Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0204/23.8BALSB
Data do Acordão:02/08/2024
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:SUZANA TAVARES DA SILVA
Descritores:INTIMAÇÃO PARA PASSAGEM DE CERTIDÃO
PARECER
DELIBERAÇÃO DO JÚRI
DOCUMENTO ADMINISTRATIVO
CONCURSO PARA JUIZ DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO
Sumário:Constitui um “documento administrativo”, integrante do procedimento, e sujeito às regras gerais de acesso aos documentos administrativos, um denominado “parecer preliminar/documento de trabalho”, que tenha de ser elaborado, por imposição normativa do regulamento do concurso, por um membro do júri (relator), contendo as valorações dos fatores consideradas por este ajustadas, para servir de base à discussão e deliberação avaliativa do júri.
Nº Convencional:JSTA000P31914
Nº do Documento:SA1202402080204/23
Recorrente:AA
Recorrido 1:CONSELHO SUPERIOR DOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS E FISCAIS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:

I – RELATÓRIO

1 – AA, Juíza de Direito em exercício de funções no Tribunal Administrativo e Fiscal do ..., veio requerer, contra o Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais (CSTAF), ao abrigo dos arts. 20.º, n.º 4 e 104.º e segs. do CPTA, “intimação para prestação de informações, consulta de documentos e passagem de certidões”, na qual formulou o seguinte pedido:
“Nestes termos, e nos mais de Direito que Vossas Excelências doutamente suprirão, deve a presente acção de intimação ser julgada procedente, por provada, e, em consequência, ser determinada a intimação do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais, para satisfazer integralmente o seu pedido constante do requerimento de 4 de Dezembro de 2023, reproduzido como documento n.º 3, com todas as consequências legais”.

2 – A Entidade Requerida (CSTAF) apresentou resposta, em que suscita as excepções de intempestividade parcial do pedido e de ininteligibilidade do pedido, pugnando, no mais, pela improcedência do pedido de intimação, sustentando que os “pareceres preliminares” em causa não meros documentos de trabalho, equivalentes a notas pessoais, não configurando, como tal, documentos administrativos sujeitos ao regime legal próprio de acesso aos documentos administrativos, revestindo carácter reservado, como expressamente constava do Aviso de abertura do concurso:

3 – Na réplica, a Requerente sustenta a improcedência das excepções.

4 - Sem vistos, por se tratar de processo urgente (art. 36º n.ºs 1 d), 2, 3 e 4 do CPTA), o processo é submetido à Conferência, cumprindo apreciar e decidir.


II. FUNDAMENTAÇÃO

1. DE FACTO

Consideramos provados os seguintes factos:

1. A Requerente é Juíza de Direito do Juízo de Direito da Jurisdição Administrativa e Fiscal, a exercer actualmente funções no Tribunal Administrativo e Fiscal do ..., Juízo Comum (acordo).
2. A Requerente foi opositora ao concurso para o provimento das vagas existentes de Juiz Desembargador das Secções de Contencioso Administrativo dos Tribunais Centrais Administrativos Norte e Sul, aberto pelo Aviso n.º ...22, de 4 de Abril e no qual foi admitida e graduada no ... lugar com a pontuação de ... (Doc. 2 junto com a p.i.).
3. Em 04-12-2023, a Requerente dirigiu, por via electrónica para o correio electrónico do Requerido, o seguinte pedido, (documento n.º 3 junto com a p.i.):
“AA, candidata ao concurso curricular de acesso aos Tribunais Centrais Administrativos, Secção de Contencioso Administrativo, aberto pelo Aviso n.º ...22, publicado no DR, 2.ª Série, n.º 66, de 4 de abril de 2022, vem requerer a V/Ex.ª, ao abrigo do disposto nos artigos 17.º, 60.º, 61.º, 63.º, 64.º, 67.º, 68.º, 82.º e 83.º, 84.º e 85.º do Código Do Procedimento Administrativo (DL n.º 4/2015, de 07 de Janeiro), certidão de teor integral, onde constem os seguintes elementos:
1. Parecer preliminar/documento de trabalho, relativamente a todos os candidatos que foram distribuídos em sorteio aos vários membros do júri, tendo em conta os fatores referidos no n.º 2 do artigo 61.º e no n.º 2 do artigo 69.º do ETAF, a valoração referida no ponto 5 e a respetiva fundamentação (cfr. ponto 17 do Aviso nº ...22, publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.º 66, de 04 de Abril de 2022.);
2. Cópia de todas as Actas do Júri no supracitado concurso, nomeadamente, as actas onde constem a densificação/fixação dos critérios/sub-critérios de atribuição de pontuação relativamente aos diversos pontos do aviso de abertura do concurso e aplicação dos mesmos a todos os candidatos admitidos.
3. Cópia de pedidos de escusa efetuados por membros do júri relativamente a candidatos para o provimento das vagas existentes de Juiz Desembargador das Secções de Contencioso Administrativo e/ou Tributário dos Tribunais Centrais Administrativos Norte e Sul.
4. Cópia do despacho que decidiu o pedido de escusa por membros do júri relativamente a candidatos para o provimento das vagas existentes de Juiz Desembargador das Secções de Contencioso Administrativo e/ou Tributário dos Tribunais Centrais Administrativos Norte e Sul.
5. Informação sobre se foram gravadas as entrevistas dos candidatos para o provimento das vagas existentes de Juiz Desembargador das Secções de Contencioso Administrativo. Em caso afirmativo, solicita-se acesso às gravações.
6. Cópia das actas das entrevistas dos candidatos para o provimento das vagas existentes de Juiz Desembargador das Secções de Contencioso Administrativo.
7. Cópia da fundamentação da deliberação n.º ...18, de 20/12/2018, que graduou os candidatos ao anterior concurso para as Secções de Contencioso Administrativo dos Tribunais Centrais Administrativos, Norte e Sul.
(…)”
4. No dia 15-12-2023, o Requerido remeteu à Requerente a seguinte mensagem (documento n.º 4 junto com a p.i.).
“Na preparação da certidão que solicitou pelo requerimento remetido em anexo à comunicação infra, suscitaram-se dúvidas, designadamente, quanto ao pedido em 7, no qual consta o seguinte: “Cópia da fundamentação da deliberação n.º ...18, de 20/12/2018, que graduou os candidatos ao anterior concurso para as Secções de Contencioso Administrativo dos Tribunais Centrais Administrativos, Norte e Sul.”.
Sucede que esta deliberação do Conselho de 17 de dezembro de 2018, publicada sob o n.º ...20/2018, com data de 20 de dezembro, apreciou reclamações apresentadas relativamente à deliberação de 1 de outubro de 2018, que homologou a lista de graduação final dos candidatos ao anterior concurso, tendo determinado a republicação da lista de graduação final.
Assim, solicita-se que confirme se efetivamente pretende a fundamentação da deliberação do Conselho de 17 de dezembro de 2018, publicada sob o n.º ...20/2018, com data de 20 de dezembro.
(…)”
5. No mesmo dia 15-12-2023, a Requerente respondeu através do envio da seguinte mensagem (documento n.º 5 junto com a p.i.).
“Em resposta ao solicitado, tenho a honra de esclarecer que a minha pretensão informativa basta-se com cópia da fundamentação final que sustentou, em 2018, a graduação dos candidatos ao anterior concurso para as Secções de Contencioso Administrativo dos Tribunais Centrais Administrativos, Norte e Sul”.
6. Em 18 de Dezembro de 2023, o Requerido remeteu à Requerente mensagem electrónica com o seguinte teor (doc. 6, junto com a p.i.):
“Em resposta aos pedidos formulados no requerimento remetido em anexo à mensagem infra, encarrega-me Sua Excelência a Presidente do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais de lhe comunicar que por despacho de 15 de dezembro de 2023:
a) indeferiu o pedido de emissão de certidão do referido “parecer preliminar/documento de trabalho”, nos termos e com os fundamentos do despacho de 27 de novembro de 2023, exarado na Informação n.º ...23 (cfr. anexo)
b) deferiu os pedidos formulados em 2, 3, 4 (estes dois últimos na parte respeitante ao concurso para as Secções de Contencioso Administrativo) e 5 a 7 do requerimento (cfr. certidão em anexo).
c) Quanto aos pedidos formulados em 3 e 4 (na parte respeitante ao concurso para as Secções de Contencioso Tributário), atento o previsto no artigo 85.º do CPA, foi determinada a notificação de V. Exa. para vir esclarecer/dizer qual o seu interesse legítimo na obtenção das informações pretendidas no âmbito do concurso para o provimento das vagas de Juiz Desembargador das secções de contencioso tributário dos Tribunais Centrais Administrativos Norte e Sul, uma vez que não foi candidata ao referido procedimento concursal.
Pelo que, fica V. Exa. notificada nos termos e para os efeitos referidos na alínea c), que antecede
(…)”.
7. A Requerente respondeu ao Requerido, por mensagem electrónica de 18 de Dezembro de 2023, com o seguinte teor (doc. 7 junto com a p.i.):
«(…) Em resposta à mensagem recebida em 18/12/2023, tenho a honra de esclarecer, para os efeitos referidos na alínea c), o seguinte:
A Requerente não se apresentou ao concurso para o provimento das vagas de Juiz Desembargador das secções de contencioso tributário dos Tribunais Centrais Administrativos Norte e Sul, razão pela qual não acompanhou o desenvolvimento desse concurso.
Porém, após conhecimento da lista de graduação – secções de contencioso administrativo, tomou conhecimento da invocação de uma causa de suspeição por um Membro do Júri, relativamente a uma Candidata, o que veio a merecer reconhecimento por parte da Presidente do Júri, no âmbito concurso para o provimento das vagas de Juiz Desembargador das secções de contencioso tributário dos Tribunais Centrais Administrativos Norte e Sul.
Constitui interesse legítimo da Requerente pretender saber se esse Membro do Júri oferece garantias de imparcialidade relativamente à mesma Candidata no concurso para o provimento das vagas de Juiz Desembargador das secções de contencioso administrativo dos Tribunais Centrais Administrativos Norte e Sul.
(…)».
8. O presente processo de Intimação foi proposto em 27/12/2023 (cfr. fls. 1 e segs. SITAF).
9. Por requerimento de 08.01.2024, a fls. 144 do SITAF, a Requerente comunicou o seguinte:
«(…)
em 5/01/2024, a Requerente recebeu uma mensagem eletrónica com o teor que segue: “Na sequência do esclarecimento efetuado na comunicação infra e em complemento à nossa comunicação de 18 de dezembro p.p., remete-se a V. Ex. certidão adicional, relativa aos pedidos formulados em 3 e 4 (na parte respeitante ao concurso para as Secções de Contencioso Tributário), do requerimento apresentado em 4 de dezembro de 2023” (Documento – certidão adicional).
(…)».


