Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01369/12
Data do Acordão:01/09/2013
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:DULCE NETO
Descritores:GARANTIA BANCÁRIA
IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
GARANTIA
FUNDAMENTAÇÃO
Sumário:I – A revogação do art.º 183º-A do CPPT pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro, determina a validade de todas as garantias prestadas ao abrigo deste preceito legal em todos os casos em que o prazo de caducidade de 3 anos ainda não se tinha consumado à data em que esta disposição legal deixou de vigorar na ordem jurídica – 1 de Janeiro de 2007.

II – Tendo a garantia bancária sido prestada em 22/12/2005 e tendo o processo de impugnação judicial a que ela se encontra umbilicalmente ligada sido instaurado em 4/05/2005, é evidente que essa garantia não caducou ao abrigo do disposto no art.º 183º-A do CPPT, mantendo-se em vigor até ao final do pleito.

III – O órgão da execução fiscal não pode vir exigir, em Junho de 2012, a prestação de uma nova garantia no valor de € 2.763.569,65 (correspondente ao montante do imposto, juros e acréscimos legais calculados até essa data) para manter suspensa a execução durante a pendência do processo de impugnação judicial, quando a garantia bancária anteriormente prestada, no valor de € 2.589.922,54 (correspondente ao montante do imposto, juros e acréscimos legais calculados à data da apresentação da impugnação) se mantém válida e em vigor e se presume idónea face ao disposto no n.º 1 do art.º 199º do CPPT.

IV – Não ocorrendo a diminuição do valor da garantia bancária prestada, mas, quando muito, a necessidade do seu reforço face à actualização dos juros de mora, não há qualquer facto com relevância legal que justifique a exigência da prestação de uma nova garantia pelo montante global da dívida exequenda, juros de mora e acréscimos legais, mas, tão só, o reforço do seu valor inicial, o que nunca foi exigido pelo órgão de execução fiscal.

V – Na reclamação judicial deduzida contra acto praticado pelo órgão da execução fiscal o tribunal tem de quedar-se pela formulação do juízo sobre a legalidade do acto tal como ele ocorreu, apreciando a respectiva legalidade em face da fundamentação contextual integrante do próprio acto, até porque o interessado apenas pode defender-se dos pressupostos que aí foram enunciados e dos quais se distraíram os efeitos lesivos, pelo que não será admissível qualquer aproveitamento do acto quando isso implique a valoração de razões de facto e de direito que não constam dessa fundamentação.

Nº Convencional:JSTA00068027
Nº do Documento:SA22013010901369
Data de Entrada:12/04/2012
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A... S.A
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TT1INST LISBOA
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC FISCAL
Legislação Nacional:CPPTRIB99 ART183-A ART183 N2 ART199 N1 N10 N5
L 30-B/2002 DE 2002/12/30
L 15/2001 DE 2001/06/15
L 53-A/2006 DE 2006/12/29 ART24
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC0138/09 DE 2009/04/22; AC STA PROC0317/08 DE 2008/06/25; AC STA PROC0787/07 DE 2008/05/07
Referência a Doutrina:JORGE DE SOUSA CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E DE PROCESSO TRIBUTÁRIO ANOTADO E COMENTADO II 2007 PAG247
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

1. A FAZENDA PÚBLICA recorre da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa que julgou procedente a reclamação que A……….., S.A., na qualidade de executada no processo de execução fiscal nº 3085200501085336, deduziu contra o acto do órgão da execução fiscal que lhe determinou a prestação de nova garantia, no valor de € 2.763.569,65, em substituição da garantia bancária que já prestara para efeitos de suspensão do mesmo processo executivo aquando da apresentação de impugnação judicial deduzida contra a liquidação de IRC donde emerge a dívida exequenda, para efeitos de manutenção da suspensão desse processo executivo.

1.1. Rematou as alegações de recurso com as seguintes conclusões:
A) Por muito respeito que mereça o vertido na decisão a quo, com a mesma não se pode, de modo algum, concordar.

B) Salvo o devido respeito, que é muito, se mais não for, até porque manda o bom senso jurídico que por mais deficientes que por vezes as leis se apresentem, quase tudo nelas pode ser corrigido pela sua adequada interpretação, o que no caso em apreço, com o devido respeito, não foi alcançado pelo areópago a quo.

