Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:049/13
Data do Acordão:02/14/2013
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ASCENSÃO LOPES
Descritores:SIGILO BANCÁRIO
AUTORIZAÇÃO
PRESSUPOSTOS
MANIFESTAÇÕES DE FORTUNA
OMISSÃO DE PRONÚNCIA
Sumário:I – Se a sentença se pronuncia e decide questão que o Tribunal foi chamado a resolver, então, independentemente de eventual erro de julgamento do decidido, não se verifica nulidade da sentença, por omissão de pronúncia.
II – A autorização de acesso à informação bancária prevista no artº 129º, nº 6 do CIRC (na redacção anterior ao decreto-lei 159/2009 de 13.07) tinha como única finalidade a comprovação do pedido de demonstração a que alude aquele normativo.
III – Tratava-se de procedimento previsto no Capitulo VIII do Código do IRC, referente às garantias dos contribuintes e que tinha como objectivo a prova pelo sujeito passivo do preço efectivo na transmissão de imóveis permitindo-lhe assim obviar à aplicação do disposto no artº 58-Aº nº 2 do mesmo diploma legal (correcções ao valor de transmissão de direitos reais sobre bens imóveis).
IV – Obtida a autorização do sujeito passivo de acesso às suas contas bancárias no âmbito de um procedimento para os efeitos do artº 129º, nº 6 do Código do IRC, essa informação bancária não pode ser utilizada pela Administração Fiscal para fundamentar correcções efectuadas no âmbito de outro procedimento contra o mesmo sujeito passivo, em sede de IRS e com avaliação indirecta da matéria tributável com base em manifestações de fortuna, nos termos dos arts. 87º, alínea f) e 89.-A, n.º 5, alínea a), da Lei Geral Tributária, sem que neste procedimento se observem as normas que regulam a sua obtenção, nomeadamente os artigos 63º e 63º-B ns. 4 e 5 da Lei Geral Tributária.
Nº Convencional:JSTA00068114
Nº do Documento:SA220130214049
Data de Entrada:01/14/2013
Recorrente:A...
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF PORTO
Decisão:PROVIDO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT
Área Temática 2:DIR PROC FISC - IRS
Legislação Nacional:CPA91 ART133 N1 ART133 N2 I ART3 N1
LGT98 ART63 B N4 ART63 ART55 ART72
CONST76 ART26 N1 ART266 N2
CIRC01 ART139 ART129 N6 ART58-A N2
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC0837/12 DE 2012/09/05
Referência a Doutrina:VIEIRA DE ANDRADE LIÇÕES DE DIREITO ADMINISTRATIVO 2ED PAG177
LEITE DE CAMPOS BENJAMIM RODRIGUES JORGE DE SOUSA LEI GERAL TRIBUTÁRIA COMENTADA E ANOTADA PAG569 PAG580.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em conferência, nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1 – RELATÓRIO


A………….., NIF …………, nos termos do artigo 89.°- A, n.°s 7 e 8 da LGT, interpôs recurso judicial da decisão do Senhor Director de Finanças do Porto, datada de 07/11/2011, que lhe fixou o rendimento colectável por métodos indirectos, para efeitos de IRS, do ano de 2008, no montante de 51.241,27€.
Por sentença de 19 de Novembro de 2012, o TAF do Porto negou provimento ao recurso.
Reagiu a A…………., interpondo o presente recurso, cujas alegações integram as seguintes conclusões:

I. Em matéria processual tributária, a aplicação subsidiária das normas do CPTA prevalece sobre a aplicação subsidiária das normas do CPC, de acordo com o elenco de alíneas constante do artigo 2.° do CPPT;

II. A norma do artigo 95.°, n.° 2 do CPTA que impõe ao juiz, no processo de impugnação contenciosa de actos administrativos, que identifique a existência de causas de invalidade diversas das que tenham sido alegadas, ouvidas as partes para alegações complementares;

III. Se o artigo 58.° da LGT estabelece o princípio do inquisitório para a administração tributária, estabelecendo que esta deve, no procedimento, realizar todas as diligências necessárias à satisfação do interesse público e à descoberta da verdade, não estando subordinada à iniciativa do autor do pedido, por maioria de razão, também o Tribunal o deve fazer;

IV. Ao não ter apreciado as questões suscitadas no requerimento formulado pela recorrente a folhas 145/148, a sentença recorrida incorreu numa omissão de pronúncia;

V. Ao deixar de se pronunciar sobre questão que devia apreciar, a sentença recorrida incorreu assim num vício de nulidade, nos termos do artigo 668.°, n.° 1, alínea d) do CPC;

VI. A utilização de informações bancárias do contribuinte por parte da administração tributária, sem precedência dos formalismos legalmente estabelecidos para o efeito, ofende o núcleo essencial do direito fundamental, constitucionalmente protegido, da reserva da vida privada (artigo 26.°, n.°s 1 e 2 da CRP).

VII. A preterição do formalismo estipulado no artigo 63.°-B da LGT, no acesso a informação bancária protegida, originando que a utilização dessa informação é determinada apenas pela Direcção Distrital de Finanças, gera um vício de incompetência no procedimento inspectivo, gerador de nulidade;

VIII. Ao não conhecer da questão da legalidade do acesso à informação bancária, a sentença recorrida incorreu num vicio de nulidade, nos termos do artigo 668.°, n.° 1, alínea d) do CPC.

IX. Deve o processo baixar à 1.ª instância para que sejam conhecidas as questões levantadas pela recorrente no requerimento de folhas 1451148.

Assim se dando provimento ao presente recurso, como é de inteira JUSTIÇA!

A entidade recorrida contra-alegou concluindo da seguinte forma:

a) Da análise da douta sentença recorrida resulta que o Meritíssimo Juiz “a quo” se pronunciou, de forma clara, rigorosa e explícita, sobre cada uma das causas de pedir invocados pela Recorrente para justificar a ambicionada anulação do acto que lhe determinou a fixação de rendimento colectável, por métodos indirectos, em sede de IRS, do ano de 2008, do montante de €51.241,27.

b) Nomeadamente, no que concerne às questões suscitadas no requerimento de fls. 145/158 dos autos, peça onde a ora Recorrente, reconhecendo, de forma implícita, o naufrágio da argumentação aduzida em sede de requerimento inicial, veio invocar um conjunto de circunstâncias que reputava de geradoras de nulidade da decisão administrativa então impugnada.

c) É indevido, por isso, apontar à douta sentença o vício de nulidade por omissão de pronúncia.

d) O que se verificou foi, apenas e só, que o Tribunal não deu acolhimento e refutou, fundamentadamente, a argumentação aduzida pela ora Recorrente.

Nestes termos e nos mais de direito aplicáveis, deve o presente recurso ser considerado totalmente improcedente e, em consequência, ser confirmada a decisão recorrida e, como tal, manterem-se todos os seus termos e efeitos, por em nada merecer reparo e se encontrar conforme às disposições legais aplicáveis aos factos em apreciação.

O EMMP pronunciou-se emitindo o seguinte parecer:

1. Questões controvertidas:
- se o juiz tem de identificar causas de invalidades diversas das alegadas, segundo resulta do disposto no C.P.T.A., nomeadamente, do seu art. 95º n.º 2, aplicável subsidiariamente, e por maioria de razão em face do previsto no art. 58.º da L.G.T.;
- se ocorreu omissão de pronúncia quanto ao requerido a fls. 145/148, a provocar nulidade, nos termos do art. 668.º n.º 1 al. d) do C.P.C.
- se a utilização de informações bancárias do contribuinte por parte da A.T. sem a precedência dos formalismos legalmente estabelecidos, ofende o conteúdo fundamental do direito fundamental da reserva da vida privada — art. 26.º n.º s 1 e 2 da C.R.P);
- se a preterição do formalismo estipulado no art. 63.º-B da L.G.T., no acesso a informação bancária protegida, gera um vício de incompetência gerador de nulidade.
2. Fundamentação.

A resposta à 1.ª primeira questão depende do que se entenda quanto à 3ª, de que será de, antes de mais, conhecer.
Na sentença recorrida, afasta-se tal com base no entendimento de não ter sido violado o conteúdo essencial do direito fundamental da reserva da vida privada.
Pese embora semelhante posição ter já sido defendida no parecer do M.º.Pº em que mais se defendeu não existir, assim, norma a cominar a sanção da nulidade, e de ser discutível na doutrina se a violação das normas pelas quais é permitido o acesso a documentação bancária é de considerar como implicando uma violação de um direito fundamental e quanto ao seu conteúdo essencial, quer parecer que a maioria da doutrina e a jurisprudência do Tribunal Constitucional vem considerar assim ser de entender — assim, nomeadamente, os acórdãos de 278/95, de 31-5-1995 e 442/07 de 14-8-2007, citados no parecer n.º 25/09, do Conselho Consultivo da P.G.R. publicado no DR II s. de 17/11/09, p. 46659 e ss..
Não parece ser de afastar a aplicação da sanção de nulidade prevista art. 133.º n.º 2 al. d) do C.P.A., a que subsidiariamente será de recorrer, e ainda que a impugnante tenha dado o seu consentimento para um tal acesso noutro procedimento.
Com efeito, se a impugnante tenha dado o seu consentimento para um tal acesso noutro procedimento tributário e a documentação bancária tinha de ser utilizada no procedimento em causa, de tributação por métodos indirectos, afigura-se não ser de presumir que o consentimento dado possa abranger ainda este procedimento.
Assim, sem o cumprimento do formalismo previsto no n.º 4 do art. 63.º B da L.G.T. ou seja, sem que tenha sido proferida decisão pelo director-geral dos Impostos, sem possibilidade de delegação, com indicação dos motivos concretos em que tal se justificava, e com notificação para efeitos de recurso.
A não ter tal ocorrido, melhor será reconhecer não satisfazer tal o conteúdo essencial do que com aquela previsão quanto ao referido direito se pretendeu salvaguardar, e bem assim poder ter sido cometida a nulidade prevista no art. 133.º n.º 2 al. d) do C.P.A., aplicável subsidiariamente, a qual, como tal, é de conhecimento oficioso.
E sendo de aplicar nesse caso, em processo tributário, o princípio do inquisitório pleno, conforme decorre conjugadamente do previsto nos arts. 99.º n.º 1 da L.G.T., e 13.º n.º1 e 124.º n.º 1 do C.P.P.T., melhor teria sido conhecer ainda de tal questão, o que não tendo ocorrido, provoca a nulidade prevista no art. 668. n.º 1 al. d) do C.P.C..
3. Conclusão.
Tendo resultado do processo de impugnação que a A.T. utilizou documentação bancária sem cumprimento do previsto no art. 68.º n.º4 da L.G.T., tal pode implicar nulidade por referência à violação do conteúdo essencial do direito à privacidade, de acordo com o previsto no art. 133.º n.º 2 al. d) do C.P.A., aplicável subsidiariamente.
Parece que, na procedência do que quanto a tal conhecimento se impunha efectuar pelo tribunal recorrido, o que é de decidir com base no que conjugadamente resulta dos arts. 99.º n.º 1 da L.G.T., e 13.º n.º1 e 124.º n.º 1 do C.P.P.T., melhor será anular o decidido por omissão de pronúncia quanto a essa questão - art. 668.º n.º 1 al. d) do C.P.C..

2 – FUNDAMENTAÇÃO

O Tribunal “a quo” deu como provada a seguinte factualidade:

A) A recorrente foi objecto de uma acção de inspecção, com base na Ordem de Serviço n.° OI 2011 03168, a qual teve por objecto os exercícios de 2008 e 2009 - cfr. Relatório de Inspecção de fls 6/58 dos autos.
B) Na sequência da acção de inspecção, referida na alínea A), os Serviços de Inspecção Tributária elaboraram o relatório final de inspecção, do qual consta, designadamente, o seguinte:
“(…)

II -B) MOTIVO, ÂMBITO E INCIDÊNCIA TEMPORAL
II- B.1.) MOTIVO DA ACÇÃO

A empresa B…………. S.A. (adiante apenas B………….), contribuinte n.° ……….., requereu, nos termos do artigo 139.º do Código do Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Colectivas (IRC) — anterior art° 129.°-, a validação dos preços de venda de diversas fracções imobiliárias que a mesma alienou no exercício de 2009, por montantes inferiores aos valores patrimoniais fixados para as respectivas fracções.
Para este efeito, a B……….. e os seus administradores autorizaram a Administração Fiscal a aceder aos seus dados bancários com referência a 2008 e 2009, conforme exige o art.° 139.º n.º 6 do código do IRC
Neste âmbito, A………., administradora da sociedade, deu consentimento à Administração Fiscal para aceder a todas as informações e documentos bancários a seu respeito.
Em resultado dessa autorização, identificaram-se diversas contas bancárias tituladas por A………..
Na análise a essas contas, foram detectados inúmeros depósitos em numerário cuja origem é desconhecida.
Dado que esses depósitos poderão ser rendimentos não declarados, foi proposta fiscalização ao sujeito passivo em questão.
(...)
II - B.3.1) ENQUADRAMENTO TRIBUTÁRIO/ACTIVIDADE EXERCIDA
(…)
Rendimentos declarados
Nas declarações entregues por A……….. a mesma mencionou os seguintes rendimentos:

Nota: Os rendimentos de trabalho dependente foram pagos pela empresa B…………. (…)

IV – MOTIVOS E EXPOSIÇÃO DOS FACTOS QUE IMPLICAM O RECURSO A MÉTODOS INDIRECTOS






Nessas contas bancárias constavam os seguintes depósitos em numerário:

Conta
Bancária
Data
Descritivo
Montante
Millennium 2
07-01-08
Dep Num/CHQS MBCP/VIS
€ 1.424,50
CGD
07-01-08
Dep c/doc
€ 4.500,00
Millennium 2
15-01-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 2.100,15
Millennium 1
21-01-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 1.515,00
Millennium 1
31-01-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 3.000,00
Millennium 2
07-02-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 1.175,00
Millennium 2
11-02-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 1.275,00
CGD
27-02-08
Dep c/doc
€ 4.500,00
Millennium 2
03-03-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 5.500,00
Millennium 2
03-03-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 10.000,00
Millennium 2
03-03-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 10.000,00
CGD
07-03-08
Dep c/doc
€ 4.500,00
CGD
07-03-08
Dep c/doc
€ 1.380,00
Millennium 2
17-03-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 165,00
Millennium 2
20-03-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 292,00
Millennium 1
26-03-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 1.000,00
Millennium 2
26-03-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 7.500,00
Millennium 1
31-03-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 1.740,00
BBVA
31-03-08
Dep Numerário
€ 1.400,00
Millennium 2
11-04-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 100,00
Millennium 2
17-04-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 100,00
Millennium 1
18-04-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 700,00
CGD
18-04-08
Dep c/doc
€ 4.500,00
Millennium 2
29-04-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 9.135,00
Millennium 2
16-05-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 1.000,00
Millennium 2
27-05-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 3.000,00
Millennium 2
28-05-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 1.000,00
BBVA
30-05-08
Dep Numerário
€ 1.400,00
Millennium 2
30-05-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 6.585,62
Millennium 1
30-06-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS - Numerário
€ 2.595,27
BBVA
30-06-08
Dep Numerário
€ 1.500,00
Millennium 2
30-06-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 12.914,73
Millennium 1
08-07-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 1.500,00
CGD
09-07-08
Depósito
€ 400,00
Millennium 2
14-07-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 2.000,00
Millennium 1
17-07-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 700,00
Millennium 2
17-07-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 5.025,00
Millennium 2
17-07-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 9.000,00
Millennium 2
17-07-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 10.500,00
Millennium 2
28-07-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 7.500,00
Millennium 1
31-07-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 1.871,00
BBVA
31-07-08
Dep Numerário
€ 1.400,00
Millennium 2
31-07-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 11.614,00
Millennium 2
01-08-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 4.000,00
Millennium 2
12-08-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 6.060,00
Millennium 1
29-08-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 2.590,00
BBVA
29-08-08
Dep Numerário
€ 1.500,00
Millennium 2
29-08-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 8.745,00
CGD
04-09-08
Depósito
€ 500,00
Millennium 2
12-09-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 1.370,00
BBVA
30-09-08
Dep Numerário
€ 2.000,00
Millennium 2
30-09-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 8.960,00
Millennium 1
13-10-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 1.875,00
Millennium 2
14-10-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 1.375,00
Millennium 2
23-10-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 10.000,00
BBVA
31-10-08
Dep Numerário
€ 1.500,00
Millennium 2
31-10-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 100,00
Millennium 2
31-10-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 865,00
CGD
07-11-08
Depósito
€ 1.400,00
Millennium 1
12-11-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 3.000,00
Millennium 2
12-11-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 4.000,00
Millennium 1
28-11-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 1.890,00
BBVA
28-11-08
Dep Numerário
€ 2.500,00
Millennium 1
19-12-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 1.000,00
Millennium 2
19-12-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 2.000,00
BBVA
31-12-08
Dep Numerário
€ 1.400,00
Total 2008
€ 227.637,27
Millennium 1
26-01-09
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 700,00
Millennium 2
13-02-09
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 5.000,00
BBVA
26-02-09
Dep Numerário
€ 1.500,00
Millennium 1
27-02-09
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 2.600,00
Millennium 2
13-03-09
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 5.000,00
Millennium 1
30-03-09
Depósito Numerário 2250900 12350221184
€ 500,00
Millennium 1
30-03-09
Depósito Numerário 2250900 12350221187
€ 600,00
Millennium 1
30-03-09
Depósito Numerário 2250900 12350221189
€ 600,00
Millennium 1
30-03-09
Depósito Numerário 2250900 12350221191
€ 600,00
BBVA
01-04-09
Dep Numerário
€ 76,85
Millennium 2
21-04-09
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 4.675,00
CGD
30-04-09
Depósito
€ 1.750,00
Millennium 2
05-06-09
Dep Num/CHQS MBCP/VIS
€ 6.900,00
Millennium 2
08-06-09
Dep Num/CHQS MBCP/VIS
€ 500,00
Millennium 2
19-06-09
Dep Num/CHQS MBCP/VIS
€ 8.150,00
Millennium 2
20-08-09
Dep Num/CHQS MBCP/VIS
€ 5.000,00
Millennium 2
23-10-09
Dep Num/CHQS MBCP/VIS
€ 3.875,00
Millennium 2
27-11-09
Dep Num/CHQS MBCP/VIS
€ 3.710,00
CGD
27-11-09
Depósito
€ 1.500,00
BBVA
30-11-09
Depósito Numerário
€ 1.400,00
Millennium 2
29-12-09
Dep Num/CHQS MBCP/VIS
€ 3.000,00
CGD
29-12-09
Depósito
€ 3.200,00
Total 2009
€ 60.836.85


IV - 2 Notificação a A…………. para identificar a fonte dos depósitos em numerário
Em 15-07-2011, notifiquei A………… para, entre outras situações:
- Identificar comprovadamente, a origem dos depósitos em numerário efectuados nas suas contas bancárias (ponto 1.1 da Notificação);
- Justificar esses depósitos, comprovadamente, e se os mesmos se encontram excluídos da sujeição a imposto sobre o rendimento das pessoas singulares ou se foram sujeitas a outro imposto (ponto 1.2 da Notificação).
Nota: Existindo uma divergência não declarada entre o acréscimo do património do sujeito passivo e os rendimentos não declarados, nos termos previsto no artº 87º alínea f) da LGT cabe ao mesmo a comprovação de que correspondem à realidade os rendimentos declarados e de que é outra a fonte das manifestações de fortuna ou do acréscimo de património ou da despesa efectuada (artº 89ºA, nº 3 da LGT)

Em resposta, A……….. afirmou que sendo os depósitos em numerário “não será possível ter algum comprovativo da sua origem. Deste modo, solicito que me clarifiquem exactamente o que pretendem”. Mas que os mesmos “decorrem de poupanças que fui acumulando ao longo dos anos” e que “resultaram de rendimentos declarados
“É que o montante de depósitos, corresponde, na maioria das situações, a valores reembolsados pela B…………. relativamente a montantes que eu havia colocado naquela empresa para fazer face ás suas dificuldades.”

Face ao exposto, verifica-se que não foi exibido qualquer comprovativo sobre a fonte do acréscimo verificado.

IV - 3) Notificação a A…………. para indicar qual a repartição que cabe a cada titular nos depósitos efectuados nas contas bancárias co-tituladas com C…………

Em 15-07-2011, notifiquei A………… para:
- Em relação às contas bancárias co-tituladas com o sujeito passivo C………. (BBVA. Millennium 2 e CGD), indicar comprovadamente qual a repartição que cabe a cada um nos depósitos (ponto 1.3 da Notificação)

Em resposta, de 29-07-2011, A……….. afirmou que a parte que lhe cabe nessas contas bancárias é a seguinte:
Conta bancária
Percentagem
BBVA
100%
Millennium 2
0%
CGD1
50%



A mesma acrescentou que, em relação à conta do Millennium 2, “nem a correspondência é remetida para a minha morada, nem disponho de cheques ou cartões de crédito relativamente a esta conta. O contrário se passa em relação à conta Millennium 1 que somente a mim pertence, sendo, aliás, a correspondência enviada para a minha morada”.
O sujeito passivo C………… também foi notificado para o mesmo efeito e confirmou a repartição dos valores dos depósitos que foi indicado por A………….
Além das respostas dos sujeitos passivos constata-se igualmente o seguinte.
- conta BBVA
- A primeira titular da conta é A…………;
- A movimentação desta conta bancária diz respeito quase integralmente a um empréstimo de €300.000,00 (crédito intercalar para a aquisição de um imóvel, segundo A………..), já existente em 01-01-2008, e que foi liquidado em 01-04-2009, através de depósito de cheque bancário n°3072372141, de 31-03-2009, no montante de €301.848,48, debitado da conta CGD 1.
O valor deste depósito corresponde, em valor, a mais de 90% da totalidade dos depósitos efectuados nessa conta bancária, agregando 2008 e 2009, e foi obtido por A………. através de financiamento na CGD.
Este financiamento, no montante de €550.000,00, destinou-se à aquisição de imóvel por A……….. (exclusivamente), tendo sido utilizado da seguinte forma, na data da escritura de compra/venda:
- pagamento do valor remanescente do imóvel;
- liquidação de empréstimo anterior obtido para o mesmo efeito.

Dado que as entradas nesta conta bancária têm origem em factos relacionados com A……… e a assunção pelas partes (C……….. e A………) que a movimentação e titularidade efectiva da mesma é da responsabilidade da contribuinte em análise, considera-se mesma será propriedade exclusiva de A………...

- conta Mlllennium 2

a) O primeiro titular da conta é C…………
b) É a conta bancária que recebeu mais depósitos provenientes da B…………, em 2008 e 2009, no montante total de €566.850,00, sendo que C…………. é titular, em 31-12-2008 e 31-12-2009, de 97% do capital social dessa sociedade;
c) No primeiro extracto desta conta bancária com referência a 2008 (Janeiro), verifica-se que a mesma está associada a nove créditos mobiliários.
Consultado o sistema informático da DGCI (Modelo 11/Património), verificou-se que o sujeito passivo C……….. contraiu diversos empréstimos com hipoteca, junto do Millennium BCP, referentes aos imóveis indicados no quadro seguinte, em relação aos quais é possível associar aos créditos indicados no extracto bancário da conta em análise:


Valor da Dívida ao Millennium
em 31-01-2008
Mútuos com hipoteca contraídos por C……… junto do Millennium
Data
Montante
Artigo Matricial
Fracção
Localização
97.180,24 €
20-12-2004
€ 100.000,00
5428
D
Canidelo/VN Gaia
46.338,49 €
20-12-2004
€ 47.500,00
5428
D
75.984,38 €
18-01-2007
€ 76.640,00
8482
F
Oliv. Douro/VN Gaia
179.370,13 €
11-05-2007
€ 180.720,00
1201
B
Porto Salvo/Oeiras
49.748,20 €
30-05-2007
€ 50.000,00
4365
AT
Oliv. Douro/VN Gaia
7.462,73 €
30-05-2007
€ 7.500,00
4365
AT
93.700,00 €
25-01-2008
€ 93.700,00
6722
G
Canidelo/VN Gaia
41.300,00 €
25-01-2008
€ 41.300,00
6722
G
143.896,63 €
11-12-2007
€ 144.000,00
19430
U
Porto Salvo/Oeiras


Deste modo, conclui-se que os créditos à habitação constantes desta conta bancária estão relacionados com C………. e não com A………...

Por outro lado, verificou-se que um dos prédios que é propriedade de A……….. foi também adquirido através de crédito obtido junto do Milllennium BCP, conforme resulta da consulta ao sistema informático da DGCI (Modelo 11/Património).
Contudo, este crédito está associado à conta bancária Millennium 1 e não Millennium 2 (conta em análise), o que vem corroborar a alegação de que a conta Millennium 1 é, de facto, da responsabilidade exclusiva de A………., enquanto que a conta Millennium 2, embora seja “titulado por ambos os sujeitos passivos, materialmente relaciona-se com os “negócios” de C………...


Valor da Dívida ao Millennium 1 em 31-01-2008Mútuos com hipoteca contraídos por C……… junto do Millennium
Data
Montante
Artigo Matricial
Fracção
Localização
€ 143.365,85
05-06-2007
€ 144.000,00
790
R/C e 1º
Porto Salvo/Oeiras


Face ao exposto e tendo em conta a assunção pelas partes (C……….. e A………..) que a movimentação e titularidade efectiva da mesma é da responsabilidade de C………., entende-se considerar que os depósitos realizados na mesma não pertencem a A………..

IV - 4) Divergência existente entre os rendimentos declarados e o acréscimo de património de A…………

Em relação aos depósitos totais em numerário elencados no ponto IV -1) e tendo em consideração o disposto no ponto anterior, são excluídos do incremento patrimonial de A……….. os depósitos em numerário verificados na conta Millennium 2 e metade do valor dos depósitos efectuados na conta CGD, de que resulta;


Conta
Bancária
Data
Descritivo
Montante
CGD
07-01-08
Dep c/doc
€ 2.250,00
Millennium 1
21-01-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 1.515,00
Millennium 1
31-01-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 3.000,00
Millennium 2
07-02-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 1.175,00
CGD
27-02-08
Dep c/doc
€ 2.250,00
CGD
07-03-08
Dep c/doc
€ 2.250,00
CGD
07-03-08
Dep c/doc
€ 690,00
Millennium 1
26-03-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 1.000,00
Millennium 1
31-03-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 1.740,00
BBVA
31-03-08
Dep Numerário
€ 1.400,00
Millennium 1
18-04-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 700,00
CGD
18-04-08
Dep c/doc
€ 2.250,00
BBVA
30-05-08
Dep Numerário
€ 1.400,00
Millennium 1
30-06-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS -Numerário
€ 2.595,27
BBVA
30-06-08
Dep Numerário
€ 1.500,00
Millennium 1
08-07-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 1.500,00
CGD
09-07-08
Depósito
€ 200,00
Millennium 1
17-07-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 700,00
Millennium 1
31-07-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 1.871,00
BBVA
31-07-08
Dep Numerário
€ 1.400,00
Millennium 1
29-08-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 2.590,00
BBVA
29-08-08
Dep Numerário
€ 1.500,00
CGD
04-09-08
Depósito
€ 250,00
BBVA
30-09-08
Dep Numerário
€ 2.000,00
Millennium 1
13-10-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 1.875,00
BBVA
31-10-08
Dep Numerário
€ 1.500,00
CGD
07-11-08
Depósito
€ 350,00
Millennium 1
12-11-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 3.000.00
Millennium 1
28-11-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€1.890,00
BBVA
28-11-08
Dep Numerário
€ 2.500,00
Millennium 1
19-12-08
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 1.000,00
BBVA
31-12-08
Dep Numerário
€ 1.400,00
Total 2008
€ 51.241,27
Millennium 1
26-01-09
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 700,00
BBVA
26-02-09
Dep Numerário
€ 1.500,00
Millennium 1
27-02-09
Dep_Num/CHQS MBCP/VIS
€ 2.600,00
Millennium 1
30-03-09
Depósito Numerário 2250900 12350221184
€ 500,00
Millennium 1
30-03-09
Depósito Numerário 2250900 12350221187
€ 600,00
Millennium 1
30-03-09
Depósito Numerário 2250900 12350221189
€ 600,00
Millennium 130-03-09Depósito Numerário 2250900 12350221191
€ 600,00
BBVA01-04-09Dep Numerário
€ 76,85
CGD30-04-09Depósito
€ 875,00
CGD27-11-09Depósito
€ 750,00
BBVA30-11-09Dep Numerário
€ 1.400,00
CGD29-12-09Depósito
€ 1.600,00
Total 2009
€ 11.801,85
Nota: Os depósitos na conta bancária CGD estão indicados em metade do seu valor


Em termos anuais, os depósitos em numerário verificados em contas bancárias de A………… foram de:


Exercício
Depósitos em numerário
2008
51.241,27 €
2009
11.801,85 €


IV - 5) Verificação de pressupostos para avaliação indirecta da matéria colectável com referência a 2008

Nos termos do art.°57°, n.°1, da Lei Geral Tributária, com redacção à data dos factos, pode efectuar-se avaliação indirecta do rendimento colectável quando exista uma divergência não justificada de, pelo menos, um terço entre os rendimentos declarados e o acréscimo de património ou o consumo evidenciados pelo sujeito passivo no mesmo período de tributação.
Confrontado os dados indicados nos capítulos anteriores deste Relatório:


Rubrica
Exercício de 2008
Rendimentos Declarados
€ 16.300,00 *
Rendimentos Declarados + 1/3 Rendimentos Declarados
€ 21.733,33
Acréscimo de Património (a+b)
€ 67.541,27
- rendimentos declarados (a)
€ 16.300,00
- depósitos em numerário (b)
€ 51.241,27
* ver ponto II - B. 3) - os rendimentos de trabalho dependente e rendimentos prediais não foram pagos em numerário mas sim através de meio de pagamento em que é possível identificar a sua origem: B……… e D……….., Lda, contribuinte n° ………..



