Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0262/18
Data do Acordão:05/17/2018
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:TERESA DE SOUSA
Descritores:LEI DE PROCESSO NOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS
RECURSO JURISDICIONAL
PRAZO DE INTERPOSIÇÃO
Sumário:I – Nos processos submetidos ao regime da LPTA, os recursos jurisdicionais deduzem-se no prazo de dez dias, contados da notificação da decisão, ao que se segue o despacho de admissão do recurso e a apresentação das alegações (art. 106º da LPTA).
II – O decurso desse prazo peremptório de dez dias extingue o direito de recorrer, não se podendo conhecer do recurso extemporaneamente interposto.
Nº Convencional:JSTA000P23294
Nº do Documento:SA1201805170262
Data de Entrada:03/08/2018
Recorrente:MUNICÍPIO DE ODIVELAS
Recorrido 1:A...., S.A.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo

1. Relatório

Banco …………, S.A. [actualmente A……….., S.A.], devidamente identificado nos autos, intentou no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa (TACL), em 15.03.2002, recurso contencioso do despacho do Presidente da Comissão Instaladora do Município de Odivelas, de 28 de Dezembro de 2001, pedindo a declaração de nulidade ou a anulação daquele despacho.

Foi proferida sentença, em 22.07.2017, que julgou o recurso contencioso procedente e, em consequência, anulou o acto recorrido.

Inconformado com esta decisão [notificada através de carta datada de 26.06.2017], o Recorrido interpôs recurso jurisdicional mediante requerimento de interposição de recurso e alegações, apresentados em 12.09.2017 (cfr. fls. 307 e seguintes).

Por despacho de 18.09.2017, foi admitido o recurso interposto, nomeadamente por ter sido considerado tempestivo, nos termos do disposto no art. 638º, nº 1 do CPC, com a redacção que lhe foi dada pela Lei nº 41/2013, de 26/6 (cfr. fls. 319/320).

Notificado para apresentar contra-alegações, veio o Recorrente contencioso, Recorrido, em requerimento autónomo, de fls. 323/324, suscitar a intempestividade do recurso jurisdicional interposto, devendo ser rejeitado, “(…) face ao incumprimento, pelo recorrente, do prazo de 10 dias previsto no art. 102º da LPTA e no art. 685º/1 do CPC, na redacção anterior ao DL 303/2007, de 8 de Março, que terminou em 2017.07.10”, requerendo a urgente conclusão ao Senhor Juiz titular, por forma a evitar-se a necessidade da prática de actos inúteis.
Juntou comprovativo de que se procedeu à notificação prevista pelos arts. 221º e 255º do CPC (cfr. fls. 325).

O Recorrido apresentou contra-alegações a fls. 330 e seguintes, suscitando nas conclusões 1ª a 6ª a inadmissibilidade do recurso [juntando comprovativo da notificação prevista nos arts. 221º e 255º do CPC].

Remetido o processo ao Tribunal Central Administrativo Sul (TCA Sul), pela Senhora Desembargadora Relatora foi suscitada a excepção de incompetência em razão da hierarquia daquele Tribunal (cfr. fls. 370).

O Município de Odivelas requereu a remessa dos autos a este Supremo Tribunal Administrativo (cfr. fls. 373).

O A………, S.A., no requerimento em que se pronuncia sobre a incompetência em razão da hierarquia e remessa a este STA, requer esta remessa “tendo em vista a apreciação prioritária da inadmissibilidade do recurso interposto pelo MO, em 2017.09.12, com fundamento na sua intempestividade, face ao incumprimento, pelo recorrente, do prazo de 10 dias estabelecido no artº 102º da LPTA e no art. 685º/1 do CPC, na redacção anterior ao DL 303/2007, de 8 de Março, …”, juntando comprovativo da notificação prevista nos arts. 221º e 255º do CPC (cfr. fls. 379 a 382).

Por despacho de fls. 384 e 385 foi declarada a incompetência do TCA Sul em razão da hierarquia para apreciar o recurso jurisdicional, e determinada a remessa dos autos a este STA.

A Exma Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer a fls. 393 e 394 no sentido da procedência da questão prévia suscitada, sendo de rejeitar, em consequência, o presente recurso.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

