violência doméstica, p. e p. pelo artigo 152.°, n.° 1, alínea a), e n.° 2, do Código Penal, na pena de três anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período, sob regime de prova e sob condição de entregar a quantia de € 2 000 à APAV, no prazo de 1 ano, e fazer prova disso nos autos (cfr.fls. 50 a 58 do processo administrativo);
i) Na referida sentença, o tribunal judicial julgou como provados os seguintes factos:
1. O arguido A………. e a ofendida B………… casaram um com o outro em 13 de Maio de 2006.
2. Antes dessa data já viviam juntos como se de marido e mulher se tratassem, desde data não apurada do ano de 1999.
3. Dessa união nasceram duas filhas, C………… em 21.7.2002 e D………… em 12.12.2007.
4. Em data não determinada, mas antes de 13 de maio de 2006, uma noite, o arguido e a ofendida foram jantar com uns amigos.
5. Quando regressaram a casa, como B……….. se recusou manter relações sexuais com o arguido, este respondeu-lhe que faria sexo com a primeira mulher que encontrasse pela frente.
6. Então, porque a ofendida respondeu que o arguido era um porco e não lhe tocava mais, A…………. exaltou-se e agarrou a companheira pelo pescoço e colocou-a fora de casa, tendo B………. pernoitado, nessa noite em casa de vizinhos.
7. Em 2010, no inverno, em data não determinada, pelas três horas da madrugada, quando regressavam a casa de carro, na sequência de uma discussão relacionada com um relacionamento extra-conjugal de um amigo do arguido, ao chegarem ao Sítio do Pateiro, o arguido expulsou a esposa da viatura, dizendo que o casamento de ambos tinha acabado.
8. Nessa noite, a ofendida seguiu para casa a pé.
9. Telefonou à mãe do arguido, contando o que se passava e solicitando que lhe abrisse a porta.
10. Uma vez em casa, o arguido continuou a discutir com a esposa e a determinada altura, na presença da filha mais nova, agarrou a ofendida pelo pescoço enquanto dizia “puta, não vales nada”.
11. A partir dessa altura as discussões entre o casal passaram a ocorrer com mais frequência e na sequência das mesmas, o arguido dizia que “só precisava de uma mulher para foder”, apelidando a esposa de “burra’, dizendo que “não valia nada, que só servia para ter sexo, cozinhar e lavar a casa”.
12. Em Setembro ou Outubro de 2010, em data não apurada, hora do almoço, o arguido telefonou à esposa perguntando-lhe onde tinha estado, na companhia de quem, uma vez que lhe tinha ligado diversas vezes e a ofendida não tinha atendido as chamadas.
13. Nesse mesmo dia, mais tarde, o arguido chegou a casa exaltado, trancou a porta, guardou a chave e começou a empurrar a ofendida várias vezes para o sofá ao mesmo tempo que dizia, agora vais morrer.
14. Nesse dia, a ofendida sentiu muito receio do arguido.
15. Quando se conseguiu libertar do arguido, a ofendida abriu a janela da sala e saltou para a rua, pedindo auxílio aos vizinhos.
16. No dia 28 de junho de 2011, à noite, a ofendida foi jantar com os colegas de trabalho.
17. Quando chegou a casa, sita na Urbanização …………, lote ……, ……… em …………, o arguido iniciou uma discussão, afirmando que a esposa não tinha ido ao jantar, mas a outro local.
18. Na sequência da discussão, o arguido exaltou-se e arremessou o comando da televisão na sua direção, não logrando atingir a esposa.
19. Acto contínuo, desferiu uma joelhada na ofendida, atingindo-a na zona do tórax, do lado direito, agarrando-a ainda no pescoço e batendo-lhe na cabeça.
20. Em consequência direta do comportamento descrito, B………… sofreu dores e traumatismo na zona da grelha costal direita, que demandaram um período de nove dias de doença, com dois dias de afetação da capacidade para o trabalho geral e sete dias de afetação para o trabalho profissional.
21. No dia 31 de Julho de 2011, quando se encontravam na residência acima indicada, porque a ofendida se tivesse recusado a assinar os papéis do divórcio sem que antes fossem devidamente analisados por advogado, o arguido exaltou-se dizendo que ia ficar com tudo, com o carro, a casa e as duas filhas.
22. Em seguida, dirigiu-se à esposa dizendo “puta, não vales nada”.
23. Saturada do comportamento do arguido, nesse dia a ofendida saiu de casa.
24. O arguido agiu sempre de forma livre, deliberada e consciente.
25. Actuou com o propósito concretizado de infligir maus tratos físicos e psíquicos à companheira.
26. Sabia que as expressões supra indicadas ofendiam a companheira na sua honra e consideração.
27. Agiu com intenção de ofender a saúde e a integridade física e psicológica da ofendida.
28. Sabia que com a sua conduta afectava ainda a dignidade pessoal da ofendida bem como o seu equilíbrio psicológico e emocional, criando nela sentimentos de humilhação, insegurança, medo e inquietação pela sua vida e integridade física, segurança e bem-estar.
29. Sabia que a sua conduta era proibida e punida por lei.
30. O arguido não possui antecedentes criminais.
j) Em 25 de Março de 2013, foi junta ao processo disciplinar a sentença condenatória proferida no processo criminal, com a menção de que a mesma havia transitado em julgado no dia 29 de Janeiro de 2013 (cfr. fls. 50 do processo administrativo)
k) Em 1 de Abril de 2014, o processo disciplinar continuou, tendo sido solicitada pelo instrutor para junção ao mesmo de documentos e nota de assentos (cfr. fls. 61 a 70 do processo administrativo);
l) Em 14 de Julho de 2014, foi deduzida acusação no processo disciplinar contra o requerente, por ter praticado infracção disciplinar “de acordo com o disposto no artigo 4.° do RD/PSP” e infringido o “Princípio Fundamental, previsto no artigo 6.° do RD/PSP, conjugado como artigo 152.°, n.° 1, alínea a) e n.° 2 do Código penal, e o Dever de Aprumo previsto no artigo 16.° n.° 1 e n° 2 alínea , do RD/PSP”, na qual consta que “à conduta do arguido corresponde a pena disciplinar de aposentação compulsiva ou a de demissão, previstas nos artigos 25°, n.° 1, alíneas e g), 43.° e 47.°, n.° 1, do RD/FSP” (cfr. fls. 71 a 75 do processo administrativo)
m) Em 22 de Agosto de 2014, o requerente foi notificado da acusação (cfr. fls. 79 do processo administrativo);
n) Em 10 de Setembro de 2014, depois de ter sido prorrogado o prazo para 20 dias, foi apresentada defesa escrita pelo requerente, na qual este respondeu à acusação, ofereceu prova e invocou a prescrição do procedimento disciplinar (cfr. fls. 80 e 84 a 121 do processo administrativo);
o) Entre 15 de Outubro de 2014 e 1 de Novembro de 2014, foram inquiridas pelo instrutor as testemunhas indicado pelo autor (cfr. fls. 147 a 169 do processo administrativo);
