Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0422/15
Data do Acordão:11/19/2015
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:ANA PAULA PORTELA
Descritores:COMISSÃO DE SERVIÇO
RENOVAÇÃO
GESTÃO CORRENTE
INDEMNIZAÇÃO
CARGO DIRIGENTE
Sumário:I - No âmbito do Decreto-Lei nº 323/89, de 26 de Setembro e da Lei 49/99 de 22/6, a comissão de serviço dos titulares de cargos dirigentes, que não for expressamente renovada, cessa automaticamente no termo do respectivo prazo e os titulares de cargos dirigentes cuja comissão de serviço não for renovada permanecem no exercício das respectivas funções em regime de gestão corrente até à designação do novo titular, no âmbito do DL 323/89 sem prazo e pelo prazo de seis meses no âmbito da Lei 49/99.
II - Quando cessou a comissão de serviço da aqui recorrente pelo decurso do prazo de 3 anos sem que tivesse ocorrido renovação da mesma, em 6/5/2000, portanto na vigência desta Lei 49/99, as funções passaram a ser asseguradas em regime de gestão de corrente ou substituição pelo prazo máximo de seis meses e posteriormente em situação precária até ao despacho de 12.03.2007 do Presidente do Instituto da Vinha e do Vinho, I.P., que, em função da reestruturação dos serviços determinou a cessação de funções de todos os dirigentes daquele Instituto.
III - Não há, nesta situação, direito a uma indemnização por cessação automática da comissão de serviço, derivado de reorganização dos serviços, prevista no referido art. 26º da Lei n.º 2/2004 que visa compensar o titular de cargo dirigente pela frustração das suas expectativas remuneratórias em função de um prazo estipulado para fim da comissão de serviço em que está investido, quando a remuneração do cargo exercido em comissão é superior à que aufere no lugar da sua categoria por não existir qualquer expectativa relativamente a um termo para o exercício de funções, sabendo (ou devendo saber) que a situação pode terminar a qualquer momento por não existir qualquer prazo fixado para a mesma.
IV - O não recebimento de uma indemnização que não está prevista na lei para a situação precária da aqui recorrente mas apenas para uma situação legal de comissão de serviço, não afecta a igualdade, boa fé e justiça (não são iguais as situações precárias e tituladas e não é a mesma coisa o direito à remuneração relativa ao exercício de uma função e o direito a uma indemnização que pressupõe um prazo de vigência que não existe na situação precária e já existe na vigência de uma comissão de serviço a termo) e da confiança (a haver expectativas as mesmas não eram legítimas nem fundadas).
Nº Convencional:JSTA00069432
Nº do Documento:SA1201511190422
Data de Entrada:06/15/2015
Recorrente:A............
Recorrido 1:INSTITUTO DA VINHA E DO VINHO, IP
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC REVISTA EXCEPC
Objecto:AC TCAS
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR ADM CONT - ACÇÃO ADM ESPECIAL.
Legislação Nacional:CPC13 ART615 N1 C D ART608 N2.
CCIV66 ART12.
CONST76 ART266 N2.
L 2/2004 DE 2004/01/15 ART26 N1 ART27 ART22.
DL 323/89 ART7 N1 B ART18 N10 ART5.
DL 34/93 DE 1993/02/13 ART1.
DL 49/99 DE 1999/06/22 ART18 ART41.
L 51/2005 DE 2005/08/30.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC046799 DE 2004/10/27.
Referência a Doutrina:MARIA DA GLÓRIA GARCIA - IN ESTUDOS SOBRE O PRINCIPIO DA IGUALDADE 2005.
FREITAS DO AMARAL - DIREITO ADMINISTRATIVO VII PAG201 PAG142.
MARCELO CAETANO - VOLI 1991 PAG486.
Aditamento:
Texto Integral: I-RELATÓRIO
1. A…………, devidamente identificada nos autos, moveu, no TAF de Sintra, uma ação administrativa especial, em que requereu a anulação do despacho de 23.05.2007 do Presidente do IVV, que lhe negou o direito a uma indemnização por cessação de comissão de serviço no valor de 5.208€, acrescida de juros de mora.

O IVV contestou a ação, concluindo que a comissão de serviço da A. havia cessado em 6 de Maio de 2000, pelo que encontrando-se a mesma em regime de gestão corrente, o despacho recorrido não enferma de qualquer ilegalidade.

2. O TAF de SINTRA, em 18.04.2013, proferiu acórdão, julgando a ação procedente, e, consequentemente anulou o despacho recorrido e condenou o IVV a proceder ao pagamento à A. da indemnização prevista no nº 1 do art. 26º da L. 2/2004, de 15.01., calculada nos termos do disposto nos nºs 2 e 3, do mesmo artigo, acrescida de juros de mora à taxa legal.

3. Inconformado, o IVV interpôs recurso para o TCAS, que, a fls. 225/232, concedeu provimento ao recurso.

4. Inconformada, A………… vem interpor recurso de revista para esse STA deste Acórdão, nos termos do art.º 150.º do CPTA.

Para tanto alega, em conclusão:

“1 - O IVV, IP interpôs recurso jurisdicional da decisão sumária proferida pelo Exº Desembargador Relator a 1-07-2014, no sentido de não admitir o recurso por aquele deduzido.

2 - Onde o recorrido requereu a retificação daquela decisão, arguiu a nulidade da mesma e, subsidiariamente, dela reclamou para a Conferência.

3 - O douto acórdão recorrido decidiu, em conferência: julgar procedente a reclamação deduzida, julgar procedente o recurso e revogar o acórdão proferido pelo TAF Sintra.

4 - A recorrente não se conforma com tal decisão por julgar que a mesma viola normas de direito substantivo e processuais, e ser altamente injusta, pelo que vem deduzir recurso de revista.

5 - Está em causa no presente recurso uma questão cuja apreciação, pela sua elevada relevância jurídica e social, o torna claramente necessário para uma melhor aplicação do direito ao caso em apreço.

6 - A relevância jurídica advém-lhe do facto de ter sido violada lei substantiva, pelo facto de terem sido aplicadas as normas dos artº 7º, nº 1 al. b) e nº 10 do artº 18º do DL 323/89, na redação dada pelo DL 34/93 de 13-02, quando as mesmas já se encontravam revogadas pelo artigo 26º nº 1 da lei nº 2/2004.

7 – A recorrente preenche o requisito de 12 meses de serviço efetivo previstos no nº 1 do artº 26º da lei 2/2004, para que o recorrido lhe pague o diferencial de remunerações a título de indemnização pela cessação da respetiva comissão de serviço na sequência da reorganização do serviço.

8 - A expetativa remuneratória da recorrente surge aquando da tomada de posse da comissão de serviço que se prolongou por 3 anos, e ressurge e manteve-se ao longo de sete anos em que se manteve naquele cargo.

9 - Importa referir que a proteção da expetativa da recorrente é assegurada pelo nº 1 do artº 26º da Lei 2/2004, pelo facto de ter exercido funções dirigentes por mais de 12 meses, mais concretamente durante 10 anos, muito embora sete dos quais como agente putativo.

10 – Ao referir-se ao mínimo de 12 meses seguidos de exercício efetivo de funções como dirigente, a norma do nº 1 do artº 26º da lei 2/2004 compreende também o exercício das funções em gestão corrente para além dos 12 meses, devendo a mesma ser objeto de interpretação extensiva.