C) Pelo que, com o devido respeito, bastaria que fosse dada uma maior acuidade ao escopo do vertido nos arts. 169º, n.º 8; 199º n.º 5 e 10 do art. 199º todos do CPPTributário e art. 52º da LGT, conjugadamente com a mais recente jurisprudência dos nossos Tribunais superiores, assim como do Oficio Circulado 60.090 de 15.05.2012 da DSGT, para que, se pudesse aquilatar pela improcedência da Reclamação aduzida pelo Recorrido/Reclamante, maxime, para que melhor se pudesse aferir pela “justeza” do acto do órgão de execução fiscal que determinou a prestação de nova garantia bancária no valor de € 2.763.569,65 euros.

D) In casu a Recorrente, conclui não ter razão o Tribunal a quo, que julgou num determinado sentido que, perante a mais recente Jurisprudência dos Tribunais Superiores e com os elementos constantes dos autos, mormente o teor adequado, justo e proporcional do Ofício Circulado 60.090 de 15.05.2012 da DSGT, não tem a devida correspondência com o modo como as normas que constituem o fundamento jurídico da decisão a quo deveriam ter sido interpretadas e aplicadas.

E) Na douta decisão sub judice o respeitoso areópago a quo julgou procedente a reclamação apresentada pelo Recorrido/reclamante tendo, consequentemente, determinado a anulação do acto ora reclamado por entender que “Na situação em apreço o despacho de suspensão da execução foi proferido em 30.12.2005 nos termos do art. 169º do CPPT, pelo que a caducidade da garantia ocorreria, nos termos do art. 183º-A, apenas em 2008, mantendo-se, não obstante, os efeitos da suspensão.

F) Com a revogação do regime da caducidade da garantia, passou esta matéria a ser regida pelo art. 183º, n.º 2 do CPPT”.

G) Mais ficando dito no douto aresto a quo que, “Assim e não constando que o processo de impugnação (que determinou a suspensão) tenha sido decidido, e não estando caducada a garantia à data em que foi revogado o respectivo regime não há razão para que a mesma seja levantada, sendo certo que dos autos também não ressalta qualquer fundamento que justifique a sua substituição por outra”.

H) Com o devido respeito pelo sufragado na decisão a quo, no que tange ao tema da caducidade da garantia prestada para efeitos de suspensão da execução fiscal, o areópago a quo concluiu que “...a garantia prestada em execução fiscal e não caducada, de harmonia com o disposto no art. 183.°-A do CPPT, só poderá ser levantada oficiosamente ou a requerimento de quem a haja prestado quando tenha sido decidido o processo que a determinou com decisão favorável ao garantido ou com pagamentos da divida, nos termos do n.º 2 do art.º 183° do CPPT, no caso contrario”.

I) Não obstante a conclusão plasmada na decisão a quo, a mesma não é de molde a obviar ao solicitado pelo Órgão de execução fiscal, ao ter determinado a prestação de uma nova garantia bancária no valor de 2.763.569,65 euros, ou seja, uma garantia que consubstancie um valor actualizado e que assegure a idoneidade e a formalidade da garantia que já havia sido prestada pela Recorrida em 22.12.2005, no valor de 2.589.922,54 euros.

J) Desta forma se respeitando os requisitos que permitam a manutenção daquela garantia por um período de tempo indeterminado, em face do prescrito no n.º 1 do art. 169º do CPPT, que suspende a execução “até decisão do pleito”, data esta indeterminável, considerando os diversos meios de reacção e os diferentes tempos de resolução de cada órgão decisor.

K) Pelo que, o sobredito é de per si fundamento justo e legitimo para justificar a substituição da garantia que no pretérito havia sido prestada pela recorrida por uma outra no valor actualizado de 2.763.569,65 euros, contrariamente ao que vem asseverado na douta decisão a quo.

L) A suficiência da garantia deve ser verificada pelo órgão competente a todo tempo.

M) E tal como sucedeu no caso em apreço, caso o órgão de execução fiscal constate que a garantia prestada é insuficiente, deve ser ordenada a notificação do executado dessa insuficiência e da obrigação de reforço ou prestação de nova garantia no prazo de 15 dias (prazo previsto no n.º 8 do art. 169º e n.º 10 do art. 199º, ambos do CPPT).

