Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01877/13
Data do Acordão:11/26/2014
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ANA PAULA LOBO
Descritores:TRIBUTAÇÃO
DIVIDENDOS
FUNDOS DE PENSÕES
LIVRE CIRCULAÇÃO DE CAPITAIS
RESTRIÇÃO
Sumário:Será pela análise concreta da tributação global dos dividendos tendo em conta a sua tributação em Portugal e na Holanda que se poderá verificar se o direito interno, nomeadamente as normas relativas à retenção na fonte, em princípio violadoras do artº 63º do TFUE, como disse o Tribunal de Justiça, em 6 de Outubro de 2011, no proc. C-493/09, na situação concreta, constituem uma restrição à livre circulação de capitais, proibida pelo indicado preceito.
Nº Convencional:JSTA000P18292
Nº do Documento:SA22014112601877
Data de Entrada:12/10/2013
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:STICHTING PENSIONENFONDS ABP E OUTRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Recurso Jurisdicional
Decisão recorrida – Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa
. 25 de Setembro de 2013. - Julgou a impugnação procedente e, em consequência condenou a Fazenda Pública no pedido de anulação dos actos de retenção na fonte de IRC impugnados, e consequente restituição do imposto indevidamente pago, bem como no pagamento dos respectivos juros indemnizatórios.

Acordam nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

A Representante da Fazenda Pública, veio interpor o presente recurso da decisão supra mencionada, proferida no âmbito do processo de impugnação n.° 1692/12.3 BELRS que Stichting Pensionenfonds ABP, e, Stichting Pensionenfonds Zorg en Welzijn, deduziram contra o indeferimento tácito da reclamação graciosa que tinha por objecto o reembolso da retenção na fonte em sede de IRC sobre o pagamento de dividendos relativos ao ano de 2009 e 2010, no montante de 1.575.325,37€., tendo, para esse efeito formulado, a final da sua alegação, as seguintes conclusões:

I. Quanto ao regime legal interno relativo à retenção na fonte à taxa liberatória dos dividendos distribuídos por sociedades residentes a sociedades não residentes e a sua alegada violação do Direito Comunitário, o Tribunal a quo concluiu que os actos tributários impugnados nos presentes autos padecem de vício de violação de lei, por considerar que a retenção na fonte em IRC dos dividendos distribuídos por sociedades anónimas residentes em Portugal aos ora Recorridos enquanto Fundos de Pensões não residentes, efectuada nos termos do art. 16.º, n.º 1 do EBF conjugado com os arts. 87.º, n.º 4, al. c), 94º, n.º 1, al. c) e 98.º, n.º 1 do CIRC (na redacção vigente à data dos factos), viola o princípio da livre circulação de capitais previsto no art. 56.º do TCE e, consequentemente, o art. 8.º, n.º 4 da CRP.

II. Considera a AT que, no caso em apreciação, o diferente regime fiscal aplicável aos Fundos de Pensões estrangeiros não lesa os princípios da não discriminação e da liberdade de circulação de capitais ínsito no Direito Comunitário (arts. 12.º e 56.º do TCE e actuais arts. 18.º e 63.º do TFUE), pelo que a retenção em sede de IRC em discussão não enferma de qualquer ilegalidade.

III. A fim de concluir pela legalidade dos actos impugnados face às disposições do direito comunitário supra mencionadas importa atender, em primeiro lugar, aos preceitos legais internos em vigor na data dos factos tributários:
- O regime dos Fundos de Pensões plasmado no Decreto-Lei 12/2006, de 20/01, que transpôs para a ordem jurídica nacional a Directiva n.º 2003/41/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 03/06, relativa às actividades e à supervisão das instituições de realização de planos de pensões profissionais, designadamente, o seu art. 38.º, n.º 1, al. a), que refere que, entre outros requisitos, as sociedades gestoras de fundos de pensões devem constituir-se sob a forma de sociedades anónimas e ter a sede social, e a principal e efectiva da administração, em Portugal;
- O art. 16.º, n.º 1 do EBF que estatuía que nos exercícios em apreciação “[s]ão isentos de IRC os rendimentos dos fundos de pensões e equiparáveis que se constituam e operem de acordo com a legislação nacional” (realce e sublinhado nossos);

- Os arts. 87.º, n.º 4, al. c), 94.º, n.º 1, al. c) e 98.º, n.º 1 do CIRC (na redacção vigente à data dos factos) por força dos quais o regime de tributação aplicável aos Fundos de Pensões residentes era diferente do aplicável aos não residentes, na medida em que os rendimentos destes obtidos em Portugal estavam sujeitos a retenção na fonte a uma taxa liberatória de 20%.

- A Convenção para Evitar a Dupla Tributação (CDT) celebrada entre Portugal e a Holanda, aprovada pela Resolução da Assembleia da República n.º 62/2000, de 12-07-2000.