11 - Com efeito, repugnaria à unidade do sistema jurídico que o tempo da gestão corrente após a cessação da comissão por reorganização do serviço releve para efeitos de acesso na carreira (cfr nº 4 do artº 29º da Lei 2/2004), e não releve para efeitos de indemnização (nº 1 do artº 26º).

12 - Estão ainda em causa no presente recurso interesses de relevância social, não só para a recorrente como ainda para quem se encontre ou venha a encontrar no futuro em idêntica situação.

13 - Daí que a gestão corrente ainda que a título de agente putativo, deva relevar para efeitos do preenchimento do período mínimo de 12 meses de exercício de funções de dirigente a que alude o nº 1 do artº 26º da lei 2/2004, sem o que sairia frustrada a obrigação da observância pela administração dos princípios da justiça, da confiança e da boa fé.

14 - O acórdão recorrido violou lei processual (al. c) nº 1 do artº 615º CPC) ao não se pronunciar sobre questão que deveria ter conhecido, ou seja, o efetivo exercício da recorrente como Chefe de Divisão durante sete anos como agente putativo.

15 - O presente recurso tem como fundamento as nulidades previstas no artº 674º/1 al.c) conjugado com o artº 615º al. c) e d) ambos do CPC, de que padece o acórdão recorrido.

16 - O recorrido admitiu expressamente que a comissão de serviço da recorrente cessou a 1 de Março de 2007, pelo que é juridicamente inadmissível que o acórdão recorrido sufrague que a dita comissão havia cessado por caducidade a 6 de Maio de 2000.

17 - Ao manter a recorrente no exercício continuado e efetivo do cargo dirigente durante sete anos, o recorrido alimentou dessa forma a expetativa daquela de que iria ser nomeada para nova comissão de serviço em qualquer momento.

18 - A ora recorrente revê-se na decisão do douto acórdão do TAF Sintra, a cuja fundamentação adere por ser a que decorre da lei vigente à data da cessação do desempenho efetivo do cargo dirigente, e por salvaguardar a observância dos princípios da confiança, da boa fé e da justiça.

19 - Não é verdade que “nunca existiu qualquer manifestação da intenção de renovar a comissão de serviço da Recorrente”, conforme alegou o recorrido.

20 - Já que o contrário se conclui da decisão do recorrido que desde 1-05-2000 até 28 de Fevereiro de 2007 continuou a exigir à recorrente o exercício das funções daquele cargo dirigente.

21 - Cargo aquele que subsistiu até Fevereiro de 2007.

22 - O recorrido não cumpriu as formalidades legais de renovação da comissão de serviço da recorrente e não procedeu à abertura de concurso para provimento daquele cargo dirigente.

23 - O acórdão recorrido é nulo, porque os seus fundamentos estão em oposição com a decisão.

24 - Já que esta foi tomada no pressuposto de que a comissão de serviço da recorrente cessou após conhecimento da reorganização do serviço, o que não é verdade já que aquela ocorreu a 6 de Maio de 2000 e a reorganização ocorreu a 1 de Março de 2007.

25 - O acórdão recorrido não deu relevância ao exercício pela recorrente das funções do cargo dirigente em regime de gestão corrente para além do prazo máximo de seis meses.

26 - A gestão corrente é o “título” que habilita o exercício de funções nos casos em que, após a cessação da comissão de serviço de cargo dirigente, o titular se mantém a exercer as mesmas funções até à sua cessação efetiva, quer por nomeação do novo titular, quer em virtude de qualquer outro facto.

27 - Outra das premissas do acórdão recorrido é a de que o prazo de 12 meses é avaliado até ao termo da cessação da comissão de serviço, independentemente de continuar ou não o dirigente a exercer funções após a data da reorganização do serviço.

28 - Não é correta esta premissa por violar os princípios da igualdade, da confiança e da boa fé.

29 - É também inaceitável admitir-se no acórdão recorrido a tutela do direito da recorrente aos vencimentos auferidos durante os sete anos de gestão corrente, e não se admitir ao mesmo tempo a referida tutela quanto à indemnização prevista no nº 1 do artº 26º da lei 2/2004.

30 - A solução interpretativa que aponta no sentido de a fronteira dos 12 meses ser a que se reporta ao exercício efetivo do cargo, incluindo o tempo de exercício realizado em regime de gestão corrente, é a solução constitucionalmente mais adequada.

31 - Face ao que o entendimento sufragado no douto acórdão recorrido não pode prevalecer por não acolher tal solução.

32 - O direito da recorrente à indemnização do diferencial de vencimentos baseia-se nos preceitos em que o douto acórdão recorrido baseou a solução contrária, ou seja,

33 - A comissão de serviço da recorrente não foi extinta por reorganização do serviço que apenas ocorreu a 28-2-2007.

34 - Decorreram mais de 12 meses de exercício do cargo pela recorrente após a última renovação da comissão.

35 - E decorreram sete anos de exercício do cargo após a cessação da comissão de serviço da recorrente.

36 - O acórdão recorrido é nulo por violação de lei substantiva - artº 18º nº 10 do DL 323/89, norma atualmente reproduzida no nº 1 do artº 26º da lei 2/2004, e princípios da igualdade, da confiança, boa fé e justiça.

37 - O acórdão recorrido violou ainda as normas do artº 615º nº 1 al. c) e d) do CPC.

38 - A recorrente tem direito à indemnização pelo exercício durante mais de 12 meses do cargo de Chefe de Divisão do recorrido.

Termos em que, deve admitir-se a revista, por procedente, confirmando-se o acórdão do TAF Sintra, como é de


JUSTIÇA!”

5. O recorrido não contra-alegou.

6. Foi proferido Acórdão deste STA a admitir o recurso de revista nos seguintes termos:

“ (...) A recorrente justificou a admissibilidade da revista face aos requisitos previstos no art. 674º do CPC, quando ao presente processo é aplicável o regime da revista excepcional prevista no Código de Processo nos Tribunais Administrativos. Daí que as razões invocadas para justificar a admissibilidade da revista estejam em grande medida deslocadas. Importa, todavia, saber se a questão colocada preenche ou não os requisitos do art. 150º do CPTA acima referidos.

3.3. A questão decidida foi a de saber se a ora recorrente tinha ou não direito a uma indemnização pela cessação da sua comissão de serviço que se iniciou em 7 de Maio de 1997, prevista no art. 26º da Lei 2/2004, de 15 de Janeiro.

Nesse artigo consagra-se o direito a uma indemnização quando a cessação da comissão de serviço encargo dirigente “decorra da extinção ou reorganização da unidade orgânica”.

O acórdão recorrido entendeu que a referida comissão cessou por caducidade em 6 de Maio de 2000, a recorrente sustenta que o próprio recorrido admitiu que a mesma cessou a 1 de Março de 2007, por reestruturação dos serviços do Instituto da Vinha e do Vinho.

É, essencialmente, contra o entendimento do acórdão recorrido, ou seja, o entendimento segundo o qual a comissão de serviço caducou, em 6 de Maio de 2000, por não ter sido expressamente renovada, que a recorrente se insurge.

O acórdão recorrido abordou a questão transcreveu um acórdão do STA proferido no processo 46799, de 27-10-2004. Depois de transcrever o acórdão concluiu:

“Aplicando ao caso trazido a recurso a doutrina sustentada no Acórdão do STA tirado no processo n.º 46799 de 27/10/2004, concluiu-se que assiste razão ao ora Recorrente (Instituto da Vinha e do Vinho), na medida em que a comissão de serviço da ora recorrida cessou em 6-5-2000 com fundamento em caducidade, tendo continuado a exercer funções em gestão corrente até à data de 12-3-2007 em que foi informada de que a comissão de serviço iria cessar com efeitos reportados a 1-3-2007”.