N) Se o executado não proceder ao reforço, nem prestar nova garantia deve proceder-se ao levantamento da correspondente suspensão processual e à prossecução dos termos normais do processo.

O) Outrossim, a prestação inicial da garantia e o reforço/prestação de nova garantia, deverão ser efectuados dentro dos prazos previstos naquela normas, mas sem prejuízo da admissão da prestação de garantia após decurso dos mesmos, desde que ainda se encontre pendente algum dos meios de reacção previstos no n.º 1 do art. 169º do CPPT, e desde que o valor da garantia se encontre devidamente actualizado.

P) A garantia deve corresponder sempre a uma segurança do órgão de execução fiscal de que efectuará a cobrança da divida, mesmo no caso de incumprimento do devedor e independentemente da vontade deste, pelo que impende permanentemente sobre os Serviços um dever de vigilância da sua validade, vigência e idoneidade, notificando o executado para proceder ao seu reforço, sempre que necessário.

Q) O instrumento de constituição da garantia deve ser apreciado casuisticamente pelo órgão competente (n.º 9 do artigo 199º do CPPT), só sendo aceite se estiverem cumpridos, não só todos os requisitos em termos de suficiência do seu valor (n.º 6 do artigo 199º do CPPT), mas também os que permitam a sua manutenção por um período de tempo indeterminado.

R) Face à redacção do n.º 1 do art. 169º daquele mesmo diploma legal, que suspende a execução “até à decisão do pleito”, data esta que é indeterminável, considerando os diversos meios de reacção e os diferentes tempos de resolução de cada Órgão decisor.

S) A garantia prestada não deve estar sujeita a um prazo de validade, pelo que os Serviços não devem aceitar garantias que não cumpram esse requisito.

T) A caducidade da garantia, prevista actualmente no art. 183º-A do CPPT, só ocorre em caso de falta de diligência da administração tributária, por não ter cumprido o prazo de um ano para proferir decisão em sede de reclamação graciosa (n.º 1 do art. 183º-A do CPPT). Caso esse incumprimento seja da responsabilidade do reclamante/recorrido (n.º 2 daquele artigo), não ocorre essa caducidade.

U) A caducidade ocorre tanto nos casos em que se trate de “garantia prestada” pelo contribuinte, como de garantias constituídas pela própria administração, nos termos do art. 195º do CPPT (hipoteca legal ou penhor), pois o sentido da norma é incutir à administração tributária uma tramitação célere do processo, pelo que não há razão para distinguir estas garantias, para estes efeitos.

V) Deste regime de caducidade de garantia ficará afastada a penhora, face à revogação expressa do n.º 1 do art. 235º do CPPT.

W) Nos termos da redacção anterior do n.º 1 do art. 183º-A do CPPT, revogada pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro, o regime de caducidade da garantia era aplicado, não só à reclamação graciosa, mas também à impugnação judicial, recurso judicial ou oposição à execução, apontando-se para o prazo máximo de um ano para a decisão da reclamação graciosa, e de três anos para o julgamento em 1ª instância dos processos judiciais.

X) A redacção actual daquele preceito restringe o âmbito de aplicação da norma às situações de apresentação de reclamação graciosa, o que permite concluir que o instituto da caducidade da garantia se destina, apenas, a devolver à administração os custos da sua própria ineficiência.

Y) Acompanhando esta leitura, caso exista caducidade da garantia na pendência da reclamação graciosa e, posteriormente, seja interposto recurso hierárquico, não deve a AT solicitar a prestação de nova garantia, pois subsiste o pleito que se iniciou com a reclamação graciosa, sendo o recurso hierárquico um prolongamento desse procedimento.

Z) Z) Diversamente, tal não pode ocorrer no caso de (eventual) reacção judicial ao indeferimento da pretensão do contribuinte na fase administrativa, por se passar de um “pleito gracioso” para um “pleito judicial”.

AA) Na verdade, neste caso o atraso na decisão da impugnação não pode ser imputado à Administração, mas a um órgão de soberania que é independente - o Tribunal.

