Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0205/12
Data do Acordão:07/02/2015
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CA
Relator:CARLOS CARVALHO
Descritores:CASO JULGADO
ACÇÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL
EXECUÇÃO DE JULGADO ANULATÓRIO
Sumário:I - A exceção dilatória do caso julgado visa evitar que o tribunal, duplicando as decisões sobre idêntico objeto processual, contrarie ou reafirme o anteriormente decidido.
II - Ocorre tal exceção se não remanescer na ação administrativa especial instaurada para impugnação de ato administrativo qualquer objeto pretensivo que não haja já sido julgado, com trânsito, nos autos de execução de decisão judicial anulatória deduzidos pelo mesmo autor.
Nº Convencional:JSTA000P19253
Nº do Documento:SAP201507020205
Data de Entrada:05/16/2012
Recorrente:A........
Recorrido 1:PROCURADOR - GERAL DA REPÚBLICA.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam em conferência no Pleno da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:
1. RELATÓRIO
1.1. A………., devidamente identificada nos autos, instaurou neste Supremo Tribunal a presente ação administrativa especial contra o “PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA” [abreviadamente PGR] e na qual foi peticionado, pela motivação inserta na petição inicial de fls. 04/84, que fosse declarada a nulidade do despacho daquele que - no decurso da execução que ela movera contra a Procuradoria-Geral da República para pagamento da quantia que esta foi condenada a pagar-lhe - determinou a restituição da quantia de que a «PGR» se achava credora [paga à A. a título de vencimentos], operando dessa forma a compensação de créditos, e, bem assim, a inexistência desse crédito.

1.2. Findos os articulados veio a ser proferido despacho pelo Relator donde, em suma, se extrai e se decidiu que “atenta a evidente dependência desta ação relativamente ao citado processo executivo e não sendo absolutamente certo que se verifique a repetição de causas, suspendo a instância nos termos do art. 279.º/1 do CPC até que a legalidade da compensação seja decidida na ação executiva”.

1.3. Objeto de impugnação aquela decisão para a Conferência por parte da A., aqui recorrente, veio a ser proferido acórdão por este Supremo, datado de 11.10.2012, a revogar o despacho reclamado e a absolver o Réu da instância [cfr. fls. 468/477].

1.4. A A., inconformada, recorreu então para o Pleno deste Supremo apresentando o seguinte quadro conclusivo que se reproduz [cfr. fls. 484 e segs. - paginação processo suporte físico tal como as referências posteriores a paginação salvo expressa indicação em contrário]:
...
A - DAS NULIDADES PROCESSUAIS
1. Dispõe o art. 1.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) que o processo nos Tribunais Administrativos se rege por aquele Código, pelo Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF) e, subsidiariamente pelo disposto na Lei de Processo Civil.
2. Nos termos previstos pelo art. 17.º do ETAF o julgamento em cada Secção compete ao Relator e a dois Juízes - Adjuntos - na designação do art. 18.º do mesmo diploma legal.
3. Assim se definindo no citado art. 17.º do ETAF a composição do Tribunal em formação Coletiva - Conferência - para o julgamento das questões que, por lei lhe estão conferidas a atribuídas para deliberação.
4. O douto acórdão aqui em causa deliberou em Conferência nos termos impostos pelo art. 27.º, n.º 2 do CPTA, sobre reclamação apresentada pela Autora, ora Recorrente, do douto despacho do Colendo Juiz Conselheiro Relator, em formação Coletiva para julgamento, definida como supra referido no citado art. 17.º do ETAF.
5. Porém, pende nesse Colendo Supremo Tribunal Administrativo um incidente de suspeição, suscitado no presente processo e relativo a um dos Colendos Juízes Conselheiros-Adjuntos que integrou a referida Conferência e que, por força da pendência da decisão definitiva sobre aquela suspeição, não pode, no processo, ter qualquer intervenção.
6. Com efeito, a questão relativa àquele incidente de suspeição não foi ainda definitivamente julgada, aguardando decisão de constitucionalidade em recurso admitido pelo douto despacho constante da fotocópia que aqui sob doc. 1 se junta.
7. A intervenção do Colendo Juiz Conselheiro-Adjunto foi, assim, levada a efeito no douto acórdão recorrido em violação do disposto no art. 132.º do CPC aplicável ex vi art. 1.º do CPTA que, no seu n.º 1 determina, como efeito da arguição da suspeição na marcha do processo que «A causa principal segue os seus termos, intervindo nela o juiz substituto».
