Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0906/14.0BEVIS-S1
Data do Acordão:12/17/2019
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ASCENSÃO LOPES
Descritores:RECLAMAÇÃO
CUSTAS DE PARTE
HONORÁRIOS
DOCUMENTO COMPROVATIVO
Sumário:I - De acordo com a alínea d) do artº 25, do RCP a parte vencedora indicará, em rubrica autónoma, as quantias pagas a título de honorários de mandatário ou de agente de execução. Não se trata de um valor aleatório, pré-fixado, ou sem justificação, trata-se do valor pago a título de honorários, naturalmente documentado.
II - O valor de 50% do somatório das taxas de justiça pagas pelas partes é o limite imposto por lei para compensar a parte vencedora, naturalmente se tiver suportado despesas com honorários de mandatário judicial desse valor, ou superior, recebendo, o que tiver efectivamente pago, na totalidade quando o valor dos honorários se contenha dentro dos 50% do somatório das taxas de justiça pagas pelas partes.
Nº Convencional:JSTA000P25358
Nº do Documento:SA2201912170906/14
Data de Entrada:03/06/2019
Recorrente:AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:PARQUE EÓLICO DE ......, SA
Votação:MAIORIA COM 1 VOT VENC
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em conferência, nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1 – RELATÓRIO

Vem a Autoridade Tributária e Aduaneira recorrer para este Supremo Tribunal da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé que julgou improcedente a reclamação da nota discriminativa e justificativa de custas.

Inconformada com o assim decidido, apresentou as respectivas alegações que resumiu nas seguintes conclusões:
«I. A interposição do presente Recurso é efetuada ao abrigo do disposto no n.º 5, do artigo 280.º, do CPPT, que admite o direito ao Recurso por Oposição de Julgados, para o STA, independentemente da alçada, das decisões que, relativamente à mesma questão de direito, perfilhem solução oposta “relativamente ao mesmo fundamento de direito e na ausência substancial de regulamentação jurídica, com mais de três sentenças do mesmo ou outro tribunal de igual grau ou com uma decisão de tribunal de hierarquia superior” independente da alçada;
II. A Fazenda Pública identificou, relativamente à mesma factualidade e questão de direito, pelo menos doze Despachos proferidos por tribunais do mesmo grau (que se juntam) nos quais se decidiu em sentido oposto ao do Despacho agora recorrido (no sentido de que a teleologia da norma (n.º 5 do art.º 280.º do CPPT), não obsta a que se admita o recurso quando a decisão recorrida e as decisões fundamento não sejam Sentenças, vide Acórdão do STA, de 03.05.2017, proferido no processo 0141/17, disponível para consulta em www.dgsi.pt);
III. Para além daqueles doze Despachos identificou-se também um Acórdão proferido pelo STA, em 16.09.2015, no processo n.º 01443/13 (que também se encontra disponível para consulta em www.dgsi.pt), que perfilhou solução oposta à do Despacho agora recorrido;
IV. A questão dirimida no, aliás, douto Despacho de que se recorre, é a de saber se, atenta a redação dos artigos 25.º e 26.º, do RCP, está a parte que solicita o pagamento de honorários de mandatário, a título de custas de parte, obrigada a fazer prova de que, de facto, suportou o pagamento de honorários ao seu mandatário, bem como do montante suportado;
V. O Tribunal “a quo” decidiu não resultar do artigo 26.º, do RCP, ou de outras normais legais, que o credor das custas de parte tenha que apresentar, nesta situação, documentação das despesas de honorários;
VI. Não concorda a Fazenda com o assim decidido, dando aqui por reproduzidos, para efeitos de fundamentação do presente Recurso, a argumentação constante de várias decisões que perfilharam solução contrária e que se juntam;
VII. Mais se acrescenta, sempre com o devido respeito, que incorre em erro o Tribunal “a quo” ao fazer uma mera interpretação literal do referido dispositivo legal, a qual, ainda assim, não pode levar à conclusão que dele extrai.
VIII. Da leitura do disposto nos artigos 25.º e 26.º, do RCP, resulta que apenas tem que constar da nota justificativa o montante suportado com honorários se o valor dos mesmos for inferior a 50% das taxas de justiça pagas pelas partes, pois pelo n.º 5, do artigo 26.º, do RCP, “O valor referido na alínea c) do n.º 3 é reduzido ao valor indicado na alínea d) do n.º 2 do artigo anterior quando este último seja inferior àquele” - ou seja, quando o valor suportado a título de honorários de mandatário pela parte vencida for inferior a 50% da soma das taxas de justiça pagas pelas partes, apenas há que pagar aquele valor – e não mais – e será este valor o que deverá constar da nota justificativa;
IX. Quando os honorários suportados pela parte vencedora forem de valor superior a 50% do somatório das taxas de justiça pagas pela parte vencida e pela parte vencedora, é este o limite legalmente imposto, nada mais havendo a pagar para além daquela percentagem, não exigindo a lei que o seu valor conste da nota justificativa;
X. Resulta de todo o regime de honorários a requerer em custas de parte, fixado no RCP, que a necessidade de prova dos montantes pagos é intrínseca ao funcionamento deste regime, precisamente, porque não está ali previsto o pagamento, à parte vencedora, de 50% do somatório das taxas de justiça pagas pela parte vencida e pela parte vencedora (montante máximo) tout court;
XI. O direito que assiste à parte vencedora de ser ressarcida das despesas efetivamente suportadas a título de honorários de mandatário, não pode ser entendido (porque seguramente o não quis o legislador) como um “prémio” no valor correspondente a 50% do somatório das taxas de justiça pagas no processo pelas partes, independentemente do valor que aquela haja, de facto, despendido com honorários, ou mesmo que nada tenha despendido;
XII. Na ausência de um documento comprovativo do valor pago pela parte vencida ao seu mandatário no processo, não pode a Fazenda Pública, nem o Tribunal, nem o Ministério Público, confirmar se o respetivo valor é inferior, igual ou superior a 50% do somatório das taxas de justiça pagas no processo pelas partes;
XIII. Nos termos da lei, o ónus da prova de factos constitutivos de direitos recai sempre sobre quem os invoque, pelo que caberia à impugnante fazer prova dos montantes que efetivamente despendeu com o seu mandatário neste processo;
XIV. O Acórdão do STA de 16.09.2015, proferido no processo n.º 01443/13, disponível para consulta em www.dgsi.pt, em análise ao disposto nos artigos 25.º e 26.º do RCP, perfilhou solução oposta ao do Despacho recorrido, deixando expresso que: «De acordo com a alínea d) do artº 25, a parte indicará, em rubrica autónoma, as quantias pagas a título de honorários de mandatário ou de agente de execução. Não se trata de um valor aleatório, pré-fixado, ou sem justificação, trata-se do valor pago a título de honorários, naturalmente documentado, com a liquidação dos impostos devidos. Mas não pode incluir na nota discriminativa e justificativa qualquer valor pago a título de honorários, mesmo que efetivamente pago. (…), os referenciados artigos não prevêem, de modo nenhum, o pagamento (pela parte vencida) de 50% do somatório das taxas de justiça pagas pelas partes, para compensação da parte vencedora face às despesas com honorários do mandatário, sem que esse valor tenha que ser justificado”;