BB) Pelo que, após o reconhecimento da caducidade da garantia, por não ter sido cumprido o prazo máximo de um ano para decisão da reclamação graciosa, o interessado só pode beneficiar da suspensão até à decisão graciosa do pleito. Pelo que, tal como no caso sub judice,

CC) sendo apresentado qualquer meio jurisdicional de reacção, só se verificará nova suspensão do processo de execução se o devedor prestar nova garantia idónea, para cujo cálculo devem ser contabilizados os juros de mora até à data de apresentação do novo meio de reacção, em conformidade com o n.º 6 do artigo 199º do CPPT.

DD) A suspensão da execução deve manter-se se for prestada garantia idónea no prazo previsto no n.º 8 do art. 169º do CPPT e n.º 10 do art. 199º do CPPT (15 dias após notificação do executado para prestação de nova garantia), ou, caso não seja prestada, até ao termo deste prazo.

EE) Se o interessado não proceder à prestação de nova garantia idónea dentro deste prazo deve ser levantada de imediato a suspensão da execução. Esta só voltará a suspender-se se e quando for prestada garantia idónea, desde que ainda se encontre pendente algum dos meios de reacção previstos no n.º 1 do art. 169º do CPPT, em conformidade com a parte final do n.º 6 do mesmo artigo. Sendo que, neste caso, os juros de mora devem ser contabilizados até à data da apresentação efectiva da garantia.

FF) Em conclusão, nada há a apontar ao cumprimento e respeito pelos pertinentes normativos legais por parte da Administração Tributária no âmbito do processo de execução fiscal sub judice, pelo que quanto a esta temática o aresto a quo também não deverá manter-se na Ordem Jurídica.

GG) Pelo que, em face de todo o supra exposto, no processo sub judice não deverá resultar qualquer anulação do despacho reclamado.

HH) Por conseguinte, salvo o devido respeito, que é muito, o Tribunal a quo lavrou em erro de interpretação e aplicação do direito e dos factos, nos termos supra explanados, assim como não considerou nem valorizou como se impunha, em abono da harmonização dos procedimentos (e da objectiva, proporcional, legal e justa necessidade de ajustamento e respeito pelos requisitos da suficiência atinente à garantia no caso sub judice) o Oficio Circulado 60.090 de 15.05.2012 da DSGT que faz parte dos autos em apreço.


1.2. A Recorrida apresentou contra-alegações para sustentar a manutenção do julgado.

1.3. O Exm.º Magistrado do Ministério Público emitiu douto parecer no sentido de que o recurso não merecia provimento.

1.4. Com dispensa de vistos, dada a natureza urgente do processo, cumpre decidir.

2. A sentença recorrida deu por assente a seguinte factualidade:

a) O Serviço de Finanças de Lisboa 3 instaurou face à certidão de divida n.º 2005/271362 o PEF n.º 3085200501085336, contra a sociedade B…………, Lda., para cobrança coerciva de dívidas de IRC do ano de 2000, no montante de € 1.879.261,84 - cfr. fls. 2 da cópia certificada do PEF aqui em anexo.

b) A executada prestou garantia bancária nos autos de execução supra, datada de 20/12/2005 e emitida pelo Banco C……….., SA., com o n.º 36230484081651, no montante de € 2.589.922,54, para efeitos de suspensão do processo de execução fiscal n.º 3085200501085336, assumindo-se, ali, o Banco responsável como fiador e principal pagador pelas entregas até ao limite da garantia prestada destinadas a garantir o eventual pagamento da divida ao Estado de IRC de 2000 — tudo conforme fls. 4 da cópia certificada do PEF aqui em anexo.

c) Em 2005 a aqui Reclamante deduzira Impugnação Judicial do acto tributário objecto de cobrança coerciva nos autos de execução aqui em conflito — não contestado (ponto 4 do petitório e inf. da AT ponto 2 pág. 54 dos autos).

d) Em 30112/2005 foi proferido, no processo executivo a que nos vimos referindo, despacho, emanado do respectivo Chefe do Serviço de Finanças a suspender a execução nos termos do art. 169.° do CPPT — cfr. consta da cópia certificada do PEF aqui em anexo.

e) Em 08/02/2012 foi proferido novo despacho no PEF supra pela chefe de Finanças, em regime de substituição, com o teor que a seguir se descreve:

«(...)
O presente processo encontra-se suspenso a aguardar anulação.
No âmbito do Plano de Qualificação e Segurança da base de dados do SEF, foi iniciado em 1 de Fevereiro de 2008, o projecto de "Saneamento dos processos suspensos a aguardar anulação no SEF", que determina que se proceda à reanálise dos pressupostos que determinaram a suspensão do processo.

