Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0626/09
Data do Acordão:09/30/2009
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ISABEL MARQUES DA SILVA
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
ERRO NA FORMA DE PROCESSO
RESPONSÁVEL SUBSIDIÁRIO
OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO
EXECUÇÃO FISCAL
CONVOLAÇÃO
REVERSÃO DA EXECUÇÃO
MEIO PROCESSUAL ADEQUADO
Sumário:I - O responsável subsidiário pode impugnar a liquidação de imposto cuja responsabilidade lhe é atribuída e/ou opor-se à execução que contra ele reverteu, mas não pode fazê-lo indiferentemente por um ou outro meio consoante o que mais lhe convier, pois a cada direito corresponde o meio processual adequado para o fazer valer em juízo;
II - O meio processual adequado para reagir contra o despacho de reversão, com fundamento na ilegitimidade do executado e na prescrição da dívida exequenda em relação a ele é a oposição à execução fiscal (artigos 204.º, n.º 1, alíneas b) e d) do CPPT);
III - Havendo erro na forma de processo, haverá que ordenar a "convolação" do meio processual inadequado em meio processual adequado quando a tal não obste, como no caso, a intempestividade da petição de impugnação para ser apreciada como oposição.
Nº Convencional:JSTA00065991
Nº do Documento:SA2200909300626
Data de Entrada:06/12/2009
Recorrente:A...
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL.
Objecto:SENT TT1INST LISBOA PER SALTUM.
Decisão:NEGA PROVIMENTO.
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - IMPUGN JUDICAL.
Legislação Nacional:LGT98 ART22 N4 ART23 N5 ART97 N3.
CPPTRIB99 ART97 N1 ART98 N4 ART99 ART203 N1 A ART204 N1 B D.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- Relatório -
1 – A… com os sinais dos autos, recorre para este Supremo Tribunal da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa, de 19 de Novembro de 2008, que indeferiu liminarmente a impugnação por si deduzida contra a liquidação exequenda no processo de execução fiscal n.º 153819960100605053 e apensos, apresentando as seguintes conclusões:
1. O meio processual para atacar o acto tributário é a impugnação, nos termos previstos no artº 99.º do CPPT;
2. O Impugnante apresentou o pedido em tempo, na qualidade de responsável subsidiário, conforme Artº. 22º, n.º 4 da LGT;
3. Na petição de impugnação o impugnante não invocou qualquer dos fundamentos previstos no art.º 204 do CPPT, o que demonstra que o meio processual utilizado era o de impugnação;
4. A haver dúvida, sob a fundamentação, o pedido e o meio processual idóneo, a decisão não podia ser outro, que não seja a de convidar o impugnante a aperfeiçoar a petição inicial.
Termos em que se requer que seja revogada a decisão recorrida ordenando-se o prosseguimento dos autos de impugnação do acto tributário.
2 - Não foram apresentadas contra-alegações.
3 - O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal emitiu parecer nos seguintes termos:
Objecto do recurso: despacho de rejeição liminar da petição inicial de impugnação judicial.
Nas conclusões das suas alegações de recurso (fls. 43 e segs.) alega o recorrente que o processo de impugnação seria o meio processual adequado pois que na petição da impugnação não invocou qualquer dos fundamentos previstos no art.º 204.º do Código de Procedimento e Processo Tributário.
Sem prescindir, alega que o tribunal a quo deveria ter notificado o impugnante para aperfeiçoar a petição inicial.
Fundamentação:
Afigura-se-nos que o recurso não merece provimento.
Com efeito a questão que se coloca ao tribunal é uma questão exclusivamente de direito, que é a de saber se os fundamentos invocados na petição inicial se podem enquadrar nos pressupostos do processo de impugnação judicial.
Trata-se questão que há-de ser decidida com base nos fundamentos invocados na petição inicial e não com base nos fundamentos agora alegados em sede de recurso.
Ora, como se alcança daquela peça processual, o recorrente invocava como fundamentos da sua pretensão a sua ilegitimidade e a ausência de culpa na inexistência de património da devedora originária.
Trata-se de fundamentos que se reconduzem à apreciação de um acto proferido em sede de processo executivo e à discussão da legalidade do despacho de reversão e da própria execução, pelo que será a oposição à execução fiscal o meio processual adequado para o requerente impugnar a legalidade do despacho que ordena a reversão (Vide neste sentido, os Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 19.11.2008, recurso 711/08, de 04.06.2008, recurso 76/08, de 11.04.2007, recurso 19/07, de 08.03.2006, recurso 01249/05, e de 13.07.05,processo 4504/05, todos in www.dgsi.pt, e os acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, citados neste último aresto, de 24-1-2001, proferido no recurso n.º 25701: - de 8-2-2001, proferido no recurso n.º 25758, e – de 24-3-2004, proferido no recurso n.º 1844/03).