XV. No sentido da indispensabilidade de apresentação de recibo – ou outro documento de quitação comprovativo do pagamento e montantes dos honorários, para além das várias decisões supra identificadas, também Salvador da Costa, in “Regulamento das Custas Processuais, anotado e Comentado, 2011 – 3.ª edição – Custas Judiciais em Geral, Almedina;
XVI. Assim, ao decidir como decidiu, perfilhou o douto Despacho sub judice solução oposta “relativamente ao mesmo fundamento de direito e na ausência substancial de regulamentação jurídica, com mais de três sentenças” (no caso, Despachos) à de outros tribunais de igual grau, assim como a uma decisão de tribunal de hierarquia superior;
XVII. A impugnante requereu à Fazenda Pública, a título de custas de parte, o pagamento da quantia total de € 6 528,00, (Seis mil, quinhentos e vinte e oito euros), valor que em sede de reclamação se comprovou ser excessivo, mas, mesmo assim, o Tribunal “a quo” indeferiu a reclamação e condenou a Fazenda Pública em custas;
XVIII. Porque na reclamação aqui em causa, a parte vencida foi a impugnante e a parte vencedora foi a Fazenda Pública, impunha-se uma decisão contrária à que foi proferida pelo Tribunal “a quo”;
XIX. Porque na reclamação aqui em causa, a parte vencida foi a impugnante e a parte vencedora foi a Fazenda Pública, impunha-se a condenação da impugnante em custas;
XX. Salvo o devido respeito, padece a decisão em apreço de erro de julgamento de direito, por violação do disposto nos artigos 25.º, n.º 2, alínea d), e 26.º, n.º 3, alínea c), ambos do RCP, e no artigo 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPC.
Nestes termos e nos mais de Direito aplicável, com o douto suprimento judicial, requer-se a V.as Ex.as se dignem julgar PROCEDENTE o presente recurso, por totalmente provado e, em consequência, que revoguem e substituam o Despacho ora recorrido por douto Acórdão no qual se decida pela total procedência da reclamação da nota discriminativa e justificativa das custas de parte apresentada pela Fazenda Pública, atenta a motivação supra exposta, e no sentido da obrigatoriedade de junção de documento comprovativo (recibo ou outro documento de quitação) do valor dos honorários de mandatário pagos, sempre que a compensação dos mesmos seja solicitada a título de custas de parte através da nota justificativa prevista no artigo 25.º do RCP, com a consequente condenação da impugnante em custas, tanto nesta sede como na supra referida reclamação da nota discriminativa e justificativa das custas de parte.