A manutenção do processo de execução fiscal nesta fase impede a realização de compensações, penhoras, vendas e o cancelamento de beneficias fiscais, pelo que deve ser temporária.

Em conformidade com instruções transmitidas pelo mail do NMJT de 151011/2008, procedeu-se à reanálise acima referida, tendo-se concluído que o processo deve continuar na mesma fase do SEF, pelo motivo indicado no quadro infra, pelo que determino que essa suspensão se mantenha. De acordo com as mesmas instruções, a presente decisão é válida por 30 dias, findos os quais me devem ser de novo presentes os autos para nova reapreciação.

N.º Processo: 3085200501085336

Motivo: Outros motivos

2012-02-08 — Nova recolha sefweb da mesma garantia não ficando esta suspensa atendendo à diferença temporal entre a data da notificação e a data da recolha (proc. adm. garantia n.º 1/2012)

(...)» -Tudo conforme consta da cópia certificada do PEF aqui em anexo.

f) Em 14/06/2012 foi remetida pelo Serviço de Finanças de Lisboa 3, carta à Reclamante na pessoa do seu mandatário, com o seguinte teor:

«Assunto: NOTIFICAÇÃO PARA APRESENTAÇÃO DE NOVA GARANTIA
1ª NOTIFICACÃO
Na sequência do despacho do Exmo. Sr. Director de Finanças de Lisboa Adjunto exarado em 2012-06-11. Fica por este meio notificado para, no prazo de 15 dias (QUINZE DIAS) prestar nova garantia em substituição da anteriormente apresentada por impugnação judicial ao IRC do ano de 2000 (processo de execução fiscal n.º 3085200501085336), nos termos do Art.º 195º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), no montante de € 2.763.569,65 (DOIS MILHOES SETECENTOS E SESSENTA E TRÊS MIL QUINHENTOS E SESSENTA E NOVE EUROS E SESSENTA E CINCO CENTIMOS), conforme demonstração que segue:

CALCULO DO MONTANTE DA GARANTIA A PRESTAR
Valor Reclamado
€ 1.879.261,84
Juros de mora
€ 312.605,64
Custas
€ 18.988,24
SOMA
€ 2.210.855,72
Acréscimo sobre a soma 25% € 552.713,93
MONTANTE DA GARANTIA A PRESTAR€ 2.763.569,65

- tudo conforme consta da cópia certificada do PEF em anexo - Não contestado.

g) A presente reclamação foi apresentada em 28/06/2012 no Serviço de Finanças de Lisboa 3 — cfr. fls. 4 dos autos

Factos Não Provados: Do adquirido processual não ressalta que tenha sido decidida a Impugnação a que se refere o ponto C. deste probatório.

3. A questão que a Recorrente coloca à apreciação deste Tribunal é a de saber se a sentença recorrida padece de erro de julgamento em matéria de direito ao ter concluído, ao abrigo do quadro legal em vigor à data dos factos tributários relevantes, que não pode considerar-se caducada a garantia que neste processo de execução fiscal foi prestada em 22/12/2005 por força da apresentação, em 4/05/2005, de impugnação judicial deduzida contra o acto tributário de liquidação donde emerge a dívida exequenda (IRC/2000), e que, como tal, não há razão para que a mesma seja levantada nem fundamento legal para a exigência de prestação de uma nova garantia para a suspensão desse mesmo processo executivo.