IV. A nível comunitário relevam, além dos arts 12.º e 56.º do TCE já acima mencionados, o art. 58.º do mesmo Tratado, na parte que ora se transcreve:
1. O disposto no artigo 56.º não prejudica o direito de os Estados-Membros:
a) Aplicarem as disposições pertinentes do seu direito fiscal que estabeleçam uma distinção entre contribuintes que não se encontrem em idêntica situação no que se refere ao seu lugar de residência ou ao lugar em que o seu capital é investido;
b) Tomarem todas as medidas indispensáveis para impedir infracções às suas leis e regulamentos, nomeadamente em matéria fiscal e de supervisão prudencial das instituições financeiras, preverem processos de declaração dos movimentos de capitais para efeitos de informação administrativa ou estatística, ou tomarem medidas justificadas por razões de ordem pública ou de segurança pública.
3. As medidas e procedimentos a que se referem os n.ºs 1 e 2 não devem constituir um meio de discriminação arbitrária, nem uma restrição dissimulada à livre circulação de capitais e pagamentos, tal como definida no artigo 56.º. (...)”.
V. Refere o citado art. 58.º do TCE que a proibição de restrições aos movimentos de capitais não constitui um impedimento a que um EM consagre um regime diferente para os contribuintes que não se encontrem em idêntica situação.

VI. Posto isto, antes de concluir pelo carácter discriminatório de uma determinada norma nacional (no caso está em discussão a admissibilidade à luz do direito comunitário do disposto no art. 16.º, n.º 1 do EBF) e da existência ou não de causas de justificação que legitimem o carácter discriminatório da mesma, importa determinar, em primeiro lugar, se estamos perante situações comparáveis. Isto porque, só existe discriminação quando o direito interno de um EM aplica regras diferentes a situações comparáveis ou sujeita situações diferentes a um regime idêntico.

VII. Assim, é necessário proceder à comparação concreta dos casos em litígio a fim de saber se uma situação caracterizada por um tratamento diferente é ou não constitutiva de discriminação proibida pelo Tratado, colocando os não residentes de outros Estados Membros em desvantagem face aos residentes. Ora, tal apreciação não foi considerada na sentença do Tribunal de 1ª Instância.

VIII. A sentença em crise limita-se a remeter, neste ponto, para os princípios da não discriminação e da liberdade de circulação de capitais previstos, respectivamente, nos arts. 12.º e 56.º do TCE (actuais arts. 18.º e 63.º do TFUE) e para acórdãos do TJUE, nos quais são mobilizados esses mesmos princípios, sem apurar se o imposto retido pelas Recorridas é recuperado no Imposto devido no país do seu domicilio fiscal ou se se encontram sujeitas a um nível de tributação idêntico aos Fundos de Pensões residentes em Portugal (cfr. 1.º da p. 14).

IX. Não ficando demonstrado que, em concreto, se verifica a violação dos princípios da não discriminação e da livre circulação de capitais não se pode concluir tout court pelo carácter discriminatório da norma interna em discussão (art. 16.º do EBF). Neste sentido, já se pronunciou o Supremo Tribunal Administrativo (STA), no Acórdão de 29/02/2012, proferido no Processo n.° 01017/11.

X. Acresce que, a este respeito, importa ter em conta o firmado na Convenção para Evitar a Dupla Tributação (CDT) celebrada entre Portugal e a Holanda, designadamente o seu art. 24.º, nºs 2 e 4, que permite que o imposto pago em Portugal, relativamente a elementos do rendimento ou do capital, seja deduzido na Holanda, permitindo às ora Recorridas recuperar a parte do imposto retido em Portugal e não reembolsado. E os próprios objectivos visados com a CDT — evitar a dupla tributação e prevenir a evasão fiscal em matéria de impostos sobre o rendimento e o capital — que constituem fundamentos igualmente tidos em conta a nível comunitário, motivo pelo qual o TJUE revela uma maior abertura na aceitação das disposições das convenções de dupla tributação celebradas pelos EMs.

XI. O que fica dito permite refutar as seguintes premissas acolhidas na sentença em apreciação:
i) que as Recorridas se encontram numa situação objectiva comparável à dos Fundos de Pensões constituídos e a operar de acordo com a legislação portuguesa;

ii) que a presente situação controvertida envolve um tratamento discriminatório das Recorridas face às sociedades residentes em Portugal.

XII. No que tange à primeira premissa, a M. Juíza do Tribunal Tributário de Lisboa em nenhum ponto da sua decisão se refere à origem da globalidade dos rendimentos das Recorridas e ao regime de tributação a que se encontram sujeitas no Estado de residência, não tendo igualmente em consideração o mecanismo da eliminação da dupla tributação consagrado na CDT (u., em especial o seu art. 24.º, n.ºs 2 e 4).

XIII. Ora, neste contexto, convém ter em conta que, no plano fiscal, um tratamento diferenciado, de residentes não constitui, em si mesmo, uma discriminação proibida pelo Tratado, uma vez que não existe obrigação de tratamento nacional para os não residentes. Como é reconhecido pelo TJUE, a situação destas duas categorias de sujeitos passivos apresenta diferenças objectivas, quer do ponto de vista da origem dos rendimentos, quer da possibilidade de ter em conta a capacidade contributiva dos contribuintes (v. Acórdão de 14/02/1995, Schumacker, processo C-279/93, Acórdão de 11/08/1995, Wielokx, processo C-80/94, Acórdão de 14/09/199, Gschwinld, processo C-391/97)11.