8. Não se mostra designado o Juiz substituto do Colendo Juiz Conselheiro-Adjunto em causa, nos termos assim impostos pela citada norma do art. 132.º do CPC, pelo que se verifica, com a referida intervenção, desvio do formalismo processual legalmente determinado para a prática de ato - Julgamento em Conferência - por Tribunal cuja formação não cumpre os requisitos da lei para a respetiva composição, por não se achar preenchido com o número de juízes indicados pelo art. 60.º do ETAF.
9. Pois, na verdade, a norma do art. 132.º do CPC retira ao Colendo Juiz Conselheiro-Adjunto em causa, por força das concretas circunstâncias decorrentes da referida suspeição, o poder de julgar no processo em que a mesma foi arguida e no qual está, assim, impedido de exercer as respetivas funções.
10. Estando desprovido, assim, dos respetivos poderes, um dos Juízes que compõe a Conferência que proferiu o douto acórdão recorrido, por força do citado art. 132.º do CPC, foi o mesmo prolatado por apenas dois dos três Juízes que, nos termos do citado art. 17.º do ETAF, devem compor o Tribunal, em violação que, consequentemente, deu lugar à verificação da nulidade processual que, nos termos do art. 201.º do CPC aplicável ex vi art. 1.º do CPTA aqui se argui com todos os efeitos legais inerentes.
11. Por outro lado, e sem conceder relativamente à nulidade processual supra arguida, operada assim por violação das normas e regras processuais que definem a composição e formação do Tribunal em causa, aqui invoca a Recorrente a nulidade processual operada também com a prolação do douto acórdão recorrido, outrossim em violação do citado art. 132.º do CPC que, também no respetivo n.º 1 impede que, quer o despacho saneador, quer a decisão final sejam proferidas no processo enquanto a questão da suspeição não estiver definitivamente julgada.
12. Mesmo que tivesse havido lugar à designação do Juiz substituto imposta, como supra referido nas concretas circunstâncias processuais pelo citado n.º 1 do art. 132.º do CPC, não podia o Tribunal - assim então devidamente composto - proferir no processo decisão final.
13. Decisão final que, contudo, e ainda que sem a adequada formação e composição, o Tribunal, efetivamente, proferiu, ao deliberar no douto acórdão aqui em causa, a absolvição do Réu da instância.
14. Decisão final de absolvição do Réu da instância, que tendo sido proferida assim, em violação do preceituado no art. 132.º, n.º 1 do CPC opera a nulidade processual que, nos termos do art. 201.º do CPC aplicável ex vi art. 1.º do CPTA aqui consequentemente se argui, com todos os efeitos legais inerentes.
15. As nulidades processuais insanáveis invocadas e arguidas, operadas pela violação das normas dos arts. 17.º do ETAF e 132.º do CPC, deram consequentemente lugar à violação do conceito normativo que subjaz à norma do art. 202.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa (CRP), em resultado da interpretação que daquelas normas foi feita em sentido da sua não aplicação ou da sua incorreta aplicação.
16. Sendo, pois, inconstitucional, por violação do referido conceito normativo ínsito à norma do art. 202.º, n.º 1 da CRP, qualquer interpretação das citadas normas dos arts. 17.º do ETAF e 132.º do CPC ou de quaisquer outras que para o efeito venham a ser aplicadas, feita em sentido que permita a prolação do douto acórdão recorrido por tribunal não composto nem formado e, assim, não constituído devidamente, nos termos legais ali impostos, bem como a prolação de decisão final que, nos mesmos termos legais está impedido de proferir, em inconstitucionalidades que aqui desde já se arguem.
17. O douto acórdão recorrido deliberou com fundamento nas normas legais dos arts. 108.º, 110.º e 111.º do CPC, ali expressamente invocadas para efeito da decisão nele tomada e assim alicerçado na incompetência relativa do Tribunal que tais normas especificamente regulam.
18. Dispõe, todavia, o art. 110.º do CPC - como supra dito expressamente invocado no Douto Acórdão recorrido - que a questão da incompetência ali regulada naquela norma deve ser suscitada e decidida, como do n.º 3 da mesma norma se transcreve «até à prolação do primeiro despacho subsequente ao termo dos articulados».