Foram apresentadas contra alegações a fls. 100/109 verso, do processo físico, com o seguinte quadro conclusivo:
«1. Ao abrigo do artigo 280.º, n.º 5 do CPPT, a Fazenda Pública interpôs recurso da douta decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria que julgou improcedente a reclamação da nota discriminativa e justificativa de custas de parte enviada pela Recorrida à Fazenda Pública, no entanto, entende a Recorrida que não estão reunidos os pressupostos de admissibilidade que depende este recurso.
2. Como resulta do artigo 280.º, n.º 5 do CPPT, “A existência de alçada não prejudica o direito ao recurso para o Supremo Tribunal Administrativo de decisões que perfilhem solução oposta relativamente ao mesmo fundamento de direito e na ausência substancial de regulamentação jurídica, com mais de três sentenças do mesmo ou outro tribunal de igual grau ou com uma decisão do tribunal de hierarquia superior.”
3. Não obstante, a Recorrente identificou como decisões fundamento sete decisões de incidentes de reclamações de notas justificativas e discriminativas de custas de parte, previstas no artigo 33.º da Portaria n.º 419-A/2009, pelo que, não sendo estas decisões verdadeiras sentenças, os requisitos previstos no n.º 5 do artigo 280.º do CPPT não estão cumpridos.
4. Pelo que, assumindo a norma do n.º 5 do artigo 280.º do CPPT natureza excecional, relativamente à regra da irrecorribilidade de decisões dos tribunais tributários proferidas em processos de impugnação judicial e de execução fiscal contida no n.º 4, não pode a Recorrente aplicar uma interpretação extensiva a este dispositivo.
5. Acresce, que para que seja admissível o recurso para uniformização de jurisprudência previsto no artigo 280.º, n.º 5 do CPPT, este dispositivo requer que a decisão recorrida esteja em oposição com 3 decisões do mesmo ou outro tribunal de igual grau, pelo que, tendo a Recorrente indicado somente uma decisão do TAF de Beja e somente duas decisões do TAF de Leiria e uma decisão do TAF de Loulé, estas decisões não poderão ser consideradas como decisões fundamento.
6. Relativamente ao acórdão do STA proferido no processo 01443/13 indicado pela Recorrente como acórdão fundamento, a Recorrida entende que o mesmo não perfilha solução oposta à decisão recorrida, pelo que não pode ser aceite como decisão fundamento.
7. O que está em causa na decisão recorrida é a necessidade ou não de comprovar o pagamento dos honorários de mandatário despendidos com o processo judicial para que a Impugnante tenha direito a incluir na nota discriminativa e justificativa de parte 50% do somatório das taxas de justiça pagas por ambas as partes, tendo o tribunal a quo entendido, através da decisão recorrida, pela não necessidade de comprovação documental pela parte vencedora dos honorários pagos.
8. No acórdão fundamento esteve em causa, entre outros, a fiscalização de normas do Regulamento de Custas Processuais na parte em que prevêem o pagamento pela parte vencida de 50% do somatório das taxas de justiça pagas pelas partes, para compensação da parte vencedora face às despesas com honorários de mandatário, sem que esse valor tenha que ser justificado, entendendo a Fazenda Pública que esta previsão viola os princípios constitucionais do acesso ao direito e aos tribunais e da proporcionalidade, tendo o STA decidido desatender o pedido formulado pela Fazenda Pública por entender que os preceitos do RCP não enfermam da apontada inconstitucionalidade e que a interpretação da Fazenda, por desconforme com o texto da lei, não pode fundamentar qualquer declaração de inconstitucionalidade.
9. Aquilo que o acórdão fundamento refere é apenas que, ainda que a parte tenha documentação e comprovação de que pagou honorários de mandatário em valor ao limite legal de 50% do somatório das taxas de justiça pagas pela parte vencida e pela parte vencedora, não pode incluir esse valor, perfeitamente documentado e que pagou os devidos impostos, na nota justificativa de custas de parte, pelo que este acórdão não perfilha solução oposta com a decisão ora recorrida.
10. O acórdão não diz, em qualquer momento, que o valor efetivamente pago de honorários tenha de ser documentado ou comprovado, pelo que este acórdão não perfilha solução oposta à decisão recorrida na medida em que não foi decidido no acórdão fundamento pela necessidade de comprovação de honorários.
11. Deste modo, este acórdão não pode ser aceite como decisão fundamento para efeitos de admissibilidade do presente recurso.
12. A decisão recorrida não merece qualquer reparo ao ter considerado que não existe necessidade de comprovar documentalmente o valor dos honorários suportados pela parte vencedora para que esta tenha direito a receber a título de custas de parte 50% do somatório das taxas de justiça pagas pelas partes para compensação dos valores suportados com honorários de mandatário.
13. O que está em causa no presente processo é saber se a parte vencedora deve apresentar com a nota discriminativa e justificativa de custas de parte o recibo de honorários pago ao seu mandatário para que tenha direito a receber da parte vencida 50% do somatório das taxas de justiça pagas pelas partes para compensação dos valores suportados com honorários de mandatário.
14. A Recorrente sustenta que o pagamento de 50% do somatório das taxas de justiça pagas pela partes para compensação da parte vencida com honorários de mandatário não é devido sem que a parte vencida comprove documentalmente que efetivamente pagou estes valores a título de honorários, no entanto, aquilo que a lei estabelece é que: (i) A Recorrida estava obrigada a indicar em rubrica autónoma da nota discriminativa e justificativa de custas de parte o valor das despesas com mandatário até ao limite correspondente a 50% do somatório das taxas de justiça pagas pela parte vencida e pela parte vencedora, a título de honorários do mandatário (e tão só a indicar não se exigindo qualquer documentação ou comprovação do valor), (ii) Caso as quantias efetivamente pagas pela Recorrida a título de honorários de mandatário sejam superiores aos limites previstos no artigo 26.º nº. 3 está vedada à Recorrida a possibilidade de indicar na nota discriminativa e justificativa de custas de parte esses valores que excedem o limite.
15. Da conjugação dos normativos legais emerge que sempre que o valor peticionado a título de honorários do mandatário não exceda aquele limite de metade da taxa de justiça globalmente considerada inexiste o dever de comprovar o efetivo pagamento de honorários bastando a sua mera indicação (cfr. decisão de reclamação de custas proferida pelo TAF de Viseu no processo n.º 345/16.8BEVIS).
16. Assim, e como bem decidido pelo tribunal a quo, o único requisito que a lei estabelece para que a parte seja condenada no pagamento de 50% do somatório das taxas de justiça pagas pela parte vencida e pela parte vencedora para compensação da parte vencedora face às despesas com honorários é a apresentação da nota justificativa com indicação em rubrica autónoma das quantias pagas que não excedam aquele limite legal.
17. O entendimento da Recorrida, quando sustenta que “a Requerente, não tendo de fazer prova dos montantes que suportou a título de honorários, venha a adquirir o direito a solicitar sempre o montante equivalente a 50% da soma das taxas de justiça pagas pelas partes, independente de os mesmos corresponderem a tal montante, ou mesmo que os não tenha pago”, também não pode proceder na medida em que: (i) a lei não exige esta comprovação; (ii) a lei só exige que o valor seja indicado em rubrica autónoma na nota justificativa e discriminativa de custas de parte apresentadas à Fazenda Pública; (iii) o mandato se presume oneroso, motivo pelo qual a lei não prevê o pagamento de custas de parte para compensação com honorários de mandatário quando não tenha sido constituído mandatário (artigo 26.º, n.º 5 do RCP); e os honorários cobrados pelo mandatário e a forma do seu pagamento se inserem na relação entre o advogado e o cliente, protegida pelo seu sigilo profissional (neste sentido vide decisão de reclamação de custas proferida pelo TAF de Viseu no processo n.º 345/16.8BEVIS).
18. Ainda, entende a Recorrida que a afirmação da Recorrente de que “caso a parte vencedora venha pedir o que não pagou estará a violar o disposto naquela alínea c) do n.º 2 do artigo 25.º do RCP”, também não pode proceder na medida em que (i) a alínea c) do n.º 2 do artigo 25.º do RCP prevê a inclusão na nota de custas dos valores pagos a título de encargos ou despesas suportadas pelo agente de execução, o que não é o que está em causa nestes autos e (ii) a lei não prevê que a parte vencedora possa requerer valores aleatórios e não pagos, prevendo somente que, quando solicitar o pagamento dentro do limite fixado na lei, basta indicar este valor sem qualquer necessidade de comprovação documental.
19. A Fazenda Pública não necessita saber se o valor pago pela Recorrida com honorários de mandatário é ou não superior àquele limite na medida em que a lei garante à parte vencedora o pagamento de custas no valor de 50% do somatório das taxas de justiça pagas pelas partes bastando que esta indique este valor em rubrica autónoma na nota discriminativa e justificativa de custas de parte apresentada à parte vencida.
20. Isto é de tal forma evidente que os tribunais se têm pronunciado de forma uniforme considerando que sempre que o valor peticionado a título de honorários do mandatário não exceda o limite de metade da taxa de justiça globalmente considerada, inexiste o dever de comprovar o efetivo pagamento de honorários, bastando a sua mera indicação (ver, exemplificativamente as sentenças proferidas nos processos 211/14.1BEVIS, 331/16.8BEVIS, 264/14.2BEVIS, 193/13.7BEVIS, 34/13.5BEVIS, 32/13.9BEVIS, 451/14.3BEVIS, 31/13.0BEVIS, 332/16.6BEVIS e 35/13.3BEVIS).
21. A falta de comprovação/documentação poderia ter como consequência que o montante devidamente indicado na nota discriminativa e justificativa de custas de parte a título de honorários de mandatário não seria devido, sobretudo porque a lei determina no artigo n.º 26º do RCP a condenação da parte vencida nesse montante desde que tenha sido apresentada nota justificativa (o que efetivamente se verificou), sendo que tal documentação já se encontra na posse da AT que recebe todas as faturas emitidas pelos mandatários da Impugnante através do sistema SAFT pelo que a AT estaria a solicitar documento que se encontra na sua posse e que comprova claramente que as quantias que foram pagas pela Impugnante aos seus mandatários são muitíssimo superiores aos valores peticionados como compensação de honorários não podendo a AT invocar que é outro departamento que recebe tal informação porque a isso é alheia a Impugnante).
22. Por todo o exposto, e atenta a letra da lei, o presente recurso não deverá ser admitido por não estarem cumpridos os requisitos de admissibilidade previsto no artigo 280.º, n.º 5 do CPPT.
23. E, caso o presente recurso seja admitido, o que só por dever de patrocínio se concebe, terá o mesmo de ser julgado necessariamente improcedente uma vez que a Recorrida cumpriu todas as exigências previstas na lei para que a nota justificativa de custas de parte constitua título executivo das quantias nela indicadas, nomeadamente relativas à compensação de honorários de mandatário.»