2. DE DIREITO

2.1. Da alegada excepção de intempestividade parcial do pedido

2.1.1. O Requerido alega, no essencial: i) que o pedido de certidão relativo ao “pedido de escusa por membros do júri relativamente a candidatos para o provimento das vagas existentes de Juiz Desembargador das Secções de Contencioso Administrativo e/ou Tributário dos Tribunais Centrais Administrativos Norte e Sul” havia sido parcialmente satisfeito em 18.12.2023 com a prestação da informação de que não tinha havido pedidos de escusa no âmbito do concurso para o provimento de vagas nas secções do contencioso administrativo; e ii) que, em relação à emissão da certidão respeitante aos pedidos de escusa no âmbito do concurso para o provimento de vagas nas secções do contencioso tributário, a intimação deu entrada antes de estar verificado o pressuposto processual do artigo 105.º do CPTA, ou seja, antes do indeferimento do pedido, uma vez que ainda não teria decorrido o prazo legal para que o Requerido desse voluntariamente cumprimento ao pedido, como, de resto, veio a suceder.

2.1.2. Na réplica a Requerente vem alegar, no essencial, que o pedido formulado em 4.12.2023 era único, pois embora incluísse a emissão de várias certidões, elas respeitavam todas ao mesmo procedimento e tinham em vista a impugnação de um único acto final. Assim, a resposta que o Requerido deu a esse pedido em 18.12.2023 tem de entender-se como uma resposta única de satisfação parcial do pedido, o que, nos termos do disposto no artigo 105.º, n.º 2, alínea b) do CPTA corresponde ao preenchimento do pressuposto legal para o uso deste meio legal – intimação para a prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões – pelo que não pode falar-se neste caso em intempestividade parcial.