19. Suscitada e decidida, assim, no douto Acórdão recorrido a questão da incompetência relativa do Tribunal foi deliberada em momento para o efeito não admitido do iter processual e, consequentemente, em violação da citada norma do art. 110.º, n.º 3 do CPC porquanto «o primeiro despacho subsequente ao termo dos articulados» havia já sido proferido no processo, integrando, aliás, o próprio douto Despacho reclamado e objeto de decisão naquele Aresto.
20. Bem se compreendendo, aliás, a limitação imposta pela citada norma do n.º 3, do art. 110.º do CPC, para o momento da prática do ato processual em que se suscita e consequentemente se decide a questão da incompetência relativa, pois quis o legislador intuir que, depois de já praticado no processo um ato jurisdicional - «o primeiro ato subsequente ao termo dos articulados» - in casu o douto Despacho reclamado, viesse o Tribunal em ato processual assim posterior, declarar a sua incompetência, necessariamente determinante da invalidade daquele outro ato processual anterior.
21. Não pode o Tribunal ser competente para um ato jurisdicional - «o primeiro subsequente ao termo dos articulados» - e deixar de o ser, por incompetência declarada a posteriori, para a prática dos atos subsequentes aquele, que foi praticado anteriormente em razão da competência, antes verificada, daquele mesmo Tribunal.
22. E, assim, tendo sido a questão da incompetência relativa do Tribunal decidida em momento processual não admitido pela citada norma do art. 110.º, n.º 3 do CPC, em ato processual que não admitia tal prática - no douto Acórdão recorrido - está o mesmo consequentemente inquinado com a nulidade processual que aqui, igualmente sem conceder relativamente às nulidades processuais insanáveis supra invocadas e arguidas, nos termos do art. 201.º, n.º 1 do CPC, se invoca também com todos os efeitos legais inerentes.
23. Nulidade processual ora invocada e arguida que, uma vez declarada fará considerar o Tribunal competente contrariamente ao deliberado no douto Acórdão recorrido, ainda que sem poderes para julgar com decisão final - posto que devidamente composto, formado e constituído - enquanto a questão da referida suspeição não estiver definitivamente julgada.
B - DAS NULIDADES DA DECISÃO
24. Em razão da violação da supra citada norma do art. 110.º, n.º 3 do CPC, que deu lugar à consequente nulidade processual supra invocada e arguida nos pontos XIX a XXV, proferiu assim o douto Acórdão recorrido da Decisão sobre matéria - questão da incompetência relativa - sobre a qual não podia, naquele douto Acórdão, ter chamado a pronunciar-se, ultrapassado que estava pois, já, o momento do iter processual legalmente imposto para tal pronúncia.
25. E, assim, o Tribunal suscitou oficiosamente, decidiu e conheceu, da questão da qual não podia conhecer, por força do citado art. 110.º, n.º 3 do CPC, fazendo enfermar a Decisão tomada no douto Acórdão consequentemente da nulidade que operada em violação do art. 95.º, n.º 1 do CPTA, está prevista no art. 668.º, n.º 1 al, d) do CPC aplicável ex vi art. 1.º do CPTA e ali verificada por excesso de pronúncia.
26. Verificando-se excesso de pronúncia quanto à suscitação e decisão da questão da incompetência relativa do Tribunal por esta ter constituído, aliás, a questão central da Decisão tomada no douto Acórdão recorrido, como controvérsia da qual aquela Decisão retirou especialmente a consequência jurídica em que se fundamentou, como essencial para dirimir a questão a decidir e sobre o mérito da qual veio consequentemente a deliberar.
27. Nulidade da Decisão que verificada por violação das normas supra em XXVII citadas está prevista no art. 668.º, n.º 1 al. d) do CPC e que aqui se argui, consequentemente, com todos os efeitos legais inerentes.
28. A pronúncia levada a efeito em excesso na Decisão tomada no douto Acórdão recorrido sobre a questão da incompetência relativa, conduziu à absolvição do Réu da instância que como supra invocado em arguição de nulidade constitui decisão final no processo.
29. Ora, tal como supra também invocado em arguição daquela nulidade, nos pontos XIII a XVIII que aqui para o presente efeito se dão como reproduzidos, o Tribunal não podia, por força da pendência da questão relativa à arguição da suspeição, nos termos impostos pelo art. 132.º, n.º 1 do CPC, ter proferido decisão final no processo.