Com efeito, o recurso vem interposto da sentença que decidiu julgar procedente a reclamação apresentada pela sociedade executada no sentido da revogação do despacho proferido pelo Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa-3 que determinou a obrigatoriedade de prestação de uma nova garantia, no valor de € 2.763.569,65 para efeitos de suspensão do processo de execução fiscal n.º 3085200501085336, tendo em conta que se encontra já prestada uma garantia bancária, no valor de € 2.589.922,54 (correspondente ao montante do imposto e dos juros em dívida e acréscimos legais calculados à data da apresentação da impugnação), para efeitos de suspensão desse processo executivo.
Segundo a sentença, «Dispunha, à data dos factos, o n.º 1 do art. 183º-A do CPPT (introduzida pela Lei n.º 30-B/2002, de 30/12, que aprovou o OE para 2003) que: “A garantia prestada para suspender a execução em caso de reclamação graciosa, impugnação judicial, recurso judicial ou oposição, caduca se a reclamação graciosa não estiver decidida no prazo de um ano a contar da data da sua interposição ou se na impugnação judicial ou na oposição não tiver sido proferida decisão em 1. a Instância no prazo de três anos a contar da data da sua apresentação”.
Ora, este art. 183º- A do CPPT foi aditado pela Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho e revogado pelo artigo 94º da Lei n.º 53-A/2006, de 29/12, não obstante a revogação não ter aplicação às situações em que se encontre a decorrer o respectivo prazo de caducidade, ou seja a revogação não implicou a caducidade das garantias entretanto prestadas e em que aquele prazo ainda não se mostrava completo e, consequentemente, nestes casos, os requisitos para a sua ocorrência não são regulados pela lei nova (vide neste sentido Jorge Lopes de Sousa in CPPT Anotado e Comentado, II Volume, 2007, pág. 247 e seguintes).
A norma legal supra citada permitia ao interessado obter a declaração de caducidade da garantia sem perder o efeito suspensivo da execução, verificados e mantidos que fossem os requisitos que haviam implicado a sua concessão, ou seja, o processo continuaria suspenso até ao momento em que esta garantia se mantivesse, nos termos do preceituado no art. 169º do CPPT, nomeadamente em caso de reclamação graciosa, impugnação judicial ou recurso judicial que tenham por objecto a legalidade da divida exequenda.
Por seu lado o n.º do art. 183º do CPPT permite que a garantia poderá seja levantada oficiosamente ou a requerimento de quem a haja prestado logo que no processo que a determinou tenha transitado em julgado decisão favorável ao garantido ou haja pagamento da divida.
Assim, será de concluir que a garantia prestada em execução fiscal e não caducada, de harmonia com o disposto no artigo 183º-A do CPPT, só poderá ser levantada oficiosamente ou a requerimento de quem a haja prestado quando tenha sido decidido o processo que a determinou com decisão favorável ao garantido ou com pagamento da dívida, nos termos do n.º 2 do artigo 183º do CPPT, no caso contrário (vide a este respeito o Ac. do STA proferido no Proc. n.º 317/08 em 25/06/2008, consultável na internet).
Na situação em apreço o despacho de suspensão da execução foi proferido em 30/12/2005 nos termos do art. 169º do CPPT, pelo que a caducidade da garantia ocorreria, nos termos do art. 183º-A, apenas em 2008, mantendo-se, não obstante, os efeitos da suspensão.
Com a revogação do regime da caducidade da garantia, passou esta matéria a ser regida pelo artigo 183º n.º 2 do CPPT.
Assim e não constado que o processo de impugnação (que determinou a suspensão) tenha sido decidido, e não estando caducada a garantia à data em que foi revogado o respectivo regime, não há razão para que a mesma seja levantada, sendo certo que dos autos também não ressalta qualquer fundamento que justifique a sua substituição por outra.».