2.1.3. É importante sublinhar que a informação que está aqui em causa – a cópia de pedidos de escusa efetuados por membros do júri relativamente a candidatos para o provimento das vagas existentes de Juiz Desembargador das Secções de Contencioso Administrativo e/ou Tributário dos Tribunais Centrais Administrativos Norte e Sul e a cópia do despacho que decidiu o pedido de escusa por membros do júri relativamente a candidatos para o provimento das vagas existentes de Juiz Desembargador das Secções de Contencioso Administrativo e/ou Tributário dos Tribunais Centrais Administrativos Norte e Sul – não corresponde integralmente ao mesmo procedimento, pois a Requerente solicitava informação e passagem de certidões sobre elementos do concurso para as vagas existentes de Juiz Desembargador das Secções de Contencioso Tributário dos Tribunais Centrais Administrativos Norte e Sul, concurso ao qual não era opositora. Tendo sido essa a razão pela qual, de resto, o Requerido questionou o interesse legítimo no acesso à dita informação.
Porém, esse aspecto não se afigura suficiente para permitir sustentar a tese de que estamos perante um exercício autónomo de dois direitos à informação administrativa e, com base nesse enquadramento jurídico, julgar procedente a excepção. Senão vejamos.
A informação sobre aquele concreto aspecto do procedimento concursal ao qual a Requerente não tinha sido opositora estava materialmente ligado ao procedimento concursal ao qual a Requerente tinha sido opositora, atento o facto de estarem em causa dois procedimentos paralelos no tempo, em que, a respeito da concreta informação solicitada, havia uma coincidência entre o elemento do júri e a opositora que concorria com a candidata e aqui Requerente. A Requerente tem razão quando alega que, este meio processual visa assegurar o acesso à informação procedimental para o exercício da mesma finalidade, ou seja, que o concreto elemento do outro concurso cuja informação solicitou no requerimento visava apenas inteirar-se de aspectos relativos à validade do acto final do procedimento em que era opositora, dada a coincidência dos elementos e a suspeita de que pudesse ter havido um tratamento diferente para situações iguais.
Assim, apesar de formalmente respeitar a outro procedimento concursal, a informação administrativa solicitada no requerimento consubstancia uma unidade material com o procedimento concursal em que a Requerente participou, como, de resto, o próprio Requerido acabou por concluir após o esclarecimento prestado pela Requerente, o que o levou a emitir a certidão requerida. Por isso, não é correcto afirmar-se que o pedido de informação formulado nos pontos 3 e 4 do requerimento supra transcrito no ponto 3 da matéria de facto deva considerar-se como um diferente e autónomo exercício do direito à informação, submetido a regras diferentes, em relação ao qual a presente intimação se deva considerar parcialmente extemporânea por ser óbvia e necessária a prévia identificação de um interesse legítimo. A existência de um tal interesse está, a seu modo, pressuposta na especial circunstância do carácter paralelo dos procedimentos e da participação de elementos do júri e de concorrentes nos dois procedimentos.
Assim, o que resulta do requerimento apresentado a fls. 144 do SITAF (ponto 9 da matéria de facto) é que o âmbito do pedido da presente intimação para passagem de certidão ficou reduzido em razão da superveniente emissão do que o próprio Requerido qualifica como “complemento à certidão” (v. artigo 8.º da resposta), mas dessa emissão não resultou a satisfação do pedido — uma vez que esse complemento de certidão não englobava todos os elementos solicitados —, nem a inutilidade da instância.
Acresce que, neste enquadramento, não tem também sentido a tese do Requerido de que essa emissão posterior da certidão deve justificar uma repartição das custas por corresponder a um decaimento parcial do pedido, pois a intimação é entendida, pelas razões que antes avançámos, como tendo um objecto unitário face à informação procedimental a que a Requerente pretende ter acesso mediante a emissão de uma certidão.
Improcede, portanto, a alegada excepção de intempestividade parcial.


2.2. Da alegada excepção de ininteligibilidade do pedido

2.2.1. O Requerido alega que a Requerente não formulou correctamente o pedido ao enunciá-lo como uma intimação “para satisfazer integralmente o seu pedido constante do requerimento de 4 de Dezembro de 2023, reproduzido como documento n.º 3, com todas as consequências legais”.

2.2.2. Porém, também esta excepção há-de improceder, pois, se é certo que o pedido deveria enunciar expressamente o objecto das certidões requeridas não se limitando a remeter para o requerimento administrativo prévio, também é verdade que o Requerido entendeu e interpretou correctamente o objecto desta intimação no contexto do procedimento administrativo prévio que a antecedeu, seja quando emitiu certidão correspondente a parte do que era pedido em 18.12.2023, seja quando suplementou aquela informação com a emissão do complemento de certidão em 4 de Janeiro de 2024, seja quando indeferiu o pedido de acesso a parte da informação requerida e que deu azo à presente acção urgente.

2.2.3. Em suma, as imprecisões e imperfeições apontadas ao requerimento inicial não permitem sustentar, nem a sua ineptidão, nem resulta demonstrado que o Requerido não tivesse compreendido o seu objecto, pelo que improcede a alegada excepção de ininteligibilidade do pedido.