Dado que em 2008 o valor de acréscimo patrimonial (€67.541,27) diverge em mais de que um terço dos rendimentos declarados acrescidos de um terço (€21.733,33) e a depositante não justificou a origem desse acréscimo, conforme define o artº 89ºA, n.° da LGT, n°3, “cabe ao sujeito passivo a comprovação de que correspondem à realidade os rendimentos declarados e de que é outra a fonte das manifestações de fortuna ou o acréscimo de património ou o consumo evidenciados”, verificam-se os pressupostos para avaliação indirecta do rendimento colectável de A…………

Nota - Os pressupostos para avaliação indirecta não se aplicam ao exercício de 2009, desde logo porque o acréscimo patrimonial verificado foi inferior ao mínimo exigível de €100.000,00, conforme disposto no artº 87º, alínea f), da LGT com a redacção em vigor para esse ano (diferente da redacção aplicável a 2008)

V – CRITÉRIOS E CÁLCULOS DOS FACTOS QUE IMPLICAM O RECURSO A MÉTODOS INDIRECTOS


Nos termos do art.° 89.°A, n°5, da LGT:
No caso da alínea f) do a digo 87.º, considera-se como rendimento tributável em sede de IRS, a enquadrar na categoria G, quando não existam indícios fundados, de acordo com os critérios previstos no artigo 90º que permitam à administração tributária fixar rendimento superior, a diferença entre o acréscimo de património ou o consumo evidenciados e os rendimentos declarados pelo sujeito passivo no mesmo período de tributação.

Deste modo, a quantificação do incremento patrimonial não justificado será obtida a partir dos cálculos elencados no próximo quadro, com base nos factos já mencionados no capítulo anterior

Exercício Acréscimo de Património
(a)
Rendimentos Declarados (b)Acréscimo Patrimonial não Justificado (c=b-a)
2008
€ 67.541,27
€ 16.300,00
€ 51.241,27

Conclui-se assim que o acréscimo patrimonial não justificado que foi obtido por “A………., no valor de €51.241,27, em 2008, constitui rendimentos de categoria G Incrementos Patrimoniais, nos termos do art.°9°, n°1, alínea d), e art°9°, n.°3, do código do IRS (montante a acrescer aos rendimentos declarados pela contribuinte).
(…)
lX-- Direito de audição
Em 14-10-2011 (dentro do prazo legal), deu entrada na Direcção de Finanças do Porto um documento através do qual foi exercido o Direito de Audição de A……….. (Entrada n.º 048829).
Nesse documento a contribuinte expõe a sua não concordância quanto às correcções propostas, com base nas alegações que a seguir se encontram resumidas e comentadas no que se entende ser materialmente relevante.
(…)
Pontos 35 a 50
A Exponente não comprovou a origem dos 88 depósitos em numerário, no montante de € 51.241,27, porque não é possível apresentar qualquer comprovativo, na medida em que estão em causa depósitos em numerário, conforme já expresso pela mesma em resposta à notificação que lhe foi efectuada.
Nos termos do art° 89.° da Lei Geral Tributária, cabe ao sujeito passivo comprovar que correspondem à realidade os rendimentos declarados e de que é outra a fonte das manifestações de fortuna ou o acréscimo de património evidenciado.
Considera a exponente que nunca havia sido concedido a possibilidade à exponente de dar tal justificação.
Ora, para além das poupanças que juntou no passado, esta recebeu € 72.500,00 da sociedade E…………, SA., na sequência da alienação de participações que efectuou em 2006 sendo que este montante ultrapassa consideravelmente o montante de €51.241,27, cuja origem se questiona.
Pelo que não há qualquer divergência entre o património/despesa da Exponente e os rendimentos declarados que não seja devidamente justificada.
Comentário: A contribuinte A……….. considera que nunca teve a possibilidade de dar explicação sobre seu acréscimo patrimonial.
Contudo, a mesma foi notificada, em 15-07-2011 (ponto 1 da Notificação), para justificar o incremento patrimonial detectado, sendo dado nota nessa notificação de que existindo uma divergência não declarada entre o acréscimo de património e os rendimentos declarados, cabe ao mesmo a comprovação de que correspondem à realidade os rendimentos declarados e de que é outra a fonte das manifestações de fortuna ou acréscimo de património ou da despesa efectuada, nos termos do art.º 87.º alínea f), e art.° 89.°A, n.º 3 da LGT (em anexo — folhas 14 a 17);
Quanto ao recebimento € 72.500,00 da sociedade E……….. SA., este montante foi entregue a A……….. através do cheque n.° 5431700084, sobre o FINIBANCO, emitido em 12-02-2008, e depositado na conta bancária que A……….. possui no FINIBANCO (Conta n.º 33024106101), em 13-02-2008 (em anexo — folhas 18 a 21).
Nota: Como nesta conta bancária não foram identificados depósitos em numerário, a mesma não se encontrava ainda identificada neste Relatório.
Isto é, não existe qualquer relação entre este depósito proveniente da E……….. SA. e os depósitos em numerário em análise, pelo que não se entende a justificação apresentada por A………...
Face ao aposto, entende-se ser de manter as correcções propostas no Projecto de Relatório de Inspecção Tributária
(...) - idem.

C) Em 2008, a recorrente recebeu da sociedade “E…………, S.A.” a quantia de 72.500,00 €, através do cheque n.° 5431700084, sacado sobre o Finibanco, emitido em 12/02/2008. — cfr. anexo n.° 18 do Relatório de Inspecção, fls 43 do PA apenso aos autos.

D) Em 13/02/2008 o cheque referido em C) foi depositado na conta bancária n.° 33024106101 de que a recorrente é titular no Finibanco — cfr. anexos 19 e 20 do Relatório de Inspecção, fls 44/45 do PA apenso aos autos.

E) Na sequência da acção inspectiva referida na alínea A), em 07/11/2011 o Senhor Director de Finanças do Porto proferiu acto de fixação do rendimento tributável referente ao ano de 2008, com o seguinte teor:
Nos termos do n.° 2 do art.° 65° do código de IRS e de acordo com o disposto na alínea f) do n.° 1 do art.° 87° e do n.° 5 do art° 89.° A, ambos da LGT, fixo o rendimento tributável no montante de € 63.860,63 (sessenta a três mil oitocentos e sessenta euros e vinte e sessenta e três cêntimos), sendo 51.241,27 (cinquenta e um mil duzentos e quarenta e um euros e vinte e sete cêntimos) a enquadrar na categoria G, conforme art.° 9.° do código do IRS, o valor de 800,00 (oitocentos euros), na categoria F, e 11.819,36 (onze mil oitocentos e dezanove euros e trinta e seis cêntimos) na categoria A, conforme declaração apresentada pelo sujeito passivo”, — cfr fls 47 do PA apenso.
F) Em 07/11/2011 foi remetido, por carta registada com aviso de recepção, o oficio n.° 66021/0505, recepcionado em 08/11/2011, dando conhecimento à recorrente do teor do relatório de inspecção tributária e da fixação por métodos indirectos do conjunto de rendimentos líquidos relativamente ao IRS do ano de 2008, no montante de 63.860,63 € - cfr fls 48/49 dos autos.

G) O presente recurso deu entrada neste Tribunal em 25/11/2011. — cfr. carimbo aposto a fls 1 dos autos.

3 – DO DIREITO

A meritíssima juíza do TAF do Porto julgou o recurso improcedente por entender que:
(destacam-se apenas os trechos da decisão com interesse para o presente recurso)
I. Relatório
A………….., NIF ……….., residente na ……….., n.° …….., 4100 — …….. Porto, vem, nos termos do artigo 89.°- A, n.°s 7 e 8 da LGT, interpor recurso judicial da decisão do Senhor Director de Finanças do Porto, datada de 07/11/2011, que lhe fixou o rendimento colectável por métodos indirectos, para efeitos de IRS, do ano de 2008, no montante de 51.241,27€.
Como fundamento da sua pretensão alega, em essência, que não se verifica qualquer divergência entre o seu património/despesa e os rendimentos declarados que não se encontre devidamente justificada, uma vez que recebeu, no ano de 2008, o montante de 72.500,00 € da sociedade E…………, S.A., através do cheque n.° 543170084, sobre o Finibanco, na sequência da alienação de participações que efectuou em 2006.
Conclui, deste modo, que não se encontram reunidos os pressupostos para a avaliação indirecta nos termos da alínea f) do n.° 1 do artigo 87.° da LGT.
Acrescenta que ainda que se justificasse o recurso à avaliação indirecta a sua quantificação está errada, porquanto apenas se poderia considerar como acréscimo patrimonial não justificado a diferença entre os montantes depositados - 51.241,27 € - e os rendimentos declarados — 16.300,00 € -, que corresponderia a 34.941,27 €, uma vez que já incidiu IRS sobre os rendimentos declarados.
Conclui pedindo a anulação do acto recorrido.

O Senhor Director de Finanças do Porto apresentou oposição, alegando, em síntese, que não bastava à recorrente demonstrar a existência de um qualquer rendimento não sujeito a tributação para comprovar a realidade dos rendimentos declarados, tornando-se igualmente necessário demonstrar a aplicação do fluxo financeiro a que se reporta o acréscimo patrimonial identificado.
Sustenta, assim, que não existe qualquer relação entre o depósito proveniente da sociedade E…………., S.A. e os depósitos em numerário pelo que o acréscimo patrimonial evidenciado não se encontra justificado.
Conclui pugnando pela improcedência do presente recurso.
Notificada da oposição da entidade recorrida, a recorrente veio, por requerimento de fls. 145/158 dos autos “submeter à apreciação deste Tribunal de um vício que, na verdade, não havia sido invocado no requerimento inicial, mas que determina a nulidade da decisão de avaliação da matéria colectável apurada, e da consequente liquidação de imposto.
Invoca agora a nulidade da decisão recorrida por a Administração Tributária ter utilizado de forma ilícita informação bancária da recorrente obtida, com a sua autorização, mas no âmbito de outro procedimento.
Argumenta a recorrente que esta questão, apesar de só agora vir invocada deve ser apreciada pelo Tribunal por se tratar de questão de conhecimento oficioso.
Invoca, em sustento da sua tese, que o princípio do inquisitório, consagrado no artigo 99.° da LGT prescreve que, na fase instrutória, o juiz deve realizar ou ordenar oficiosamente todas as diligências que se lhe afigurem úteis para conhecer a verdade relativamente aos factos alegados ou que oficiosamente pode conhecer.
Acrescenta que, não contendo o processo judicial tributário nenhuma norma que regule especificamente a limitação do juiz às questões alegadas pelas partes, torna-se necessário proceder à integração das normas processuais através do recurso ao direito subsidiário, concluindo, assim, pela aplicação do n.° 2 do artigo 95°, n.° 2 do CPTA.
De qualquer modo, refere, a arguição do vício invocado, determinando a nulidade do acto, pode ser feita pela recorrente a todo o tempo, por força do princípio estabelecido no n.° 3 do artigo 102.° do CPPT, segundo o qual a nulidade dos actos da administração tributária não é sanável pelo decurso do tempo.
Concretizando o vício invocado, sustenta a recorrente que a Administração Tributária utilizou informação bancária respeitante à recorrente obtida, com o seu consentimento, no âmbito do procedimento previsto no artigo 139°, n.° 6 do CIRC.
Deste modo, conclui, a Administração Tributária utilizou a informação bancária obtida noutro procedimento, para os efeitos da alínea f) do artigo 87.° da LGT, sem decisão da entidade competente, sem audição prévia da ora recorrente e, ao não desencadear tal procedimento, sem a garantia da sindicabilidade judicial da decisão, a qual teria efeito suspensivo.

Em sede de contraditório, a entidade recorrida alegou, em suma, que a recorrente pretende alterar a causa de pedir, quando já se encontram estabilizados os elementos essenciais da causa, violando o artigo 268° do CPC, aplicável ex vi artigo 2°, alínea e) do CPPT.
Mais refere que a consequência do vício imputado ao acto recorrido nunca seria a nulidade, mas a mera anulabilidade, pelo que teria de ser invocada no prazo estabelecido no artigo 146.°-B do CPPT, aplicável ex vi artigo 89.°-A, n.°s 7 e 8 da LGT.