p) Em 23 de Abril de 2015, foi elaborado o relatório final pelo instrutor do processo, considerando provada a matéria de facto constante da acusação e que esta se enquadrava na qualificação jurídica nela constante (violação do “princípio fundamental” constante do artigo 6.° do Regulamento Disciplinar da PSP e do dever de aprumo), propondo a aplicação da pena de suspensão por 60 dias, suspensa na sua execução pelo período de 2 anos (fls. 184 a 217 do processo administrativo);
q) Do relatório final elaborado pelo instrutor consta, entre o mais, o seguinte:
«(…)
.6 - Matéria apurada:
6.1. Factos Provados:
a. O arguido, A……….. e a ofendida B………… casaram um com o outro em 13 MAI 2006, fls. 36 e 51V;
b. Antes dessa data já viviam juntos como se de marido e mulher se tratassem, desde data não apurada do ano de 1999, fls. 36 e 51V;
c) Dessa união nasceram duas filhas, C………… em 21JUL2002 e D………… em 12DEZ2007, fls. 36 e 51V;
d. Em data não determinada, mas antes de 13MAI2006, uma noite, o arguido e a ofendida foram jantar com uns amigos, fls.5. 36 e 51V;
e. Quando regressaram a casa, como B…………. se recusou manter relações sexuais com o arguido, este respondeu-lhe que fazia sexo com a primeira mulher que encontrasse pela frente, fls. 36 e 51V;
f. Então, porque a ofendida respondeu que o arguido era um porco e não lhe tocava mais, A……….. exaltou-se e agarrou a companheira pelo pescoço e colocou-a fora de casa, tendo B………… pernoitado, nessa noite em casa de vizinhos, fls. 36 e 51V;
g. Em 2010, no inverno, em data não determinada, pelas três horas da madrugada, quando regressavam a casa de carro, na sequência de uma discussão relacionada com um relacionamento extra-conjugal de um amigo do arguido, ao chegarem ao Sítio do Pateiro, o arguido expulsou a esposa da viatura, dizendo que o casamento de ambos tinha acabado, fls. 36V e 51V;
h. Nessa noite, a ofendida seguiu para asa a pé, fls. 36V e 51V;
i. Telefonou à mãe do arguido, contando o que se passava e solicitando que lhe abrisse a porta, fls. 36V e 51V;
j. Uma vez em casa, o arguido continuou a discutir com a esposa e a determinada altura, na presença da filha mais nova, agarrou a ofendida pelo pescoço enquanto dizia “puta, ordinária, não vales nada”, fls. 36V e 51V;
k. A partir dessa altura as discussões entre o casal passaram a ocorrer com mais frequência e na sequência das mesmas, o arguido dizia que “só precisava de uma mulher para foder”, apelidando a esposa de “burra”, dizendo que “não valia nada, que só servia para ter sexo, cozinhar e lavar a casa”, fls. 36V e 52;
l. Em Setembro ou Outubro de 2010, em data não apurada, à hora do almoço, o arguido telefonou à esposa perguntando-lhe onde tinha estado, na companhia de quem, uma vez que lhe tinha ligado diversas vezes e a ofendida não tinha atendido as chamadas, fls. 36V e 52;
m. Nesse mesmo dia, mais tarde, o arguido chegou a casa exaltado, trancou a porta, guardou a chave e começou a empurrar a ofendida várias vezes para o sofá ao mesmo tempo que dizia, agora vais morrer, fls. 36V e 52;
n. Nesse dia, a ofendida sentiu muito receio do arguido, fls. 36 V e 52;
o. Quando se conseguiu libertar do arguido, a ofendida abriu a janela da sala e saltou para a rua, pedindo auxilio aos vizinhos, fls. 36V e 52;
p. No dia 28JUN2011, à noite, a ofendida foi jantar com os colegas de trabalho, fls. 37 e 52;
q. Quando chegou a casa, sita na Urbanização …………, lote ……, …….. em ………….., o arguido iniciou uma discussão, afirmando que a esposa não tinha ido ao jantar, mas a outro local, fls. 37 e 52;
r. Na sequência da discussão, o arguido exaltou-se e arremessou o comando da televisão na sua direção, não logrando atingir a esposa, fls. 37 e 52;
s. Acto contínuo, desferiu uma joelhada na ofendida, atingindo-a na zona do tórax, do lado direito, agarrando-a ainda no pescoço e batendo-lhe na cabeça, fls. 37 e 52;
t. Em consequência direta do comportamento descrito, B………… sofreu dores e traumatismo na zona da grelha costal direita, que demandaram um período de nove dias de doença, com dois dias de afetação da capacidade para o trabalho geral e sete dias de afetação para o trabalho profissional, fls. 37 e 52;
u. No dia 31JUL2011, quando se encontravam na residência acima indicada, porque a ofendida se tivesse recusado a assinar os papéis do divórcio sem que antes fossem devidamente analisados por advogado, o arguido exaltou-se dizendo que ia ficar com tudo, com o carro, a casa e as duas filhas, fls. 37 e 52;
v. Em seguida, dirigiu-se à esposa dizendo “puta grandessíssima puta, não vales nada, puta que te pariu”, fls. 37 e 52V;
w. Saturada do comportamento do arguido, nesse dia a ofendida saiu de casa, fls. 37 e 52V; O arguido agiu sempre de forma livre, deliberada e consciente, fls. 37 e 52V;
y. Actuou com o propósito concretizado de infligir maus tratos físicos e psíquicos à companheira, fls. 37 e 52V;
z. Sabia que as expressões supra indicadas ofendiam a companheira na sua honra e consideração, fls. 37V e 52V;
aa. Agiu com intenção de ofender a saúde e a integridade física e psicológica da ofendida, fls. 37V e 52V;
bb. Sabia que com a sua conduta afetava ainda a dignidade pessoal da ofendida bem como o seu equilíbrio psicológico e emocional, criando nela sentimentos de humilhação, insegurança, medo e inquietação pela sua vida e integridade física, segurança e bem-estar, fls. 37V e 52V;
cc. Sabia que a sua conduta era proibida e punida por lei, fls. 37V e 52V;
dd. O arguido, foi condenado pelo Tribunal de Família e Menores e de Comarca de Portimão, no âmbito do processo-crime n.°………, cujo acórdão transitou em julgado em 29JAN2013, pela prática do crime de violência doméstica, previsto e punido pelo Artigo 152°, n.°1, alínea a) e n.° 2 do Código Penal, na pena de 3 (três) anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período, ao abrigo do disposto no artigo 50.° do Código Penal, sob regime de prova e sob condição de entregar a quantia de 2.000€ (dois mil euros) à APAV, no prazo de 1 (um) ano e fazer prova disso nos autos, fls. 50 a 58;
ee. O arguido, cumpriu a condição de no prazo de 1 (um) ano, entregar a quantia de 2.000€ (dois mil euros) à APAV, fls. 60.
6.2. Factos não provados:
a. Que o arguido lhe tenha chamado “ordinária”, fls. 52V;
b. Nenhum outro facto com interesse para a boa decisão da causa ficou por apurar.
7- Apreciação jurídico-disciplinar dos factos:
Com a conduta provada nos autos, o arguido não cumpriu com o disposto no artigo 6°, como Princípio Fundamental, e do Dever de Aprumo previsto no artigo 16°, n.° 1, alínea, do RD/PSP, conjugada com o artigo 152°, n° 1 alínea a) e n°2 do mesmo artigo, do Código Penal.