Esta decisão não merece qualquer censura, pois em face da revogação do citado artigo 183º-A do CPPT, a partir de 1/1/2007, passou a reger em tal matéria apenas o n.º 2 do artigo 183º do CPPT, segundo o qual a garantia só poderá ser levantada quando no processo que a determinou tenha transitado em julgado decisão favorável ao garantido ou haja pagamento da dívida. E, assim, a revogação do artigo 183º-A do CPPT determina a validade de todas as garantias prestadas ao abrigo do citado preceito legal em todos os casos em que o prazo de caducidade de 3 anos ainda não se tinha consumado a 1 de Janeiro de 2007 - data em que operou a revogação do referido preceito por força da entrada em vigor da Lei do OE/2007. Neste sentido, entre outros, os Acórdãos proferidos pelo STA em 22/04/2009, no proc. n.º 0138/09, em 25/06/2008, no proc. n.º 0317/08 e em 7/05/2008, no proc. n.º 0787/07.
No caso vertente, considerando que a garantia bancária foi prestada em 22 de Dezembro de 2005 e que o processo de impugnação a que ela se encontra umbilicalmente ligada - no qual se discute a legalidade da obrigação tributária donde emerge a divida exequenda - foi instaurado em 4 de Maio de 2005, é evidente que a garantia não caducou ao abrigo do disposto no artigo 183º-A do CPPT, pois o prazo de 3 anos não estava consumado à data em que esta disposição legal deixou de vigorar na ordem jurídica - 1 de Janeiro de 2007.
A garantia prestada pela executada/impugnante é, pois, válida e mantém-se em vigor até ao final do pleito, e é idónea uma vez que a idoneidade das garantias bancárias é presumida nos termos do n.º 1 do artigo 199º do CPPT.
Por outro lado, embora a Fazenda Pública venha agora invocar que a necessidade de prestar nova garantia se escuda na necessidade de actualizar o valor da garantia prestada – porquanto o valor da dívida exequenda se cifra agora em € 2.763.569,65 face à necessidade de actualizar os juros de mora em dívida e no que vem determinado no Oficio Circulado n.º 60.090, de 15.05.2012, da DSGT quanto à exigência desse reforço – para daí concluir que o órgão de execução fiscal podia solicitar a prestação de nova garantia ao abrigo do disposto no n.º 10 do art.º 199º do CPPT, o certo é que não foi essa a justificação enunciada no acto reclamado para a exigência de nova garantia, acto que nem sequer alude à diminuição do valor da garantia bancária anteriormente prestada ou sua insuficiência e necessidade de prestar um reforço de modo a cobrir o montante resultante da actualização dos juros de mora, conforme preceituado no n.º 5 do artigo 199° do CPPT. Aliás, se se tratasse da necessidade de um reforço, a nova garantia nunca poderia ascender ao montante total de € 2.763.569,65, como foi exigido, mas tão só à diferença entre o valor da garantia já prestada e que se mantém válida (no valor de € 2.589.922,54) e o acréscimo do valor de juros que se impunha actualizar e reforçar para efeitos de manutenção da suspensão do processo executivo.
Ora, o tribunal tem de quedar-se pela formulação do juízo sobre a legalidade do acto sindicado tal como ele ocorreu, apreciando a respectiva legalidade em face da fundamentação contextual integrante do próprio acto, até porque o interessado apenas pode defender-se dos pressupostos que aí foram enunciados e dos quais se distraíram os efeitos lesivos, pelo que não será admissível qualquer aproveitamento do acto quando isso implique a valoração de razões de facto e de direito que não constam dessa fundamentação, isto é, que não foram invocados para conduzir ao acto reclamado, pois se assim não fosse o particular ver-se-ia surpreendido em juízo com a invocação de uma outra realidade e isso representaria uma contracção do seu direito de reclamação contenciosa contra os actos lesivos praticados no processo de execução fiscal.
Deste modo, e em suma, a posição acolhida pela Recorrente nos presentes autos carece da qualquer suporte legal, uma vez que: (i) a garantia prestada pela executada/impugnante se mantém válida e em vigor, não tendo caducado; (ii) trata-se de uma garantia idónea nos termos do n.º 1 do art.º 199° do CPPT; (iii) o órgão da execução fiscal nunca solicitou o reforço dessa garantia, mas sim a prestação de uma nova garantia pelo montante global de € 2.763.569,65, sem qualquer consideração e/ou ponderação da já prestada; (iv) não ocorrendo a diminuição do valor da garantia bancária prestada, mas, quando muito, a necessidade do seu reforço face à actualização dos juros de mora em dívida, não há qualquer facto com relevância legal que justifique a exigência de uma nova garantia pelo montante global da dívida de imposto, juros de mora e acréscimos legais, mas tão só, e quando muito, de um reforço do seu valor inicial, o que nunca foi exigido pelo órgão de execução fiscal.
Termos em que se impõe confirmar a sentença que anulou a decisão do órgão de execução fiscal que determinou à executada a prestação de uma nova garantia no valor de € 2.763.569,65.

4. Face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso.

Custas pela recorrente.


Lisboa, 9 de Janeiro de 2013. – Dulce Manuel Neto (relatora) – Isabel Marques da Silva – Lino Ribeiro.