O Exm.° Magistrado do Ministério Público emitiu parecer no sentido da improcedência do presente recurso.

II. Questões decidendas

Nos termos do disposto no artigo 660.° do CPC, aplicável ex vi artigo 2.° alínea e) do CPPT, “o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão fica prejudicada pela solução dada a outras. Não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras”. O presente recurso tem por objecto a decisão de avaliação da matéria tributável por métodos indirectos proferida pelo Director de Finanças do Porto, em 07/11/2011, que fixou à recorrente o rendimento tributável, para efeitos de IRS, a enquadrar na Categoria G, do ano de 2008, no montante de 51.241,27 €.
Em sustento da sua pretensão invocou a recorrente a ilegalidade da decisão de determinação da matéria tributável por métodos indirectos e da respectiva quantificação.
Alegou, em suma, que (…)
Notificada do teor da oposição da entidade recorrida, vem a recorrente, por requerimento de fls. 145/158 dos autos, “submeter à apreciação por este Tribunal de um vício que, na verdade, não havia sido invocado no requerimento inicial, mas que determina a nulidade da decisão de avaliação da matéria colectável apurada, e da consequente liquidação de imposto”.
Invoca agora a recorrente a nulidade do despacho recorrido por utilização ilícita da informação bancária, porquanto apenas autorizou a Administração Tributária a aceder aos seus dados bancários, com referência a 2008 e 2009, para validação dos preços de venda pela sociedade B…………, S.A., de diversas fracções imobiliárias que esta alienou no ano de 2009, ao abrigo do procedimento previsto no artigo 139°, n.° 6 do CIRC.
Sustenta, assim, que a Administração Tributária não adoptou o procedimento legalmente estabelecido no artigo 63.°-B da LGT para aceder à informação bancária utilizada para desencadear o procedimento de determinação da matéria colectável por métodos indirectos.
Argumenta que, não obstante não ter sido invocado este vício no requerimento inicial, impõe-se o seu conhecimento pelo Tribunal, já que, para além de estar em causa vício gerador de nulidade e, como tal, invocável a todo o tempo, tal questão é de conhecimento oficioso do Tribunal, atento o princípio do inquisitório plasmado no artigo 99° da LGT.
Convoca ainda a aplicação subsidiária do n.° 2 do artigo 95.° do CPTA que determina que o juiz deve identificar a existência de causas diversas das que tenham sido alegadas.

Em sede de contraditório, a entidade recorrida argumenta que a recorrente pretende proceder à alteração da causa de pedir, num momento em que já se encontram estabilizados os elementos essenciais da causa, violando, por essa via, o disposto no artigo 268.° do CPC, aplicável ex vi artigo 2.°, alínea e) do CPPT.
Acrescenta que, ainda que assim não se entendesse, a consequência do vício imputado ao acto recorrido nunca seria a nulidade, mas a mera anulabilidade, pelo que, não sendo de conhecimento oficioso, teria de ser invocada no prazo estabelecido no artigo 146.° - E do CPPT, aplicável ex vi artigo 89.°-A, n°s 7 e 8 da LGT.
Mais refere que, de qualquer modo, não ocorreu qualquer violação de acesso a informação e documentos bancários, já que a recorrente autorizou e validou a utilização de elementos recolhidos pelos serviços de Inspecção Tributária, tornando, assim, desnecessário o recurso ao procedimento gizado no artigo 63.°-B da LGT, não se afigurando legítimo o entendimento segundo o qual a autorização de acesso do contribuinte apenas serve para aquilo que lhe é favorável.
Em face do exposto, importa, antes de tudo, indagar se a alegada ilegalidade do despacho em crise fundada na utilização ilegítima da informação bancária obtida no âmbito de outro procedimento administrativo pode (e deve) ser conhecida pelo Tribunal.
Vejamos, então.
Acerca do objecto da sentença no âmbito do processo de impugnação judicial, nomeadamente no que concerne aos poderes de cognição do tribunal, Jorge Lopes de Sousa refere o seguinte:
Nos termos dos arts. 660°, n.º 2 661.º, n.º 1 do CPC, para além de questões de conhecimento oficioso, o juiz não pode conhecer na sentença de questões não suscitadas pelas partes, nem condenar em objecto ou quantidade superior ao que tiver sido pedido.
As partes é que circunscrevem o thema decidendum, através do pedido e da defesa. O juiz não tem de saber se porventura, à situação das partes conviria melhor outra providência que não a solicitada, ou se esta poderia fundar-se noutra causa petendi.
Em processos anulatórios, cada um dos vícios imputados ao acto impugnado constitui uma causa de pedir, como se conclui do preceituado na parte final do n.° 4 do art 498 ° do CPC, em que se estabelece nas acções de anulação a causa de pedir é a “nulidade especifica que se invoca para obter o efeito pretendido”.
Assim, se for pedida apenas a anulação parcial de um acto tributário, com fundamento em determinado vício, o tribunal não poderá, em princípio, anulá-lo integralmente.
Por outro lado não basta que haja coincidência ou identidade entre o pedido e o julgado; á necessário, além disso que haja identidade entre a causa de pedir (causa petendi) e a causa de julgar (causa judicandi).
Por isso se for pedida a anulação de um acto de liquidação com base em determinado vício gerador de mera anulabilidade (causa de pedir no processo de impugnação judicial), não pode o tribunal anular o acto impugnado com fundamento em vício diferente, não invocado.
Excepção a estas limitações dos poderes de cognição ocorrem em matéria de nulidades, pois trata-se de vícios de conhecimento oficioso, que o tribunal pode apreciar independentemente de serem invocados (an. 134.º n.° 2 do CPA) (...)”.
Acrescenta adiante: “Os poderes de cognição do tribunal são, em regra, delimitados pelos factos alegados, salvo quanto a questões de conhecimento oficioso (arts. 99.° n.°1, da LGT e 13.º n.°1 do CPPT).
No entanto, não carecem de alegação nem prova os factos notórios, que são os que são do conhecimento geral, nem os factos de que o tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções, que sejam comprováveis documentalmente (arts. 264.º n.° 1, e 514.º do CPC), nem os factos indiciadores de uso anormal do processo (art.° 665.º do CPC).
O tribunal tomará também em atenção os factos instrumentais que resultem da instrução e discussão da causa (art. 264. n.° 2 do CPC).
Para além disso, o tribunal pode tomar em consideração os factos essenciais à procedência das pretensões formuladas ou das excepções deduzidas que sejam complemento ou concretização de outros que as partes hajam oportunamente alegado e resultem da instrução e discussão da causa, desde que a parte interessada manifeste vontade de deles se aproveitar e à parte contrária tenha sido facultado o exercício do contraditório (art. 264.º n°3, do CPC).
A utilização pelo tribunal, para a resolução de questões colocadas pelas partes, de factos não alegados que não são de conhecimento oficioso não constitui uma nulidade da sentença, mas sim uma violação do princípio do dispositivo, enunciado no art. 264.º do CPC. (in Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Volume II, Áreas Editora, 2011, págs. 318/319).
Pese embora tais considerações se reportem ao processo de impugnação judicial, não vemos razões para não as aplicar em matéria de recurso da decisão de determinação da matéria tributável por métodos indirectos.
Vejamos, então, se a questão entretanto invocada pela recorrente pode ser conhecida pelo Tribunal.
Relembremos que a recorrente começou por invocar como fundamento do recurso a ilegalidade da decisão de determinação da matéria tributável por métodos indirectos por não se encontrarem reunidos os pressupostos legais previstos na alínea f) do artigo 87.° da LGT, já que comprovou, como lhe competia, nos termos do n.° 3 do artigo 89.° da LGT que os rendimentos declarados correspondiam à realidade e que o acréscimo patrimonial evidenciado provinha da alienação de participações sociais efectuada à sociedade E……….., S.A. em 2006.
Em ponto algum do articulado a recorrente invoca como fundamento de anulação da decisão recorrida a utilização ilegítima da informação bancária por parte da Administração Tributária.
Aliás, como a própria recorrente reconhece só, posteriormente, em sede de resposta à oposição deduzida pela entidade recorrida, veio submeter essa questão à apreciação do Tribunal.
Ora, por força do artigo 89.°-A, n.° 6 da LGT e 146.°-B, n.° 5 do CPPT, o recurso da decisão de avaliação da matéria tributável de IRS por métodos indirectos rege-se, com as devidas adaptações, pelo regime previsto para o recurso da decisão de acesso directo da administração tributária à informação bancária dos sujeitos passivos, no artigo 146.°-B do CPPT.
Nos termos do disposto no n,° 2 do citado artigo 146.°-B, a petição tem de ser apresentada no prazo de 10 dias a contar da data em que o contribuinte foi notificado da decisão, devendo indicar sumariamente as razões da sua discordância com a decisão da administração tributária de proceder à avaliação da matéria tributável de IRS por métodos indirectos (n.° 1 do mesmo preceito), bem como os meios de prova, nomeadamente se pretender questionar a factualidade subjacente à decisão (n.° 3 do dito preceito).
Assim sendo, a menos que esteja em causa uma questão de conhecimento oficioso, a apreciação da questão invocada pela recorrente em momento posterior à apresentação da petição do recurso está vedada ao Tribunal.
A recorrente invoca em primeira linha o princípio do inquisitório, plasmado no artigo 99.° da LGT.
Ora, decorre do n.° 1 citado artigo 99.° da LGT que “o tribunal deve ordenar ou realizar oficiosamente todas as diligências que se lhe afigurem úteis para conhecer a verdade relativamente aos factos alegados ou de que oficiosamente pode conhecer”.
No mesmo sentido, prescreve o n.° 1 do artigo 13.° do CPPT que “aos juízes dos tribunais tributários incumbe a direcção e julgamento dos processos da sua jurisdição, devendo realizar ou ordenar todas as diligências que considere úteis ao apuramento da verdade relativamente aos factos que lhes seja lícito conhecer”.
Este princípio tem de ser concatenado como princípio do dispositivo, segundo o qual recai sobre as partes o ónus de alegar.
Com efeito, fora dos casos de conhecimento oficioso o tribunal apenas pode servir-se de factos alegados pelas partes e apreciar e decidir as questões que estas lhe apresentem.
Quer isto dizer que o princípio do inquisitório não autoriza o juiz a servir-se de factos não alegados, pois que reporta-se à prova e não à sua alegação.
Por essa razão, não pode o princípio do inquisitório consistir num meio para suprir insuficiências verificadas na alegação dos factos e na invocação das questões.
Como tal, não acompanhamos a argumentação expendida pela recorrente segundo a qual o processo judicial tributário se estrutura apenas segundo o princípio da investigação, e não de acordo com o princípio do dispositivo, sendo o único interesse a promover o interesse público de tributação de acordo com a lei, ficando, assim, as partes desoneradas do seu ónus de alegação.
Na verdade, tal princípio apenas vale em absoluto, sem restrição a qualquer alegação de factos, no domínio do direito sancionatório público, onde o princípio da verdade material se afirma como princípio estruturante.
Não colhe, por esta via, a argumentação da recorrente.
Invoca ainda a recorrente a aplicação subsidiária da norma constante do artigo 95º n.° 2 do CPTA, que determina que “nos processos impugnatórios, o tribunal deve pronunciar-se sobre todas as causas de invalidade que tenham sido invocadas contra o acto impugnado, excepto quando não possa dispor dos elementos indispensáveis para o efeito, assim como deve identificar a existência de causas de invalidade diversas das que tenham sido alegadas, ouvidas as partes para alegações complementares pelo prazo comum de 10 dias, quando o exija o respeito pelo princípio do contraditório”.
Também aqui entendemos que a recorrente carece de razão.
É certo que, estando em causa um “recurso” de decisões da Administração, deverão aplicar-se subsidiariamente, ao abrigo do artigo 2.° alínea c), as regras do CPTA que regulam as acções administrativas especiais de impugnação de actos administrativos (artigos 46.° e ss.).
No entanto, tratando-se de um processo especial com tramitação célere e simplificada afigura-se-nos que apenas necessitará de ser integrado com normas de aplicação subsidiária no que concerne aos requisitos da petição inicial (cfr., nesse sentido, Jorge Lopes de Sousa, in obra citada, pág. 559).
Quanto ao demais, reger-se-á pelas regras previstas para o recurso das decisões da Administração Tributária de acesso directo à informação bancária dos sujeitos passivos, constantes do artigo 146.°-B do CPPT, ex vi artigo 89.°-A, n.° 6 da LGT.
Entendemos, pois, que não há que convocar em sede de recurso da decisão da matéria tributável por métodos indirectos, ao abrigo do artigo 89.°-A da LGT, a norma constante do artigo 95.°, n.° 2 do CPTA.
Refere, finalmente, a recorrente que sendo o vício ora invocado determinante de nulidade, podia ser invocado a todo o tempo.
Como é sabido, em matéria de invalidade dos actos administrativos a regra é a da anulabilidade, apenas existindo nulidade quando se verifique a falta de qualquer dos elementos essenciais do acto ou quando houver lei que expressamente preveja esta forma de invalidade (cfr. artigos 133.°, n.° 1 e 135.° do CPA).
Como se refere no acórdão do STA de 30/11/2011, proferido no processo n.° 0894/10, “(...) optou-se, ali, por um regime misto na previsão dos vícios que conduzem à nulidade do acto administrativo: admitiu-se o critério da nulidade por natureza (princípio da cláusula geral), mas, por outro lado, combinou-se este critério com o da enumeração exemplificativa - a chamada nulidade por determinação da lei. Como ensinam Aroso de Almeida e Fernandes Cadilha (Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, vol I pag. 247) “a nulidade constitui o regime de excepção, ao passo que a anulabilidade é o regime-regra. É o que se depreende do disposto no artigo 135° do CPA, segundo o qual são anuláveis os “actos administrativos praticados com ofensa dos princípios ou normas jurídicas aplicáveis para cuja violação se não preveja outra sanção.” (...) A anulabilidade constitui uma forma de invalidade do acto administrativo que se reconduz à violação de uma regra ou de um princípio jurídico de natureza formal (de competência, de forma ou de trâmite) ou substantiva. No primeiro grupo, incluem-se:
(a) a violação de regras relativas à competência do autor do acto, quando não envolvam as situações extremas de falta de atribuições, geradores de nulidade (incompetência relativa); (b) vícios de forma, que poderão consistir na preterição de formalidades no âmbito do procedimento administrativo (arts. 54° e segs. do CPA), na omissão ou deficiência respeitante à forma do acto (art. 120° do CPA), desde que não se reconduza à carência absoluta da forma legal ou na omissão ou deficiência atinente à enunciação do objecto e dos elementos do acto (art. 123° do CPA)”. Em suma, serão, pois, nulos os actos tributários a que falte algum dos seus elementos essenciais (elementos essenciais dos actos tributários serão aqueles que sejam necessários para assegurar a sua exequibilidade) e os actos indicados no n°2 do art. 133° do CPA, entre os quais constam os que ofendam o conteúdo essencial de um direito fundamental e os que ofendam os casos julgados (...)”.
Importa, pois, aquilatar se o acto impugnado ofende o conteúdo essencial de um direito fundamental.
Como salienta Jorge Lopes de Sousa “não é qualquer ofensa de um direito fundamental que a alínea d) do n.° 2 do artigo 133.º do CPA, mas apenas as ofensas do seu conteúdo essencial
Uma ofensa deste tipo só ocorrerá quando perante ela o direito fundamental afectado fique sem expressão prática apreciável, o que não é o caso de uma liquidação ilegal, que apenas atinge limitadamente o direito de propriedade dos seus destinatários.
Por outro lado, entre as violações possíveis de direitos por normas tributárias, a sanção mais grave da nulidade, por razões de proporcionalidade; terá de ser reservada para os actos que representam mais graves violações dos direitos tributários” (cfr. obra citada, pág. 330).
Não constitui tarefa fácil aferir quando ocorre ofensa do conteúdo essencial de um direito fundamental.
Segundo Jorge Miranda, “o conteúdo essencial deve ser entendido como um limite absoluto correspondente à finalidade ou ao valor que justifica o direito” (“Manual de Direito Constitucional”, Tomo IV, 3.ª Edição, 2000, pág. 341).
Assim sendo, só se verifica a violação do conteúdo essencial de um direito fundamental quando, em consequência do acto administrativo, não subsiste o mínimo sem o qual o direito não pode subsistir (cfr. acórdão do TCA- Sul de 06/05/2010, proferido no processo n.° 06108/10).
Ora, a recorrente alega que a Administração Tributária fixou a matéria tributável por métodos indirectos com base em prova obtida ilicitamente e sem precedência dos procedimentos legalmente obrigatórios, violando deste modo, o seu direito fundamental à reserva da intimidade da vida privada, consagrado do artigo 26.° da CRP.
E que uma interpretação dos artigos 63.°-B da LGT e 139.°, n.° 6 do CIRC no sentido de que o conhecimento de dados bancários do sujeito passivo para efeitos do procedimento previsto no artigo 139.° do CIRC permite que esse conhecimento seja utilizado para efeitos da alínea f) do artigo 87.° da LGT, sem necessidade de seguir o procedimento estabelecido no artigo 63.° - B da LGT, seria manifestamente inconstitucional por violar os n.°s 1 e 2 do artigo 26.° da CRP.
É inquestionável que o direito à reserva da vida privada tem assento constitucional (artigo 26°, n.° 1 da CRP), assumindo a natureza de um direito fundamental.
Todavia, tal direito não é irrestrito ou absoluto, podendo ser sujeito a restrições ou condicionamentos, desde que salvaguardado o conteúdo essencial do direito.
Por essa razão, o legislador é particularmente exigente na definição dos pressupostos do acesso à informação bancária dos sujeitos passivos por parte da Administração, exigindo-se a fundamentação com expressa menção dos motivos que justificam a decisão de derrogação do sigilo bancário e reservando-se o poder de decidir aos dirigentes máximos da Administração Tributária sem possibilidade de delegação de competências (cfr. artigo 63.° - B da LGT).
Afigura-se-nos, porém, que ainda que possa considerar-se ocorrer, in casu, uma violação do direito à reserva da vida privada, tal violação não atinge uma intensidade chocante que fira o acto da nulidade absoluta e insanável cominada no artigo 133°, n.° 2, alínea d) do CPA.
E ainda que se admita que, como alega a recorrente, a interpretação dos artigos 63.°-B da LGT e 139°, n.° 6 do CIRC no sentido de que o conhecimento de dados bancários do sujeito passivo para efeitos do procedimento previsto no artigo 139,° do CIRC permite que esse conhecimento seja utilizado para efeitos da alínea f) do artigo 87.° da LGT, sem necessidade de seguir o procedimento estabelecido no artigo 63.°-B da LGT, é inconstitucional por violação do artigo 26.° da CRP, daí não decorre a nulidade do acto em crise.
De facto, como constitui entendimento jurisprudencial pacífico e reiterado os actos que apliquem normas inconstitucionais, padecendo de vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de direito, geram a mera anulabilidade do acto, salvo se ocorrer ofensa do conteúdo essencial de um direito fundamental, o que, como vimos, não sucede no caso em apreço.
Deste modo, sendo o vício apontado ao acto impugnado sancionado com a mera anulabilidade, tal questão não é de conhecimento oficioso, estando a sua arguição sujeita ao prazo previsto no artigo 146.°-B do CPPT.
Em face de tudo quanto vem explanado, impõe-se concluir que não tendo sido oportunamente alegado o vício de violação de lei, decorrente da utilização ilegítima da informação bancária por parte da Administração Tributária, está vedado a este Tribunal o seu conhecimento.
Assim, a questão a decidir nos presentes autos reconduz-se à de saber se o acto em crise padece de vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de facto.

