Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:03341/19.0BEPRT
Data do Acordão:09/10/2020
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:CARLOS CARVALHO
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
APRECIAÇÃO PRELIMINAR
INTIMAÇÃO PARA PASSAGEM DE CERTIDÃO
ORDEM DOS ADVOGADOS
ACESSO AO DIREITO
PATROCÍNIO JUDICIÁRIO
NÃO ADMISSÃO DO RECURSO
Sumário:Não é de admitir a revista do acórdão do TCA que, negando provimento ao recurso de apelação, manteve a decisão do TAF que havia julgado procedente a pretensão de intimação da Ordem dos Advogados a facultar o acesso a informação de procedimento de patrocínio/apoio judiciário se não se vislumbra uma especial relevância social ou indício de interesse comunitário significativo que extravase os limites do caso concreto e a sua singularidade, e se no entendimento no mesmo firmado não se vislumbra padecer de erros lógicos ou jurídicos manifestos e estar o mesmo em linha com a jurisprudência do Supremo sobre a matéria.
Nº Convencional:JSTA000P26308
Nº do Documento:SA12020091003341/19
Data de Entrada:07/24/2020
Recorrente:ORDEM DOS ADVOGADOS PORTUGUESES
Recorrido 1:A.....................
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em apreciação preliminar, na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:

1. «ORDEM DOS ADVOGADOS» [OA], invocando o disposto no art. 150.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos [CPTA], peticiona a admissão do recurso de revista por si interposto do acórdão de 29.05.2020 do Tribunal Central Administrativo Norte [doravante TCA/N] [cfr. fls. 252/260 - paginação «SITAF» tal como as ulteriores referências à mesma, salvo expressa indicação em contrário], que negou provimento ao recurso que a mesma havia dirigido à sentença que a intimou a «facultar ao Requerente a consulta da integralidade dos processos administrativos n.ºs 125730/2017, 85151/2019, 90359/2019, 135855/2018, 9430/2019, 73836/2013 e passagem de certidão dos documentos que vierem a ser selecionados para esse fim» e a «emitir as certidões das fls. fls. 9, 10, 11, 14, 15 e 16, do processo administrativo n.º 85313/2019 e das fls. 10 a 12 do processo n.º 90438/2019» proferida pelo Tribunal Administrativo de Fiscal do Porto [doravante TAF/P] nos autos de intimação para a prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões contra si deduzido por A………, devidamente identificado nos autos.

2. Motiva a admissão do recurso de revista [cfr. fls. 294/313] na relevância social e jurídica do objeto de litígio [acesso à documentação respeitante aos pedidos de escusa deduzidos no procedimento de patrocínio/apoio judiciário e segredo profissional do advogado/patrono] e, bem assim, a necessidade de «uma melhor aplicação do direito», dada a incorreta aplicação feita no acórdão sob recurso do disposto nos arts. 268.º da Constituição da República Portuguesa [CRP], 83.º e 85.º, ambos do Código de Procedimento Administrativo [CPA/2015] e 92.º do Estatuto da Ordem dos Advogados [EOA].

3. O aqui recorrido produziu contra-alegações em sede de recurso de revista [cfr. fls. 320/331] nas quais pugna, mormente, pela sua não admissão.
Apreciando:

4. Dispõe-se no n.º 1 do art. 150.º do CPTA que «[d]as decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excecionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito».

5. Do referido preceito extrai-se, assim, que as decisões proferidas pelos TCA’s no uso dos poderes conferidos pelo art. 149.º do CPTA, conhecendo em segundo grau de jurisdição, não são, em regra, suscetíveis de recurso ordinário, dado a sua admissibilidade apenas poder ter lugar quando: i) esteja em causa apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, revista de importância fundamental; ou, ii) o recurso revelar ser claramente necessário para uma melhor aplicação do direito.

6. Como vimos o TAF/P decidiu intimar a R. nos termos supra reproduzidos [cfr. fls. 190/208], sendo que dessa decisão a aqui Recorrente, inconformada, interpôs recurso jurisdicional dirigido ao TCA/N o qual confirmou tal decisão para o efeito sustentando que «o pedido de escusa apresentado por advogado nomeado no âmbito do patrocínio judiciário, constitui um incidente enxertado no procedimento de proteção jurídica, a cuja documentação trocada entre o advogado nomeado e a Ordem dos Advogados, o beneficiário do apoio judiciário tem direito a aceder, não se tratando de matérias abrangidas por segredo profissional, podendo quanto muito tais documentos conterem “dados pessoais”, situação em que se impõe que tais dados sejam expurgados de acordo com um juízo de proporcionalidade», juízo este firmado naquilo que constitui a jurisprudência dos TCA’s e deste Supremo Tribunal no seu acórdão de 01.02.2017 - Proc. n.º 0991/16, decisão que abundantemente citou.

7. A alegação expendida pela Recorrente não se mostra persuasiva, tudo apontando, presentes os contornos do caso sub specie, no sentido de que as instâncias decidiram com acerto, tanto mais que se mostra assente em fundamentação jurídica que se apresenta como plausível e razoável e que se louva em jurisprudência deste Supremo Tribunal sobre a matéria, pelo que a admissão do recurso não se revela como necessária para uma melhor aplicação do direito e de importância fundamental no plano social e jurídico.

8. Tal como já afirmado por esta Formação de Admissão Preliminar em caso similar ao ora sub specie [cfr. acórdão de 05.04.2019 - Proc. n.º 02167/18.2BEPRT] «[a] questão que se coloca nesta revista respeita aos direitos dos interessados no procedimento administrativo, a qual envolve a sensível articulação do direito à informação com o sigilo profissional. … As instâncias decidiram de forma uniforme e com uma fundamentação muito semelhante, citando jurisprudência recente deste Tribunal. Deste modo, tudo indica que decidiram com acerto tanto mais quanto é certo que a sua fundamentação, que seguiu de perto essa jurisprudência, é consistente e plausível. … Por outro lado, ainda que se admita que controvérsia suscitada nos autos possa vir a repetir-se, não se justifica a admissão da revista com vista a uma melhor interpretação e aplicação do direito».

9. É de notar que o tratamento e enquadramento da concreta questão em discussão não tem suscitado dúvidas ou divergências ao nível da jurisprudência, não se vislumbrando ocorrer na situação uma especial relevância social ou indício de interesse comunitário significativo que justifique a necessidade de admissão do recurso.

10. Assim, tudo conflui para a conclusão de que a presente revista mostra-se inviável, não se justificando submetê-la à análise deste Supremo, impondo-se in casu a valia da regra da excecionalidade supra enunciada.

DECISÃO
Nestes termos e de harmonia com o disposto no art. 150.º do CPTA, acordam os juízes da formação de apreciação preliminar da Secção de Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal em não admitir a revista.
Custas pela recorrente.
D.N..
Lisboa, 10 de setembro de 2020
[O relator consigna e atesta, que nos termos do disposto no art. 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13.03, aditado pelo art. 03.º do DL n.º 20/2020, de 01.05, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes integrantes da formação de julgamento, os Conselheiros Jorge Artur Madeira dos Santos e José Augusto Araújo Veloso]
Carlos Luís Medeiros de Carvalho