Com efeito, e como se refere no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 13.07.2005, processo 504/05, in www.dgsi.pt, «sendo o despacho que decide a reversão proferido no âmbito de um processo de execução fiscal, o meio processual a utilizar para o impugnar será um dos que a lei prevê para os interessados defenderem os seus interesses neste meio processual».
No mesmo sentido aponta a função processual da oposição à execução fiscal, a qual, como refere o Cons.º Jorge Lopes de Sousa, no seu Código de Procedimento e de Processo Tributário, 4.ª ed., pág. 1045, «embora com tramitação autónoma em relação ao processo executivo, funciona na dependência deste, como uma contestação à pretensão do exequente (…)». Por isso, refere aquele autor, «a oposição à execução fiscal estará naturalmente vocacionada, como contestação que é, para a invocação de quaisquer fundamentos que possam servir para contrariar a pretensão executiva, independentemente do seu carácter substantivo ou adjectivo (art. 487.º do CPC), à semelhança do que sucede com o processo civil, em que a oposição do executado é o meio processual adequado para a invocação de qualquer falta de pressupostos processuais (art. 813.º, alínea c), do C.P.C.)».
Bem andou, pois, o despacho recorrido ao considerar que, in casu, a oposição à execução fiscal é o meio processual adequado para o revertido atacar a legalidade de despacho que ordena a reversão.
Não procede também a argumentação de que o tribunal a quo deveria ter notificado o impugnante para aperfeiçoar a petição inicial.
É que estamos manifestamente perante um erro na forma do processo e não perante mera irregularidade susceptível de ser sanada através de aperfeiçoamento.
Com efeito, e como bem se salienta na decisão recorrida, de acordo com o disposto no art.º 98.º, n.º 4 do CPPT o que se impunha na situação em análise era a convolação para o meio processual adequado, sendo que só não foi ordenada essa convolação por ter sido ultrapassado o respectivo prazo.
A convolação redundaria assim num acto inútil e, por isso, proibido por lei.
Nestes termos somos de parecer que o presente recurso não merece provimento, devendo confirmar-se o julgado do tribunal recorrido.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
- Fundamentação -
4 – Questões a decidir
São duas as questões a decidir no presente recurso: a primeira, consiste em saber se o acto impugnado e os fundamentos em que assenta a impugnação deduzida cabem no objecto e fundamentos legalmente previstos da impugnação judicial e, em caso negativo, se o tribunal “a quo” devia ter notificado o impugnante para aperfeiçoar a petição inicial e não, como fez, ter indeferido liminarmente a petição de impugnação.
5 – Apreciando.
5.1 Do objecto e fundamentos da impugnação judicial
A sentença recorrida, a fls. 25 a 27 dos autos, indeferiu liminarmente a petição inicial de impugnação apresentada pelo ora recorrente, pois que o acto que o Impugnante pretende impugnar é o acto proferido no processo de execução fiscal pelo qual foi decidida a reversão da execução fiscal instaurada contra “B…, Lda”, e contra o ora impugnante, como responsável subsidiário (sentença recorrida, a fls. 25 dos autos) e tanto o pedido como a causa de pedir são típicos da oposição (sentença recorrida, a fls. 26 dos autos).
Alega, contudo o recorrente que o meio processual adequado para atacar o acto tributário é a impugnação, nos termos do Artº 99º do CPPT (conclusão 1 das conclusões suas alegações de recurso, supra transcritas) e que na petição de impugnação o impugnante não invocou qualquer dos fundamentos previstos no artº 204 do CPPT, o que demonstra que o meio processual utilizado era o de impugnação (conclusão 3 das conclusões suas alegações de recurso, supra transcritas).
Vejamos.
É pacífico na jurisprudência e na doutrina, que a impugnação judicial, regulada nos artigos 99.º e seguintes do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), constitui o meio de reacção paradigmático de que dispõe o contribuinte para atacar, com fundamento em qualquer ilegalidade, o acto tributário, tomado este em sentido próprio, ou seja, como acto de liquidação do tributo, sendo igualmente este o meio processual adequado para reagir contra outros actos em matéria tributária para os quais a lei preveja ser este o meio de reacção do contribuinte (cfr. o n.º 1 do artigo 97.º do CPPT). Também não oferece dúvida dispor o responsável subsidiário da faculdade de impugnar a liquidação de imposto, a par da faculdade de se opor à execução, pois que são garantias que a própria lei lhe assegura (cfr. os artigos 22.º, n.º 4 e 23.º, n.º 5 da Lei Geral Tributária – LGT) e, que se saiba, ninguém legitimamente contesta.