XIV. As Recorridas só se encontrariam em situação comparável às sociedades residentes em Portugal se o Estado holandês consagrasse, em sede de Imposto sobre as sociedades, regras de tributação, incluindo taxa aplicável, regras de determinação do lucro tributável e demais obrigações fiscais iguais às vigentes em Portugal, o que se desconhece.

XV. Assim, labora em erro a M. Juíza do Tribunal a quo quando conclui a fls.15 e 16 da sua decisão que: “In casu, como vimos do quadro jurídico nacional, um Fundo de Pensões residente em Portugal está isento de IRC nos dividendos que lhe são distribuídos, ao passo que um fundo residente na União Europeia está sujeita a uma tributação liberatória à taxa de 20%, pelo que, não restam dúvidas que as situações são comparáveis, ou seja, excluindo o factor residência, um Fundo de Pensões residente em Portugal encontra-se na mesma situação que um Fundo de Pensões não residente.” Ao contrário do afirmado supra, nos presentes autos, não resulta demonstrada a comparabilidade das situações em apreço.

XVI. No que diz respeito à incorrecção da segunda premissa, a mesma advém da circunstância de, não se encontrando as Recorridas numa situação comparável às das sociedades residentes, a não aplicabilidade da Isenção prevista no art. 16.º do EBF não implicar um tratamento discriminatório em desfavor daquelas.

XVII. Para que se pudesse concluir, in casu, no sentido do carácter discriminatório do regime que sujeita a retenção na fonte as entidades financeiras não residentes, as Recorridas teriam que demonstrar que suportaram uma tributação mais elevada no seu conjunto, o que não se verificou. Neste sentido, v. Acórdão Gerritse, de 12 de Junho de 2003 (Processo C-234/01).

XVIII. É de frisar que estamos perante matéria de facto e não de direito que cabia às Recorridas demonstrar - a necessidade de fazer prova dos factos constitutivos dos direitos por quem os invoca encontra-se firmada no ordenamento fiscal português, no art. 74.° da LGT, tendo os Contribuintes que a cumprir nas mais variadas situações com relevância fiscal. Não o tendo feito, não é possível invocar o carácter discriminatório da norma em discussão.

XIX. Assim, ao contrário do firmado na sentença em crise, não é inequívoco que as entidades financeiras portuguesas que pagam dividendos a entidades, também elas nacionais, estejam numa situação de vantagem relativamente às entidades residentes noutros EMs da UE que efectuem operações semelhantes.

XX. Perante a incorrecção das premissas acima assinaladas não é possível concluir, como faz o Tribunal a quo, que a norma interna em discussão conduz, no presente, a um tratamento desvantajoso dos rendimentos de fonte nacional obtidos pelos Fundos de Pensões não residentes e à consequente violação do princípio comunitário da não discriminação, plasmado no art. 56.º do TCE.

XXI. Do mesmo modo, não é de aceitar a transposição directa, para os presentes autos, do Acórdão do TJUE de 06/10/2011, proferido no processo C-493/09, como resulta do teor da sentença em apreciação.

XXII. Decidir com justiça implica decidir com racionalidade prática e com correcção ética ou axiológica, i.e., de uma forma racional e materialmente justa à luz da lei e do Direito.

XXIII. Seguindo de perto a análise crítica de Casalta Nabais, in Introdução ao Direito Fiscal das Empresas, pp. 81 e ss., constata-se que a jurisprudência que vem sendo proferida pelo TJUE, a propósito da fiscalidade dos EMs e da sua compatibilidade com a fiscalidade da União não é isenta de críticas, devido ao seu carácter casuístico e à sua indiferença face aos valores cimeiros que devem presidir às constituições fiscais, como a capacidade contributiva enquanto critério de distribuição dos encargos fiscais e a realização do interesse fiscal do Estado enquanto comunidade política.

XXIV. Ora, a decisão de direito da presente causa não pode deixar de atender aos valores e princípios que presidiram à constituição e aprofundamento da União Europeia — a efectiva integração comunitária traduzida na aproximação económica e social dos EMs mais pobres aos mais ricos —, bem como ao facto de que a liberdade de circulação de capitais não constitui um fim em si mesmo, mas um meio potenciador do crescimento económico, emprego e desenvolvimento.

XXV. Outro aspecto negligenciado pela jurisprudência comunitária, neste domínio, é que o parâmetro fiscal constitui apenas um dos factores que os agentes económicos consideram nas suas opções/decisões, daí o Tribunal não poder concluir tout court que determinada medida fiscal por implicar um eventual tratamento discriminatório contende inevitavelmente com a liberdade de circulação de capitais.

XXVI. Cabendo à jurisprudência dar ao concreto problema jurídico em litígio a solução que se revele racional e ético-juridicamente mais adequada, a mesma não se pode ater acriticamente a precedentes que pareçam mais imediatamente aplicáveis ao caso.