8- Medida e graduação da pena disciplinares:
Nos termos do disposto no artigo 43.° do RD/PSP, na aplicação e graduação da pena disciplinar deve atender-se a que:
a. As infracções cometidas pelo arguido, são suscetíveis de inviabilizar a manutenção da relação funcional, porque praticou factos que constituem ilícito criminal censurável no ordenamento jurídico português vigente, bem como de elevada censurabilidade, à luz do plasmado no RD/PSP, devendo ter-se eximido à sua prática.
b. Por estar investido de funções de autoridade pública estava obrigado a evitar as condutas em causa, sendo-lhe portanto exigido que se inibisse à sua prática.
c Às faltas cometidas pelo arguido são aplicáveis as penas disciplinares de aposentação compulsiva ou de demissão, previstas nos artigos 25.°, n.° 1, alínea f) e g), e 47°, n° 1, do RD/PSP.
d. Ainda assim, salvo melhor opinião, no decurso do processo disciplinar formulamos a nossa convicção e sem termos a veleidade de desconsiderar ou apoucar a decisão jurisdicional no reflexo que deve ter na apreciação da matéria disciplinar, muito pelo contrário, isso permite-nos no caso sub judice, analisar os factos um pouco mais atomisticamente, principalmente no que tange à pena justa e equilibrada, isto na óptica do direito disciplinar.
e. Consideramos que as penas terão sempre no seu horizonte como fim, não o objectivo único da punição retributiva, (puniatur quia pecratum est), mas acima de tudo o de reconduzir o violador da norma ao cumprimento da mesma e também em certa medida, de proteção do próprio transgressor porque cria na sociedade o sentimento de paz jurídica.
f. As penas no seu significado e fim, têm ainda a função de prevenção que sequer geral positiva e não de expiação.
g. Tendo em linha de conta que as penas se traduzem em um sofrimento infligido ao agente, devem limitar-se ao mínimo indispensável para a realização dos seus fins, até porque além do mal que directamente representam, têm também na maioria das vezes custos não só para os mesmos, mas também para as suas famílias, as mais das vezes inocentes e sempre, e não dispiciendos, custos para a sociedade.
h. Nesta senda, acompanhando a defesa, consideramos que a situação familiar do arguido, com duas filhas menores ao seu encargo, deve merecer um especial cuidado aquando da aplicação da pena disciplinar.
i. Embora na acusação promovida ao arguido, o enquadramento dos factos se faça visando uma pena expulsiva, atendendo ao que se acaba de enunciar supra, em nosso modesto entendimento, a mesma deve ser comutada para uma pena de suspensão.
j. O Agente Principal ……….. – A………., tem 19 anos e 362 dias de serviço (foi alistado a 26ABR1995), possui o 11.º ano como habilitações literárias e tem registadas na sua ficha biográfica, as Medalhas de Comportamento Exemplar, Graus Cobre (2004) e Prata (2012), bem como a Medalha de Assiduidade de 1 Estrela (2006), como condecorações, fls. 64, 66;
1. Não tem registadas quaisquer recompensas na sua ficha biográfica, fls. 66;
m. Encontra-se na classe exemplar de comportamento, pois não tem registada qualquer pena disciplinar na sua ficha biográfica, fls. 66;
n. A informação do superior hierárquico é favorável ao arguido, fls. 69; 8 - Conclusões:
a. Dever-se-ão considerar como provados os factos constantes da acusação deduzida ao arguido;
b. Foi apresentada defesa escrita, por parte do arguido, a contestar os factos de que é acusado, conforme consta a fls. 84 a 121;
e Não há circunstâncias dirimentes da responsabilidade disciplinar a considerar;
d. A título de atenuantes, são de considerar as circunstâncias previstas no Artigo 52.º n.° 1, alíneas b), g) e h) do Regulamento Disciplinar da Polícia de Segurança Pública;
e. Como agravante milita contra si a circunstância constante no Artigo 53.° n.° 1, alínea, do Regulamento Disciplinar da Policia de Segurança Pública;
f. À infracção cometida é aplicável a pena de Suspensão, prevista no Artigo 25.°, n.° 1, alínea d), por força do Artigo 46.°, conjugado com o Artigo 43.° do citado Regulamento Disciplinar.
(…)»;
r) Em 6 de Maio de 2015, por despacho do Comandante do Comando Distrital de Faro, foi aplicada ao requerente a pena disciplinar de suspensão, por sessenta dias, suspensa na sua execução pelo período de dois anos, considerando provados os factos descritos no relatório final, por ter infringido “o Artigo 6.° (Princípio Fundamental) do Regulamento Disciplinar da Policia de Segurança Pública, conjugado com o Artigo 152.°, n.° 1, alínea a) e n° 2 do Código Penal, infringindo ainda o Artigo 16.° (Dever de Aprumo) n° 1 e n.° 2 alínea f) do sobredito Regulamento Disciplinar” (cfr. fls. 218 a 222 do processo administrativo);
s) Em 18 de Maio de 2015, o requerente apresentou recurso hierárquico da decisão disciplinar, dirigido ao Director Nacional da Policia de Segurança Pública (cfr.fls.228 a 244 do processo administrativo);
t) Em 29 de Julho de 2015, por despacho do Director Nacional da PSP exarado sob informação e proposta (n.° 2105GDD02122) elaborada pela Directora do Gabinete de Deontologia e Disciplina, foi determinada “reformulação” do processo disciplinar “a partir do relatório final”, por se considerar que este padecia de vício de fundamentação (por não se conseguir perceber a motivação pela qual foi proposta uma “sanção disciplinar dois graus inferiores” em relação à “moldura abstractamente aplicada à conduta do arguido”, a que corresponderia a pena disciplinar de aposentação compulsiva ou a demissão) e de incompetência [o instrutor, para “além de qualificar a sanção disciplinar de acordo com as suas competências, quantificou a pena disciplinar em 60 (sessenta dias) de suspensão, suspensa na sua execução por um período de 2 (dois) anos, cuja competência compete à entidade com competência disciplinar decidir a quantificação da pena disciplinar”] (cfr. fls 270 a 272 do processo administrativo)
u) Em 17 de Fevereiro de 2016, o instrutor reformulou o relatório final, no qual consta, entre o mais, o seguinte:
Da matéria de facto
9.1 O arguido, foi condenado pelo Tribunal de Família e Menores e de Comarca de Portimão, no âmbito do processo-crime n.º ………, cujo acórdão transitou em julgado em 29JAN2013, pela prática do crime de violência doméstica, previsto e punido pelo Artigo 152°, n.° 1, alínea a) e n.° 2 do Código Penal, na pena de 3 (três) anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período, ao abrigo do disposto no artigo 50.° do Código Penal, sob regime de prova e sob condição de entregar a quantia de 2.000€ (dois mil euros) à APAV, no prazo de 1 (um) ano e fazer prova disso nos autos, fls. 50 a 58;
9.2 Tais factos sustentam-se, logo nos autos de notícia/denúncia e queixa, que aqui se dão por integralmente reproduzidos — fls. 4 a 14.
9.3 Sustentam-se, também, no depoimento da testemunha ………, que declarou ter assistido em 17ABR2011, em ……… a uma discussão e ameaças pelo arguido à queixosa — fls. 40 a 42.
9.4 No seu interrogatório o arguido admitiu a existência de algumas discussões entre si e a vítima, mas negou os restantes factos imputados pela queixosa, sustentado nunca a ter agredido, ameaçado, maltratado ou injuriado por qualquer forma; não a proibira de fazer o que quer que fosse, inclusivamente ter cartão multibanco e de crédito de uma conta conjunta — fls. 25 a 27.
9.5 No que respeita aos depoimentos das testemunhas em sede de defesa, a Dra. ……….. ouvida a fls. 153, disse que no seu entendimento a lesão que a vítima apresentava não lhe parecia corresponder a uma lesão causada por um traumatismo num joelho porque a lesão apresentava-se em forma retangular e não arredondada como seria normal.
A testemunha ……….., ouvido a fls. 166 a 168, disse que nunca presenciou qualquer discussão desta ou de outra índole entre o casal, bem como nunca sentiu qualquer mal-estar entre ambos, que acha estranho que tal tenha ocorrido, dada a falta de qualquer queixume físico por parte da Sra. B………... Teve conhecimento que a Sra. B………… saiu da residência do casal sozinha e por sua vontade.