30. Tendo proferido a referida decisão final de absolvição, que estava impedido de proferir, e violando assim o disposto no citado art. 132.º, n.º 1 da CPC incorreu a Decisão, tomada no douto Acórdão recorrido em nulidade, gerada igualmente por excesso de pronúncia e que operada por violação do art. 95.º, n.º 1 do CPTA está prevista no art. 668.º, n.º 1, al. d) do CPC e que aqui, consequentemente, também se argui com todos os efeitos legais inerentes.
31. A Decisão proferida no douto Acórdão aqui recorrido sobre a Reclamação que à Conferência foi submetida a juízo constitui a decisão final do processo, cujo termo foi ali deliberado por absolvição do Réu da instância, decisão final que, como supra dito, não pode ainda ser tomada em razão da pendência da questão relativa à referida suspeição, nos termos impostos pelo citado art. 132.º, n.º 1 do CPC, assim se verificando a supra arguida nulidade da Decisão que, por excesso de pronúncia integra matéria de deliberação por lei vedada à sua prolação e que, consequentemente, não podia ter conhecido também nos termos do citado art. 95.º, n.º 1 do CPTA.
32. A Decisão proferida no douto Acórdão recorrido enferma ainda da nulidade prevista na al. b) do n.º 1 do art. 668.º do CPC, aplicável ex vi art. 1.º do CPTA, por nela se verificar falta de fundamentação de facto e de direito que justifique a decisão tomada.
33. Como resulta de toda a argumentação expendida na Decisão tomada no douto Acórdão em causa, a respetiva fundamentação assenta em elementos de facto e de direito que tão só e apenas servem para sustentar a competência do Tribunal por onde corre a ação executiva, na qual poderá vir a ser apreciada a questão da validade do ato administrativo objeto de impugnação na presente ação administrativa especial, não se encontrando na Decisão qualquer fundamento de facto e de direito que imponha a declaração de incompetência relativa do Tribunal por onde corre a presente ação o qual ali veio a ser declarado incompetente somente em razão daquela competência verificada (do outro Tribunal) e pela simples invocação das normas dos arts. 108.º, 110.º e 111.º do CPC.
34. A incompetência do Tribunal só pode ser declarada em razão e com expresso fundamento assente nas normas legais, aplicados aos elementos de facto em que a abstração de tais normas se concretiza, como únicas determinantes objetivas, e assim não arbitrárias, nem discricionárias da verificação daquela incompetência, a qual, jamais pode, por qualquer forma, ser deliberada por exclusão decorrente da verificação da competência de outro Tribunal.
35. As regras definidoras e reguladoras da competência dos Tribunais Administrativos constantes das Leis Processuais Administrativas impostas pelo art. 1.º do CPTA e, por força deste preceito, constantes também das Leis Processuais Civis e de Organização Judiciária - cfr. art. 62.º do CPC - não podem deixar de ser expressamente invocadas, interpretadas e consequentemente aplicadas, para que se delibere sobre incompetência relativa verificada in casu e que assim foi declarada sem a consideração de tais regras e normas processuais de imperativa aplicação.
36. Regras definidoras e reguladoras da competência dos Tribunais que a definem e caracterizam em razão da matéria, da hierarquia, do valor da causa, da forma do processo, do território, e por força dos quais aquela competência, consequentemente se atribui ou se exclui.
37. A aplicação de tais regras definidoras e caracterizadoras da atribuição ou da exclusão da competência do Tribunal por onde corre a presente ação administrativa especial não se encontra plasmada em nenhum ponto da fundamentação - quer de facto quer de direito - em que assenta a Decisão, tomada no douto Acórdão recorrido, de declarar a incompetência relativa daquele Tribunal.
38. Não consta da Decisão tomada no douto Acórdão recorrido qualquer referência sequer, às normas dos arts. 11.º a 44.º do ETAF, 13.º a 22.º, 31.º a 36.º, 46.º a 77.º do CPTA, 62.º e segs. do CPC, entre outras que, tal como os da Lei n.º 52/2008 de 28 de agosto - enquanto Lei de Organização Judiciária - são especialmente definidoras e reguladoras da questão da competência do Tribunal em causa, por onde pende a presente ação administrativa especial e que, por nenhuma forma, podiam estar ausentes da fundamentação expendida na Decisão que veio a declarar incompetência relativa daquele Tribunal.