O Ministério Público, neste STA, emitiu parecer com o seguinte conteúdo:
«I. Objecto do recurso.
1. O presente recurso vem interposto, ao abrigo do nº5 do artigo 280º do CPPT, do despacho do Mmo. Juiz do TAF de Viseu, datado de 06/11/2018, que no âmbito da apreciação de reclamação da nota discriminativa de custas de parte apresentada pela Fazenda Pública, considerou não se mostrar necessária a apresentação, por parte do credor de custas, de documentação a comprovar o pagamento de honorários a mandatário judicial, ao abrigo do disposto no artigo 26º do RCP, e condenou a reclamante em custas pelo incidente.
2. A Recorrente começa por justificar a admissibilidade do recurso, ao abrigo do disposto no nº5 do artigo 280º do CPPT, invocando que a decisão recorrida está em oposição com mais de três sentenças dos tribunais de 1ª instância, que identificou e de que juntou cópia, e com o acórdão do STA de 16/09/2015, processo nº 01443/13.
E quanto ao mérito do recurso, considera a Recorrente que a decisão em causa contraria a jurisprudência do acórdão do STA de 16/09/2015, proferida no processo nº 01443/13, no sentido de que só há lugar ao pagamento de quantia a titulo de compensação de honorários à parte vencedora desde que seja comprovado documentalmente esse pagamento e com os limites previstos na lei.
II. APRECIAÇÃO DO RECURSO.
1. Afigura-se-nos que se mostram reunidos os requisitos de admissibilidade do recurso ao abrigo do disposto no nº5 do artigo 280º do CPPT, por a decisão recorrida estar em oposição com três decisões de tribunais do mesmo grau de hierarquia e em oposição com um aresto de tribunal de hierarquia superior, conforme se alcança da documentação junta pela Recorrente.
2. A questão que se coloca consiste em saber se a decisão recorrida padece do vício de erro de julgamento ao ter considerado que a quantia peticionada a título de honorários a mandatário forense constante da nota discriminativa de custas de parte era sempre devida a título de compensação, independentemente da junção de comprovativo de prova documental sobre a emissão de recibo referente a esse pagamento.
Resulta dos autos que a Fazenda Pública apresentou reclamação da nota discriminativa de custas, insurgindo-se contra o montante peticionado a título de compensação pelo pagamento da taxa de justiça, por considerar ser devido montante inferior, e contra o montante peticionado a título de compensação por honorários devidos a mandatário constituído, por considerar não se mostrarem justificados através de prova documental.
No despacho sindicado, o Mmo. Juiz “a quo” considerou assistir razão à Reclamante na parte relativa ao montante da taxa de justiça devida, por a reclamada ter admitido erro no seu cálculo e concordado com o teor da reclamação. Já no que respeita ao montante peticionado a título de compensação de honorários, considerou haver apenas lugar à sua redução, em função da mencionada redução da taxa de justiça devida.
E no que respeita à responsabilidade pelas custas do incidente (relativo à apresentação da reclamação), o Mmo. Juiz “a quo” fixou essa responsabilidade a cargo da Fazenda Pública.
É contra os dois segmentos desta última parte da decisão judicial que se insurge a Recorrente Fazenda Pública, por considerar que o pagamento de honorários depende da apresentação de comprovativo desse pagamento pela parte vencedora e por entender que a reclamada e aqui recorrida ter também ficado vencida no incidente e dever ser co-responsabilizada pelo pagamento das custas do mesmo.
E afigura-se-nos que lhe assiste razão.
Com efeito, da conjugação do disposto nos artigos 25.º, n.º 2, al. d), e 26.º, n.º 3, al. c), do RCP, resulta que só há lugar ao pagamento dos honorários efetivamente suportados pela parte vencedora e dentro dos limites ali fixados. Tal foi o entendimento sufragado no aresto do STA, citado pela Recorrente, de 16-09-2015, proferido no recurso n.º 01443/13, e no qual se deixou exarado que os referidos preceitos legais“ não prevêem, de modo nenhum, o pagamento (pela parte vencida) de 50% do somatório das taxas de justiça pagas pelas partes, para compensação da parte vencedora face às despesas com honorários do mandatário, sem que esse valor tenha que ser justificado. O que os referidos artigos prevêem é que esse limite imposto por lei para compensar a parte vencedora, naturalmente se tiver suportado despesas com honorários de mandatário judicial desse valor, ou superior, recebendo, o que tiver efectivamente pago, na totalidade quando o valor dos honorários se contenha dentro dos 50% do somatório das taxas de justiça pagas pelas partes.”.
Entendimento este sufragado na doutrina pelo conselheiro Salvador da Costa, in “Regulamento das Custas Processuais, Anotado”, 5.ª Edição, Almedina, 2013, pág. 305, em cuja obra defende que: “a obrigação da parte vencida pagar à parte vencedora a compensação é limitada, por um lado, ao valor que esta tenha efectivamente despendido com o pagamento de honorários de mandatário judicial (...) e, por outro lado, pela circunstância de os honorários em causa não deverem ser de valor superior a metade do valor das taxas de justiça pagas por ambas as partes.”

Entendemos, assim, que se impõe a revogação da decisão recorrida nesta parte.
Afigura-se-nos, contudo, que a parte reclamada deve ser convidada a juntar o respetivo comprovativo dos honorários pagos, em prazo a fixar, pois não há motivo bastante para ver precludido o direito a regularizar o seu pedido.
Afigura-se-nos igualmente que tendo a Fazenda Pública visto deferida a sua reclamação, a responsabilidade pelas custas do incidente deve ficar a cargo da parte reclamada (sendo certo que mesmo a entender-se como na decisão recorrida, a responsabilidade pelas custas sempre devia ser repartida, por a reclamante ter obtido vencimento parcial da reclamação).