2. Os Factos
A factualidade pertinente à decisão é a constante do Relatório.

3. O Direito
O presente recurso jurisdicional foi interposto em processo a que é aplicável a Lei de Processo dos Tribunais Administrativos (LPTA), visto a acção (então recurso contencioso) ter sido intentada em data anterior à entrada em vigor do CPTA (cfr. arts. 5º, nº 1 e 7º da Lei nº 15/2002, de 22/2).
A questão a decidir, suscitada pelo recorrido, nos termos acima indicados, sendo, aliás, de conhecimento oficioso (art. 641º, nº 2 do CPC), é a de determinar se o recurso interposto é inadmissível por extemporaneidade na sua interposição, contrariamente ao que decidiu o despacho de 18.09.2017.
A questão respeita ao modo de interposição dos recursos jurisdicionais em processos instaurados ainda na vigência da LPTA: se estes se deduzem mediante requerimento a oferecer no prazo de 10 dias, contado da notificação da decisão recorrida, ao que se seguirá o despacho de admissão do recurso e a fase das alegações; ou se tais recursos se interpõem mediante requerimento, a deduzir trinta dias contados do mesmo evento, que junte ou inclua a respectiva alegação.
Esta questão já foi apreciada e resolvida por este STA, nomeadamente, nos acórdãos de 22.02.2011, Proc. nº 01019/10, de 27.10.2016, Proc. nº 0871/16 e de 07.12.2016, Proc. nº 0816/16.
Assim, reiterando a doutrina que havia anteriormente sido firmada, no acórdão de 27.10.2016, expendeu-se que: «…conforme o artigo 5.º, n.º 1 da Lei nº 15/2002, de 22 de Fevereiro, as disposições do CPTA não se aplicam aos processos que se encontrem pendentes à data da sua entrada em vigor.
Essa regra tem excepções que, no entanto, não relevam para o presente caso.
Ora, o CPTA entrou em vigor em 1 de Janeiro de 2004, conforme o artigo 7.º dessa Lei nº 15/2002, na redacção do artigo 2.º da Lei n.º 4-A/2003, de 19 de Fevereiro.
Assim, a tramitação do recurso haverá de obedecer ao disposto na LPTA aprovada pelo DL n.º 267/85, de 16 de Julho.
Nesse regime, sem prejuízo do aí especialmente disposto, os recursos regem-se pela lei processual civil – artigo 102.º.
Especialmente previsto está o prazo para apresentação de alegações – artigo 106.º, que se conta após a notificação do despacho de admissão de recurso.
Mas não há disposição especial quanto ao requerimento de interposição, que haverá que obedecer, portanto, ao disposto na lei processual civil. Ora, o disposto na lei processual civil é o regime previsto nos artigos 685.º, n.º 1 e 698.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, na versão anterior à entrada em vigor do DL 303/2007.
Com efeito, o novo regime de recursos resultante desse Decreto-Lei não se aplica aos processos pendentes à data da sua entrada em vigor – artigo 11.º, n.º 1»
E o mesmo acórdão continuou:
«Há que observar, pois, qual o regime de interposição de recursos aplicável ao caso. Trata-se, no que aqui interessa, do que vem regulado no artigo 685.º do CPC, na redacção anterior à aprovação pelo citado DL 303/2007. Segundo o disposto no seu n.º 1, “O prazo para a interposição dos recursos é de dez dias, contados da notificação da decisão”.»
Aderimos, por inteiro, a esta jurisprudência – que é a inequivocamente certa.
Como se depreende do art. 106º da LPTA, o aqui recorrente tinha de manifestar a sua vontade de recorrer da sentença nos dez dias subsequentes à notificação dela – ou nos três dias úteis imediatamente seguintes (art. 139º, n.º 5 do CPC).
Ao que se seguiria o «despacho de admissão do recurso», referido nesse art. 106º, e a subsequente entrada na fase das alegações, «sensu proprio».
E convém assinalar a absoluta impossibilidade desse prazo de dez dias ser acrescido do igual tempo a que hoje se refere o art. 638º, n.º 7, do CPC (já previsto no art. 685º, n.º 7, do CPC anterior). É que aquele primeiro prazo destina-se à simples manifestação da vontade de recorrer; e o último prazo, de igual magnitude, é explicável por uma outra coisa – pelo modo como se irá exercer a actividade recursiva.
(…)
É geralmente sabido que o decurso do prazo peremptório extingue o direito de praticar o acto processual (art. 139º, nº 3, do CPC). E a circunstância do tribunal «a quo» ter afirmado a tempestividade do recurso é irrelevante, pois essa pronúncia não vincula o tribunal superior (art. 641º, nº 5 do CPC).»

Esta doutrina, que aqui se acompanha e reitera, tem inteira aplicação para a análise e decisão da situação verificada no presente processo.
Com efeito, a sentença foi notificada às partes por carta de 26.06.2017, presumindo a lei (cfr. art. 254º, nº 3 do CPC, na anterior redacção, ou art. 248º do CPC/2013) que a notificação ocorre no terceiro dia, pelo que o prazo de 10 dias para interpor o recurso terminava em 10.07.2017 (ou, com multa, em 13.07 – art. 139, nº 5 do CPC).
Assim sendo, o prazo para o aqui recorrente interpor recurso da sentença terminou ainda antes das férias judiciais do Verão de 2017, sendo claramente extemporânea a interposição do recurso apenas em 12.09.2017, sem que se tenha invocado qualquer “justo impedimento”.
Acresce que, não assume qualquer relevância o facto de o recurso ter sido admitido por despacho de 18.09.2017, pois que, tal admissão é sempre provisória, ao não vincular o tribunal superior, o qual tem a faculdade de rever essa decisão, por lhe caber aferir dos pressupostos legais da regularidade e legalidade da instância de recurso jurisdicional oficiosamente, podendo implicar o não conhecimento do objecto do recurso (cfr. acórdão de 07.12.2016 acima referido).
Assim, verifica-se a extemporaneidade do recurso suscitada pelo recorrido.

Pelo exposto, acordam em não conhecer do objecto do recurso.
Sem custas.

Lisboa, 17 de Maio de 2018. – Teresa Maria Sena Ferreira de Sousa (relatora) – José Augusto Araújo Veloso – Maria do Céu Dias Rosa das Neves.