3.3. No acórdão deste STA transcrito na decisão recorrida estava em causa a génese do direito a uma indemnização pela cessação da comissão de serviço de cargos dirigentes, regulada então pelo Decreto-Lei 323/89, de 26 de Setembro. Entendeu o referido acórdão que para a situação de não renovação de comissão de serviço, por falta de manifestação expressa de intenção de renovar por parte do membro do Governo competente “o dirigente se manterá no exercício de funções de gestão corrente até á nomeação de novo titular do cargo”.

Contudo, a matéria de facto dada como assente no acórdão seguido (acórdão proferido em 27-10-2004, no processo 046799) era algo diferente. Neste processo 046799 (onde foi proferido o acórdão copiado) o interessado tinha exercido efectivamente o cargo dirigente desde o dia 4 de Junho de 1997 até ao dia 31 de Outubro de 1998. Em 21 de Julho de 1998 foi deliberado dar conhecimento ao interessado que a sua comissão de serviço cessou automaticamente com a entrada em vigor da nova orgânica dos serviços. Em 30 de Julho foi comunicado ao interessado que se manteria no exercício do cargo em regime de gestão. Gestão que, como se vê, durou entre 21 de Julho de 1998 até 31 de Outubro do mesmo ano. O interessado, no processo 046799, manteve-se em exercício de funções já depois de decidida a reorganização dos serviços e até à efectiva ocorrência desta, por um período de tempo ligeiramente superior a três meses.

No presente caso o exercício a título de “gestão corrente” teria ocorrido, segundo o acórdão recorrido desde 6 de Maio de 2000 até 12-3-2007. Mais: o interessado manteve-se ao serviço muito anos antes de ter surgido a necessidade de reorganização dos serviços.

Daí que, a primeira conclusão é a de que o acórdão deste STA transcrito teve uma base factual bastante diversa. Não se colocava ali a questão de saber qual a relevância jurídica de uma prestação de serviço durante 7 anos. Portanto, a mera transcrição do acórdão sem autonomizar as concretas situações de facto do presente processo, não é uma abordagem juridicamente fundada das questões em apreço. De resto a lei aplicável, neste momento, nem sequer é a lei que foi aplicada no acórdão transcrito.

Por outro lado, o acórdão do STA citado apreciou a questão à luz de um regime revogado, no qual, inclusivamente, encontrou uma lacuna de regulamentação que preencheu.

Julgamos, assim, que o presente recurso deve ser admitido com vista a uma melhor aplicação do direito, ou seja, com vista a uma decisão que aplique o direito (vigente) à realidade factual dada como provada.”


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II. OS FACTOS

O tribunal a quo considerou a seguinte factualidade (fixada na primeira instância):

“A. Por despacho de 01.05.1997, do Secretário de Estado da Produção Agro Alimentar, a Autora foi nomeada, na modalidade de Comissão de Serviço, para o cargo de Chefe de Divisão de Gestão Financeira e Patrimonial do Instituto da Vinha e do Vinho - cfr. Termo de Posse a fls. 10 do Processo Administrativo (PA) apenso.

B. A Autora tomou posse no cargo em que foi nomeada em 07.05.1997 - cfr. Termo de Posse a fls. 10 do PA apenso.

C. Em 12.03.2007 a Autora foi informada de que a comissão de serviço iria cessar com efeitos reportados a 01.03.2007 - por acordo.

D. Em 12.03.2007 o Presidente do Instituto da Vinha e do Vinho, I.P., emitiu o Despacho n° 2/2007, com o teor que, em síntese, se extrai: «Assunto: Nomeação de Pessoal Dirigente: Com a entrada em vigor do Decreto-Lei nº 46/2007, de 27 de fevereiro, e da Portaria n° 219-H/2007, de 28 de fevereiro, que vieram respectivamente reestruturar o Instituto da Vinha e do Vinho (IVV) e determinar a organização interna do novo Instituto da Vinha e do Vinho, I.P., cessaram funções todos os dirigentes daquele Instituto reestruturado. Assim, nos termos dos artigos 21º e 27° da Lei 2/2004, de 15 de janeiro, com a alteração introduzida pela Lei nº 51/2005, de 30 de agosto, como forma de assegurar a funcionalidade do Instituto da Vinha e do Vinho, I.P., para exercer, em regime de substituição, os cargos dirigentes das unidades orgânicas constantes do nº 4, do Artº. 1º dos Estatutos do Instituto da Vinha e do Vinho, I.P., publicados em Anexo à referida Portaria, e do meu despacho nº 1/2007, de 12 de março, nomeio os seguintes funcionários: O presente despacho produz efeitos a partir de 01.03.2007» - cfr. fls. 7 a 9 do PA apenso.

E. Em 15.05.2007 a Autora requereu ao Presidente do Instituto da Vinha e do Vinho, I.P., o pagamento de indemnização no valor de € 5.208,00, nos termos do disposto no art. 26° da Lei n° 2/2004, de 15.01, com os seguintes fundamentos:

«1. A ora Exponente, em 1 de maio de 1997, tomou posse no cargo de Chefe de Divisão de Gestão Financeira e Patrimonial desse Instituto.

2. A Comissão de Serviço no exercício das funções de chefia foi sucessivamente renovada.

3. Em 12 de março de 2007 foi-lhe dado conhecimento pessoal pelo então Senhor Diretor de Serviços de Administração, de que a referida comissão de serviço iria cessar com efeitos reportados a 1 de março desse ano.

4. A Exponente auferia a retribuição mensal no cargo de Chefe de Divisão de 2.487,93 €.

5. Como Assessora Principal aufere a retribuição mensal de 2.319,93 €.

6. Ora, tendo a sua comissão de serviço cessado por reorganização dos serviços, a que se refere o disposto no artigo 25°, nº 1, alínea b) da Lei nº 2/2004, de 15 de janeiro, que aprovou o Estatuto do Pessoal Dirigente dos Serviços e Organismos da Administração Central, Regional e Local do Estado, a Expoente, por força do disposto no artigo 26º daquela Lei, tem direito a uma indemnização.

7. Com efeito, a situação aqui descrita preenche a previsão da norma vertida no n° 1 do artigo 26° da citada Lei, com a retificação introduzida pela Lei nº 51/2005, de 30 de agosto, devendo a determinação do seu montante e o respetivo pagamento obedecer às normas constantes dos nºs 2 e 3 do mencionado artigo 26°.

8. Por assim ser, tendo a comissão de serviço, ora cessada, o seu início em 1 de maio de 2006, em situação normal apenas atingiria o seu termo em 1 de maio de 2009.

9. Significando, assim, que cessou ao fim de um período de vigência, a contar da última renovação, de apenas 10 meses (de 1 de maio de 2006 a 1 de março de 2007).

10. Logo, com base no regime estabelecido nos nºs 2 e 3 do artigo 26° da Lei nº 2/2004, de 15 de janeiro, o montante global da indemnização devida corresponde ao período de 26 meses, período de tempo que falta para o termo da comissão de serviço (de 1 de março de 2007 a 1 de maio de 2009).

11. Como o diferencial remuneratório mensal é de 168,00 €, a indemnização devida é no montante global de 5.208,00 € (cinco mil, duzentos e oito euros) correspondente aos diferenciais remuneratórios dos 26 meses que faltaram para o termo da comissão de serviço do cargo de Chefe de Divisão da Exponente, acrescidos dos diferenciais remuneratórios dos subsídios de férias e de Natal dos anos de 2007 e 2008 e do subsídio de férias do ano de 2009 (4.368,00 € + 840,00 € 5.208,00 €).» - cfr. fls. 5 e 6 do PA apenso.