XXVII. Acresce que o facto do legislador português na sequência da condenação proferida no citado Acórdão do TJUE de 06/10/2011, ter alterado através do art. 144.º, da Lei n.º 64-B/2011, de 30 /12, que aprovou o Orçamento de Estado para 2012, a redacção do art. 16.º do EBF em discussão, não infirma a validade da actuação da Administração.

XXVIII. A Administração Tributária não pode deixar de aplicar as normas legais que a vinculam, porquanto está a mesma adstrita ao princípio da legalidade. Efectivamente, a Administração Tributária, como qualquer órgão da Administração Pública, encontra-se estritamente vinculada ao cumprimento da lei, de acordo com o art. 3.° do Código do Procedimento Administrativo (CPA), que é aplicável subsidiariamente às relações jurídico- tributárias, ex vi alínea e) do art. 2.º da Lei Geral Tributária. Desta forma, a Autoridade Tributária tem que aplicar os Códigos Fiscais que se encontram em vigor e as disposições deles constantes que regulam determinada relação juridico-tributária, de acordo com a citada al. b) do art. 2.º da LGT, in casu, as normas constantes do CIRC e do Estatuto dos Benefícios Fiscais, aprovado pelo DL 215/89, de 1 de Julho já citadas.

XXIX. Na verdade, tem a Administração Fiscal que considerar que no processo de elaboração das normas em questão o legislador terá tido em atenção todo o ordenamento jurídico, quer nacional, quer Comunitário, pelo que as normas devem respeitar os mesmos, sendo certo, também, que não cabe à Administração Tributária a sindicância das normas quanto à sua adequação relativamente ao Direito Comunitário.

XXX. Assim, é nosso entendimento que a posição das Impugnantes não tem sustentação legal, pois não encontra qualquer respaldo na letra da lei, mormente na letra dos arts. 88.º, n.º 1—al. c) (na redacção à data dos factos), 94.º, n.º 1—al. c) e 98.º, n.º 1, todos do CIRC, no art. 16.º, n.º 1 do EBF e ainda na al. a) do n.º 1 do art. 38.º do DL 12/2006, de 20/01. E isto porque, na determinação do sentido e alcance da lei não poderá, nos termos do n.º 2 do art. 9.º do Código Civil (CC), aplicável por remissão expressa da alínea d) do art. 2.º da LGT, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso.

XXXI. Tendo em consideração o já acima exposto, designadamente, o facto da diferença de tratamento efectuada pelas normas internas de um EM poder respeitar a situações não comparáveis objectivamente não se pode concluir que aquelas acarretam sempre uma discriminação.

XXXII. Sem prescindir, tendo em conta que, na sequência do citado Acórdão do TJUE de 06/10/2011, o aditamento do n.º 7 ao art. 16.º do EBF, que isenta de IRC «os rendimentos dos fundos de pensões que se constituam, operem de acordo com a legislação e estejam estabelecidos noutro Estado membro da União Europeia ou do espaço económico europeu, neste último caso desde que esse Estado membro esteja vinculado a cooperação administrativa no domínio da fiscalidade equivalente à estabelecida no âmbito da União Europeia, não imputáveis a estabelecimento estável situado em território português”, desde que se verifiquem cumulativamente os restantes requisitos aí enunciados, só entrou em vigor no ano de 2012, ex vi, da Lei n.° 64-B/2011, de 30-12, a actuação da Administração não merece qualquer censura.

XXXIII. Mais, vem reforçar a posição por nós defendida, o facto de a norma do n.º 7 (aditada ao art. 16.º do EBF), referir expressamente a necessidade de existir “cooperação administrativa no domínio da fiscalidade”. Tal requisito visa, sem sombra de dúvida, acautelar o controlo dos rendimentos concretos e globais auferidos pelos contribuintes em ambos os Estados. Dito de outro modo, através desta norma, tal qual foi configurada, será possível verificar, no caso concreto, se o contribuinte se encontra em condições análogas aos contribuintes residentes.

XXXIV. Também não é de admitir, neste ponto, que as normas comunitárias prevalecem sobre as normas de direito ordinário nacional, por força do Primado do Direito Comunitário, nos termos do n.º 4 do artigo 8.º da Constituição da República Portuguesa.

XXXV. Desde logo, porque, não tendo sido comprovado o carácter discriminatório das normas controvertidas, perde relevância a questão do Primado do Direito Comunitário, por não se verificar qualquer desconformidade entre o Direito Interno e o Direito Comunitário.

XXXVI. Em segundo lugar, porque na presente situação em litígio as disposições de Direito Comunitário não gozam de efeito directo.

XXXVII. Na verdade, a norma do art. 56.º do TCE, não tem efeito directo, na medida em que não consubstancia uma norma “self executting”. Antes a aplicabilidade da norma comunitária em causa no ordenamento interno dos EMs pressupõe a adopção de inúmeras Directivas, as quais por sua vez carecem, igualmente, de ser transpostas para a ordem interna dos vários Estados. Ou seja, não gozando de efeito directo, a aludida norma não prevalece, nem consequentemente, torna inaplicável as normas de direito interno português, conforme peticionado pelas ora Recorridas.