III. Saneamento
(…)

IV. Fundamentação de facto

Com relevância para a decisão a proferir nos presentes autos provaram-se os seguintes factos:
(…)

V. Fundamentação de Direito
Do vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de facto

Do erro sobre a qualificação
O presente recurso tem por objecto a decisão de avaliação da matéria tributável por métodos indirectos proferida pelo Director de Finanças do Porto, em 07/11/2011, que fixou à recorrente o rendimento tributável, para efeitos de IRS, a enquadrar na Categoria G, do ano de 2008, no montante de 51.241,27€.
Começa a recorrente por referir que não se encontram preenchidos os pressupostos legais para a avaliação da matéria tributável por métodos indirectos, uma na medida em que comprovou, no âmbito do procedimento, como lhe competia, a veracidade dos rendimentos declarados, bem como a proveniência do acréscimo patrimonial evidenciado.
Sustenta que as quantias depositadas nas suas contas bancárias provêm da alienação de participações sociais que detinha na sociedade “E……….., S.A.”, pela qual recebeu a quantia de 72.500,00€ no ano de 2008.
Conclui, deste modo, que não existe qualquer divergência entre o património/despesa da recorrente e os rendimentos declarados que não esteja devidamente justificada, pelo que não se encontram reunidos os pressupostos legais para a avaliação indirecta, nos termos da alínea f) do artigo 87.° da LGT.
A entidade recorrida, por sua vez, contrapõe que não basta à recorrente indicar um qualquer rendimento não susceptível de tributação para comprovar que correspondem à realidade os rendimentos declarados e de que é outra a fonte das manifestações de fortuna, impondo-se também a demonstração da aplicação do referido fluxo financeiro no acréscimo patrimonial evidenciado.
Vejamos.
O artigo 87°, n.° 1, alínea f) da LGT, na redacção introduzida pela Lei 55- B/2004, de 30 de Dezembro, dispunha que:
1 — A avaliação só pode efectuar-se em caso de:
(…) f) Existência de uma divergência não justificada de, pelo menos, um terço entre os rendimentos declarados e o acréscimo de património ou consumo evidenciados pelo sujeito passivo no mesmo período de tributação
Por seu turno, o artigo 89.° - A da LGT, na redacção resultante da citada Lei 55 — B/2004, preceituava o seguinte:
1 — Há lugar a avaliação indirecta da matéria colectável quando falte a declaração de rendimentos e o contribuinte evidencie as manifestações de fortuna constantes da tabela prevista no n.º4 ou quando declare rendimentos que mostrem uma desproporção superior a 50 % para menos, em relação ao rendimento padrão resultante da referida tabela.
(…)
3 - Verificadas as situações previstas no n.º 1 deste artigo, bem como na alínea f) do artigo 87.º cabe ao sujeito passivo a comprovação de que correspondem à realidade os rendimentos declarados e de que é outra a fonte das manifestações de fortuna ou o acréscimo de património ou o consumo evidenciados.
(…)
5 - No caso da alínea f) do artigo 87.º considera-se como rendimento tributável em sede de IRS, a enquadrar na categoria G, quando não existam indícios fundados, de acordo com os critérios previstos no artigo 90.º que permitam à administração tributária fixar rendimento superior, a diferença entre o acréscimo de património ou o consumo evidenciados e os rendimentos declarados pelo sujeito passivo no mesmo período de tributação.
(…)
Com efeito, com a Lei 30-G/2000, de 29 de Dezembro, também denominada Lei de Reforma da Tributação do Rendimento, que aditou à LGT a alínea d) do n.° 2 do artigo 75.° e o artigo 89.° - A, as declarações do contribuinte deixaram de beneficiar da presunção de veracidade e de boa fé prevista no artigo 74°, n.° 1 da LGT (vide A Reforma Fiscal Inadiável, J. Pina Moura e R. Sá Fernandes, Revista Fisco, Ano XII, n.°s 95/96, Abril de 2001, pág. 23 a 25).
Deste modo, verificando-se uma das manifestações de fortuna tipificadas na lei, não consentânea com os rendimentos declarados, cessa a presunção da veracidade das declarações do contribuinte, operando-se uma inversão do ónus da prova (cfr. artigo 89.°A, n.° 3 da LGT). Aqui, a Administração Tributária não tem de demonstrar a falta de veracidade da declaração e/ou escrita ou documentação de suporte, bastando-lhe demonstrar a verificação do facto que, segundo a lei, constitui uma manifestação de fortuna.
É que, como se refere no acórdão do STA de 08/07/2009 proferido no processo 0579/09, “não é este, como se sabe, o único caso em que a lei geral tributária afixar por métodos indirectos o rendimento tributável em sede de IRS (cfr. os artigos 87.º n.° 1, alíneas d) e f) e 88.° LGT), mas é este, dos previstos, o “mais automático”, aquele que menores exigências de fundamentação implica para a Administração Tributária, daí que de aplicação mais expedita.”
No caso vertente, a Administração Tributária procedeu à determinação da matéria tributável por métodos indirectos, nos termos do n.° 5 do artigo 89.°-A da LGT, por ter constatado que, não obstante ter apresentado, em 2008, declaração de rendimentos no valor de 16.300,00 €, a recorrente efectuou depósitos bancários no montante global de 51.241,27 €, evidenciando uma capacidade económica incompatível com os rendimentos declarados.
Ora, considerando que a recorrente declarou para efeitos de tributação em IRS de 2008 rendimentos no montante de 16.300,00 € e que nesse mesmo ano realizou depósitos bancários no montante de 51.241,27 € é patente a existência de uma divergência superior a um terço entre os rendimentos declarados e o acréscimo patrimonial evidenciado.
A Administração Tributária estava, pois, legitimada a proceder à determinação da matéria tributável por métodos indirectos, a menos que o recorrente demonstrasse que os rendimentos declarados correspondiam à realidade e que era outra a fonte do acréscimo patrimonial, afastando, assim, a presunção de evasão fiscal relativamente aos rendimentos declarados pelo contribuinte no ano em causa.
Ora, a recorrente, em sede de direito de audição prévia, veio justificar a divergência constatada com o recebimento de 72.500,00 € da sociedade E…………, SA, através do cheque n.° 5431700084, sobre o Finibanco, emitido em 12/02/2008 e depositado na conta bancária de que é titular no referido Banco, em 18/02/2008 (cfr. alínea B) do probatório).
Não obstante, a Administração Tributária não considerou a divergência justificada por não existir qualquer relação entre o depósito efectuado na conta bancária de que a recorrente é titular no Finibanco e os depósitos efectuados em numerário em diversas contas bancárias de que é titular.
Assim sendo, a questão que é submetida à apreciação deste Tribunal reside em saber se, para efeitos de comprovação exigida no n.° 3 do artigo 89.°- A da LGT, a fim de afastar a avaliação da matéria tributável por métodos indirectos, basta ao sujeito passivo demonstrar que no ano em causa dispunha de meios financeiros não sujeitos a tributação para efeitos de IRS, de valor superior ao acréscimo patrimonial evidenciado, ou se, para além disso, carece de demonstrar quais os concretos meios financeiros que foram afectos à manifestação de fortuna evidenciada.
Sobre esta questão o STA já se pronunciou nos acórdãos de 15/02/2012 e de 12/04/2012, proferidos nos processos n.°s 050/12 e 0298/12, respectivamente.
Refere-se no citado aresto de 15/02/2010 o seguinte:
(...)
Breve Resenha Jurisprudencial:
Assim, no acórdão de 27/05/2009 rec. 0403/09 sustentou-se:
I - Tem lugar avaliação indirecta da matéria tributável quando o contribuinte evidencie manifestações de fortuna previstas na tabela que consta do n.° 4 do art. 89.°-A da LGT
II - Quando se prova a existência de uma das manifestações de fortuna dos tipos aí previstos, cabe ao sujeito passivo a prova de que correspondem à realidade os rendimentos declarados e de que a fonte das manifestações de fortuna evidenciadas não é rendimentos sujeitos a declaração em sede de IRS.
III - Demonstrando-se que os rendimentos declarados em sede de IRS acrescidos de empréstimos contraídos pelo sujeito passivo totalizam valor superior ao das manifestações de fortuna, deve entender-se que foi feita a prova exigida pelos n.ºs 3 e 4 do art. 89.°-A da LGT e que, por isso, não pode efectuar-se a avaliação indirecta da matéria tributável nos termos aí indicados.
(...)
Na mesma linha de interpretação surpreende-se também o Ac. do TCA-Norte de 28/10/2010 tirado no recurso 212/10.9BEPNF, assim sumariado:
I - Evidenciada a realização pelo contribuinte, num determinado ano, de suprimentos de montante superior a € 50.000,00 quando declarou rendimentos inferiores em 50% relativamente ao rendimento padrão (que foi fixado pelo legislador em 50% do valor dos suprimentos – cf. tabela constante do nº4 do art.° 89.º-A da LGT), consideram-se verificados os pressupostos legais para a avaliação indirecta do seu rendimento tributável desse ano.
II - Para prova da ilegitimidade deste acto de avaliação indirecta não basta ao contribuinte demonstrar que no ano em causa detinha meios financeiros de valor superior ao dos suprimentos realizados, mas também quais os concretos meios financeiros que afectou à realização desses suprimentos, sob pena de não se poder ter como justificada a manifestação de fortuna evidenciada (cf. n.º 3 do art. 89.º-A da LGT que exige ao contribuinte a «comprovação [...] de que é outra a fonte das manifestações de fortuna» evidenciadas).
III - Para prova da ilegitimidade deste acto de avaliação indirecta só deve dar-se relevância à justificação total do montante que permitiu a “manifestação de fortuna”, pelo que a justificação meramente parcial não afasta a aplicabilidade da determinação indirecta dos rendimentos que permitiram tal manifestação de fortuna.
IV - Já assim não é, contudo, no que respeita à fixação do rendimento sujeito a tributação como “incremento patrimonial” em sede de IRS onde a justificação parcial há-de relevar para a fixação presuntiva do montante do “acréscimo patrimonial não justificado” sujeito a imposto, atenta a natureza das normas em causa — concernentes à incidência objectiva do imposto —, a proibição constitucional de presunções legais absolutas de rendimentos derivada do princípio da capacidade contributiva, o disposto no art. 73.° da LGT — que determina que «as presunções consagradas nas normas de incidência tributária admitem sempre prova em contrário» —, e bem assim a busca de um cânone interpretativo conforme aos princípios da igualdade, da capacidade contributiva, da tributação dos rendimentos reais, e do Estado de Direito Democrático (cf. acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 19 de Maio de 2010, proferido no processo com o n.° 734/09).
