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Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0829/12.7BELRA 0212/18
Data do Acordão:11/14/2018
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FRANCISCO ROTHES
Descritores:NULIDADE DE ACÓRDÃO
OMISSÃO DE PRONÚNCIA
Sumário:I - As nulidades das decisões judiciais situam-se no âmbito da sua validade formal e pressupõem que o concreto acto jurisdicional tenha desrespeitado as regras próprias da sua elaboração e estruturação ou violado o conteúdo e limites do poder à sombra da qual foi decretado.
II - Verifica-se omissão de pronúncia (cfr. art. 125.º, n.º 1, do CPPT) se o tribunal deixa por conhecer questões que foram suscitadas pelas partes sem indicar razões para justificar essa abstenção de conhecimento e se da decisão jurisdicional também não resulta, de forma expressa ou implícita, que esse conhecimento ficou prejudicado.
III - Não se pode configurar a nulidade por omissão de pronúncia relativamente às questões que o tribunal expressamente deixou fora do âmbito do recurso nem quanto às questões de que o tribunal conheceu, ainda que o sentido decisório não seja o pretendido pelo recorrente.
Nº Convencional:JSTA000P23849
Nº do Documento:SA2201811140829/12
Data de Entrada:02/27/2018
Recorrente:A...
Recorrido 1:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Arguição de nulidades do acórdão proferido no recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de impugnação judicial com o n.º 829/12.7BELRA

1. RELATÓRIO

1.1 O Requerente acima identificado, notificado do acórdão proferido nestes autos por este Supremo Tribunal Administrativo, que negou provimento ao recurso por ele interposto da sentença por que a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, com fundamento em erro na forma do processo insusceptível de ser corrigido por convolação para a forma processual adequada – que seria a oposição à execução fiscal –, absolveu a Fazenda Pública (a seguir Recorrida) da instância no processo de impugnação judicial por aquele deduzido na qualidade de responsável subsidiário chamado, por reversão, à execução fiscal instaurada contra a sociedade denominada “B……………, Lda.” para cobrança de dívidas de IVA e de IRC, veio arguir a nulidade do acórdão por omissão de pronúncia.

1.2 A Requerida não respondeu.

1.3 Cumpre apreciar e decidir, tendo-se dispensado os vistos dos Conselheiros adjuntos, atento o carácter urgente do processo.


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2. FUNDAMENTAÇÃO

2.1 O Recorrente arguiu a nulidade do acórdão proferido de fls. 104 a 112 dos presentes autos por omissão de pronúncia, invocando a alínea d) do n.º 1 do art. 615.º do Código de Processo Civil (CPC).
A nulidade por omissão de pronúncia, expressamente prevista no art. 125.º, n.º 1, do CPPT, está directamente relacionada com o comando fixado n.º 2 do art. 608.º do CPC, segundo o qual «o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras». É o vício de que enfermam as decisões judiciais que tenham deixado por apreciar alguma questão cujo conhecimento se lhe impunha por ter sido invocada pelas partes. Constitui, pois, o reverso do dever que impende sobre o tribunal nos termos referido n.º 2 do art. 608.º do CPC.
Por conseguinte, só pode ocorrer omissão de pronúncia quando o tribunal não toma posição sobre questão colocada pelas partes, não emite decisão no sentido de não poder dela tomar conhecimento nem indica razões para justificar essa abstenção de conhecimento, e da decisão judicial também não resulta, de forma expressa ou implícita, que esse conhecimento tenha ficado prejudicado em face da solução dada ao litígio.
Dito isto, vejamos por que o Requerente considera verificada esta nulidade.
Começa o Requerente por expressar a sua discordância com o entendimento que o acórdão fez do âmbito do recurso, de que o Recorrente se teria conformado com a decisão quanto ao erro na forma do processo e apenas discordava da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria na parte em que nesta se julgou inviável a convolação para o meio processual adequado. Mas, se bem entendemos a alegação do Requerente, não há motivo para discordância alguma: o Requerente, que não recorreu da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria na parte em que julgou verificado o erro na forma do processo, afirma que não se conformou com a mesma sentença na parte em que considerou inviável a convolação e foi precisamente com esse âmbito que o acórdão deste Supremo Tribunal encarou o recurso.
De seguida, considera o Requerente que este Supremo Tribunal omitiu pronúncia quanto à questão da convolação.
Salvo o devido respeito, temos dificuldade em alcançar o sentido dessa alegação, uma vez que a questão da convolação foi expressamente tratada e decidida no ponto 2.2 do acórdão, sob a epígrafe “DA INVIABILIDADE DA CONVOLAÇÃO” e abordada sob a dupla óptica da “CONVOLAÇÃO EM OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL” e da “CONVOLAÇÃO EM REQUERIMENTO DIRIGIDO AO ÓRGÃO DA EXECUÇÃO FISCAL”, como resulta da epígrafe dos pontos 2.2.2.1 e 2.2.2.2, respectivamente.
Quanto ao demais alegado no requerimento, na parte que se refere aos vícios imputados às liquidações, relembramos que no recurso apenas se discutiu a possibilidade de convolação da petição inicial, uma vez que no recurso apenas se questionou a sentença na parte em que a não admitiu e já não na parte em que julgou verificado o erro na forma do processo.
Sempre salvo o devido respeito, não faz sentido esgrimir a nulidade por omissão de pronúncia relativamente a questões que, manifestamente, se situam fora do objecto do recurso, quais sejam as respeitantes à legalidade das liquidações.
Finalmente, também não pode considerar-se que haja omissão de pronúncia quanto à convolação em requerimento de arguição da prescrição dirigido ao órgão da execução fiscal, uma vez que este Supremo Tribunal tratou essa questão expressamente, como acima ficou dito.
Resta-nos relembrar que as nulidades das decisões judiciais se referem ao desrespeito pelo concreto acto jurisdicional das regras próprias da sua elaboração e estruturação ou à violação do conteúdo e limites do poder à sombra da qual foi decretado e não a eventuais erros de julgamento em que tenha ocorrido. Dito de outro modo, as nulidades situam-se no âmbito da validade formal das decisões, que não no âmbito da sua validade material.
Por tudo o que deixámos dito, concluímos que o acórdão não padece da nulidade por omissão de pronúncia que o Requerente lhe imputou.

2.2. Assim, preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões:

I - As nulidades das decisões judiciais situam-se no âmbito da sua validade formal e pressupõem que o concreto acto jurisdicional tenha desrespeitado as regras próprias da sua elaboração e estruturação ou violado o conteúdo e limites do poder à sombra da qual foi decretado.

II - Verifica-se omissão de pronúncia (cfr. art. 125.º, n.º 1, do CPPT) se o tribunal deixa por conhecer questões que foram suscitadas pelas partes sem indicar razões para justificar essa abstenção de conhecimento e se da decisão jurisdicional também não resulta, de forma expressa ou implícita, que esse conhecimento ficou prejudicado.

III - Não se pode configurar a nulidade por omissão de pronúncia relativamente às questões que o tribunal expressamente deixou fora do âmbito do recurso nem quanto às questões de que o tribunal conheceu, ainda que o sentido decisório não seja o pretendido pelo recorrente.


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3. DECISÃO

Em face do exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência, em indeferir o requerido.

Custas pelo Recorrente.


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Lisboa, 14 de Novembro de 2018. – Francisco Rothes (relator) – Aragão Seia – Dulce Neto.