Considera estranho que a Sra. B…………, perante tal ameaça grave à sua integridade física, permanecesse na residência até Julho de 2011.
Referiu que nunca teve conhecimento de qualquer ameaça de morte por parte do arguido.
Ora, isso não pode significar que o arguido não o tivesse feito. As condutas por que o arguido foi acusado abrangem um largo período temporal e, na sua maioria, foram praticadas no interior da residência do casal. As condutas típicas associadas ao crime de violência doméstica são levadas a cabo, maioritariamente, no seio dos envolvidos - agressor e vítima, na residência do casal, ou em locais de nenhuma aposição pública, apenas podendo ser parcialmente corroborado por familiares, vizinhos, visitas da residência ou testemunhas ocasionais.
9.6 Portanto, não se podendo ter tais depoimentos por não credíveis parciais, e partindo do principio de que neles se disse a verdade, devem ser acolhidos na estrita medida em que, muito embora aquelas testemunhas, chegassem a ter tido a possibilidade de conviver com o casal, em algumas ocasiões, ter-se-á dado o caso de nesses momentos não ter ocorrido nenhuma situações daquelas em que o arguido teve comportamentos por que foi acusado.
Ora, decorre da experiência do homem médio, colhida no dia-a-dia, que um casal, mesmo em períodos de relações tensas, recebendo em casa visitas, tenta manter as aparências e não entrar em discussões, muito menos em injúrias ou agressões, tentando fazer que a situação não seja exposta: na perspectiva da vítima, para evitar expor a sua vida, não dar azo a comentários, evitar mais violência.
Na perspectiva do agressor, para não ser descoberto e manter as aparências.
9.7 Como acima já se expendeu, tendo o arguido sido condenado em processo-crime pela prática dos factos por que foi nos presentes autos acusado, não pode tal facto ignorar-se, sem que a entidade com poder disciplinar possa, fazendo o enquadramento que considere mais adequado, aplicar ao arguido a pena que melhor se coadune às necessidades de repressão e prevenção, nos termos do disposto nos art°s. 37.º, n.º 2, e 39°, n.º 1, do RD/PSP.
9.8 E tanto assim é que o STA e o STJ vêm firmando jurisprudência uniforme no sentido de que “A decisão penal condenatória, transitada em julgado, vincula a decisão disciplinar no que respeita à verificação da existência material dos factos e dos seus autores, sem prejuízo da sua valoração e enquadramento jurídico para efeitos disciplinares” (Cfr. Acórdão do STA de 19/06/2007, Proc. n° 01058/06 e STA de 15.10.91, recº 29.002, de 28.01.99, recº 32.788 e de 18.02.99, recº 37476).
9.9 Ainda de acordo com tal jurisprudência, e em respeito do caso julgado penal (Cfr. art°s 84° e 467°, n.º 1, do CPP, 673° a 674°-A do CPC ex vi art° 4.º e 205°, n.º2, da CRP), a entidade com competência disciplinar, logo também o instrutor, está vinculada aos factos dados por provados na decisão penal condenatória do arguido, relevantes para a decisão destes autos, sem prejuízo da sua valoração e enquadramento jurídico para efeitos disciplinares.
9.10 Por outro lado, o facto de o arguido já ter sido punido em tribunal não retira nenhum mérito ao processo. Tem sido pacifica a jurisprudência e a doutrina considerarem que, se bem que duplamente censuráveis, a responsabilidade criminal não consome a responsabilidade disciplinar, por, cada uma dessas instâncias visar fins diferentes, sendo que com a responsabilidade disciplinar se visa adequar a conduta do funcionário à imagem da instituição que serve, pretendendo-se que essa imagem e o seu reflexo sejam positivos e de molde a criarem no público/cidadão a confiança nas instituições. Pelo que, se essa imagem reflecte condutas desapropriadas/desajustadas, esbate-se a confiança do público/cidadão, degradando-se a imagem das instituições com a dos seus servidores (Cfr. Par. da PGR n.ºs 163/82, de 09112, BMJ, 328-337 e Proc. 101/87, de 12/03, DR., n.° 99, II Série, de 29/04/88).
9.11 Não viola, pois, o princípio constitucional “Ne bis in idem” a dupla instância de punibilidade do arguido pela prática dos mesmos factos, pois, se por um lado, nos termos do Ac. STA de 15/10/91, BMJ 410-846, “a repressão disciplinar e a repressão criminal, mesmo que baseadas no mesmo facto, são independentes, uma vez que aquela visa a satisfação dos interesses próprios de um grupo social, enquanto esta se preocupa com a defesa de interesses essenciais da comunidade política”, por outro lado, segundo o Ac. STA de 21/04/94, Proc. 32164, “o clássico princípio do “Ne bis in idem”, transposto para o direito disciplinar, proíbe a aplicação ao mesmo funcionário ou agente de mais de uma pena disciplinar por cada infracção ou a sua punição quando já tenha sido definitivamente isento de pena pela prática da infracção”, não sendo assim violado o art.° 29.°, n.º 5, da CRP.
9.12 Em todas as suas resoluções podendo determinar-se de forma diversa, porque sabia que, fazendo-o, atentava contra a dignidade pessoal e moral e o bem-estar físico, mental e social da ofendida, e incorria por isso, além de responsabilidade criminal, em responsabilidade disciplinar, optou o arguido por maltratá-la nos termos constantes da acusação! Além disso, sabendo que com a sua conduta podia atentar contra a liberdade pessoal da ofendida/testemunha B……….., e por via disso incorrer de igual forma em responsabilidade criminal e disciplinar, encetando o comportamento nos precisos termos constantes da acusação.
9.13 Em face de todos os elementos probatórios assim sumariados e analisados suficientemente provados estão os factos por que ao arguido foi deduzida a acusação, tanto que foi por eles condenado, no âmbito do processo - crime, pela prática de um crime de violência doméstica, p. p. pelo art° 152°, n.º 1, al. a), do Código Penal, na pena de 3 anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período, com sentença transitada em julgado, constituindo a sentença criminal, por força de caso julgado, impondo-se obrigatoriamente para todas as entidades públicas ou privadas, embora a entidade titular do poder disciplinar possa ajuizar a aplicação ao arguido de uma pena em medida proporcional e adequada à sua conduta.
9.14 Tais factos existiram e foi o arguido quem os praticou, devendo a acusação ter-se por subsistente e provada.
9.15 A conduta do arguido, assim dada como provada, assume uma ilicitude e culpabilidade elevada, logo resulta elevada a sua censurabilidade. Cumprindo-lhe zelar pela ordem e segurança e evitar a prática de crimes, nomeadamente contra a integridade física, a liberdade, a integridade moral, o bom nome das pessoas e a paz social, ao atentar contra tais valores, a forma como o fez, violou o arguido esse dever.
9.16. Não existem, pois, nos autos elementos capazes de afastarem a responsabilidade disciplinar do arguido, não se mostrando haver circunstâncias dirimentes da sua responsabilidade disciplinar, mormente das previstas no art° 51° do RD/PSP.
10. Do direito
[...]
10.3 Ora, ao arguido, nas datas do cometimento das condutas porque foi condenado, estando vinculado à PSP, mesmo em período de folga, cumpria-lhe observar e obedecer aos preceitos legais e regulamentares inerentes a tal vínculo, nomeadamente todos os restantes deveres funcionais previstos no RD/PSP, logo, os acabados de sumariar. Além disso.