Por despacho do relator o despacho do Mº Pº foi notificado à entidade reclamada nos termos e para os efeitos ali promovidos sendo que a mesma continuou a defender a não necessidade de comprovação das despesas com honorários de advogados, tendo apresentado várias cópias de facturas que lhe foram apresentadas para pagamento de honorários pelos seus Advogados constantes de fls.136 a 144 dos autos.

2 – Fundamentação:
O despacho de que se recorre tem o seguinte teor:
«Reclamação da nota discriminativa das custas de Parte apresentada pelo Exmo. RFP e resposta apresentada pela Impugnante:
Na reclamação há a considerar duas partes:
- a respeitante à taxa de justiça paga a mais pela Impugnante, parte em que não há dissenso pois esta veio a considerar que a Reclamante tem razão;
- a nota discriminativa na parte em que não é apresentada documentação dos honorários pedidos pela Impugnante.
Operando-se a redução da taxa de justiça paga a mais e consequente redução dos 50% das taxas pagas pelas Partes, a nota discriminativa, por, na parte respeitante aos honorários ser tão só de 50% da soma daquelas, e este montante é o que emana da aplicação ao caso concreto da norma prevista no artigo 26º do RCP, não resultando desta norma ou de outras que o credor das custas de parte tenha que, nesta situação, apresentar documentação das despesas de honorários, pelo que se indefere a reclamação.
Custas do incidente em 1 UC pela Reclamante.»

DECIDINDO NESTE STA
A questão que se coloca está devidamente identificada no parecer do Sr. Procurador Geral Adjunto supra destacado, consistindo em saber se a decisão recorrida padece do vício de erro de julgamento ao ter considerado que a quantia peticionada a título de honorários a mandatário forense constante da nota discriminativa de custas de parte não carecia de comprovação documental sendo sempre devida a título de compensação, por atenção ao disposto nos artigos 25º e 26º do Regulamento das Custas Processuais (RCP).

Previamente haverá que verificar da verificação ou não dos requisitos de admissibilidade do recurso ao abrigo do artº 284º nº 5 do CPPT, sendo que a recorrida se pronuncia em sede de contra-alegações pela sua não admissibilidade.
Vejamos:
Ainda que a norma do artigo 280º nº 5 do CPPT tenha natureza excepcional, relativamente à regra da irrecorribilidade das decisões afigura-se-nos que, no caso concreto tais requisitos estão reunidos uma vez que a decisão recorrida foi indicada como estando em oposição com três decisões de tribunais do mesmo grau de hierarquia, as quais embora consubstanciando a forma de despacho são decisões definitivas que põem termo à reclamação e portanto equiparáveis a sentenças atendendo à sua substância e teleologia intrínseca e, ainda, em oposição com um acórdão deste STA de 16.09.2015, proferido no processo n.º 01443/13, sendo que bastaria a referência que é feita a este acórdão de um tribunal superior, para consentir a admissão e conhecimento do presente recurso, considerando ainda que as decisões em confronto designadamente a do acórdão do STA referido perfilham, a nosso ver, «solução oposta» estando em causa o «mesmo fundamento de direito» e uma identidade de factos subjacentes sendo que embora este aresto tenha abordado o questão colocada na vertente da eventual inconstitucionalidade dos preceitos do RCP supra destacados, acaba por se pronunciar expressamente quanto à necessidade de documentação do valor pago a título de honorários, o que foi determinante para a consideração de que não ocorriam as inconstitucionalidades ali suscitadas.

Conhecendo, como entendemos dever conhecer do recurso apresentado, por verificação dos respectivos requisitos de admissibilidade assim se assegurando o valor da igualdade na aplicação do direito, passaremos de imediato ao conhecimento do recurso.
Do mérito do recurso:

O Regulamento das Custas Processuais (RCP) aprovado pelo D. L. 34/2008 de 26 de Fevereiro veio estabelecer um novo paradigma de pagamento e cobrança das custas processuais e em particular de custas de parte de que entendemos dever começar por dar uma referência sumária.
Assim, nos termos do artº 529º nº 4 do CPC as custas processuais abrangem a taxa de justiça, os encargos e as custas de parte e por sua vez estas compreendem o que cada parte haja despendido com o processo e tenha direito a ser compensada em virtude da condenação da parte contrária, nos termos do Regulamento das Custas Processuais – art.º 529º, n.º 4 do C. P. Civil.
Estão compreendidas nas custas de parte - art.º 533º do mesmo código - nomeadamente as seguintes despesas que devem ser objeto de nota discriminativa e justificativa, na qual devem constar também todos os elementos essenciais relativos ao processo e às partes:
As taxas de justiça pagas; Os encargos efetivamente suportados pela parte; As remunerações pagas ao agente de execução e as despesas por este efetuadas; Os honorários do mandatário e as despesas por este efetuadas.

Não sendo pagas as custas de parte, a parte vencedora dispõe de título executivo, conforme resulta dos artigos 26.º, n.º 3, e 36.º, n.º 3, do RCP, e do artigo 607.º, n.º 6, do CPC, devendo a execução ser instaurada pela própria parte. No dizer, exemplarmente sintetizado, do Ac. do Tribuanl Constitucional tirado no processo 440/14 “(…) contrariamente ao regime aplicável anteriormente à reforma do Código das Custas Judiciais introduzida pelo Decreto-Lei n.º 324/2003, de 24 de dezembro de 2003 - em que vigorava a restituição antecipada, pelo Cofre Geral dos Tribunais, da taxa de justiça paga pelo vencedor no decurso da ação -, as custas de parte, incluindo as quantias pagas efetivamente a título de taxa de justiça ou outros encargos do processo e a compensação por despesas com honorários do mandatário judicial, são pagas diretamente pela parte vencida à parte que delas seja credora, competindo ao interessado o ónus de remeter para o tribunal e a parte vencida a respetiva nota discriminativa e justificativa, após o trânsito em julgado da sentença (artigos 25.º e 26.º, n.º 2, do RCP).

Por outro lado, as custas de parte não integram a conta de custas a elaborar pela secretaria do tribunal, nem beneficiam do direito de retenção relativamente a quantias depositadas à ordem do tribunal, nem estão abrangidas pelo processo de execução de custas a instaurar pelo Ministério Público, cabendo à parte vencedora, em caso de incumprimento, intentar por iniciativa própria a competente ação executiva contra o responsável pelas custas (artigos 29.º, 34.º e 36.º, n.º 3, do RCP(…).

No nosso caso questiona-se apenas o montante a considerar nas custas de parte a título de honorários pagos ao mandatário pela parte vencedora e a necessidade ou não de documentação deste pagamento.