V - Assim, embora a justificação parcial não afaste a aplicação do método de avaliação indirecta previsto no art. 89.°-A da LGT não pode deixar de ser considerada na quantificação do rendimento tributável que vai ser determinado por esse método (cf. o mesmo acórdão), entendendo-se que a quantificação do rendimento tributável da recorrente deve ser igual a 50% do valor dos suprimentos, deduzindo-se a este valor que se considerou justificado para a realização dos suprimentos, já que este montante não está, nem pode estar, sujeito a IRS não podendo, consequentemente, ser presumido ou considerado como rendimento sujeito a tributação.
Tendo presente o regime da avaliação indirecta previsto no referido art. 89.°-A e a sua teleologia, parece-nos claro que a lei exige uma relação causal entre os meios financeiros não sujeitos a declaração e à sua afectação à manifestação de fortuna evidenciada. Faz todo o sentido que só os meios financeiros que possam ser causa da manifestação de fortuna devam ser considerados para afastar a possibilidade de avaliação indirecta da matéria colectável prevista na alínea f) do artigo 87° da LGT e também no n° 1 do art° 89° da mesma lei. O primeiro dos acórdãos supra citados deste STA, que é modelar, não chega a debruçar-se sobre a questão, específica, agora colocada. Já o acórdão do TCA- Norte foi chamado a fazê-lo. E, concordamos quando ali se refere que “(…) só a demonstração de quais os concretos meios financeiros não sujeitos a declaração foram afectados à manifestação de fortuna evidenciada permitirá considerar satisfeita a exigência de justificação feita no n.° 3 daquele artigo.
(…)
Só assim se pode considerar que o contribuinte, para evidenciar determinada manifestação de fortuna, não despendeu rendimentos sujeitos a declaração. A não ser assim, bem podia suceder que o contribuinte continuasse a manter na sua disponibilidade os meios financeiros que alegou e demonstrou não estarem sujeitos a declaração totalmente incólumes (i.é, não consumidos por manifestação de fortuna alguma), sendo até que sempre poderia usar os mesmos meios financeiros para justificar diferentes manifestações de fortuna ou, pelo menos, manifestações de fortuna evidenciadas em anos diferentes. Ora, manifestamente, nem pode ser isso que quis o legislador nem esse entendimento colhe apoio na letra da lei”.
Concluímos, pois, que a melhor interpretação do mencionado art. 89.º.A, n.° 3, da LGT exige que o contribuinte prove a relação causal de afectação de certo rendimento (não sujeito a tributação) a determinada manifestação de fortuna evidenciada. E, falamos de relação causal e não de relação directa por não lhes reconhecermos o mesmo significado, mas apenas proximidade. Na relação causal admitimos vias indirectas de prova. Em substância parece-nos que a relação causal tem uma maior correspondência verbal com os termos legais usados no n° 3 do art° 89-A da LGT ao referir-se a “é outra a fonte das manifestações de fortuna”, o que pode traduzir-se por “é outra a causa das manifestações de fortuna”. Com efeito, tal exigência de relação directa não vem expressa, minimamente, na letra do preceito que vimos analisando.
A exigência de relação causal parece-nos adequada à satisfação dos fins da norma, de prevenção da fraude fiscal e a mesma posiciona-se num nível de exigência de prova perfeitamente realizável e exigível ao sujeito passivo, que pode até ser mais rigorosa/exigente para o contribuinte mas que não lhe coarcta a possibilidade de provar a afectação de certos rendimentos a um determinado consumo por outras vias, para além da directa, conhecidas as características da fungibilidade, transmissibilidade/meio de troca e até geradoras de crédito perante terceiros que o dinheiro possui.
Já a exigência, unicamente, da falada relação directa de afectação de certo rendimento (não sujeito a tributação) a determinada manifestação de fortuna pode conduzir a situações de prova muito difícil, que poderia obstar à elisão da presunção que o sujeito passivo contribuinte tem todo o direito de concretizar (…)”.
Assim, na esteira da mais recente jurisprudência do STA e do TCA-Norte, à qual aderimos, temos de concluir que não bastava à recorrente demonstrar que em 2008 detinha meios financeiros não sujeitos a tributação em sede de IRS de valor superior ao acréscimo patrimonial patenteado, antes se lhe impondo ainda demonstrar quais os concretos meios que afectou à manifestação de fortuna que lhe vem imputada pela Administração Tributária.
Vejamos, então se, in casu, a recorrente logrou demonstrar a existência de uma relação causal entre a quantia recebida da sociedade E…………, S.A., pela alienação das participações sociais e os montantes depositados em numerário em diversas contas bancárias de que a mesma era titular.
Da factualidade vertida no probatório, resulta apenas que em 2008, a recorrente recebeu da sociedade “E…………, S.A.”, o montante de 72.500,00 €, através do cheque n.° 5431700084, sacado sobre o Finibanco, o qual veio a ser depositado na conta bancária n.° 33024106101, de que a mesma é titular nesse mesmo Banco (cfr. alíneas C) eD)).
Ora, tal factualidade é manifestamente insuficiente para demonstrar a existência de uma relação de causalidade entre o recebimento da referida quantia, através de cheque e os depósitos patenteados nas contas bancárias da recorrente.
De facto, embora a recorrente alegue que as quantias depositadas provêm da alienação das participações sociais, cujo pagamento foi efectuado através de cheque, pela sociedade E…………, S.A., a verdade é que apenas consegue provar que recebeu a referida quantia e que a depositou na conta bancária de que é titular no Finibanco, ficando por demonstrar que tal quantia foi efectivamente destinada aos depósitos em numerário realizados nas diversas contas por si tituladas.
Em bom rigor, a recorrente nem sequer demonstra a que título recebeu a referida quantia da sociedade E……….., S.A..
De qualquer modo, ainda que se considerasse existir uma relação causal entre o recebimento do cheque emitido pela sociedade E…………, S.A. e os depósitos em numerário, tendo o pagamento sido efectuado por cheque emitido em 12/02/2008 e depositado na conta bancária da recorrente em 13/02/2008, nunca se poderia considerar justificados os depósitos efectuados em 07/01/2008, 21/01/2008, 31/01/2008 e 07/02/2008.
Assim sendo, a recorrente não logrou justificar a divergência constatada entre os rendimentos declarados e a manifestação de fortuna evidenciada, pelo que se encontram reunidos os pressupostos para a determinação da matéria colectável por métodos indirectos, nos termos do artigo 89.°- A, n.° 4 da LGT.
Improcedem, em face do exposto, as alegações da recorrente.

Do erro na quantificação

Sustenta, finalmente, a recorrente que, ainda que se justifique o recurso à avaliação por métodos indirectos, apenas se poderia considerar como acréscimo patrimonial não justificado a diferença entre os depósitos evidenciados nas suas contas bancárias e os rendimentos declarados, ou seja, 34.941,27€, na medida em que sobre os rendimentos declarados (16.300,00€) já incidiu IRS.
Também aqui não assiste razão à recorrente, como passamos a explicitar.
Nos termos do disposto no n.° 5 do artigo 89.° - A da LGT “no caso da alínea f) do artigo 87.º considera-se como rendimento tributável em sede de IRS, a enquadrar na categoria G, quando não existam indícios fundados, de acordo com os critérios previstos no artigo 90.º que permitam à administração tributária fixar rendimento superior, a diferença entre o acréscimo de património ou o consumo evidenciados e os rendimentos declarados pelo sujeito passivo no mesmo período de tributação”.
Ora, como resulta do ponto V. do Relatório de Inspecção o valor considerado como acréscimo patrimonial não justificado, a enquadrar na categoria G, foi o de 51.241,27 €, correspondente ao valor dos depósitos em numerário efectuados nas contas bancárias tituladas pela recorrente (cfr. alínea B) do probatório).
De igual modo, do acto de fixação do rendimento tributável consta ter sido fixado “o rendimento tributável no montante de € 63.860,63 E (sessenta e três mil oitocentos e sessenta euros e sessenta e três cêntimos), sendo €51.241,27 (cinquenta e um mil duzentos e quarenta e um euros e vinte e sete cêntimos), a enquadrar na categoria G, conforme art.° 9.° do código do IRS, o valor de € 800,00 (oitocentos euros) na categoria F e € 11.819,36 (onze mil oitocentos e dezanove euros e trinta e seis cêntimos), na categoria A, conforme declaração apresentada pelo sujeito passivo” (cfr. alínea E) do probatório).
Não se vislumbra, pois, qualquer erro de quantificação.
Com efeito, a Administração Tributária, procedeu correctamente à fixação do rendimento tributável, enquadrando na categoria G, o acréscimo patrimonial não justificado evidenciado nas contas bancárias tituladas pela recorrente, ou seja, 51.241,27 € e nas categorias F e A os rendimentos constantes da declaração de rendimentos apresentada pela recorrente no ano de 2008.
Em face do exposto, improcedem, in totum, as alegações da recorrente.

VI. Valor da causa
(…)

VII. Decisão
Em face do exposto, nega-se provimento ao presente recurso e, em consequência, absolve-se a entidade recorrida do pedido.”



DECIDINDO NESTE STA:
Suscita a recorrente várias questões prévias que o Mº Pº elencou no seu parecer, supra destacado, como importando saber:
- Se o juiz tem de identificar causas de invalidades diversas das alegadas, segundo resulta do disposto no C.P.T.A., nomeadamente, do seu art. 95º n.º 2, aplicável subsidiariamente, e por maioria de razão em face do previsto no art. 58.º da L.G.T.;
- se ocorreu omissão de pronúncia quanto ao requerido a fls. 145/148, a provocar nulidade, nos termos do art. 668.º n.º 1 al. d) do C.P.C.
- se a utilização de informações bancárias do contribuinte por parte da A.T. sem a precedência dos formalismos legalmente estabelecidos, ofende o conteúdo fundamental do direito fundamental da reserva da vida privada — art. 26.º n.º s 1 e 2 da C.R.P);
- se a preterição do formalismo estipulado no art. 63.º-B da L.G.T., no acesso a informação bancária protegida, gera um vício de incompetência gerador de nulidade.