10.4 O facto de o arguido ter tido todas aquelas condutas, sabendo que lhe eram vedados e por elas poderia vir a ser criminal e disciplinarmente punido, e com as mesmas se conformando, evidencia um claro e grave desrespeito por normas de serviço e acentuado desinteresse pelo cumprimento de deveres profissionais.
10.5 Conformando-se com essa conduta, e de acordo com o artigo 4°. do RD/PSP, violou o arguido deveres funcionais, a cujo cumprimento estava vinculado, a saber Principio Fundamental, previsto no art° 6° do ED/PSP, com referência ao art° 152°, n° 1, al. a), do C. Penal, e do Dever de Aprumo, previsto no artigo 16°, n°s 1 e 2, al., ambos do RD/PSP.
10.6 Dessas condutas não pode deixar de se considerar ter resultado prejuízo, manifesto, em primeiro lugar para a queixosa, pelos danos físicos e morais e/ou psicológicos causados pelos comportamentos atentatórios da sua dignidade pessoal e bem-estar físico, mental e social, e liberdade pessoal, em segundo lugar, para o serviço e para a disciplina, quer pela negatividade que aqueles acarretaram para a imagem e o prestígio, quer do arguido, enquanto agente de autoridade, quer da Instituição.
10.7 Em todas aquelas resoluções agiu o arguido a título de dolo, que no caso se deverá ter por directo, nos termos das disposições conjugadas dos art° 66° do RD/PSP, 13° e 14°, n° 1, do C. Penal, pelo que, no seu conjunto, resultou elevado o desvalor das suas condutas, não só pela natureza dos actos concretamente praticados, como pela sua qualidade de agente da PSP, que lhe conferia uma responsabilidade acrescida em relação ao cidadão médio, tanto que possuía a necessária capacidade e liberdade para se poder determinar de forma diversa.
10.8 A favor do arguido militam as circunstâncias atenuantes da responsabilidade disciplinar o bom comportamento anterior, ter medalhas atribuídas e a boa informação do superior hierárquico de que depende, previstas no art° 52° n° 1, als. b), g) e h), do RD/PSP - fls. 64, 66, 69
10.9 Contra o arguido militam as circunstâncias agravantes da responsabilidade disciplinar o facto de a infração ser cometida na presença de outros, ou ainda em público; infração comprometedora da honra, do brio, do decoro profissional ou prejudicial à ordem ou ao serviço a acumulação de infracções, todas previstas do artigo 53°, n°s 1, a 1), do RD/PSP.
11. Da natureza e medida da pena
11.1 Nos termos dos critérios enunciados no art° 43° do RD/PSP, na determinação da medida da pena deverá atender-se “à natureza e gravidade da infração, à categoria do funcionário ou agente, ao grau de culpa, à sua personalidade, ao seu nível cultural, ao tempo de serviço e a todas as circunstâncias que militem contra ou a favor do arguido”.
11.2 O arguido protagonizou, no seu conjunto, uma conduta caracterizada por uma gravidade tal, assumindo um comportamento lesivo e ofensivo da imagem da PSP, que torna inviável a manutenção da sua relação funcional, já que, cumprindo-lhe prevenir a criminalidade e a prática dos demais actos contrários à lei e garantir a segurança e a protecção das pessoas e dos bens, tendo, por isso, o dever de reforçar na comunidade civil a confiança na acção desenvolvida pela Corporação, não ser o próprio a praticar tais actos.
11.3 O arguido de acordo com as funções que exerce tem por missão, ainda que não se encontre ao serviço, defender a legalidade democrática, garantir a segurança interna e os direitos dos cidadãos, por isso cumpria-lhe observar e obedecer aos preceitos legais e regulamentares inerentes ao vínculo, nomeadamente aos deveres funcionais previstos no ED/PSP.
11.4 As infracções praticadas pelo arguido inviabilizam a manutenção da relação funcional, impossibilitando a conservação da sua condição enquanto agente policial, por ofender de forma muito grave a dignidade e o prestígio da função que exerce, quebrando a confiança que deve existir entre a Corporação, os seus elementos, e a comunidade.
11.5 Não pode, assim, deixar-se de considerar ter sido, em todas as suas resoluções, intensas a gravidade, a licitude e a culpa emergente das suas condutas, logo intenso o seu desvalor, não só pela natureza dos actos concretamente praticados, como pela sua qualidade de agente da PSP, que lhe conferia uma responsabilidade acrescida em relação ao cidadão médio, tanto que possuía a necessária capacidade e liberdade para se poder determinar de forma diversa.
11.6 Ademais, as condutas do arguido, promotoras de comportamentos contrários à lei, encerram um grau de desvalor tal que fazem quebrar a confiança que deve existir entre a Corporação e os seus agentes, pelo que a prática de tais infracções não podem deixar de ser puníveis com a pena disciplinar de aposentação compulsiva ou demissão, nos termos das disposições conjugadas dos art°s 25.°, n.° 1, als. 9 e g), 43.°, 47°, n.°s 1 e 2, al. c), 48° e 49°, n° 1, alíneas a) e b), todos do RD/PSP, por se tornar inviável a manutenção da relação funcional.
12. Registo Disciplinar/Comportamental
O arguido tem 20 anos de serviço na PSP, possui o 11.º ano; não averba louvores, foram-lhe atribuídas as medalhas de cobre, de 1 estrela de Comportamento Exemplar e Assiduidade, respectivamente, está na classe de comportamento exemplar; goza de boa informação de serviço do superior hierárquico de que depende - fls. 64, 66, 69
13. Proposta de pena
Assim, considerando que:
a) Resulta da análise feita dos elementos de prova reunidos e arreados para os autos que deverão ter-se por suficientemente provados todos os factos imputados na acusação deduzida notificada ao arguido, já que os mesmos existiram, foi o arguido quem os praticou e constituem infracção disciplinar, devendo assim a acusação ter-se por subsistente, por devidamente provada;
b) Com as suas condutas dadas como provadas, o arguido violou os Princípio Fundamental, previsto no art° 6° do RD/PSP, com referência ao art° 152°, n° 1, al. a), do C. Penal, e do Dever de Aprumo, previsto no artigo 16°, n°s 1 e 2, al. 9, ambos do RD/PSP;
c) O arguido agiu a título de dolo directo (Cfr. art° 4° e 66° do RD/PSP e 13° e 14° n° 1, do C. Penal);
d) Às infracções cometidas, por constituírem no seu conjunto, dadas a gravidade, consequências, grau de ilicitude e intensidade de culpa, a prática de factos inviabilizadores da manutenção da relação funcional, corresponde uma das penas de aposentação compulsiva ou demissão, nos termos das disposições conjugadas dos art°s 25.°, n.° 1, als. 9 e g), 43.°, 47.°, n.°s 1 e 2, al. c), 48° e 49°, n° 1, alíneas a) e b), todos do RD/PS.
Concluído que se mostra o presente processo, face às anteriores conclusões, e nos termos do disposto nos art°s 87°, n° 1, do RD/PSP, submeto o assunto à superior apreciação de V. Ex com a proposta para que, mostrando-se com as mesmas concordante, seja determinada a sua remessa ao GDD da DNIPSP para análise e posterior decisão superior, em virtude de, dada a pena proposta na acusação, e de acordo com art.° 18° do RD/PSP, e em face do Anexo V, ao art° 157° do Estatuto de Pessoal da PSP, Dec-Lei n.° 243/2015, de 19/10, a competência para a sua aplicação caber a S. Exa, o MAl.