XXXVIII. Quanto à condenação pelo Tribunal a quo no pagamento de juros Indemnizatórios, nos termos do art. 43.° da LGT é de referir que tal dever só impende sobre a Administração Tributária se se verificar uma qualquer ilegalidade que denote o carácter indevido da prestação tributária à luz das normas substantivas, ilegalidade essa que terá de ser necessariamente imputável a erro dos serviços.

XXXIX. Ora, no caso em apreço a Administração Fiscal limitou-se, portanto, a aplicar as consequências jurídicas, que, do ponto de vista fiscal, se impunham face à ocorrência dos pressupostos de facto subjacentes às normas dos arts. 88.º, n.º 1 — al. c) e 4 (na redacção à data dos factos), 94.º, n.º 1 — al. c) e 98.º, n.º 1, todos do CIRC, no art. 16.º, n.º 1 do EBF e ainda na al. a) do n.º 1 do art. 38.º do DL 12/2006, de 20/01, pelo que deverá igualmente ser revogada a decisão do Tribunal de 1ª Instância que julgou procedente o peticionado quanto aos juros indemnizatórios.

Requereu que seja revogada a sentença.
Contra-alegaram as recorridas tendo terminado esta sua peça processual com as seguinte conclusões:

A) O presente Recurso vem interposto da Douta Sentença proferida pelo Tribunal a quo que decidiu julgar procedente a impugnação judicial apresentada pelas ora Recorridas dos atos de retenção na fonte de IRC dos anos de 2009 e 2010, por considerar que os referidos atos tributários padeciam de vício de violação de lei, em particular por violação do princípio da liberdade de circulação de capitais previsto no Tratado, tal como determinado pelo TJUE, em acórdão proferido a 6 de Outubro de 2011, no processo C-493/09;

B) A questão material controvertida encontra-se resolvida, uma vez que o TJUE no processo C-493/09 já declarou a legislação nacional, em particular a norma do EBF ora sindicada, desconforme com o direito comunitário, em particular com o artigo 56º do Tratado;

C) No referido processo, o Estado português foi condenado por conferir um tratamento discriminatório aos fundos de pensões residentes na União Europeia, uma vez que na ótica do Tribunal a diferença de tratamento conferida aos dividendos auferidos por fundos de pensões torna o investimento dos fundos de pensões não residentes em sociedades portuguesas menos atraente, constituindo, assim, uma restrição ilegítima e injustificada à liberdade de circulação de capitais e, como tal, contrária ao Direito Comunitário;

D) Considerando o disposto no artigo 288º do Tratado e o carácter vinculativo das decisões adoptadas pelo TJUE, parece claro que a sentença recorrida não merece qualquer censura, o que motivou, aliás, que o legislador nacional já tenha alterado a norma controvertida do EBF, de forma a acolher a jurisprudência firmada no referido Acórdão;

E) O dever de anulação dos actos tributários ora sindicados não decorre, assim, da necessidade de aplicação retroativa da alteração legislativa introduzida pelo Orçamento do Estado para 2012, tal como invocado pela ora Recorrente, mas sim do reconhecimento expresso por parte do TJUE do carácter ilegal do regime fiscal nacional em vigor e incidente sobre os fundos de pensões;

E) Constitui jurisprudência pacífica dos nossos tribunais que, atento o primado do Direito Internacional face ao Direito interno, a doutrina prevista em acórdãos do TJUE que declare a desconformidade de normas nacionais dos Estados Membros aplica-se também aos factos tributários que tenham ocorrido em momento anterior desde que acautelado em tempo o direito de acção processual previsto na legislação interna (vide Acórdão STA, processo n.º 0275/08, de 04.06.2008);

G) A questão é também absolutamente pacífica para a própria Administração Tributária, a qual no passado dia 7 de novembro, divulgou o Ofício-Circulado n.º 20168/2013, sancionado pelo Gabinete da Subdiretora-geral do IR e das Relações Internacionais, orientando os serviços para a necessidade e dever dos serviços da Administração Tributária acatarem a decisão proferida pelo TJUE no processo C-493/09 e anularem os atos tributários praticados até 31.12.2011;

H) Do quadro legal em vigor à data dos factos tributários em análise resultava que um Fundo de Pensões residente em Portugal, quando recebia dividendos ou outros rendimentos provenientes de sociedades sediadas em Portugal estava sujeito a um regime fiscal mais favorável do que o aplicável a um Fundo de Pensões constituído de acordo com a legislação de um qualquer outro Estado Membro da União Europeia quando recebia dividendos ou outros rendimentos de fonte portuguesa;

I) A legislação nacional concedia aos Fundos de Pensões domiciliados em Portugal a possibilidade de beneficiarem de um regime que lhes permitia receber os dividendos isentos de tributação, bastando, para tal, que estivessem constituídos de acordo com a legislação nacional;

J) Por contraste, no caso de Fundos de Pensões constituídos noutro Estado Membro da União Europeia, os mesmos não beneficiavam de idêntica isenção, estando sujeitos a uma tributação efetiva de 20% em sede de IRC;