F. Acto impugnado: Por Despacho de 23.05.2007 do Presidente do Instituto da Vinha e do Vinho, I.P., exarado sobre a Informação n° 21/07, foi indeferido o pedido identificado na alínea que antecede, com os seguintes fundamentos:

«1. A Técnica Superior A…………, foi nomeada em comissão de serviço pelo período de três anos, Chefe de Divisão de Gestão Financeira e Patrimonial do quadro de pessoal do Instituto da Vinha e do Vinho por despacho do Secretário de Estado da Produção Agro-Alimentar, de 01 de maio de 1997. A posse do exercício do cargo verificou-se em 07 de maio de 1997.

2. Com a publicação do Dec-Lei nº 46/2007, de 27 de fevereiro e da Portaria nº 219-H/2007, de 28 de fevereiro, foram definidas novas atribuições, aprovados os estatutos e criada uma nova estrutura orgânica para o Instituto da Vinha e do Vinho, IP.

Estes diplomas surgem na sequência da publicação do Decreto-Lei n° 209/2006, de 27 de outubro, que definiu a nova Lei Orgânica do MADRP e na qual é prevista a reestruturação do IVV, I.P.

3. Na sequência da reestruturação a que se refere o ponto anterior, cessou, em 28 de fevereiro de 2007, a Comissão de Serviço, como Chefe de Divisão de Gestão Financeira e Patrimonial, da Técnica Superior A………….

4. Através de requerimento datado de 14 de maio de 2007, a Dra. A………… solicitou a indemnização a que se refere o Art. 26º da Lei nº 2/2004, de 15 de janeiro.

5. Nos termos da alínea c) do art. 25° da Lei referida no ponto anterior, com a alteração introduzida pela Lei n° 51/2005, de 30 de agosto, a comissão de serviço dos titulares dos cargos dirigentes cessa:

"Por extinção ou reorganização da unidade orgânica, salvo se for expressamente mantida a comissão de serviço no cargo dirigente do mesmo nível que lhe suceda ".

6. O art. 26° do mesmo diploma estabelece:

No n.º 1: "Quando a cessação da comissão de serviço se fundamente na extinção ou reorganização da unidade orgânica... os dirigentes têm direito a uma indemnização desde que contem, pelo menos, 12 meses seguidos de exercício de funções. "

No n.º 2: "A indemnização referida no ponto anterior será calculada em função do tempo que faltar para o termo da comissão de serviço e no montante que resultar da diferença entre a remuneração base do cargo dirigente cessante e a remuneração da respectiva categoria de origem ".

7. Pelo exposto e uma vez que a sua comissão de serviço terminou em 6 de maio de 2000, não tendo sido renovada posteriormente, quer nos termos do Art. 18º da Lei nº 49/99, de 22 de junho, quer ao abrigo da lei actualmente em vigor - Arts. 23º e 24° da Lei nº 2/2004 - a requerente, à data de 28 de fevereiro de 2007, encontrava-se a assegurar as funções dirigentes em regime de gestão corrente, pelo que não tem direito à indemnização a que se refere o art. 26° da Lei nº 2/2004.» - cfr. fls. 2 a 4 do PA apenso.

G. Em 25.05.2007 a Autora foi pessoalmente notificada da decisão que antecede - cfr. fls. 1 do PA apenso.

H. A Autora auferia a remuneração de € 2.487,93 no cargo de Chefe de Divisão - por acordo.

I. Autora aufere a remuneração de € 2.319,93 como Assessora Principal - por acordo.

J. A presente acção deu entrada neste Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra em 30.08.2007 - cfr. SITAF.”


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III. O DIREITO

1. Nulidade por violação do art. 615 º nº 1 al. c) e d) do CPC.

Alega a recorrente que o acórdão recorrido violou as alíneas c) e d) do nº 1 do artº 615º CPC ao não se pronunciar sobre questão que deveria ter conhecido, ou seja, o efetivo exercício da recorrente como Chefe de Divisão durante sete anos como agente putativo e que há contradição entre os fundamentos e a decisão já que o recorrido admitiu expressamente que a comissão de serviço da recorrente cessou a 1 de Março de 2007, pelo que é juridicamente inadmissível que o acórdão recorrido sufrague que a dita comissão havia cessado por caducidade a 6 de Maio de 2000.

E que, ao manter a recorrente no exercício continuado e efetivo do cargo dirigente durante sete anos, o recorrido alimentou dessa forma a expectativa daquela de que iria ser nomeada para nova comissão de serviço em qualquer momento.

Nos termos do art. 615º relativo aos casos de nulidade de sentença diz o nº 1 que na al c) Quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão e na al. d) “O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”.

Ora, jurisprudência e doutrina têm entendido que há que distinguir “questões” de “razões” (ou seja, argumentos), e que a falta de apreciação de todos os motivos indicados, não constituem causa de nulidade de sentença ou acórdão.

Conforme resulta deste preceito e do art. 608º nº 2 do CPC o tribunal deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras – ver neste sentido o Ac. STJ de 25/09/2003 - Proc. n.º 03B659).

Como diz o Prof. M. Teixeira de Sousa (in: “Estudos sobre o novo Processo Civil”, Lex, Lx 1997, págs. 220 e 221) é “... corolário do princípio da disponibilidade objectiva (art. 264.º, n.º 1 e 664.º 2ª parte) …” o que “… significa que o tribunal deve examinar toda a matéria de facto alegada pelas partes e analisar todos os pedidos formulados por elas, com exceção apenas das matérias ou pedidos que forem juridicamente irrelevantes ou cuja apreciação se tornar inútil pelo enquadramento jurídico escolhido ou pela resposta fornecida a outras questões. (...) sendo questões “... todas as pretensões processuais formuladas pelas partes que requerem decisão do juiz, bem como os pressupostos processuais de ordem geral e os pressupostos específicos de qualquer ato (processual) especial, quando realmente debatidos entre as partes …” (cfr. Prof. A. Varela in RLJ, Ano 122º, pág. 112) e não podem confundir-se “... as questões que os litigantes submetem à apreciação e decisão do tribunal com as razões (de facto ou de direito), os argumentos, os pressupostos em que a parte funda a sua posição na questão …” (cfr. Prof. Alberto dos Reis in: “Código de Processo Civil Anotado”, vol. V).

Quanto aos fundamentos que a recorrente alega como oposição entre os fundamentos e a decisão tal apenas é suscetível de conduzir a um erro sobre o julgamento e não a qualquer nulidade de acórdão por contradição.

Quanto à existência de nulidade por omissão de pronúncia é patente que a mesma não existe já que o tribunal apenas tinha que conhecer das questões que lhe foram suscitadas, as quais se encontram delimitadas pelas conclusões das alegações.

Nas alegações de recurso para o TCS a questão a conhecer era a de saber se a recorrente tinha ou não direito a uma indemnização nos termos do art. 26º da Lei 2/2004 sendo a qualificação como agente putativo meramente acessória da fundamentação jurídica seguida por uma das instâncias e não uma verdadeira questão de que cumprisse conhecer.

Não ocorre, pois, qualquer nulidade.