2.3. Da intimação para a emissão de certidão

2.3.1. Já no que respeita ao objecto da intimação – que se identifica, presentemente, com o indeferimento do pedido de passagem de certidão de documentos relativos ao procedimento concursal em causa, na parte em que o Requerente solicitava certidão do “parecer preliminar/documento de trabalho, relativamente a todos os candidatos, que foram distribuídos em sorteio aos vários membros do júri, tendo em conta os factores referidos no n.º 2 do artigo 61.º e no n.º 2 do artigo 69.º do ETAF, a valoração referida no ponto 5 e a respectiva fundamentação (cfr. ponto 17 do Aviso n.º ...22, publicado no Diário da República, 2.ª Série, nº 66, de 04 de abril de 2022)” – cabe destacar que esta questão foi já objecto de três decisões deste Supremo Tribunal Administrativo – os acórdãos exarados nos processos n.ºs 0200/23.5BALSB; 0193/23.9BALSB e 0195/23.5BALSB, todos de 11 de Janeiro de 2024 — todos integralmente disponíveis em www.dgsi.pt, para os quais se remete a título de fundamentação integral, dispensando-se a reprodução integral dos respectivos textos.

2.3.2. Com efeito, valem aqui integralmente as razões que ali se expenderam para julgar procedentes as intimações para acesso à informação e passagem de certidões:
i) os documentos cujo acesso à informação foi recusado são, à luz dos preceitos normativos reguladores do direito de acesso à informação procedimental “documentos administrativos” e não meras “notas pessoais” [artigos 82.º a 85.º do CPA e artigo 1.º, n.º 4 da Lei n.º 26/2016, de 22 de Agosto (Lei de Acesso aos Documentos Administrativos - LADA)];
ii) a Requerente, enquanto interessada no procedimento concursal em questão, tem direito de acesso ao mesmo, seja por consulta seja através de informação ou de reprodução de quaisquer documentos que o integrem;
iii) a os documentos cujo acesso e informação se requer são documentos procedimentais (isto é, documentos que fazem parte, forçosamente, do procedimento), já que a sua elaboração é obrigatória, normativamente determinada (pelas normas concursais constantes do Aviso de abertura) e com finalidade normativamente estabelecida – cfr. pontos 17, 18, 21 e 22 do Aviso n.º ...22;
- a jurisprudência pretérita deste STA tem afirmado que o disposto no art. 3.º n.º 2, alínea a) da LADA se reporta «à tutela da privacidade de quem elabora o documento, nela se incluindo as anotações que não tenham de ser produzidas enquanto tais, designadamente por força da lei ou de regulamento» - cfr. Acórdão de 19/12/2006 (proc. 0850/06), sendo também esse o entendimento da CADA (Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos) vertido nos Pareceres n.ºs 403/2022,389/2018, 354/2018, 126/2017 ou 482/2015.
- o acesso a esses documentos são pode ser prejudicado pelo facto de o Requerido alegar que não os incluiu nos procedimentos individuais, uma vez que, sendo os mesmos substancialmente “documentos administrativos” (pelas razões antes explicitadas), eles têm de figurar no procedimento; nem pelo facto de o Requerido não lhes ter atribuído essa natureza no âmbito da tramitação procedimental, pois a qualificação que a entidade administrativa dá a esses documentos é irrelevante para efeitos de garantia do acesso aos mesmos quando estes, substancialmente, integrem (como sucede aqui) o âmbito da informação procedimental, que é também, no plano jurídico, um direito fundamental análogo a direitos, liberdades e garantias;


III. DECISÃO

Pelo exposto, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal em julgar procedente a presente intimação, intimando a Entidade Requerida “Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais (CSTAF)” a, no prazo de 10 dias, facultar à Requerente a certidão solicitada, ou seja, em complemento dos elementos já fornecidos, a certidão que inclua o “Parecer preliminar/documento de trabalho, relativamente a todos os candidatos que foram distribuídos em sorteio aos vários membros do júri, tendo em conta os factores referidos no n.º 2 do artigo 61.º e no n.º 2 do artigo 69.º do ETAF, a valoração referida no ponto 5 e a respectiva fundamentação”.

Custas a cargo da Entidade Requerida.

Fixa-se à presente intimação o valor de 30.001,00€ por se tratar de uma causa de valor indeterminável por estarem em causa bens imateriais.

Lisboa, 8 de Fevereiro de 2024. - Suzana Maria Calvo Loureiro Tavares da Silva (relatora) - Cláudio Ramos Monteiro - Liliana Maria do Estanque Viegas Calçada.