(cfr.fls. 277 a 291 do processo administrativo)
v) Em 3 de Março de 2016, por despacho do Comandante do Comando Distrital de Faro, foi determinada a remessa do processo disciplinar ao Gabinete de Deontologia e Disciplina da DNPSP, para apreciação e decisão de Sua Exa. o Director Nacional da Polícia de Segurança Pública, com a seguinte fundamentação “atendendo a que as penas propostas a aplicar ao Agente Principal ………. — A…………, do efectivo deste Comando Distrital, recaem sobre a de aposentação compulsiva ou de demissão (...) as quais excedem o meu limite de competência no respeitante à imposição de penas” (cfr fls 292 do processo administrativo);
w) Em 12 de Maio de 2016, o Conselho de Deontologia e Disciplina da PSP emitiu parecer de que devia ser aplicada ao autor “a pena disciplinar de demissão, prevista nos artigos 25.°, n° 1, alínea g), 43.°, 47.º, n.°s 1 e 2, alínea c), e 49.º, n.° 1, alíneas a) e b), todos do Regulamento Disciplinar da Policia de Segurança Pública”, em reunião em cuja minuta de acta consta, entre o mais, o seguinte:
«(…)
Os membros do CDD, visto o processo e discutida a matéria em causa, consideram estar suficientemente provado que as infrações disciplinares praticadas pelo arguido inviabilizam a manutenção da relação funcional.
Na discussão ficou subjacente que os efeitos da conduta do arguido se repercutem na própria Corporação e, por isso, a pena disciplinar de aposentação compulsiva não se afigura suficientemente penalizadora, uma vez que lhe permitia manter a qualidade de agente da autoridade na situação de aposentado, com os direitos inerentes a essa condição e com evidente desprestígio para a PSP, pelo que, a pena adequada à gravidade da infração praticada é a pena disciplinar de demissão, justificando-se, por isso, a rotura total do vínculo à PSP.
Finda a discussão procedeu-se à votação, por escrutínio secreto, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 4.° do Regulamento de funcionamento do Conselho de Deontologia e Disciplina, aprovado pela Portaria n.° 1284/2008, de 10 de novembro, tendo-se apurado o seguinte resultado: três votos a favor de pena disciplinar não expulsiva; seis votos a favor da pena disciplinar de demissão; três votos a favor da pena disciplinar de aposentação compulsiva.
(…)».
(cfr.fls. 296 a 301 do processo administrativo);
x) Em 6 de Junho de 2016, o Director Nacional da PSP submeteu a decisão à Ministra da Administração Interna, com a proposta de aplicação da pena disciplinar de demissão ao requerente (cfr. fls 302 do processo administrativo);
y) Em 11 de Janeiro de 2017, a Ministra da Administração Interna decidiu aplicar ao autor a pena disciplinar de demissão, por despacho do qual consta o seguinte:
«(…)
7. Reformulado o processo foi elaborado, a 17 de fevereiro de 2016, o relatório de folhas 277 a 291 no qual o Instrutor analisou de forma exaustiva as peças processuais relevantes e a prova e concluiu que com a sua conduta, dada como provada, o arguido infligiu o princípio fundamental constante do artigo 6° do RDPSP, por referência ao artigo 152°, n°1, alínea a) e n.° 2 do Código Penal, e o dever de aprumo, previsto no artigo 16°, n.°s 1 e 2, alínea do RDPSP.
8. Mais considerou o Instrutor, no seu relatório, que às infrações cometidas, por consubstanciarem no seu conjunto, dadas as consequências, gravidade, grau de ilicitude e intensidade da culpa, a prática de factos inviabilizadores da manutenção da relação funcional, corresponde uma das penas de aposentação compulsiva ou de demissão, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 25°, n°1, alíneas e g), 43°, 47°, n.° 1 e 2, alínea c), 48° e 49°, n.°1, alínea a) e b), todos do RDPSP (cfr. fls 277 a 291).
9. Foi colhido o parecer do Conselho de Deontologia e Disciplina da Polícia de Segurança Pública, que, a 12 de maio de 2016, se pronunciou, por maioria, pela aplicação ao arguido da pena disciplinar de demissão prevista nos artigos 25° n° 1, alínea g), 43°, 47°, n° 1 e 2, alínea c), e 49°, n.° 1, alíneas a) e b) todos do RDPSP (cfr. fls. 296 a 301).
10. O Diretor Nacional da Polícia de Segurança Pública, nos termos e com os fundamentos do relatório do Instrutor e do parecer do Conselho de Deontologia e Disciplina da Polícia de Segurança Pública, em despacho de 6 de junho de 2016, propôs a aplicação ao arguido da pena disciplinar de demissão (cfr. fls 302).
11. A Direção de Serviços de Assessoria Jurídica, Contencioso e Política Legislativa da Secretaria Geral do Ministério da Administração Interna, consultada para o efeito, emitiu o parecer n° 444-MM/2016, de 14 de novembro, no qual se pronuncia pela regularidade do processo e pela aplicação ao arguido da pena disciplinar de demissão.
12. Atento o exposto, nos termos e com os fundamentos constantes do relatório do Instrutor de folhas 277 a 291, do parecer do Conselho de Deontologia e Disciplina da Policia de Segurança Pública, do despacho do Diretor Nacional da Policia de Segurança Pública e do referido parecer da Direção de Serviços de Assessoria Jurídica, Contencioso e Política Legislativa da Secretaria Geral do Ministério da Administração Interna, aplico ao arguido, Agente Principal da Policia de Segurança Pública n° ………., A……….., a pena disciplinar de demissão.
(cfr fls. 374 a 376 do processo administrativo);
aa) Em 11 de Abril de 2017, a decisão disciplinar foi publicada em ordem de serviço.


3. O Direito
O Autor recorre do acórdão do TCAS que entendeu, contrariamente ao que havia considerado a primeira instância, que o procedimento disciplinar instaurado àquele, que culminou na aplicação da pena demissão, não se encontra prescrito.
Com efeito, entendeu a sentença do TAF de Loulé que o procedimento disciplinar aqui em causa, está prescrito nos termos do disposto no art 6º, nº 6 do Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que Exercem Funções Públicas (EDTQEFP), aprovado pela Lei nº 58/2008, de 9 de Setembro, aplicável por remissão expressa do art. 66º do Regulamento Disciplinar da Policia de Segurança Pública (RDPSP), aprovado pela Lei nº 7/90, de 20 de Fevereiro, por se estar perante uma lacuna, perante uma falta ou omissão deste Regulamento Disciplinar.
O TCAS entendeu não ser aplicável ao processo disciplinar em apreço o art. 6º, nº 6 do EDTQEFP, mas antes o art. 121º, nº 3 do Código Penal, pelo que o prazo de prescrição é de 15 anos, não havendo ocorrido a prescrição.
O Recorrente defende que o acórdão recorrido incorreu, ao assim entender, em erro na interpretação e aplicação do Direito.


O Recorrente, é agente da Polícia de Segurança Pública (PSP), tendo contra si sido levantado auto de notícia por violência doméstica, em 31.07.2011, e determinada a instauração de procedimento disciplinar em 31.08.2011, vindo este a ser suspenso por se considerar que “não existem elementos de prova suficientes para deduzir, desde já, acusação” e “atendendo a que o arguido tem processo criminal pendente pelos mesmos factos do processo disciplinar”, foi determinada a suspensão do procedimento disciplinar até que se concluísse o processo criminal pendente, em 07.02.2012.
O aqui Recorrente veio a ser condenado, em 13.04.2012, pela prática do crime de violência doméstica, em três anos de prisão, com execução suspensa por igual período com condicionalismos, sendo esta condenação junta ao processo disciplinar em 25.03.2013. Neste processo foi deduzida acusação em 14.07.2014, a qual foi notificada ao arguido em 22.08.2014. A pena de demissão veio a ser aplicada em 11.01.2017, sendo o acto impugnado.