2. Violação do artº 26º da lei 2/2004

Vem a recorrente invocar a violação pela decisão recorrida do artigo 26º nº 1 da Lei nº 2/2004 de 15/1, por ser esta a norma aplicável, quando o tribunal recorrido aplicou as normas dos artº 7º, nº 1 al. b) e nº 10 do artº 18º do DL 323/89, na redação dada pelo DL 34/93 de 13-02, já revogadas.

Está em causa nestes autos um pedido de indemnização ao abrigo do art. 26º nº 1 da Lei 2/2004, por cessação da comissão de serviço de funções de dirigentes quando a mesma decorra da extinção ou reorganização da unidade orgânica e desde que se possam contar pelo menos 12 meses seguidos de exercício do cargo.

O tribunal de 1ª instância entendeu que era de anular o despacho de 23/05/2007 que indeferiu o pedido da recorrente à indemnização prevista no art. 26º da Lei 2/2004 de 15/1 na redação da Lei 51/2005 e 30/8, e condenou o IVV a pagar a referida indemnização à aqui recorrente.

Por sua vez, em sede de recurso jurisdicional o TCAS revogou a decisão recorrida e julgou procedente o recurso mantendo o despacho que indeferiu o pedido de atribuição de indemnização supra referido.

Então vejamos os factos e a sua integração no direito aplicável.

A autora, aqui recorrente, foi nomeada, na modalidade de Comissão de Serviço, para o cargo de Chefe de Divisão de Gestão Financeira e Patrimonial do Instituto da Vinha e do Vinho por despacho de 01.05.1997, do Secretário de Estado da Produção Agro Alimentar, para o qual tomou posse em 07.05.1997.

Não resulta dos autos que essa comissão de serviço tenha sido renovada.

Em 12.03.2007 o Presidente do Instituto da Vinha e do Vinho, I.P., emitiu o Despacho n° 2/2007, com o seguinte teor: «Assunto: Nomeação de Pessoal Dirigente: Com a entrada em vigor do Decreto-Lei nº 46/2007, de 27 de fevereiro, e da Portaria n° 219-H/2007, de 28 de fevereiro, que vieram respectivamente reestruturar o Instituto da Vinha e do Vinho (IVV) e determinar a organização interna do novo Instituto da Vinha e do Vinho, I.P., cessaram funções todos os dirigentes daquele Instituto reestruturado...” informando-a que se encontrava abrangida pelo mesmo.

Ao tempo em que a recorrente foi nomeada e tomou posse no cargo dirigente de Chefe de Divisão de Gestão Financeira e Patrimonial do Instituto da Vinha e do Vinho estava em vigor o DL 323/89 de 25/9, entretanto alterado pelo DL 34/93 de 13/2 e revogado pelo DL 49/99 de 22.06.

Dispunha o artigo 5º daquele DL 323/89 que:

“Artigo 5.º

Provimento

1 - O pessoal dirigente é provido em comissão de serviço por um período de três anos, que poderá ser renovada por iguais períodos.

2 - Para efeitos de eventual renovação da comissão de serviço, deve o membro do Governo competente ser informado pelos respectivos serviços, com a antecedência mínima de 90 dias, do termo do período de cada comissão, cessando esta automaticamente no fim do respectivo período sempre que não seja dado cumprimento aquela formalidade.

3 - A renovação da comissão de serviço deverá ser comunicada ao interessado até 30 dias antes do seu termo, cessando a mesma automaticamente no final do respectivo período se o membro do Governo competente não tiver manifestado expressamente a intenção de a renovar, caso em que o dirigente se manterá no exercício de funções de gestão corrente até à nomeação de novo titular do cargo.”

E, posteriormente, veio o Decreto-Lei n.º 34/93 de 13 de Fevereiro dispôr:

“A aplicação do Decreto-Lei n.º 323/89, de 26 de Setembro, vem revelando a necessidade de o aperfeiçoar, pelo que se introduzem alterações pontuais ao regime nele consagrado e se clarificam algumas das suas disposições, com vista a facilitar uma interpretação e execução uniformes integradas no espírito do diploma.

O presente diploma visa, designadamente, definir com maior clareza o conceito de direito à carreira, previsto no artigo 18.º, evidenciando que o mesmo é reconhecido com o objectivo de evitar possíveis prejuízos no desenvolvimento da carreira de origem, bem como, por consequência, a sua relevância para efeitos de progressão.

O mesmo regime é também tornado extensivo aos dirigentes em regime de substituição.

Disciplinam-se ainda as condições de acesso à indemnização por cessação de funções, no âmbito da extinção ou reorganização de serviços, a qual se destina a assegurar as expectativas remuneratórias até ao termo da comissão de serviço, ou por um período de um ano. (...)

Artigo 1.°

O artigo 18.º do Decreto-Lei n.º 323/89, de 26 de Setembro, passa a ter a seguinte redacção:

Artigo 18.°

Direito à carreira

(...) 10 - No caso da cessação da comissão de serviço nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 7.°, os dirigentes têm direito, desde que contem pelo menos 12 meses seguidos de exercício do respectivo cargo, a uma indemnização de montante igual à diferença entre a remuneração do cargo dirigente cessante e a remuneração da respectiva categoria calculada em função do tempo que faltar para o termo da comissão, a qual não pode ultrapassar a diferença anual das remunerações, nelas se incluindo os subsídios de férias e de Natal.

11 - O direito à indemnização prevista no número anterior só é reconhecido nos casos em que à cessação da comissão de serviço não se siga imediatamente nova nomeação em cargos dirigentes.

12 - A nomeação em cargos dirigentes no período a que se reporta a indemnização determina a obrigatoriedade da reposição da importância correspondente à diferença entre o número de meses a que respeite a indemnização percebida e o número de meses que mediar até à nova nomeação.

Decorrido o prazo de três anos da comissão de serviço da aqui recorrente, a mesma não foi alvo de qualquer renovação.

Contudo, quando em 6/5/00 terminou aquela comissão, já estava em vigor o DL 49/99, ao abrigo de cujo artigo 18º havemos de qualificar a situação jurídica da recorrente cuja comissão de serviço não foi alvo de qualquer renovação.

“Artigo 18.º

Provimento

1 - O pessoal dirigente é provido em comissão de serviço por um período de três anos, que poderá ser renovada por iguais períodos.

2 - Para efeitos de eventual renovação da comissão de serviço deve o membro do Governo competente ser informado pelos respectivos serviços, com a antecedência mínima de 120 dias, do termo do período de cada comissão, cessando esta automaticamente no fim do respectivo período sempre que não seja dado cumprimento àquela formalidade.

3 - A renovação da comissão de serviço deverá ser comunicada ao interessado até 90 dias antes do seu termo, cessando a mesma automaticamente no final do respectivo período se o membro do Governo competente não tiver manifestado expressamente a intenção de a renovar.

4 - No caso de não renovação da comissão de serviço de pessoal dirigente cujo provimento está sujeito a concurso, o membro do Governo determina a abertura do concurso para o respectivo cargo no prazo previsto no número anterior.

5 - Até à nomeação do novo titular, as funções são asseguradas em regime de gestão corrente ou por substituição, não podendo ter duração superior a seis meses, salvo se estiver a decorrer o procedimento de concurso.

6 – (...) 7 - O provimento de pessoal dirigente entende-se sempre feito por urgente conveniência de serviço, salvo se o contrário for expressamente declarado no despacho de nomeação.