Sucede, contudo, que, apesar de na petição inicial de impugnação apresentada pelo ora recorrente este afirmar que vem impugnar judicialmente a liquidação exequenda (fls. 3 dos autos), nenhuma ilegalidade imputa à própria liquidação, imputando-as ao invés à reversão, que considera indevida, pois verificam-se em relação ao impugnante revertido, os pressupostos de ilegitimidade da pessoa citada, encontrando-se em relação à pessoa do mesmo impugnante, a dívida exequenda prescrita, pelo que requer que seja revogado o douto despacho que ordenou a reversão contra o aqui impugnante revertido (cfr. a conclusão da petição inicial de impugnação, a fls. 9 dos autos). Daqui se extrai, sem margem para dúvidas consistentes, que o acto sindicado é o despacho de reversão, e não a liquidação da dívida exequenda a que, em si mesma, não se imputa qualquer ilegalidade e nem em concreto sequer se identifica.
Mas assim sendo, a impugnação judicial a que o então impugnante lançou mão para atacar a reversão não é meio processualmente idóneo para reagir contra o acto de reversão, pois que sendo este um acto praticado no âmbito de um processo de execução fiscal terá de ser atacado através dos meios de defesa próprios deste processo, no caso concreto, por via da oposição à execução fiscal, pois que os fundamentos invocados para o contestar na petição de impugnação (a fls. 3 a 10 10 dos autos) se reconduzem à ilegitimidade do revertido (porque não lhe poder ser imputada a responsabilidade pelo pagamento da dívida exequenda em razão da cessação de actividade da sociedade e do exercício de funções de gerência e porque não consta do título executivo como devedor) e à prescrição da dívida em relação ao responsável subsidiário, fundamentos estes expressamente elencados nas alíneas b) e d) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT como fundamentos de oposição à execução fiscal.
A sentença recorrida, que entendeu verificado manifesto erro na forma processual utilizada, não merece, pois, censura.
5.2 Do indeferimento da impugnação judicial
A decisão tomada na sentença recorrida, no sentido do indeferimento liminar da petição resultou, por um lado, da constatação da existência de erro na forma de processo (cfr. sentença recorrida a fls. 25 e 26 dos autos), o que concluímos já ser exacto, por outro da impossibilidade de ordenar a “convolação” da petição de impugnação em petição de oposição, como determina o n.º 4 do artigo 98.º do CPPT, pois que a isso obstava o requisito da tempestividade, conclusão que se afigura igualmente exacta pois que tendo o impugnante assumido ter sido citado em 20 de Julho de 2007 (cfr. os números 28 e 32 da sua petição de impugnação, a fls. 8 e 9 dos autos) e dispondo a partir daí de 30 dias para deduzir oposição (nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 203.º do CPPT) é manifesto que a petição de impugnação, entrada no Serviço de Finanças da Lourinhã em 7 de Maio de 2008 (cfr. a data constante do carimbo que lhe foi aposto, a fls. 3 dos autos), é manifestamente extemporânea para poder ser atendida como oposição.
Entende, contudo, o recorrente que o tribunal “a quo” devia convidar o impugnante a aperfeiçoar a petição inicial (cfr. a conclusão 4 das conclusões das suas alegações de recurso, supra transcritas).
Não lhe assiste, porém, razão.
Como bem diz o Excelentíssimo Procurador-Geral adjunto junto deste Tribunal no seu parecer junto aos autos e supra transcrito o que se verifica in casu não é uma simples irregularidade da petição de impugnação, susceptível de ser sanada através de aperfeiçoamento, mas um erro manifesto na forma do processo, que, devendo ser suprido pelo juiz através da “convolação” em meio processual adequado (nos termos dos artigos 98.º, n.º 4 do CPPT e 97.º, n.º 3 da LGT) quando tal seja possível nos termos da lei, não pôde sê-lo in casu, pois que para tal era a petição de impugnação intempestiva.
Deve, pois, concluir-se que o julgado não merece qualquer censura e que o recurso não merece provimento.
- Decisão -
6 - Termos em que, face ao exposto, acordam o juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso, confirmando a decisão recorrida.
Custas pelo recorrente, fixando-se a procuradoria em 1/6.
Lisboa, 30 de Setembro de 2009. – Isabel Marques da Silva(relatora) – Jorge Lino – Lúcio Barbosa.