A questão que está em discussão na presente revista é a de saber se ocorreu a prescrição do procedimento disciplinar.
Ao Recorrente é aplicável o Regulamento Disciplinar da Polícia de Segurança Pública (RDPSP), aprovado pela Lei nº 7/90, de 20/2.
O capítulo IV deste RD/PSP, sob a epígrafe “Extinção da Responsabilidade Disciplinar”, estabelece no art. 54º, alínea a) a prescrição do procedimento disciplinar, como uma das causas de extinção do mesmo.
No art. 55º, sob a epígrafe Prescrição do procedimento disciplinar, prescreve-se o seguinte:
1 – O direito de instaurar procedimento disciplinar prescreve passados 3 anos sobre a data em que a infracção tiver sido cometida.
2 – Exceptuam-se as infracções disciplinares que constituem ilícito penal, as quais só prescrevem, nos termos e prazos estabelecidos na lei penal, se os prazos de prescrição do procedimento criminal forem superiores a 3 anos.
3 – A responsabilidade prescreve também, se conhecida a falta pela entidade com competência disciplinar, não for instaurado procedimento no prazo de 3 meses.
4 – A prescrição considera-se interrompida pela prática de acto instrutório com incidência na marcha do processo e pela notificação da acusação ao arguido.
5 – Suspende o decurso do prazo prescricional a instauração de processo de sindicância ou de mero processo de averiguações, bem como a instauração de processo de inquérito ou disciplinar em que, embora não dirigidos contra funcionário ou agente, venham a apurar-se infracções por que seja responsável.
Por sua vez, o art. 66º do EDPSP, sob a epígrafe Direito subsidiário, prevê que:
O processo disciplinar rege-se pelas normas constantes do presente Regulamento e, na sua falta ou omissão, pelas regras aplicáveis do estatuto disciplinar vigente para os funcionários e agentes da administração central e da legislação de processo penal.

A Lei nº 58/2008, de 9/9 veio aprovar um novo Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores Que Exercem Funções Públicas, nela designado por Estatuto (cfr. art. 1º desta Lei).
No art. 1º deste Estatuto estabelece-se o seu âmbito de aplicação subjectivo, prevendo-se no nº 3 deste preceito que: “Exceptuam-se do disposto nos números anteriores os trabalhadores que possuam estatuto disciplinar especial.
O art. 6º do Estatuto, sob a epígrafe Prescrição do procedimento disciplinar prescreve o seguinte:
1 – O direito de instaurar procedimento disciplinar prescreve passado um ano sobre a data em que a infracção tenha sido cometida.
2 – Prescreve igualmente quando, conhecida a infracção por qualquer superior hierárquico, não seja instaurado o competente procedimento disciplinar no prazo de 30 dias.
3 – Quando o facto qualificado como infracção disciplinar seja também considerada infracção penal, aplicam-se ao direito de instaurar procedimento disciplinar os prazos de prescrição estabelecidos na lei penal.
4 – (…)
5 - (…)
6 – O procedimento disciplinar prescreve decorridos 18 meses contados da data em que foi instaurado quando, nesse prazo, o arguido não tenha sido notificado da decisão.
7 – A prescrição do procedimento disciplinar referida no número anterior suspende-se durante o tempo em que, por força de decisão jurisdicional ou de apreciação jurisdicional de qualquer questão, a marcha do correspondente processo não possa começar ou continuar a ter lugar.
8 – A prescrição volta a correr a partir do dia em que cesse a causa da suspensão.

Face a este quadro legal, que é o aqui em questão, vejamos:
Como se vê do nº 1 do art. 55º do RDPSP, é de 3 anos o prazo de prescrição do direito de instaurar o procedimento disciplinar no regime especial aqui em causa, a contar da data em que a infracção tiver sido cometida, prescrevendo, igualmente a responsabilidade disciplinar se, conhecida a infracção pela entidade competente disciplinar, não for instaurado o procedimento no prazo de 3 meses.
Apesar de o nº 1 do art. 55º do RDPSP se referir à prescrição do direito de instaurar o procedimento disciplinar, o que resulta da conjugação dessa norma com os nºs 2, 4 e 5 é que o preceito em causa, visa tanto o período que medeia entre a data da prática da infracção e a instauração do processo disciplinar, como todo o período em que é possível exercer a acção disciplinar. Isto é, aquele que decorre desde a data da prática da infracção até à data da decisão final (como acontecia, em termos em tudo semelhantes, com o art. 4º do Estatuto Disciplinar, aprovado pelo DL nº 24/84, de 16/1, que se encontrava em vigor quando foi aprovado este regime especial).
Aliás, a própria epígrafe do preceito aponta no sentido de que o prazo de prescrição previsto no seu nº 1 não se circunscreve à prescrição do direito de instaurar o procedimento disciplinar, mas abrange o procedimento disciplinar no seu todo, como resulta do disposto no nº 4 do preceito que, ao estabelecer que a prescrição se interrompe com a prática de acto instrutório com incidência na marcha do processo e com a notificação da acusação ao arguido, remete claramente para um prazo de prescrição em curso num processo disciplinar já instaurado e não para um procedimento a instaurar, como bem salienta o Ministério Público.

No presente caso, estando em causa, como estão, factos integradores de crime de violência doméstica, que é punível em abstracto com pena de prisão até 5 anos, nos termos das disposições conjugadas do art. 152º, nºs 1, alíneas a), c) e d) e nº 2 do art. 152º do Código Penal, o prazo da prescrição do procedimento criminal a ter em conta é o prazo de 10 anos, previsto no art. 118º, nº 1, alínea b) do Código Penal.
Com efeito, embora o art. 55º do RDPSP tenha praticamente reproduzido o art. 4º do ED84 então vigente, no que respeita ao respectivo nº 2 acrescentou, relevantemente a expressão «termos» a que se segue «prazos estabelecidos na lei penal» comum a ambos [cfr. nº 3 do art. 4º].
Ora, o acrescento de tal expressão, apenas pode significar, sem sombra de dúvida, que, no que se refere às situações previstas no mencionado nº 2 do art. 55º do RDPSP, o regime de prescrição é idêntico ao do Código Penal, sendo-lhe, como tal directamente aplicável o nº 3 do art. 121º deste último diploma, segundo o qual, “(…), a prescrição do procedimento criminal tem sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo normal de prescrição acrescido de metade.”.
No caso, 15 anos, como resulta das normas citadas.
Tal entendimento é também o perfilhado no Parecer nº 160/2003, de 29.01.2004 (Nº Convencional: PGRP000060203), do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República [entendimento reiterado no parecer do mesmo CCPGR nº 37/2014, de 15.01.2015].
Este parecer nº 160/2003 (igualmente referenciado no acórdão recorrido), expende acerca da norma do art. 55º do RDPSP, que nele se detecta uma lacuna [mas apenas quando não está em causa a previsão do nº 2 do art. 55º], ao referir que “(…) o RD/PSP (e também o ED) contém uma norma, a do artigo 55.º, que regula a prescrição do procedimento disciplinar, mas que não é suficientemente restritiva, nomeadamente por dela estar ausente a regulação de prazo-limite, subsequente à ocorrência de facto interruptivo”.
Tal prazo-limite, como se concluiu no referido parecer do CCPGR nº 160/2003 é o que decorre do art. 121º, nº 3 do Código Penal. Conforme se diz naquele parecer: “(…) de onde resulta que a prescrição do procedimento disciplinar terá sempre lugar quando, desde o seu início, e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo normal de prescrição acrescido de metade”.