Assim, não se tendo verificado os requisitos para a renovação da comissão de serviço nos termos do preceito supra transcrito, em vigor ao tempo da cessação da mesma, não podemos tirar outra conclusão do que a de que a mesma cessou automaticamente por não ter havido qualquer manifestação de vontade expressa de renovação, nos termos exigidos por lei, não prevendo a lei quaisquer renovações tácitas.

Pelo que, cessada automaticamente a comissão de serviço por falta de renovação da mesma, a recorrente passa a exercer as funções de dirigente em gestão corrente.

No que para a situação dos autos releva, o exercício das funções de gestão corrente até à nomeação de novo titular do cargo, que não tinha prazo no âmbito do art. 5º nºs 1 e 3 DL 323/89, passa a ter como limite máximo o prazo de seis meses no âmbito do art. 18º Lei 49/99.

Esta nova lei é a aplicável face ao art. 12º do CC já que a lei nova abrange as próprias relações já constituídas que subsistam à data da sua entrada em vigor.

Assim, no âmbito destes diplomas, a comissão de serviço dos titulares de cargos dirigentes, que não for expressamente renovada, cessa automaticamente no termo do respectivo prazo e os titulares de cargos dirigentes cuja comissão de serviço não for renovada permanecem no exercício das respectivas funções até à designação do novo titular, nos termos e nas condições definidas no artigo 5º, nº 3 do Decreto-Lei nº 323/89, de 26 de Setembro e pelo prazo máximo de seis meses no âmbito da Lei 49/99, art. 18º.

Pelo que, quando cessou a comissão de serviço da aqui recorrente pelo decurso do prazo de 3 anos sem que tivesse ocorrido renovação da mesma, em 6/5/2000, portanto na vigência desta Lei 49/99, as funções passaram a ser asseguradas em regime de gestão de corrente ou substituição pelo prazo máximo de seis meses, salvo se estivesse a decorrer procedimento de concurso, que não era o caso.

E que ilações tirar do facto de, decorridos seis meses, ou seja, após 7/11/00, a aqui recorrente ter continuado em exercício de funções de pessoal dirigente até 23/5/07?

Não podemos esquecer que, no âmbito do DL 323/89, o exercício das funções de gestão corrente por parte do dirigente que não vira renovada a sua comissão de serviço não tinha prazo.

E que, apenas com a Lei 49/99 passou a existir como limite o prazo de seis meses.

Pelo que, no fundo, não foi aplicada à recorrente a lei em vigor ao tempo da falta de renovação da sua comissão de serviço mas antes a lei anterior ao abrigo da qual a sua situação estaria legitimada não obstante o art. 41º da nova lei dispusesse que a sua entrada em vigor ocorreria no dia 1 do mês seguinte ao da sua publicação, ou seja, 22/6/99, portanto data anterior à do fim da sua comissão de serviço em 6/5/00.

E, não podemos tirar, a nosso ver, outras ilações pelo facto de decorrido aquele prazo de seis meses _em que esteve a exercer as funções de gestão corrente daquelas funções dirigentes para que fora nomeada em comissão de serviço_ ter continuado a exercer as funções de dirigente, que não as de que as continuou a exercer em gestão corrente, que era como as vinha exercendo.

É que, não podemos ficcionar a existência de qualquer renovação automática ou nova nomeação de comissão de serviço após o decurso do prazo de gestão corrente, já que a mesma impõe uma intencionalidade que não pode resultar de uma mera passividade da autoridade que permite a manutenção de uma situação ilegal por falta de título para a mesma.

A recorrente continuou a exercer as funções administrativas de gestão corrente que eram aquelas que exercia antes de as mesmas terminarem pelo decurso do prazo de seis meses numa situação precária, tanto assim que o despacho de 12.03.2007 que determinou a cessação de funções de todos os dirigentes daquele Instituto por reorganização interna do novo Instituto da Vinha e do Vinho, I.P., a tratou como tal.

A Administração beneficiou, é certo, de ter alguém que assegurou a titularidade de um dos seus órgãos dirigentes mas a aqui recorrente também beneficiou de vantagens profissionais, sociais e pessoais decorrentes do exercício efetivo de funções correspondentes a um cargo dirigente, auferindo os vencimentos e os suplementos remuneratórios correspondentes ao cargo.

Daí que lhe devam ser atribuídos os respetivos efeitos jurídicos reconhecendo-a sua situação de facto.

Encontrada a situação em que se encontrava a aqui recorrente há-de ser ao abrigo da Lei 2/2004 de 15/1 na redação da L 51/2005 de 30/8, _diploma em vigor à data do despacho de 12/3/07 que, na sequência da publicação do Decreto-Lei n° 209/2006, de 27 de outubro, que definiu a nova Lei Orgânica do MADRP e na qual é prevista a reestruturação do IVV, I.P. _ que determinou a cessação, em 28 de fevereiro de 2007, da Comissão de Serviço, como Chefe de Divisão de Gestão Financeira e Patrimonial, da Técnica Superior A…………, que se hão-de encontrar as consequências para a mesma do referido despacho, e em função do que se pode aferir da legalidade do despacho recorrido e bondade das decisões das instâncias.

Ora, como resulta dos artigos 22º a 27º desta Lei 2/2004 de 15/1 na redação da L 51/2005, relativamente à questão da falta de renovação de comissão de serviço, o mesmo não inova relativamente aos anteriores a não ser quanto ao prazo de 90 dias como máximo para o exercício das funções pelo dirigente cessante de gestor corrente.

O que significa que ficamos na mesma lacuna jurídica que já resultava dos diplomas anteriores.

Sendo assim, e estando a aqui recorrente em situação precária como dirigente em exercício das funções de gestor corrente, vejamos se lhe deve ser aplicado o art. 26º desta Lei 2/2004 na referida redação da Lei 51/2005, que dispõe que os dirigentes têm direito a uma indemnização quando a cessação da comissão de serviço decorra da extinção ou reorganização da unidade orgânica e desde que contem pelo menos 12 meses seguidos de exercício do cargo a qual será calculada em função do tempo que faltar para o termo da comissão de serviço e no montante que resultar da diferença entre a remuneração base do cargo dirigente cessante e a remuneração da respectiva categoria de origem.

Como vimos, a comissão de serviço dos titulares de cargos dirigentes, que não for expressamente renovada, cessa automaticamente no termo do respectivo prazo nos termos supra expostos e os titulares de cargos dirigentes cuja comissão de serviço não for renovada permanecem no exercício das respectivas funções até à designação do novo titular, pelo período máximo que ao longo do tempo as diversas leis que se sucederam foram impondo, primeiro não havendo qualquer limite a esse tempo, depois seis meses e por fim 90 dias.

E, se a sua comissão de serviço havia cessado com a falta de renovação da mesma, apenas o exercício de funções dirigentes como gestão corrente após o decurso dos seis meses terminou pela reorganização dos serviços e o consequente despacho de 12/3/07.

E, se desde o fim da sua gestão corrente pelo prazo de seis meses, trabalhou mais de doze meses seguidos não há como contornar o facto de que a sua situação não estava sujeita a qualquer prazo e, por isso, poderia terminar a qualquer momento.

Tanto que, esse prazo de doze meses reporta-se sempre à existência de uma comissão de serviço, como também resulta do art. 26º nº 1 da L. 2/2004, o que não é a situação dos autos.

A este propósito tem pertinência chamar à colação, apesar de ao abrigo de outra legislação, a do DL 232/89, o que se diz no acórdão deste STA 046799 de 10/27/2004 e citado no acórdão recorrido:

5 – A questão a apreciar reconduz-se, assim, a saber se estas funções de gestão corrente, após a cessação da comissão de serviço, se devem contar para efeito de preenchimento do requisito de atribuição de indemnização prevista no n.º 10 do art. 18.º do Decreto-Lei n.º 323/89, de «12 meses seguidos de exercício do respectivo cargo», a que se refere o n.º 10 do art. 18.º.