Para a dilucidação da questão devemos considerar, essencialmente, o disposto nos seguintes normativos legais do RCP, sendo os sublinhados e negritos da nossa autoria para melhor destaque e compreensão:

Artigo 25.º
Nota justificativa
1 - Até cinco dias após o trânsito em julgado ou após a notificação de que foi obtida a totalidade do pagamento ou do produto da penhora, consoante os casos, as partes que tenham direito a custas de parte remetem para o tribunal, para a parte vencida e para o agente de execução, quando aplicável, a respectiva nota discriminativa e justificativa.
2 - Devem constar da nota justificativa os seguintes elementos:
a) Indicação da parte, do processo e do mandatário ou agente de execução;
b) Indicação, em rubrica autónoma, das quantias efectivamente pagas pela parte a título de taxa de justiça;
c) Indicação, em rubrica autónoma, das quantias efectivamente pagas pela parte a título de encargos ou despesas previamente suportadas pelo agente de execução;
d) Indicação, em rubrica autónoma, das quantias pagas a título de honorários de mandatário ou de agente de execução, salvo, quanto às referentes aos honorários de mandatário, quando as quantias em causa sejam superiores ao valor indicado na alínea c) do n.º 3 do artigo 26.º;
e) Indicação do valor a receber, nos termos do presente Regulamento.
3 - Na acção executiva, a liquidação da responsabilidade do executado compreende as quantias indicadas na nota discriminativa, nos termos do número anterior.

Este preceito veio a ser alterado pelo DL 86/2018, de 29 de Outubro passando a ter a seguinte redacção:

Artigo 25.º
[...]
1 - Até 10 dias após o trânsito em julgado ou após a notificação de que foi obtida a totalidade do pagamento ou do produto da penhora, consoante os casos, as partes que tenham direito a custas de parte remetem para o tribunal, para a parte vencida e para o agente de execução, quando aplicável, a respetiva nota discriminativa e justificativa, sem prejuízo de esta poder vir a ser retificada para todos os efeitos legais até 10 dias após a notificação da conta de custas.
2 - [...].
3 - O patrocínio de entidades públicas por licenciado em direito ou em solicitadoria com funções de apoio jurídico equivale à constituição de mandatário judicial, para efeitos de compensação da parte vencedora a título de custas de parte.
4 - (Anterior n.º 3.)»

Artigo 26.º
Regime
1 - As custas de parte integram-se no âmbito da condenação judicial por custas, salvo quando se trate dos casos previstos no artigo 536.º e no n.º 2 do artigo 542.º do Código de Processo Civil.
2 - As custas de parte são pagas diretamente pela parte vencida à parte que delas seja credora, salvo o disposto no artigo 540.º do Código de Processo Civil, sendo disso notificado o agente de execução, quando aplicável.
3 - A parte vencida é condenada, nos termos previstos no Código de Processo Civil, ao pagamento dos seguintes valores, a título de custas de parte:
a) Os valores de taxa de justiça pagos pela parte vencedora, na proporção do vencimento;
b) Os valores pagos pela parte vencedora a título de encargos, incluindo as despesas do agente de execução;
c) 50 % do somatório das taxas de justiça pagas pela parte vencida e pela parte vencedora, para compensação da parte vencedora face às despesas com honorários do mandatário judicial, sempre que seja apresentada a nota referida na alínea d) do n.º 2 do artigo anterior;
d) Os valores pagos a título de honorários de agente de execução.
4 - No somatório das taxas de justiça referidas no número anterior contabilizam-se também as taxas dos procedimentos e outros incidentes, com exceção do valor de multas, de penalidades ou de taxa sancionatória e do valor do agravamento pago pela sociedade comercial nos termos do n.º 6 do artigo 530.º do Código de Processo Civil e do n.º 3 do artigo 13.º
5 - O valor referido na alínea c) do n.º 3 é reduzido ao valor indicado na alínea d) do n.º 2 do artigo anterior quando este último seja inferior àquele, não havendo lugar ao pagamento do mesmo quando não tenha sido constituído mandatário ou agente de execução.
6 - Se a parte vencida for o Ministério Público ou gozar do benefício de apoio judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo, o reembolso das taxas de justiça pagas pelo vencedor é suportado pelo Instituto de Gestão Financeira e das Infra-Estruturas da Justiça, I.P.

A decisão ora recorrida considerou em suma que não resulta do artº 26º do RCP que o credor das custas de parte tenha de apresentar documentação comprovativa das despesas de honorários por si apresentadas, com o que não se conforma a recorrente Administração Tributária que defende exactamente o inverso. Por sua vez a recorrida sustentou que sempre que o valor peticionado a título de honorários não venha a exceder o limite de 50% do somatório das taxas de justiça pagas pelas partes para compensação da parte vencida não existe o dever de comprovar o efectivo pagamento de honorários bastando a sua mera indicação em rubrica autónoma.
Quid Júris?
Afigura-se-nos da leitura do disposto nos preceitos legais do RCP supra citados que muito embora não contenham a exigência expressa de documentação do valor dos honorários pagos na situação prevista na alínea c) do nº 3 do artº 26º do RCP (e daí, porventura, a interpretação meramente literal efectuada na 1ª instância que tem acolhimento na doutrina (vide Miguel de Lucena e Leme Côrte-Real, Advogado; Custas de Parte- Porto, Julho de 2011) e na jurisprudência (vide acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 13/11/2019 tirado no recurso nº 491/16.8T8LRA-A.C1) a melhor interpretação terá de conjugar os vários elementos previstos no artº 9º do C. Civil o qual dispõe e encontrar algum sentido entre os dois normativos supra citados que aparentemente são excludentes (em parte) um do outro.
É sabido e determinado pelo normativo acabado de referir, que a interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada mas que não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso e que na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.