39. Pelo que se verifica que a Decisão tomada no douto Acórdão recorrido assenta em fundamentação absolutamente desadequada, que não pode sequer ser considerada deficiente, incompleta ou insuficiente, pois não aprecia, em absoluto a questão ali decidida da incompetência relativa do Tribunal à luz das regras, dos princípios e das Leis, que obrigatoriamente, e só uma vez aplicadas e interpretadas, a poderão declarar.
40. Não existindo, assim, na Decisão tomada no douto Acórdão recorrido, fundamentação da qual se pode extrair o efeito conclusivo ali proclamado com a declaração de incompetência relativa do Tribunal.
41. Sendo apenas possível extrair dos preceitos legais supra em XL citados, a consequência lógica adequada a alcançar a Decisão tomada no douto Acórdão recorrido e à qual se chegou sem qualquer demonstração de raciocínio interpretativo ou iter lógico que revele a aplicação das regras e leis em que tal Decisão relativa à incompetência deve obrigatoriamente assentar, está a mesma inquinada pela nulidade gerada pela falta de fundamentação que operada em violação do art. 94.º, n.º 2 do CPTA, está prevista no art. 668.º, n.º 1, al. b) do CPC, e que aqui, consequentemente se argui com todos os efeitos legais inerentes.
42. Nulidade aqui ora invocada e arguida, verificada pela violação de todas as normas legais supra expressamente indicadas e aqui para o efeito reproduzidas, cuja não aplicação que resulta de interpretação levada a efeito em sentido do seu afastamento, viola consequentemente o conceito normativo que subjaz à norma do art. 205.º, n.º 1 da CRP, sendo outrossim inconstitucional qualquer interpretação daquelas, ou de quaisquer outras normas que venham a ser aplicadas em sentido de que a competência relativa do Tribunal possa ser declarada sem a adequada interpretação das regras e leis definidoras e reguladoras da competência dos Tribunais, pela simples verificação da competência de outro Tribunal e simples invocação das normas dos arts. 108.º, 110.º e 111.º do CPC em inconstitucionalidade que aqui desde já se argui.
C - DO JULGAMENTO E SUA DECISÃO
43. A Nulidade da Decisão, supra invocada e arguida verificada por falta de fundamentação respeitante à deliberação ali tomada de declarar a incompetência relativa do tribunal foi determinante do erro de julgamento que, salvo o muito devido respeito, ali desde logo se constata.
44. Erro de julgamento que a supra referida obrigatória consideração, aplicação e interpretação das normas e de todas as regras definidoras e reguladoras da competência dos Tribunais teria, consequentemente impedido de cometer, pois que as mesmas impõem, antes, alcançar resultado conclusivo em sentido contrário ao deliberado pela Decisão constante do douto Acórdão recorrido.
45. O Tribunal que, pela Decisão tomada no douto Acórdão recorrido, foi julgado incompetente, em razão da ali declarada sua incompetência relativa é, afinal, absolutamente competente em razão do preenchimento de todos os requisitos e pressupostos impostos pelas referidas regras e leis definidoras e reguladoras da competência dos Tribunais relativas quer à matéria, quer à hierarquia, quer ao valor da causa, quer à forma do processo, quer ao território supra em 36. indicados, e aos quais o Tribunal por onde corre a presente ação administrativa especial se deve subsumir para efeito de lhe ser atribuída e conferida a respetiva competência.
46. Estando, aliás restringida, in casu, a questão da competência ou incompetência do Tribunal aos pressupostos concernentes à forma do processo, por ser a que obviamente foi posta em causa na Decisão constante do douto Acórdão recorrido, e através da simples invocação das referidas normas dos arts. 108.º, 110.º e 111.º do CPC.
47. Forma do processo que, inequivocamente nos termos previstos no art. 46.º do CPTA é a adequada para a apreciação e para o julgamento, pelo Tribunal por onde corre, da questão submetida a juízo através da presente ação administrativa especial como modelo de ação com forma de processo e tramitação especialmente estabelecidas pelas normas processuais do CPTA como a própria, e ali adotada como meio adequado para, em sede de contencioso administrativo e em tutela reativa, ser apreciada a impugnação dos atos administrativos.
48. Forma do Processo - ação administrativa especial - que regulada no Título III do CPTA, abrange os processos cujo objetivo seja, como in casu, pretensão emergente da prática ilegal de ato administrativo - cfr. art. 46.º do CPTA - como atuação que envolve o exercício de poderes de autoridade que impõem certas especificidades de tutela jurisdicional, privativas daquele modelo e forma processual.