A letra deste preceito não exclui a possibilidade de contagem do período de tempo posterior à cessação da comissão, pois, mesmo que se entenda que o exercício das funções tem de ser limitado às de gestão corrente, as funções de gestão corrente que exerce são as do «respectivo cargo» e não de qualquer outro cargo, e entre as funções de cargos dirigentes não deixam de se incluir as de gestão corrente.

Porém, o certo é que serão funções limitadas que já não correspondem ao exercício pleno do cargo, pelo que a fórmula legal admite também a interpretação de que o exercício daquelas funções de gestão corrente não relevará para aquele efeito.

Na impossibilidade de obter no texto da lei uma informação segura sobre o alcance daquela norma, terá de fazer-se apelo à ratio legis, que sempre tem relevo decisivo na determinação do alcance da lei.

O Preâmbulo do Decreto-Lei n.º 34/93, que introduziu no Decreto-Lei n.º 323/89 aquele n.º 10 do art. 18.º refere o seguinte, sobre esta matéria: Disciplinam-se ainda as condições de acesso à indemnização por cessação de funções, no âmbito da extinção ou reorganização de serviços, a qual se destina a assegurar as expectativas remuneratórias até ao termo da comissão de serviço, ou por um período de um ano.

Assim, é à luz deste desígnio legislativo de assegurar expectativas remuneratórias, que tem de ser apurado o alcance daquele n.º 10.

Visa-se, assim, garantir ao dirigente que vê cessada antecipadamente a comissão de serviço por reorganização dos serviços e que vai ver diminuída a sua remuneração, que continuará a auferi-la durante o período de um ano, ou até ao termo normal da comissão, se este ocorrer antes daquele período de um ano.

Esta protecção de expectativas, porém, apenas é assegurada àqueles que tenham exercido o cargo por mais de 12 meses, o que deixa entrever que, na perspectiva legislativa, não serão dignas de protecção expectativas fundadas no exercício das funções de dirigente por menor período.

Como é óbvio, a partir do momento em que sabe que ocorreu a cessação da comissão de serviço, o dirigente já não tem fundamento para manter expectativas de que ela se prolongue até ao seu termo, mesmo que continue a exercer as funções de gestão corrente,

Sendo assim, relativamente aos dirigentes que vêem cessada automaticamente a comissão de serviço antes deste período de 12 meses não é garantida por aquela norma a protecção de expectativas remuneratórias, pois, na perspectiva legislativa, até ao decurso desse período elas não são atendíveis e, uma vez cessada a comissão de serviço, já não podem formar-se expectativas fundadas de não cessação antecipada da comissão.

Pelo exposto, é de concluir que a interpretação correcta daquele nº 10 do art. 18º é a de que não releva para a contagem do período de 12 meses nele referido, o exercício de funções de gestão corrente posterior à cessação da comissão de serviço.”

Neste acórdão procura-se equiparar, e no âmbito do DL 323/89, a situação do dirigente que foi alvo de uma cessação de comissão de serviço por reorganização dos mesmos à daquele que não vê a sua comissão renovada concluindo que em ambas as situações não pode relevar para contagem do tempo para efeitos do direito a uma indemnização (e nomeadamente para o prazo de 12 meses a que alude o art. 18º nº 10 do DL 34/93) o tempo prestado no exercício de funções de gestão corrente.

E, o prazo de 12 meses a que se reporta este acórdão é o prazo de 12 meses prestados no âmbito de uma comissão de serviço que terminou antes do prazo de 3 anos legalmente previsto, que é a situação a que se reporta o preceito que visa indemnizar a cessação da comissão precisamente entre o prazo mínimo de 12 meses que se exige e o prazo previsto para a comissão de serviço terminar.

Quanto à situação dos autos, não se pode chamar à colação, para preenchimento do requisito de 12 meses de serviço efetivo previstos no nº 1 do artº 26º da lei 2/2004, o tempo decorrido após a cessação de uma comissão de serviço por falta de renovação e não na sequência de qualquer reorganização do serviço.

O que cessou por força dessa reorganização foram as funções de facto que vinham sendo exercidas.

E é assim porque se entende que não pode haver qualquer expectativa no exercício de funções como se fossem em comissão de serviço quando se sabe que tal comissão já cessou.

Daí que não se possa falar de qualquer expectativa remuneratória da recorrente pela tomada de posse de uma comissão de serviço que apenas se prolongou por 3 anos, não se podendo dizer que ressurgiu apenas porque a recorrente se manteve ao longo de sete anos naquele cargo.

Aliás, as alegações da recorrente até são contraditórias porque acaba por dizer que:

“33 - A comissão de serviço da recorrente não foi extinta por reorganização do serviço que apenas ocorreu a 28-2-2007.

34 – Decorreram mais de 12 meses de exercício do cargo pela recorrente após a última renovação da comissão.

35 – E decorreram sete anos de exercício do cargo após a cessação da comissão de serviço da recorrente.”

Se assim é, a aqui recorrente está na situação de qualquer outro dirigente em exercício de funções dirigentes em comissão de serviço, de direito, quanto a todos os direitos e garantias que lhe advenham do exercício daquelas funções mas já não quanto ao direito a uma indemnização por cessação automática da comissão de serviço, derivado de reorganização dos serviços, prevista no referido art. 26º da Lei n.º 2/2004 que visa compensar o titular de cargo dirigente pela frustração das suas expectativas remuneratórias em função de um prazo estipulado para fim da comissão de serviço em que está investido, quando a remuneração do cargo exercido em comissão é superior à que aufere no lugar da sua categoria.

A recorrente não tem qualquer expectativa relativamente a um prazo de exercício de funções, sabendo (ou devendo saber) que a sua situação pode terminar a qualquer momento por não existir qualquer prazo fixado para a mesma.

Pelo que, desde que não lhe seja renovada a comissão de serviço e mesmo que tenha continuado a exercer as referidas funções, o dirigente já não tem fundamento para manter expectativas de que a sua situação se prolongue até um qualquer termo.

Quer os seis meses que se seguem à falta de renovação da comissão de serviço quer o tempo posterior, em situação precária, não podem relevar para qualquer efeito que não o qualificado por lei, nomeadamente para atribuição da indemnização a que se reporta aquele art. 26º da Lei 2/2004.

Sendo que, e como também já referimos, não podemos retirar da inexistência/omissão de qualquer renovação da referida comissão de serviço uma intencionalidade positiva de renovação implícita.

É que, se assim fosse, teríamos que estar a criar prazos de comissões de serviço fictícias decorridos prazos de gestões correntes que adulterava por completo a realidade existente e a ratio legis dos próprios diplomas legais.

Pelo que, temos de concluir que não tendo sido renovada a comissão de serviço da aqui recorrente, a mesma passou a exercer as funções que vinha exercendo em comissão de serviço legalmente como gestão corrente durante o prazo de seis meses e depois, de forma precária após os seis meses e até ao despacho que determina a cessação das referidas funções devido à reorganização dos serviços.

E tal, em nada contende com o princípio geral do sistema retributivo da ligação da remuneração à função, e remuneração dos titulares de cargo dirigentes até a efetiva cessação do exercício de funções.