Próxima desta formulação entendemos que nos presentes autos antes de mais se questiona a existência de eventual omissão de pronúncia em relação a:

a) terem sido ou não apreciadas as questões suscitadas no requerimento formulado pela recorrente a folhas 145/148, (defendendo a recorrente que tal apreciação não foi efectuada).
b) ter sido ou não apreciada a questão da legalidade do acesso à informação bancária, por parte da AT sem precedência dos formalismos legalmente estabelecidos para o efeito no artigo 63.°-B da LGT (defendendo a recorrente que tal apreciação não foi efectuada).
VEJAMOS:
Quanto à primeira questão: É patente que a decisão recorrida não enferma de qualquer omissão de pronúncia. Simplesmente ao conhecer das questões suscitadas a folhas 145 a 148 e também da questão da legalidade do acesso à informação bancária, por parte da AT não se pronunciou no sentido que a ora recorrente desejava. É só ler e compreender o que resulta do seguinte excerto da decisão recorrida produzido antes da apreciação da existência ou não de pressupostos para a tributação por métodos indirectos, sendo os sublinhados da nossa autoria para destacar os passos essenciais que revelam essa apreciação e conhecimento.” (…) Em face do exposto, importa, antes de tudo, indagar se a alegada ilegalidade do despacho em crise fundada na utilização ilegítima da informação bancária obtida no âmbito de outro procedimento administrativo pode (e deve) ser conhecida pelo Tribunal.
Vejamos, então.
Acerca do objecto da sentença no âmbito do processo de impugnação judicial, nomeadamente no que concerne aos poderes de cognição do tribunal, Jorge Lopes de Sousa refere o seguinte:
Nos termos dos arts. 660°, n.º 2 661.º, n.º 1 do CPC, para além de questões de conhecimento oficioso, o juiz não pode conhecer na sentença de questões não suscitadas pelas partes, nem condenar em objecto ou quantidade superior ao que tiver sido pedido.
As partes é que circunscrevem o thema decidendum, através do pedido e da defesa. O juiz não tem de saber se porventura, à situação das partes conviria melhor outra providência que não a solicitada, ou se esta poderia fundar-se noutra causa petendi.
Em processos anulatórios, cada um dos vícios imputados ao acto impugnado constitui uma causa de pedir, como se conclui do preceituado na parte final do n.° 4 do art 498 ° do CPC, em que se estabelece nas acções de anulação a causa de pedir é a “nulidade especifica que se invoca para obter o efeito pretendido”.
Assim, se for pedida apenas a anulação parcial de um acto tributário, com fundamento em determinado vício, o tribunal não poderá, em princípio, anulá-lo integralmente.
Por outro lado não basta que haja coincidência ou identidade entre o pedido e o julgado; á necessário, além disso que haja identidade entre a causa de pedir (causa petendi) e a causa de julgar (causa judicandi).
Por isso se for pedida a anulação de um acto de liquidação com base em determinado vício gerador de mera anulabilidade (causa de pedir no processo de impugnação judicial), não pode o tribunal anular o acto impugnado com fundamento em vício diferente, não invocado.
Excepção a estas limitações dos poderes de cognição ocorrem em matéria de nulidades, pois trata-se de vícios de conhecimento oficioso, que o tribunal pode apreciar independentemente de serem invocados (an. 134.º n.° 2 do CPA) (...)”.
Acrescenta adiante: “Os poderes de cognição do tribunal são, em regra, delimitados pelos factos alegados, salvo quanto a questões de conhecimento oficioso (arts. 99.° n.°1, da LGT e 13.º n.°1 do CPPT).
No entanto, não carecem de alegação nem prova os factos notórios, que são os que são do conhecimento geral, nem os factos de que o tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções, que sejam comprováveis documentalmente (arts. 264.º n.° 1, e 514.º do CPC), nem os factos indiciadores de uso anormal do processo (art.° 665.º do CPC).
O tribunal tomará também em atenção os factos instrumentais que resultem da instrução e discussão da causa (art. 264. n.°2 do CPC).
Para além disso, o tribunal pode tomar em consideração os factos essenciais à procedência das pretensões formuladas ou das excepções deduzidas que sejam complemento ou concretização de outros que as partes hajam oportunamente alegado e resultem da instrução e discussão da causa, desde que a parte interessada manifeste vontade de deles se aproveitar e à parte contrária tenha sido facultado o exercício do contraditório (art. 264.º n°3, do CPC).
A utilização pelo tribunal, para a resolução de questões colocadas pelas partes, de factos não alegados que não são de conhecimento oficioso não constitui uma nulidade da sentença, mas sim uma violação do princípio do dispositivo, enunciado no art. 264.º do CPC. (in Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Volume II, Áreas Editora, 2011, págs. 318/319).
Pese embora tais considerações se reportem ao processo de impugnação judicial, não vemos razões para não as aplicar em matéria de recurso da decisão de determinação da matéria tributável por métodos indirectos.
Vejamos, então, se a questão entretanto invocada pela recorrente pode ser conhecida pelo Tribunal.
Relembremos que a recorrente começou por invocar como fundamento do recurso a ilegalidade da decisão de determinação da matéria tributável por métodos indirectos por não se encontrarem reunidos os pressupostos legais previstos na alínea f) do artigo 87.° da LGT, já que comprovou, como lhe competia, nos termos do n.° 3 do artigo 89.° da LGT que os rendimentos declarados correspondiam à realidade e que o acréscimo patrimonial evidenciado provinha da alienação de participações sociais efectuada à sociedade E…………, S.A. em 2006.
Em ponto algum do articulado a recorrente invoca como fundamento de anulação da decisão recorrida a utilização ilegítima da informação bancária por parte da Administração Tributária.
Aliás, como a própria recorrente reconhece só, posteriormente, em sede de resposta à oposição deduzida pela entidade recorrida, veio submeter essa questão à apreciação do Tribunal.
Ora, por força do artigo 89.°-A, n.° 6 da LGT e 146.°-B, n.° 5 do CPPT, o recurso da decisão de avaliação da matéria tributável de IRS por métodos indirectos rege-se, com as devidas adaptações, pelo regime previsto para o recurso da decisão de acesso directo da administração tributária à informação bancária dos sujeitos passivos, no artigo 146.°-B do CPPT.
Nos termos do disposto no n.° 2 do citado artigo 146.°-B, a petição tem de ser apresentada no prazo de 10 dias a contar da data em que o contribuinte foi notificado da decisão, devendo indicar sumariamente as razões da sua discordância com a decisão da administração tributária de proceder à avaliação da matéria tributável de IRS por métodos indirectos (n.° 1 do mesmo preceito), bem como os meios de prova, nomeadamente se pretender questionar a factualidade subjacente à decisão (n.° 3 do dito preceito).
Assim sendo, a menos que esteja em causa uma questão de conhecimento oficioso, a apreciação da questão invocada pela recorrente em momento posterior à apresentação da petição do recurso está vedada ao Tribunal.
A recorrente invoca em primeira linha o princípio do inquisitório, plasmado no artigo 99.° da LGT.
Ora, decorre do n.° 1 citado artigo 99.° da LGT que “o tribunal deve ordenar ou realizar oficiosamente todas as diligências que se lhe afigurem úteis para conhecer a verdade relativamente aos factos alegados ou de que oficiosamente pode conhecer”.
No mesmo sentido, prescreve o n.° 1 do artigo 13.° do CPPT que “aos juízes dos tribunais tributários incumbe a direcção e julgamento dos processos da sua jurisdição, devendo realizar ou ordenar todas as diligências que considere úteis ao apuramento da verdade relativamente aos factos que lhes seja lícito conhecer”.
Este princípio tem de ser concatenado como princípio do dispositivo, segundo o qual recai sobre as partes o ónus de alegar.
Com efeito, fora dos casos de conhecimento oficioso o tribunal apenas pode servir-se de factos alegados pelas partes e apreciar e decidir as questões que estas lhe apresentem.
Quer isto dizer que o princípio do inquisitório não autoriza o juiz a servir-se de factos não alegados, pois que reporta-se à prova e não à sua alegação.
Por essa razão, não pode o princípio do inquisitório consistir num meio para suprir insuficiências verificadas na alegação dos factos e na invocação das questões.
Como tal, não acompanhamos a argumentação expendida pela recorrente segundo a qual o processo judicial tributário se estrutura apenas segundo o princípio da investigação, e não de acordo com o princípio do dispositivo, sendo o único interesse a promover o interesse público de tributação de acordo com a lei, ficando, assim, as partes desoneradas do seu ónus de alegação.
Na verdade, tal princípio apenas vale em absoluto, sem restrição a qualquer alegação de factos, no domínio do direito sancionatório público, onde o princípio da verdade material se afirma como princípio estruturante.
Não colhe, por esta via, a argumentação da recorrente.
Invoca ainda a recorrente a aplicação subsidiária da norma constante do artigo 95º n.° 2 do CPTA, que determina que “nos processos impugnatórios, o tribunal deve pronunciar-se sobre todas as causas de invalidade que tenham sido invocadas contra o acto impugnado, excepto quando não possa dispor dos elementos indispensáveis para o efeito, assim como deve identificar a existência de causas de invalidade diversas das que tenham sido alegadas, ouvidas as partes para alegações complementares pelo prazo comum de 10 dias, quando o exija o respeito pelo princípio do contraditório”.
Também aqui entendemos que a recorrente carece de razão.
É certo que, estando em causa um “recurso” de decisões da Administração, deverão aplicar-se subsidiariamente, ao abrigo do artigo 2.° alínea c), as regras do CPTA que regulam as acções administrativas especiais de impugnação de actos administrativos (artigos 46.° e ss.).
No entanto, tratando-se de um processo especial com tramitação célere e simplificada afigura-se-nos que apenas necessitará de ser integrado com normas de aplicação subsidiária no que concerne aos requisitos da petição inicial (cfr., nesse sentido, Jorge Lopes de Sousa, in obra citada, pág. 559).
Quanto ao demais, reger-se-á pelas regras previstas para o recurso das decisões da Administração Tributária de acesso directo à informação bancária dos sujeitos passivos, constantes do artigo 146.°-B do CPPT, ex vi artigo 89.°-A, n.° 6 da LGT.
Entendemos, pois, que não há que convocar em sede de recurso da decisão da matéria tributável por métodos indirectos, ao abrigo do artigo 89.°-A da LGT, a norma constante do artigo 95.°, n.° 2 do CPTA.
Refere, finalmente, a recorrente que sendo o vício ora invocado determinante de nulidade, podia ser invocado a todo o tempo.
Como é sabido, em matéria de invalidade dos actos administrativos a regra é a da anulabilidade, apenas existindo nulidade quando se verifique a falta de qualquer dos elementos essenciais do acto ou quando houver lei que expressamente preveja esta forma de invalidade (cfr. artigos 133.°, n.° 1 e 135.° do CPA).
Como se refere no acórdão do STA de 30/11/2011, proferido no processo n.° 0894/10,(...) optou-se, ali, por um regime misto na previsão dos vícios que conduzem à nulidade do acto administrativo: admitiu-se o critério da nulidade por natureza (princípio da cláusula geral), mas, por outro lado, combinou-se este critério com o da enumeração exemplificativa - a chamada nulidade por determinação da lei. Como ensinam Aroso de Almeida e Fernandes Cadilha (Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, vol I pag. 247) “a nulidade constitui o regime de excepção, ao passo que a anulabilidade é o regime-regra. É o que se depreende do disposto no artigo 135° do CPA, segundo o qual são anuláveis os “actos administrativos praticados com ofensa dos princípios ou normas jurídicas aplicáveis para cuja violação se não preveja outra sanção.” (...) A anulabilidade constitui uma forma de invalidade do acto administrativo que se reconduz à violação de uma regra ou de um princípio jurídico de natureza formal (de competência, de forma ou de trâmite) ou substantiva. No primeiro grupo, incluem-se:
(a) a violação de regras relativas à competência do autor do acto, quando não envolvam as situações extremas de falta de atribuições, geradores de nulidade (incompetência relativa); (b) vícios de forma, que poderão consistir na preterição de formalidades no âmbito do procedimento administrativo (arts. 54° e segs. do CPA), na omissão ou deficiência respeitante à forma do acto (art. 120° do CPA), desde que não se reconduza à carência absoluta da forma legal ou na omissão ou deficiência atinente à enunciação do objecto e dos elementos do acto (art. 123° do CPA)”. Em suma, serão, pois, nulos os actos tributários a que falte algum dos seus elementos essenciais (elementos essenciais dos actos tributários serão aqueles que sejam necessários para assegurar a sua exequibilidade) e os actos indicados no n°2 do art. 133° do CPA, entre os quais constam os que ofendam o conteúdo essencial de um direito fundamental e os que ofendam os casos julgados (...)”.
Importa, pois, aquilatar se o acto impugnado ofende o conteúdo essencial de um direito fundamental.
Como salienta Jorge Lopes de Sousa “não é qualquer ofensa de um direito fundamental que a alínea d) do n.° 2 do artigo 133.º do CPA, mas apenas as ofensas do seu conteúdo essencial
Uma ofensa deste tipo só ocorrerá quando perante ela o direito fundamental afectado fique sem expressão prática apreciável, o que não é o caso de uma liquidação ilegal, que apenas atinge limitadamente o direito de propriedade dos seus destinatários.
Por outro lado, entre as violações possíveis de direitos por normas tributárias, a sanção mais grave da nulidade, por razões de proporcionalidade; terá de ser reservada para os actos que representam mais graves violações dos direitos tributários” (cfr. obra citada, pág. 330).
Não constitui tarefa fácil aferir quando ocorre ofensa do conteúdo essencial de um direito fundamental.
Segundo Jorge Miranda, “o conteúdo essencial deve ser entendido como um limite absoluto correspondente à finalidade ou ao valor que justifica o direito” (“Manual de Direito Constitucional”, Tomo IV, 3.ª Edição, 2000, pág. 341).
Assim sendo, só se verifica a violação do conteúdo essencial de um direito fundamental quando, em consequência do acto administrativo, não subsiste o mínimo sem o qual o direito não pode subsistir (cfr. acórdão do TCA- Sul de 06/05/2010, proferido no processo n.° 06108/10).
Ora, a recorrente alega que a Administração Tributária fixou a matéria tributável por métodos indirectos com base em prova obtida ilicitamente e sem precedência dos procedimentos legalmente obrigatórios, violando deste modo, o seu direito fundamental à reserva da intimidade da vida privada, consagrado do artigo 26.° da CRP.
E que uma interpretação dos artigos 63.°-B da LGT e 139.°, n.° 6 do CIRC no sentido de que o conhecimento de dados bancários do sujeito passivo para efeitos do procedimento previsto no artigo 139.° do CIRC permite que esse conhecimento seja utilizado para efeitos da alínea f) do artigo 87.° da LGT, sem necessidade de seguir o procedimento estabelecido no artigo 63.° - B da LGT, seria manifestamente inconstitucional por violar os n.°s 1 e 2 do artigo 26.° da CRP.
É inquestionável que o direito à reserva da vida privada tem assento constitucional (artigo 26°, n.° 1 da CRP), assumindo a natureza de um direito fundamental.
Todavia, tal direito não é irrestrito ou absoluto, podendo ser sujeito a restrições ou condicionamentos, desde que salvaguardado o conteúdo essencial do direito.
Por essa razão, o legislador é particularmente exigente na definição dos pressupostos do acesso à informação bancária dos sujeitos passivos por parte da Administração, exigindo-se a fundamentação com expressa menção dos motivos que justificam a decisão de derrogação do sigilo bancário e reservando-se o poder de decidir aos dirigentes máximos da Administração Tributária sem possibilidade de delegação de competências (cfr. artigo 63.° - B da LGT).
Afigura-se-nos, porém, que ainda que possa considerar-se ocorrer, in casu, uma violação do direito à reserva da vida privada, tal violação não atinge uma intensidade chocante que fira o acto da nulidade absoluta e insanável cominada no artigo 133°, n.° 2, alínea d) do CPA.
E ainda que se admita que, como alega a recorrente, a interpretação dos artigos 63.°-B da LGT e 139°, n.° 6 do CIRC no sentido de que o conhecimento de dados bancários do sujeito passivo para efeitos do procedimento previsto no artigo 139,° do CIRC permite que esse conhecimento seja utilizado para efeitos da alínea f) do artigo 87.° da LGT, sem necessidade de seguir o procedimento estabelecido no artigo 63.°-B da LGT, é inconstitucional por violação do artigo 26.° da CRP, daí não decorre a nulidade do acto em crise.
De facto, como constitui entendimento jurisprudencial pacífico e reiterado os actos que apliquem normas inconstitucionais, padecendo de vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de direito, geram a mera anulabilidade do acto, salvo se ocorrer ofensa do conteúdo essencial de um direito fundamental, o que, como vimos, não sucede no caso em apreço.
Deste modo, sendo o vício apontado ao acto impugnado sancionado com a mera anulabilidade, tal questão não é de conhecimento oficioso, estando a sua arguição sujeita ao prazo previsto no artigo 146.°-B do CPPT.
Em face de tudo quanto vem explanado, impõe-se concluir que não tendo sido oportunamente alegado o vício de violação de lei, decorrente da utilização ilegítima da informação bancária por parte da Administração Tributária, está vedado a este Tribunal o seu conhecimento.
Assim, a questão a decidir nos presentes autos reconduz-se à de saber se o acto em crise padece de vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de facto. (…).