O acórdão recorrido parece ter entendido que a doutrina do parecer aplicável no presente caso é a que procede à integração da lacuna detectada no art. 55º do RDPSP com a aplicação do art. 121º, nº 3 do Código Penal. Mas, neste particular sem razão, já que, como se disse a aplicação deste último preceito resulta directamente da previsão do nº 2 daquele artigo 55º ao estabelecer que as infracções que constituam ilícito penal só prescrevem, nos termos e nos prazos estabelecidos na lei penal.

Não há dúvidas que a publicação do Estatuto Disciplinar, aprovado pela Lei nº 58/2008 (e revogado pela Lei nº 35/2014, de 20/6 que aprovou a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas - LGTFP), introduziu no que respeita à prescrição, alterações importantes relativamente ao regime do ED, aprovado pelo DL nº 24/84, estabelecendo no citado nº 6 do art. 6º, um prazo de prescrição do procedimento autonomizado relativamente ao prazo para instauração do procedimento disciplinar.
Regime idêntico ao estabelecido nessa matéria na Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LGTFP) que, apesar de manter o prazo de 18 meses para a prescrição do procedimento disciplinar, veio, no entanto, a clarificar o alcance do prazo previsto no nº 1 do seu art. 178º, ao dispor que esse prazo é referente à própria infracção disciplinar, deixando de associar tal prazo ao direito de instaurar o procedimento disciplinar, fórmula que vinha do ED84 e que se manteve no Estatuto aprovado pela Lei nº 58/2008.

A tese do recorrente na presente revista é a de que este prazo de 18 meses previsto no art. 6º, nº 6 do Estatuto é aplicável no presente caso, por remissão expressa do art. 66º do RDPSP, por se estar perante uma lacuna, perante a omissão do RD.
Não lhe assiste razão.
Desde logo, como já se viu - art. 1º, nº 3 do Estatuto de 2008 – este não é aplicável ao presente caso por o pessoal com funções policiais dos quadros da PSP estar submetido a um regime disciplinar especial.
Por outro lado, o disposto no art. 66º do RDPSP é um regime de aplicação subsidiária de normas processuais quer do estatuto disciplinar vigente para os funcionários e agentes da administração central, quer das normas de processo penal. O que não é o caso do instituto da prescrição, que tem carácter substantivo.
Acresce que, mesmo a entender-se que essa aplicação subsidiária, no regime da prescrição, era admissível, no caso presente nunca haveria lugar a ela, uma vez que o regime especial aplicável – o art. 55º, nº 2 do RDPSP -, prevê expressamente a aplicação do regime do Código Penal, quanto aos termos e prazos de prescrição quanto a infracções que constituam ilícito penal (cfr. os referenciados pareceres do CCPGR nºs 160/2003 e 37/2014).
Assim, o prazo prescricional é, no presente caso de procedimento disciplinar instaurado pela prática de crime de violência doméstica, de 15 anos, por aplicação do art. 55º, nº 2 do RDPSP conjugado com os arts. 118º, nº 1, alínea c), 121º, nº 3 e 152º, nºs 1, alíneas a), c) e d) e 2, todos do Código Penal.

Alega o recorrente que a interpretação do nº 3 do art. 1º do Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que Exercem com Funções Públicas, aprovado pela Lei n.º 58/2008, de 9 de Setembro, expressa no acórdão recorrido segundo a qual, e sem prejuízo da remissão expressa do artigo 66.º do EDTEFP, não se aplica à inovação do prazo de prescrição do procedimento prevista no n.º 6 do Artigo 6.º do EDTEFP, sem mais, ao pessoal da PSP com funções policiais, é inconstitucional por violação do Princípio da Igualdade consagrado no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa.
Alega ainda que a interpretação e aplicação da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LGTFP), aprovada pela Lei nº 35/2014, de 20 de Junho pelo Tribunal recorrido ao processo disciplinar em apreço é inconstitucional por violação do Princípio da irrectroactividade da Lei em matéria penal consagrado no artigo 29.º, aplicável ex vi n.º 10.º do artigo 32.º, ambos da Constituição da República Portuguesa.
E que a interpretação e aplicação do Regulamento de Disciplina da GNR, na redacção da Lei nº 66/2014, de 28 de Agosto no Acórdão recorrido configura uma violação quer ao Princípio da Proibição da Analogia em matérias penais, quer ao Principio da irrectroactividade da Lei em matéria penal, princípios consagrados no artigo 29.°, aplicável ex vi n.º 10.º do Artigo 32.º, ambos da Constituição da República Portuguesa.

As inconstitucionalidades invocadas não procedem.
Quanto à violação do princípio da igualdade apenas se verifica quando perante dois casos iguais no plano objectivo se proceda de forma diferente para cada um, quando os elementos de ponderação de ambos são iguais. Já se as situações de facto forem diversas, a solução a que se chegar será diferente.
Ora, as situações previstas na Lei nº 58/2008 e no RDPSP, e em causa nos autos, não são manifestamente iguais, demandando, como tal soluções diferentes, previstas pelo legislador nos vários estatutos disciplinares especiais. O que claramente resulta do próprio Estatuto de 2008 ao excluir do seu âmbito de aplicação os trabalhadores que possuam estatuto disciplinar especial, nos termos do seu art. 1º, nº 3.
Assim, a ser aplicável no caso o art. 66º do RDPSP (e como vimos não é), tal não implica que a interpretação a que procedeu o acórdão recorrido seja violadora do princípio da igualdade previsto no art. 13º da CRP.

Quanto à aplicação pelo acórdão recorrido da LGTFP e do Regulamento de Disciplina da GNR, ela não ocorreu, apenas se tendo limitado o acórdão recorrido a aduzir o que se estabelece nos regimes daqueles diplomas [cfr. art. 178º, nºs 1 e 5 da LGTFP e art. 46º, nºs 1 e 7 do Regulamento de Disciplina da GNR, aprovado pela Lei nº 145/99, de 1/9, na redacção introduzida pela Lei nº 66/2014, de 28/8, respectivamente], como elementos interpretativos equacionados à luz da unidade do sistema jurídico, para o regime que lhe cabia dilucidar.
Assim, ao não ter aplicado ao caso sub judice os regimes estabelecidos na LGTFP e no RDGNR o acórdão recorrido não incorreu em violação dos invocados princípio da proibição da analogia em matérias penais e do princípio da irrectroactividade da Lei em matéria penal, princípio consagrado no art. 29º, nº 1, (não se estando perante situação a que seja aplicável o nº 10.º do art. 32º da CRP, que assegura os direitos de audiência e defesa ao arguido em processos de contra-ordenação e quaisquer processos sancionatórios).

Quanto à condenação em custas no TCA e na primeira instância, tem o recorrente razão ao defender que não devia ter sido condenado nas mesmas no acórdão recorrido.
Com efeito, nem o aqui recorrente contra-alegou no recurso interposto para aquela instância, como, devendo os autos prosseguir para serem conhecidas as diversas ilegalidades imputadas ao acto impugnado na acção principal, não é possível antecipar se a posição do recorrente vai ou não obter vencimento, e em que medida, pelo que só a final será determinada a responsabilidade pelas custas (cfr. art. 527º do CPC).

Pelo exposto, acordam em negar provimento ao recurso, mantendo o acórdão recorrido com os fundamentos acima referidos.
Sem custas, nas instâncias e neste STA.

Lisboa, 28 de Junho de 2018. – Teresa Maria Sena Ferreira de Sousa (relatora) – José Francisco Fonseca da Paz – Maria do Céu Dias Rosa das Neves.