K) A distribuição de dividendos entre Estados Membros da UE não pode estar sujeita a quaisquer restrições, nem tão pouco a quaisquer discriminações baseadas na nacionalidade ou no local do investimento, uma vez que o Direito Comunitário estabelece um quadro legal destinado a eliminar quaisquer discriminações na circulação de capitais, nomeadamente em investimentos transfronteiriços (diretos ou indiretos), bem como eliminar quaisquer restrições que possam afetar a livre circulação de capitais e a livre prestação de serviços;

L) Constitui jurisprudência assente do TJUE que a diferença de tratamento entre entidades nacionais e entidades estrangeiras consubstancia uma violação do artigo 56.º do Tratado;

M) A faceta controvertida do artigo 14.º do EBF (atual artigo 16º) centra-se na circunstância de o mesmo ser, exclusivamente, aplicável aos Fundos de Pensões estabelecidos em Portugal, daqui se concluindo que, caso as ora Recorridas fossem residentes em território português, sobre os dividendos por si percepcionados no ano de 2009 (e 2010 no caso da Primeira Recorrida) não teria incidido qualquer retenção na fonte em sede de IRC;

N) As ora Recorridas e os Fundos de Pensões residentes em Portugal estão em situações comparáveis — distribuição de lucros por sociedades residentes — sendo que as Recorridas encontram-se sujeitas a tributação em Portugal, ao passo que os Fundos de Pensões residentes estão isentos sobre os mesmos rendimentos;

O) Por outro lado, a legislação portuguesa não visa estabelecer qualquer medida anti-abuso ou evitar práticas abusivas em matéria fiscal, pelo que o tratamento discriminatório conferido às ora Recorridas não encontra aqui qualquer justificação, nem a ora Recorrente logrou invocar qualquer argumento neste sentido;

P) Não se invoque contra o entendimento ora propugnado pelas Recorridas, a circunstância de estas terem beneficiado da limitação parcial de imposto concedida pelo ADT entre Portugal e a Holanda, uma vez que como tem notado o TJUE, uma Parte Contratante não pode limitar os direitos conferidos pelo artigo 56.º do Tratado com os benefícios que possam vir a ser conferidos por via de um Acordo Bilateral entre os Estados (ver Processo “Avoir Fiscal”, processo 270/86);

Q) Tratando-se de um ato normativo de natureza internacional ratificado pelo Estado Português, as normas de direito comunitário prevalecem sobre o direito interno, por força do princípio da prevalência do direito internacional, conforme preceituado no artigo 8.º da CRP) e no artigo 1.º da LGT, não carecendo de qualquer ato de transposição de caráter interno;

R) A argumentação aduzida pela ora Recorrente carece de qualquer base legal, desde logo, porquanto a legislação ora em apreço já foi declarada ilegal por parte de uma instância jurisdicional internacional à qual o Estado Português está legalmente vinculado, o que afeta de forma irremediável a legalidade dos atos tributários de retenção na fonte ora sindicados;

S) Tudo ponderado, parece inequívoco que a norma constante do atual artigo 16.º do EBF padece de manifesto vício de lei, por violação ostensiva dos princípios da legalidade tributária e do primado do direito internacional, violando, por conseguinte, o artigo 8.º da CRP, bem como os artigos 12.º e 56.º do Tratado de Roma, o que se invoca para os devidos efeitos legais, mormente para efeitos de improcedência do presente recurso, requerendo-se a este Venerando Tribunal que se digne confirmar a sentença ora recorrida, reconhecendo o direito da Primeira Recorrida à restituição da quantia de EUR 1.177.248,07 e da Segunda Recorrida da quantia de EUR 398.077,30, tudo com as demais consequências legais, mormente o pagamento de juros indemnizatórios ao abrigo do disposto no artigo 43º da LGT.


Requereram que seja o recurso julgado improcedente e confirmada a decisão recorrida, determinando a consequente anulação dos actos tributários ora sindicados, por vício de violação de lei, tudo com as devidas consequências legais.

Foi emitido parecer pelo Magistrado do Ministério Público considerando dever ser anulada a decisão recorrida e ampliada a matéria de facto.

A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos:

A) As Impugnantes são pessoas colectivas de direito holandês, constituídas sob a forma jurídica de Fundos de Pensões - o Fundo PGGM encontra-se constituído sob a forma jurídica de Fundação - e estabelecidas de acordo com a legislação interna da Holanda (cfr. fls. 32 ss do Processo Administrativo e fls. 34 a 113, todas dos autos).

B) As Impugnantes têm o seu domicílio fiscal na Holanda (cfr. fls. 32 ss do Processo Administrativo e fls. 46 e ss e fls. 34 a 113, todas dos autos).

C) No ano de 2009 e 2010, as Impugnantes receberam dividendos na qualidade de accionistas de sociedades que foram sujeitos a tributação por retenção na fonte liberatória, à taxa de 20% e 10% (cfr. documentos de fls. 99 e ss dos autos).