Falece pois a excepção de nulidade da decisão recorrida por omissão de pronúncia, o que não significa que a referida decisão tenha efectuado um julgamento acertado.
Com efeito, temos presente o art. 133º nº1 do CPA (Código do Procedimento administrativo) que refere que são nulos os actos administrativos a que falte qualquer dos elementos essenciais ou para os quais a lei comine expressamente essa forma de invalidade. E, o nº 2 enumera a título de exemplo situações de vícios que têm como consequência a nulidade

Saber quando é que estamos perante um elemento essencial não é tarefa fácil.
Para VIEIRA DE ANDRADE (Lições de Direito Administrativo, 2ª ed., Coimbra, 2011, p. 177) os elementos essenciais são os indispensáveis para que se constitua qualquer acto administrativo, não podendo valer como acto “uma decisão sem autor, sem destinatário, sem fim público, sem conteúdo, sem forma ou com vícios graves equiparáveis a tais carências absolutas, em função do tipo de acto”.
Para este autor “devem ser considerados nulos por natureza aqueles actos que sofram de um vício especialmente grave e, em princípio, evidente, avaliado em concreto em função das características essenciais de cada tipo de acto.” (obra citada p. 176). E, “a nulidade haverá sempre de reportar-se a um desvalor da actividade administrativa com o qual o princípio da legalidade não pode conviver, mesmo em nome da segurança e da estabilidade, como acontece no regime-regra da anulabilidade.” (mesma obra a fls. 178).
Aplicando estes ensinamentos ao caso dos autos.
O art. 63ºB da LGT permite o acesso da administração tributária a informações ou documentos bancários sem dependência do consentimento do titular dos elementos protegidos.
Mas o nº 4 refere que as decisões devem ser fundamentadas com expressa menção dos motivos concretos que as justificam e, notificadas aos interessados no prazo de 30 dias após a sua emissão sendo tal competência cometida ao Director-geral sem possibilidade de delegação.
Verifica-se que o legislador eliminou o direito de audiência prévia do interessado
Ora estando em causa uma compressão do direito à reserva da vida privada, consagrado no art. 26º, nº1, da CRP, este direito pode ser comprometido irremediavelmente se para além de não haver lugar a audiência prévia, não for dado cumprimento ao estabelecido no nº 4 do art. 63º-B da LGT. As exigências aí estabelecidas têm de ser entendidas em face do melindre da matéria e pressupõem uma ponderação aturada por parte do dirigente máximo que tem de fundamentar a decisão e levá-la ao conhecimento do destinatário com vista a este poder aferir da razoabilidade das razões da quebra do sigilo bancário e se a decisão foi praticada por quem é competente para tal.
Assim afigura-se que este procedimento especial (decisão fundamentada notificada ao Contribuinte num dado prazo) constitui um reduto último de defesa do direito à reserva da vida privada dos contribuintes em termos tais que a ausência do mesmo não pode deixar de ser ferida de nulidade.
Nas palavras de JORGE DE SOUSA e outros, p. 580 (LGT- comentada e Anotada) o direito à intimidade da vida privada é normalmente gravemente afectado pela derrogação do sigilo bancário.
Pelo que se afigura, atenta a gravidade dos interesses em jogo, que a cominação do não cumprimento do procedimento especial estabelecido no nº 4 do art. 63ºB com a mera anulabilidade e consequente consolidação na ordem jurídica no prazo da impugnação normal dos actos (três meses) é manifestamente insuficiente. A cominação de nulidade tem outra força e alcance. Força ao cumprimento do que está estabelecido na lei quanto à exigência de procedimento prévio de derrogação de sigilo bancário.
Nesta linha de entendimento consideramos ao contrário do decidido que o acto em causa nos presentes autos é impugnável a todo o tempo (cremos ser este também o entendimento dos autores supra citados quando a fls. 580 da sua LGT Anotada e comentada referem (…) pois a ilegalidade da derrogação terá como corolário a nulidade dos actos tributários consequentes, que forem praticados tendo como pressuposto aquela derrogação ilegal (artº 133º nº 2 al. i) do CPA”.
Consequentemente importa apreciar da manutenção na ordem jurídica da decisão recorrida estando em causa apreciar a bondade das conclusões VI) e VII) da recorrente de que a utilização de informações bancárias do contribuinte por parte da administração tributária, sem precedência dos formalismos legalmente estabelecidos para o efeito, ofende o núcleo essencial do direito fundamental, constitucionalmente protegido, da reserva da vida privada (artigo 26.°, n.°s 1 e 2 da CRP) e que a preterição do formalismo estipulado no artigo 63.°-B da LGT, no acesso a informação bancária protegida, originando que a utilização dessa informação é determinada apenas pela Direcção Distrital de Finanças, gera um vício de incompetência no procedimento inspectivo, gerador de nulidade.

Diremos desde já que a mesma não se pode manter.
À semelhança do que se decidiu no acórdão de 05/09/2012 tirado no recurso nº 0837/12, no qual o ora relator interveio como 2º adjunto, no caso é inequívoco que a Administração Fiscal teve acesso aos dados bancários do recorrido de forma legal, mas no âmbito de procedimento previsto no artº 129º do CIRC (Na redacção então em vigor, que corresponde ao artº 139º do CIRC na actual redacção – decreto-lei 159/2009 de 13.07.) requerido pela empresa B…………… SA.
Essa autorização foi concedida pela recorrida, para os efeitos do artº 129º, nº 6 do CIRC e na qualidade de administradora da referida empresa, nada permitindo concluir que este consentimento permitia à Administração Fiscal a utilização de elementos protegidos pelo sigilo bancário para outros fins que não os constantes do referido normativo.
Trata-se de procedimento previsto no Capitulo VIII do Código do IRC, referente às garantias dos contribuintes e que tem como objectivo a prova pelo sujeito passivo do preço efectivo na transmissão de imóveis permitindo-lhe assim obviar à aplicação do disposto no artº 58-Aº nº 2 do mesmo diploma legal (correcções ao valor de transmissão de direitos reais sobre bens imóveis).
A autorização de acesso à informação bancária prevista no artº 129º, nº 6 do CIRC tinha, pois, como única finalidade a comprovação do pedido de demonstração a que alude aquele normativo.
E por isso mesmo o legislador fez constar do referido normativo que o acesso à informação bancária se circunscreve «ao período de tributação em que ocorreu a transmissão e ao período de tributação anterior».
Porém a Administração Fiscal utilizou a informação bancária assim obtida, da qual teve conhecimento de múltiplos depósitos em numerário, para desencadear um procedimento de inspecção à recorrida, em sede de IRS e com referência aos exercícios de 2008 e 2009, propondo a avaliação indirecta nos termos e para os efeitos do artº 87º, al. f) do CIRS e com aplicação do artº 89º-A nº 5 da Lei Geral Tributária.
Ora, esta autorização de acesso às contas bancárias só poderá valer para o procedimento em causa e não para qualquer outro, uma vez que o fim daquele procedimento é claramente determinado, sendo as acções adoptadas adequadas e proporcionais aos objectivos a atingir.
A limitação do uso da informação bancária obtida não decorre apenas do referido artº 129º do CIRC mas também das normas que regulam a possibilidade de acesso directo da Administração Tributária a informação coberta por sigilo bancário e dos princípios que informam o procedimento tributário, mormente os arts. 63º e 63º-B, ns. 4 e 5 da Lei Geral Tributária e o princípio da proporcionalidade (arts. 266º, nº 2 da Constituição da República e 55º da Lei Geral Tributária).
Com efeito nos ns. 1 e 2 do artº 63º-B da Lei Geral Tributária na redacção da Lei nº 55-B/2004, aplicável ao caso subjudice (E também na redacção actualmente vigente.) prevêem-se situações em que a administração tributária pode aceder directamente à totalidade dos documentos cobertos pelo sigilo bancário.
Trata-se de situações em que é a própria Administração Tributária, independentemente de autorização do tribunal ou do interessado, que decide aceder a esses documentos.
Porém, mesmo nos casos em que lhe é permitido o acesso a toda a documentação bancária a actuação da Administração Tributária deverá limitar-se ao que for necessário para obtenção dos fins em vista, como impõe o principio da proporcionalidade, que deve nortear a sua actuação (Cf., neste sentido, Diogo Leite de Campos, Benjamim da Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, Lei Geral Tributária Anotada, 4ª edição, pag. 569.)
Acresce que, dado o especial relevo dos interesses em causa, nomeadamente a possibilidade de restrição de direitos individuais, consagrados constitucionalmente, nomeadamente o direito à intimidade privada (artº 26º, nº 1 da Constituição da República), a Lei Geral Tributária é particularmente exigente na definição dos pressupostos do acesso a informações e documentos bancário por parte da Administração Tributária, exigindo-se fundamentação com expressa menção dos motivos que justificam a decisão de derrogação do sigilo bancário e reservando-se o poder de decidir aos dirigentes máximos da Administração Tributária sem possibilidade de delegação de competências (artº 63º-B, nº 4 da Lei Geral Tributária).
Ora no caso, a Administração Tributária, através do procedimento previsto no artº 129º, nº 6 do CIRC e de forma indirecta, acedeu aos documentos e informações bancárias referentes à recorrida, sem que se verificassem aqueles pressupostos e sem que ao mesmo, como titular do direito ao sigilo, fosse concedida a possibilidade de sindicar esses pressupostos ou lhe fosse facultado o exercício do direito ao recurso previsto no artº 146º.B do Código de Procedimento e Processo Tributário.
E o certo é que nada nos autoriza a afastar a hipótese de provimento desse recurso, logrando-se assim impedir o acesso à documentação bancária em causa.
A não ser assim, estaríamos a permitir a utilização de informação sigilosa para outros fins tidos por convenientes pela Administração, sem que esta tivesse previamente de justificar e fundamentar o seu uso, o que redundaria numa subversão das finalidades que se pretenderam acautelar com a instituição de um regime específico e regras estritas para o acesso à informação bancária.

E, não podem ser razões atinentes ao princípio do inquisitório e à descoberta da verdade material como orientação primária da Administração Tributária no procedimento inspectivo a justificar a omissão de procedimento tendente ao levantamento do sigilo bancário para efeitos de liquidação de IRS à ora recorrente.
Com efeito, sendo certo que a Lei Geral Tributária consagra nos seus arts. 50º e 72º (Dispõe art. 50.º do Código de Procedimento e Processo Tributário que «No procedimento, o órgão instrutor utilizará todos os meios de prova legalmente previstos que sejam necessários ao correcto apuramento dos factos, podendo designadamente juntar actas e documentos, tomar declarações de qualquer natureza do contribuinte ou outras pessoas e promover a realização de perícias ou inspecções oculares».
Por sua vez refere o art. 72.º da Lei Geral Tributária que «o órgão instrutor pode utilizar para o conhecimento dos factos necessários à decisão do procedimento todos os meios de prova admitidos em direito».) o princípio da liberdade da prova no procedimento tributário e sendo manifesto que a informação bancária do Contribuinte constitui um meio de prova decisivo para a Administração Tributária formar a sua convicção, a verdade é que não pode admitir-se a utilização desse meio de prova caso o mesmo não tenha sido obtido com observância de todos os seus pressupostos legais.
Até porque, antes de mais, a Administração Tributária está obrigada a actuar em conformidade com o princípio da legalidade, consagrado no art. 266.°, n.º 2, da Constituição da República, reconhecido também genericamente no art. 55 .° da LGT e concretizado no art. 3.°, nº 1, do CPA.
Ora decorre do artº 63º nº 3 da Lei Geral Tributária que o acesso à informação protegida pelo sigilo bancário se faz nos termos previstos nos arts. 63º-A, 63º-B e 63º-C do mesmo diploma legal.
O que pressupõe que a decisão de acesso a informações e documentos bancários sem dependência do consentimento do respectivo titular deve ser fundamentada com expressa menção dos motivos concretos que a justificam e notificada aos interessados no prazo de 30 dias após a sua emissão, sendo da competência do Director Geral dos Impostos ou substituto legal, sem possibilidade de delegação e sendo susceptível de recurso (art. 63º-B nºs. 4 e 5 da Lei Geral Tributária)
No caso, como vimos, isso não sucedeu.
Daí que se entenda que a Administração Tributária utilizou ilegitimamente a informação bancária relativa ao recorrido, não tendo observado as normas que regulam a sua obtenção (artigos 63 e 63-B nºs 4 e 5 da LGT), incorrendo em vício de procedimento cuja gravidade, no caso, é geradora de nulidade por falta de procedimento adequado (elemento essencial do acto -artº 133º nº 1 do CPA).
A sentença recorrida, que validou tal actuação não pode ser confirmada.

4- Decisão:
Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em conceder provimento ao recurso, revogar a decisão recorrida e anular o acto sindicado.

Custas pela recorrida.

Lisboa, 14 de Fevereiro de 2013. – Ascensão Lopes (relator) – Pedro Delgado (voto a decisão) – Valente Torrão.