Apenas, como não tinha, ou não devia ter, qualquer expectativa de limite de prazo para o exercício das suas funções, não pode a recorrente ter direito a que lhe seja atribuída qualquer indemnização com esses fundamentos invocados.

3. Violação dos princípios da igualdade, da confiança, boa fé e justiça.

A recorrente vem invocar a violação destes princípios por entender que não faz sentido que se apliquem os princípios do enriquecimento sem causa e da confiança para tutelar aspetos relativos aos vencimentos e já não quanto aos diferenciais dos mesmos.

E que, manteve durante sete anos a expectativa quanto à indemnização aqui em causa violando-se dessa forma o princípio da confiança.

Dispõe o art. 266º nº 2 da Const. que "os orgãos e os agentes administrativos(...) devem actuar com justiça e imparcialidade no exercício das suas funções".

Diz Freitas do Amaral in Dº Administrativo, V.II, pág. 201 que este princípio significa que "a Administração Pública deve harmonizar o interesse público específico que lhe cabe prosseguir com os direitos e interesses legítimos dos particulares eventualmente afectados".

E, continua este jurista, salientando que este princípio comporta três corolários que se desdobram em três princípios: a) princípio da justiça "stricto sensu", b) princípio da igualdade e c) princípio da proporcionalidade.

Como refere [cfr Maria da Glória F P D Garcia, in Estudos Sobre o Princípio da Igualdade, Ed Almedina, 2005, de onde se destaca o seguinte:

«A igualdade é, pois, um conceito essencialmente comparativo».

«A igualdade é, pois, um conceito ligado a valores, não sendo possível estabelecê-la em concreto sem que se passe por uma prévia valoração da realidade».

«A desmontagem estrutural do princípio permitiu detectar o seu ponto nevrálgico – a opção ou escolha do critério. Permitiu também detectar que, sem valores, o princípio não tinha sentido nem actual e permitiu ainda compreender a razão pela qual uma concepção puramente lógico-formal não podia retirar do princípio ilações que não fossem puramente lógico-formais, e, consequentemente, inúteis para o mundo do direito, transformando-o em fórmula vazia. Daí que se tivesse «salvo» a força normativa do princípio através de uma sua materialização indirecta: evidência de um critério objectivo e suficiente de qualificação das situações como iguais, em função do fim a atingir com o tratamento jurídico».

«... quando Gomes Canotilho e Vital Moreira afirmam que do princípio da igualdade decorre a «obrigação de diferenciação para compensar a desigualdade de oportunidades»..., «o dever de eliminação ou atenuação, pelos poderes públicos, das desigualdades sociais, económicas e culturais, a fim de assegurar uma igualdade jurídico-material», têm este dever e aquela obrigação, em nosso entender, de ser reconduzidos ao que atrás se disse, isto é, à ideia de realização de justiça social que a Sociedade exige em cada momento da sua vivência histórica».

«Ao lado de uma igualdade puramente jurídico-normativa, desligada da intencionalidade da norma e preocupada somente com a justiça da aplicação da lei – igualdade de todos face à lei, o que implica, tendencialmente, a generalidade da norma – encontramos uma igualdade juridico-política, preocupada, por um lado, com o critério material de qualificação igual para efeitos de tratamento jurídico, e, por outro lado, com a própria intencionalidade da norma – igualdade da própria lei – critério e intencionalidade que, por sua vez, se encontram intimamente ligados ao processo formativo dos valores que lhes presidem – igualdade para o direito – quer na sua faceta política quer na sua faceta factual.”

Ora, estes princípios relevam autonomamente quando a lei confere à Administração uma margem de autonomia decisória, constituindo um limite material interno ao poder discricionário.

Na verdade, se o ato for vinculado a eventual injustiça resulta diretamente da lei, que o juiz não pode deixar de aplicar, salvo em caso de inconstitucionalidade. E, quando estamos perante um poder vinculado ou discricionário? O poder é vinculado na medida em que o seu exercício está regulado por lei. O poder será discricionário quando o seu exercício fica entregue ao critério do respectivo titular, deixando-lhe liberdade de escolha do procedimento a adoptar em cada caso como o mais ajustado à realização do interesse público protegido pela norma que o confere (Sérvulo Correia, Noções de Dº Administrativo, 1982, pág. 230.).

Discricionariedade é uma liberdade de decisão que a lei confere à Administração, a fim de que esta, dentro dos limites legalmente estabelecidos, escolha de entre várias soluções possíveis aquela que lhe parecer mais adequada ao interesse público. (Freitas do Amaral, Dº Adm., 2º V., pag.142,1988).

Discricionário significa, pois, "livre dentro dos limites permitidos pela realização de certo fim. O fim é o vínculo: corresponde a um requisito de validade cuja falta produz a invalidade do acto administrativo ". (Manual de Dº Administrativo, 1º Vol., 1991, pág. 486, M.Caetano).

Segundo o princípio da Igualdade “nas suas relações com os particulares, a Administração Pública deve reger-se pelo princípio da igualdade, não podendo privilegiar, beneficiar, prejudicar, privar de qualquer direito ou isentar de qualquer dever nenhum administrado em razão da ascendência, sexo, raça, língua…etc” art. 5º do CPA.

Mas também viola este princípio aquela diversidade de tratamento que não encontre justificação e fundamento na realização de outros interesses e princípios constitucionais e legais, também eles conformadores da atividade da Administração, e considerados preferentes, em abstracto pelo legislador, em concreto pelo autor do ato quando agindo no âmbito da sua discricionariedade.

De todo o modo e em qualquer caso, tratar desigualmente diversos administrados não será forçosamente violar o princípio da Igualdade, se afinal se estiver a tratar de modo desigual o que e no que é efetivamente desigual.

No caso sub judice está em causa a violação destes princípios face a uma determinada interpretação jurídica a dar a determinados preceitos legais.

Pelo que, não está em causa nem apenas aspetos vinculados do ato nem aspetos relativos à discricionariedade técnica.

Sendo assim, será de conhecer da violação dos referidos princípios.

Ora, não se vislumbra de que forma o não recebimento de uma indemnização que não está prevista na lei para a situação precária da aqui recorrente mas apenas para uma situação legal de comissão de serviço, possa afectar a igualdade, boa fé e justiça (não são iguais as situações precárias e tituladas e não é a mesma coisa o direito à remuneração relativa ao exercício de uma função e o direito a uma indemnização que pressupõe um prazo de vigência que não existe na situação precária e já existe na vigência de uma comissão de serviço a termo) e da confiança (a haver expectativas as mesmas não eram legítimas nem fundadas).

Aliás a fundamentação supra referida a propósito do vício de violação de lei vale para a conclusão da não violação destes princípios por deles resultar que, aquando da nomeação da recorrente para exercer as funções em comissão de serviço, já estava em vigor aquele n.º 10 do art. 18.º do Decreto-Lei n.º 323/89, que limitava a atribuição de indemnização aos casos em que existisse um período de 12 meses de exercício de funções em comissão de serviço existente e não para o caso de a mesma ter terminado por falta de renovação.

Daí que não viole qualquer daqueles princípios a inexistência de indemnização na sua situação.

Pelo que é de negar provimento ao recurso e confirmar a decisão recorrida.


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Em face de todo o exposto acordam os juízes deste STA em negar provimento ao recurso e manter a decisão recorrida com os supra referidos fundamentos.

Custas pela recorrente.

Lisboa, 19 de Novembro de 2015. – Ana Paula Soares Leite Martins Portela (relator) – Alberto Acácio de Sá Costa ReisAntónio Bento São Pedro.