D) A Primeira Impugnante efectuou pedidos de reembolso do imposto retido na fonte para os casos em que foi aplicada a taxa interna de 20% no montante correspondente à diferença entre a taxa interna de 20% e a taxa de 10% prevista no ADT celebrado entre Portugal e a Holanda, através da entrega dos Modelos 21 RFI (cfr. documentos de fls. 99 e ss dos autos).

E) O ABP suportou em Portugal em 2009 imposto por retenção na fonte no montante total de EUR 477.451,78, correspondendo à diferença entre a taxa interna e a taxa do ADT (cfr. documentos de fls. 99 e ss dos autos).

F) O ABP suportou em Portugal em 2010 imposto por retenção na fonte no montante total de EUR 699.796,29, correspondendo à diferença entre a taxa interna e a taxa do ADT (cfr. documentos de fls. 99 e ss dos autos).

G) No ano de 2009, o PGGM suportou em Portugal imposto por retenção na fonte num total de EUR 398.077, 30, correspondendo à diferença entre a taxa interna e a taxa do ADT (cfr. documentos de fls. 99 e ss dos autos).

H) Em 28/12/2011, as Impugnantes apresentaram junto do Serviço de Finanças de Lisboa 12 reclamação graciosa, nos termos do n.º 4 do art. 132.º do CPPT, na qual contestaram a legalidade das retenções na fonte de IRC relativas ao exercício de 2009 e 2010, tendo o processo corrido seus termos sob o n.° 3263201204000528 (cfr. fls. 1 e ss do Processo Administrativo).

I) A reclamação graciosa não foi decidida no prazo de 4 meses (cfr. Processo Administrativo).

J) A Impugnação foi apresentada em 30/05/2012 para tribunal tributário de Lisboa (cfr. fls. 2 e ss dos autos).

Questão objecto de recurso:

1- Vício de violação de lei.