Ora, este STA, ponderando todos os elementos de interpretação que se impõem, a propósito da apreciação da constitucionalidade dos citados preceitos do RCP, já teve oportunidade de se pronunciar sobre a necessidade de documentação das despesas de honorários apresentadas pela parte vencedora e em sentido afirmativo. Com efeito no acórdão de 16/09/2015 tirado no recurso nº 01443/13, no qual o ora relator interveio como Juiz Adjunto, expendeu-se a seguinte argumentação:
“( De acordo com a alínea d) do artº 25, a parte indicará, em rubrica autónoma, as quantias pagas a título de honorários de mandatário ou de agente de execução. Não se trata de um valor aleatório, pré-fixado, ou sem justificação, trata-se do valor pago a título de honorários, naturalmente documentado, com a liquidação dos impostos devidos. Mas não pode incluir na nota discriminativa e justificativa qualquer valor pago a título de honorários, mesmo que efectivamente pago. Como refere a parte final dessa alínea d) - salvo, quanto às referentes aos honorários de mandatário, quando as quantias em causa sejam superiores ao valor indicado na alínea c) do n.º 3 do artigo 26.º; - só poderão constar de tal nota discriminativa e justificativa os honorários pagos aos mandatários, pela parte vencedora, que não excedam 50% do somatório das taxas de justiça pagas pela parte vencida e pela parte vencedora. Isto é, como se refere na alínea c) do artº 26º, 50% do somatório das taxas de justiça pagas pela parte vencida e pela parte vencedora, é o valor que a lei impõe como limite para compensação da parte vencedora das despesas que haja suportado com honorários do mandatário judicial, evidentemente se tiver tido despesas e elas atingirem tal montante.
Assim, os referenciados artigos não prevêem, de modo nenhum, o pagamento (pela parte vencida) de 50% do somatório das taxas de justiça pagas pelas partes, para compensação da parte vencedora face às despesas com honorários do mandatário, sem que esse valor tenha que ser justificado. O que os referidos artigos prevêem é que esse é o limite imposto por lei para compensar a parte vencedora, naturalmente se tiver suportado despesas com honorários de mandatário judicial desse valor, ou superior, recebendo, o que tiver efectivamente pago, na totalidade quando o valor dos honorários se contenha dentro dos 50% do somatório das taxas de justiça pagas pelas partes.
Não enfermam, pois, os citados preceitos da apontada inconstitucionalidade(…)”.

Ou seja:
Foi exactamente a afirmação da necessidade de documentação (sempre) das despesas com honorários em apreciação que levou o STA a afastar em sede de fiscalização concreta a inconstitucionalidade, entre outros, dos preceitos supra citados.
Continuamos a concordar com esta interpretação que, a nosso ver, melhor se coaduna com a ponderação de todos os elementos interpretativos sinalizados no artº 9º do Código Civil, sendo de destacar e relevar por concordância com a mesma a argumentação da recorrente expressa nas suas conclusões XI a XIII consistente em que resulta de todo o regime de honorários a requerer em custas de parte, fixado no RCP, que a necessidade de prova dos montantes pagos é intrínseca ao funcionamento deste regime, precisamente, porque não está ali previsto o pagamento, à parte vencedora, de 50% do somatório das taxas de justiça pagas pela parte vencida e pela parte vencedora (montante máximo) sem mais nenhuma obrigação porquanto tal direito de ressarcimento das despesas efectivamente suportadas a título de honorários de mandatário, não pode ser entendido (porque seguramente o não quis o legislador) como um “prémio” no valor correspondente a 50% do somatório das taxas de justiça pagas no processo pelas partes, independentemente do valor que a título daqueles honorários tenha sido despendido, o que só pode ser confirmado pelo Tribunal através da apresentação de documento comprovativo do valor pago pela parte vencedora ao seu mandatário no processo, sendo que nos termos da lei, o ónus da prova de factos constitutivos de direitos recai sempre sobre quem os invoque, pelo que caberia à impugnante fazer prova dos montantes que efetivamente despendeu com o seu mandatário neste processo;
Ainda no mesmo sentido, embora a propósito de uma reclamação apresentada por um cidadão contra a inclusão na nota de custas de parte de uma quantia para pagamento do serviço jurídico prestado pela representação em juízo por juristas do Primeiro Ministro e de um Ministério Português, pode ver-se o acórdão da 1ª Secção de Contencioso Administrativo deste STA de 24/04/2019 tirado no recurso nº 01367/16.4BALSB onde além do mais se exarou:
(..) Os honorários dos advogados compreendem uma parte de remuneração pelo trabalho prestado e uma outra destinada ao reembolso de preparos e despesas em que aqueles incorreram enquanto mandatários de um determinado cliente e a propósito de uma determinada causa. Da leitura do RCP, designadamente da leitura do seu artigo 25.º, n.º 2, al. d) (“Devem constar da nota justificativa os seguintes elementos: (…) Indicação, em rubrica autónoma, das quantias pagas a título de honorários de mandatário ou de agente de execução, salvo, quanto às referentes aos honorários de mandatário, quando as quantias em causa sejam superiores ao valor indicado na alínea c) do n.º 3 do artigo 26.º”. Esta norma é bastante clara pois, partindo da ideia de que a parte vencida tem que pagar à parte vencedora qualquer coisa a título de honorários com o seu advogado, é imprescindível que da nota justificativa de custas constem as quantias pagas, precisamente, a título de honorários de mandatário, sendo que a nota de honorários é entregue pelo advogado ao seu cliente em momento oportuno.(…)”

E, o nosso entendimento baseia-se na consideração de que resulta da lei, muito claramente, que o legislador condicionou o pagamento dos honorários a que nos vimos referindo em duas vertentes. O seu valor real até determinada percentagem da taxa de justiça conforme o disposto no artº 25º do RCP e um valor limitado no seu máximo (valor não real) quando este ultrapasse a percentagem referida no artº art. 26°, n.º 3 do mesmo RCP. Mas para se determinar o valor de honorários a pagar (o real) ou o valor não real/ficcionado estes têm sempre de ser documentados sob pena de se assim não for entendido, então sempre que o valor dos honorários seja inferior ao referido limite máximo de 50% previsto no preceito acabado de referir, nada impediria/obstaria a que a parte vencedora venha solicitar (potencialmente, sempre) este valor máximo (sem possibilidade de qualquer controle ou aferição de eventual enriquecimento sem causa, por banda da contra parte e do próprio tribunal em sede de reclamação). E, se assim fosse ficaria completamente desprovido de efeito útil o disposto no artº 25º nº 2 alínea d) do RCP e então poderia questionar-se com propriedade a inconstitucionalidade do disposto no artº 26º nº 3 al. c) do mesmo regulamento se interpretado no sentido de que prevê, sem mais, o pagamento (pela parte vencida) de 50% do somatório das taxas de justiça pagas pelas partes, para compensação da parte vencedora face às despesas com honorários do mandatário, sem que esse valor tenha que ser justificado, o que seria violador dos princípios constitucionais do acesso ao direito e aos tribunais, e da proporcionalidade.
Não se questionam nestes autos as várias formas possíveis de documentação das despesas com honorários e sua validade pelo que entendemos que apenas nos podemos pronunciar em termos gerais sobre a necessidade ou não da sua documentação o que merece a resposta afirmativa supra expressa nos termos e com os fundamentos expostos.
A finalizar expressamos as seguintes conclusões:
1) De acordo com a alínea d) do artº 25, do RCP a parte vencedora indicará, em rubrica autónoma, as quantias pagas a título de honorários de mandatário ou de agente de execução. Não se trata de um valor aleatório, pré-fixado, ou sem justificação, trata-se do valor pago a título de honorários, naturalmente documentado.
2) O valor de 50% do somatório das taxas de justiça pagas pelas partes é o limite imposto por lei para compensar a parte vencedora, naturalmente se tiver suportado despesas com honorários de mandatário judicial desse valor, ou superior, recebendo, o que tiver efectivamente pago, na totalidade quando o valor dos honorários se contenha dentro dos 50% do somatório das taxas de justiça pagas pelas partes.