A Representante da Fazenda Pública alicerça a defesa da legalidade do acto de liquidação impugnado na circunstância de ter sido aplicado, na formação do mesmo, direito interno português que não se mostra condicionado na sua conformação pelo direito comunitário na medida em que, no caso concreto, sem se ter apurado se o imposto retido é recuperado pelas recorridas no imposto devido no país do seu domicílio fiscal ou se se encontram estas sujeitas, diremos nós, globalmente, a um nível de tributação idêntico aos Fundos de Pensões com sede em Portugal, não podemos afirmar estar em presença de situação em que o direito fiscal português trate de forma diversa situações comparáveis, em desrespeito pelos princípios da não discriminação e da livre circulação de capitais previstos, respectivamente, nos arts. 12.º e 56.º do TCE (actuais arts. 18.º e 63.º do TFUE), não podendo por isso ser dele (direito comunitário) violador.
Ainda que se não acompanhe toda a argumentação expendida a este propósito, não há dúvida que para que haja violação do princípio da não discriminação, forçoso é que se trate de forma diferente, por regra, menos favorável, a tributação dos dividendos recebidos pelas recorridas e aquele que receberiam se tivessem sede em Portugal e se mostrassem constituídas segundo as regras do direito português, conhecimento que se não alcança apenas pela análise da tributação a que são sujeitas em Portugal.
Naturalmente que só há discriminação quando se trata de forma diversa situações similares. Numa análise de primeira aparência somos levados a admitir que a situação das recorridas será similar à dos fundos de pensões constituídos segundo a lei portuguesa e com sede em Portugal e que o diverso tratamento fiscal, assente apenas na sede nacional ou estrangeira do beneficiário dos dividendos aponta para uma discriminação destas, mas essa conclusão não pode decorrer apenas do diverso regime de retenção na fonte a que são sujeitos os dividendos de umas e de outras.
Deste modo, a decisão do presente processo não pode dispensar uma análise detalhada das várias fases de tributação a que são sujeitos estes rendimentos aqui e em aplicação da convenção celebrada entre Portugal e a Holanda para evitar situações de dupla tributação. Decorre dos preceitos legais largamente enunciados na sentença, e nas diversas peças processuais juntas pelas partes aos autos, que, por isso, nos dispensamos de repetir, dado que sobre o direito interno aplicável não há qualquer divergência, a tributação a que seriam sujeitos Fundos de Pensões constituídos segundo o direito português, sediados em Portugal que, como as recorridas nos anos de 2009 e 2010, na qualidade de accionistas de sociedades com sede em Portugal destas houvessem recebido dividendos, no valor dos percebidos pelas recorridas. Todavia, quanto às recorridas sabemos apenas qual o imposto que foi retido e quais os valores que foram reembolsados tendo em conta taxa prevista no acordo para evitar a Dupla tributação celebrado entre Portugal e a Holanda, e, que o artº 24º desse Acordo permite que o imposto pago em Portugal, relativamente a elementos do rendimento ou do capital, seja deduzido na Holanda, permitindo às ora Recorridas recuperar a parte do imposto retido em Portugal e não reembolsado, sem que possamos configurar qual a globalidade de tributação a que estarão sujeitos tais dividendos tendo em conta a retenção de que foram objecto em Portugal e aquela de que terão sido objecto na Holanda.
Diversamente do referido pela recorrente, na senda do que foi afirmado em situação em tudo idêntica à destes autos, apenas divergindo quanto ao ano de percepção dos dividendos pelas recorridas, no ac. deste Supremo Tribunal Administrativo de 27/11/2013, proferido no proc. 0654/13, acessível em www.dgsi.pt, que seguiremos de perto, é incontornável para a decisão do presente processo tudo quanto foi estatuído pelo Tribunal de Justiça em 6 de Outubro de 2011, no proc. C-493/09 numa apreciação geral e abstracta da legislação portuguesa, nesta matéria, em confronto com o direito comunitário em acção proposta pela Comissão Europeia junto do Tribunal de Justiça, nomeadamente que:
«Ao reservar o benefício da isenção de imposto sobre as sociedades apenas aos fundos de pensões residentes no território português, a República Portuguesa não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força dos artigos 63º TFUE e 40º do Acordo sobre o Espaço Económico Europeu, de 2 de Maio de 1992.(...). Nestas condições, há que concluir que, no que respeita à tributação de dividendos pagos por sociedades estabelecidas em território português a título de partes sociais detidas por um fundo de pensões durante mais de um ano, a regulamentação controvertida constitui uma restrição à livre circulação de capitais proibida, em princípio, pelo artigo 63º TFUE.», não tendo o Estado português, nessa acção apresentado razões ponderosas para defender a sua legislação, e que justificassem a restrição apontada.
Será na análise concreta da tributação global destes dividendos tendo em conta a sua tributação em Portugal e na Holanda que se poderá verificar se o direito interno, em princípio violador do artº 63º do TFUE, como disse o Tribunal de Justiça, na situação concreta, constitui uma restrição à livre circulação de capitais, proibida pelo indicado preceito.
A sentença recorrida não incluiu na matéria provada factos suficientes para se estabelecer esse confronto, não tomou em consideração as consequências do Acordo para evitar a dupla tributação celebrado entre Portugal e a Holanda, nem indicou qualquer elemento que permita concluir da impossibilidade do seu funcionamento na presente situação o que nos conduz à necessidade da ampliação da matéria de facto com vista a obter elementos seguros sobre a tributação global dos referidos dividendos.
As impugnantes formularam nesta acção os seguintes pedidos:
i) A anulação dos actos de retenção na fonte de IRC sobre dividendos recebidos nos anos de 2009 e 2010 por violação frontal do disposto no artigo 8.º da CRP e dos artigos 12.º e 56.º do Tratado da Comunidade Europeia;
ii) A restituição à Primeira Impugnante da quantia de EUR 1.177.248,07, relativa a retenções na fonte de IRC suportadas em Portugal sobre dividendos recebidos nos anos de 2009 e 2010, tudo com as demais consequências legais, incluindo os respectivos juros indemnizatórios;
iii) A restituição à Segunda impugnante da quantia de EUR 398.077,30, relativa a retenções na fonte de IRC suportadas em Portugal sobre dividendos recebidos no ano de 2010, por, tudo com as demais consequências legais, incluindo os respectivos juros indemnizatórios;
iv) Com a procedência do pedido formulado em i) ii) e iii) supra, a condenação da Fazenda Pública ao pagamento das custas de parte e procuradoria na proporção do respectivo decaimento. Como causa de pedir invocam a sua situação tributária limitada, exclusivamente às retenções na fonte e aos reembolsos do valor retido a mais, tendo em conta a taxa prevista no Acordo para evitar a dupla tributação celebrado entre Portugal e a Holanda, mas nada referem quanto à tributação global desses dividendos, por forma a demonstrar que a legislação nacional, com os actos de liquidação em análise lhes aplicou um tratamento discriminatório, violando o princípio comunitário da livre circulação de capitais.
Na contestação a Representante da Fazenda Pública, tal como neste recurso, suscita matéria de excepção atinente ao confronto entre a tributação global dos dividendos recebidos pelas recorridas e a tributação de que seriam objecto se fossem só tributadas em Portugal, concluindo que não está demonstrado que, por força da retenção na fonte são as recorridas tributadas de forma mais gravosa que entidades idênticas de direito português, dados que importa apurar.
Verificado que seja que, por força das regras de direito nacional de retenção na fonte, considerada a tributação global e total dos dividendos, as recorridas estão colocadas numa situação mais gravosa que estariam se tivessem sede em Portugal e tivessem sido constituídas segundo o direito português, haverá que, em obediência ao princípio do primado do direito comunitário que anular o acto de liquidação.

Deliberação

Termos em que acordam os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em conceder provimento ao recurso e anular a decisão recorrida para que proceda à ampliação da matéria de facto provada, nos termos antes indicados.

Sem custas.

(Processado e revisto com recurso a meios informáticos (art. 131º nº 5 do Código de Processo Civil, ex vi artº 2º Código de Procedimento e Processo Tributário).

Lisboa, 26 de Novembro de 2014. - Ana Paula Lobo (relatora) – Ascensão Lopes – Dulce Neto.