Aqui chegados deve ser julgado procedente o recurso com as legais consequências.

4- DECISÃO:
Termos em que acordam os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em julgar procedente o recurso, revogando a decisão recorrida e determinando que na nota discriminativa e justificativa de custas de parte apresentada pela recorrente se considerem os honorários efectivamente pagos que não podem ser superiores a 50 % do somatório das taxas de justiça pagas pela parte vencida e pela parte vencedora.

Custas pela Recorrida em ambas as instâncias fixando-se neste STA no mínimo legal.

Lisboa, 17 de Dezembro de 2019. - Ascensão Lopes (relator) - Francisco Rothes (vencido conforme declaração que anexo) - José Gomes Correia.


Voto de vencido
As custas de parte são um conceito normativo que corresponde, não a tudo quanto a parte vencedora despendeu com o processo, mas apenas àquela parte do que, tendo sido despendido, o CPC e o RCP permitem que a parte recupere em virtude de ter obtido vencimento (total ou parcial) na causa e na medida desse vencimento (cfr. arts. 529.º, n.º 4, e 533.º, do CPC). Nelas se inclui a compensação à parte vencedora das despesas suportadas com honorários do mandatário judicial por ela constituído, compensação que a lei computa em 50% do somatório das taxas de justiça pagas pela parte vencida e pela parte vencedora, a menos que o valor efectivamente pago a título de honorários seja inferior àquele [cfr. art. 533.º, n.º 2, alínea d), e art. 26.º, n.ºs 3, alínea c), e 5, do RCP].
A meu ver, nem o elemento literal (sendo este o ponto de partida e o limite da actividade hermenêutica) nem qualquer outro elemento interpretativo permitem extrair da lei, designadamente do RCP, o sentido de que se exige à parte vencedora que tenha constituído mandatário judicial, em ordem a obter da parte vencida a compensação legalmente devida pelas despesas com honorários do mandatário judicial, a comprovação do pagamento dos honorários a este pagos e, muito menos, mediante a apresentação do respectivo recibo; exige-se-lhe apenas a apresentação da nota discriminativa e justificativa das custas de parte. Essa compensação, que consta da condenação em custas [cfr. arts. 527.º, n.º 1, 529.º, n.º 1 e 607.º, n.º 6, todos do CPC, e art. 26.º, n.º 1, do RCP], será de 50% do somatório das taxas de justiça pagas pela parte vencida e pela parte vencedora, a menos que os honorários não tenham atingido esse valor, caso em que deverá ser inscrito o seu efectivo valor em rubrica autónoma na nota de custas de parte a apresentar pela parte vencedora, nos termos da alínea c) do n.º 2 do art. 25.º do RCP.
Note-se que a apresentação da nota justificativa e discriminativa de custas de parte não equivale a um pedido de condenação da parte vencida, designadamente dos honorários suportados ou de parte deles (como parece resultar da reiterada referência a “honorários peticionados” feita no acórdão), em que competiria ao autor a alegação e comprovação dos factos constitutivos do seu direito. Essa nota visa tão-só discriminar e liquidar a responsabilidade que resulta da já proferida condenação em custas e interpelar o devedor para o pagamento.
A interpretação adoptada no acórdão cria por via jurisprudencial mais um requisito para percepção das custas de parte. Que esse requisito é, salvo o devido respeito, manifestamente impertinente resulta do facto de o mesmo não poder ser observado em situações como aquelas em que o mandato judicial é exercido no âmbito de um contrato de trabalho ou em regime de avença, situações em que a parte vencedora não terá como comprovar a relação directa entre os pagamentos efectuados ao mandatário judicial e o concreto processo.
A interpretação adoptada no acórdão dá também origem a uma intolerável situação de desigualdade, na medida em que por certo ninguém sustentará a exigência de qualquer comprovativo de pagamento quando a compensação a título de custas de parte for devida pelo patrocínio de entidades públicas por licenciado em direito ou em solicitadoria com funções de apoio jurídico, que a lei faz equivaler, para esse efeito, à constituição de mandatário judicial (cfr. art. 25.º, n.º 3, do RCP).
Poderá também questionar-se, pelo menos no que respeita às pessoas singulares, se a exigência de revelação do montante dos honorários pagos ao mandatário judicial não constituirá uma injustificada intromissão no domínio da esfera privada dos cidadãos.
Finalmente, a interpretação adoptada no acórdão parece transformar o incidente de reclamação da nota justificativa (que, a meu ver, tem o seu âmbito delimitado à verificação da medida da responsabilidade, mediante aferição da correcção da liquidação efectuada pela parte vencedora) numa verdadeira “acção dentro de uma acção”, em que se poderia discutir não só o pagamento, como até o valor dos honorários pagos pela contraparte – eventualmente, com alegação e exigências de prova mais complexas do que a própria acção a que respeitam as custas de parte – numa solução legislativa que, manifestamente, não pode ter sido querida pelo legislador.
Se, porventura, a parte vencida souber (e a AT, aqui reclamante, sempre saberá se foi ou não emitido recibo e por que valor) que o valor dos honorários efectivamente pago pela parte vencedora ao seu mandatário não atingiu 50% do somatório das taxas de justiça pagas pela parte vencida e pela parte vencedora e se na nota discriminativa não foi apresentado aquele valor [como o impõe a alínea c) do n.º 2 do art. 25.º do RCP], sempre poderá recusar o pagamento e, se o credor avançar com a execução, poderá discutir o montante efectivamente pago a título de honorários em sede de oposição à execução (cfr. art. 731.º do CPC). Nem se diga que tal não será possível por o título executivo ser uma sentença. É que o título executivo neste caso é compósito, integrado pela sentença condenatória e pela certidão da nota discriminativa (que liquida a responsabilidade por custas de parte) e só aquela tem os seus fundamentos de oposição limitados pelo art. 729.º do CPC.
Assim sendo, e dando de barato que se verifica a oposição que permite a admissão do recurso ao abrigo do disposto no n.º 5 do art. 280.º do CPPT, negaria provimento ao recurso.
(Francisco Rothes)