49. Modelo e forma de processo - ação administrativa especial - que, como meio processual legalmente previsto como o adequado, no âmbito da jurisdição administrativa, é por esta posta ao dispor dos administrados para, através da sua particular e específica tramitação, poderem ver protegidos e assegurados os seus direitos e interesses ilegitimamente lesados por ato administrativo praticado com vícios que, inquinando a sua validade, põem em causa a atuação da Administração.
50. Com efeito, uma vez praticado um ato administrativo que, ferido de ilegalidade, tem de ser consequentemente impugnado, deve o sujeito destinatário de tal ato, assim dotado da respetiva legitimidade ativa, recorrer, em via contenciosa, à ação administrativa especial que, prevista nos arts. 46.º e segs. do CPTA que foi concebida pelo legislador como a adequada e, por definição como a especial e idónea para a impugnação dos atos administrativos impugnáveis, a qual em efetivo exercício da tutela jurisdicional, não pode ceder perante qualquer outra forma de processo como alternativa deixada à livre escolha daquele destinatário.
51. Cabe, pois, ao interessado destinatário de um ato administrativo impugnável, em efetiva realização da tutela jurisdicional conferida pela jurisdição administrativa, lançar mão do meio processual suscetível de assegurar, em plenitude, a tutela dos seus direitos e interesses legítimos afetados por tal ato, e que o citado art. 46.º do CPTA impõe sem alternativa ao determinar que «seguem a forma da ação administrativa especial, com a tramitação regulada no capítulo III do presente título, os processos cujo objeto sejam pretensões emergentes da prática ou emissão ilegal de atos administrativos ...» (sublinhado nosso).
52. Como se escreve no Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, M. Aroso de Almeida e C. A. Fernandes Cadilha, 3.ª edição, Almedina, Coimbra 2010, «É esta a ideia central do princípio da tutela jurisdicional efetiva: a garantia da existência do meio processual adequado à situação jurídica concreta; mas também a possibilidade de escolha, entre diversos meios admissíveis, daquele que o interessado considere que melhor assegura a efetivação do seu direito. O critério geral para aferir a adequação do meio processual utilizado, em cada caso, será apenas o da idoneidade processual face ao tipo de pretensão que tenha sido deduzida em juízo" (sublinhado nosso).
53. E, à escolha do meio processual adequado subjaz o requisito fundamental do interesse processual ou do interesse em agir que, caracterizado in casu pela necessidade de garantir e assegurar a efetiva tutela dos direitos e legitimamente ofendidos pela prática do ato administrativo em causa na presente ação, impõe o recurso à ação administrativa especial, como único meio capaz de fazer afastar os prejuízos sérios e graves causados à sua, ali Autora, ora Recorrente, por tal ato administrativo, cujo Autor pretende retirar direito há muito subjetivado na esfera jurídica da sua destinatária e com recurso a construção jurídica em absoluto destituída de fundamentação legal que possa sustentar a sua pretensão.
54. Como ação resulta demonstrado na presente … administrativa especial, a Autora, ora Recorrente foi expressamente notificada, enquanto sua destinatária, do ato administrativo aqui objeto de impugnação, tendo tal notificação constituído, elemento essencial do respetivo procedimento, por força do qual tal ato se tomou completo, perfeito e consequentemente eficaz na ordem jurídica em que se insere e como decorrência legal das disposições impostas pelos arts. 66.º e 127.º do Código de Procedimento Administrativo (CPA).
55. Em face da eficácia externa conferida ao ato administrativo em causa e ao disposto na norma do art. 51.º do CPTA, e em razão da invalidade operada pelos vícios de que enferma, e que se pretende ver declarada, viu-se a ora Recorrente, enquanto destinatária daquele ato, na contingência de, em observância dos prazos impostos pelos arts. 58.º e 59.º do CPTA, ter de interpor, assim, a presente ação administrativa especial, sendo inquestionavelmente própria adequada e idónea para apreciar e julgar dos vícios ali arguidos e próprios da atividade administrativa.
56. E à escolha da via da ação administrativa especial, como meio adequado e idóneo à impugnação do ato administrativo em causa - tornada imperiosa após a já referida respetiva notificação - não deixou de presidir o princípio da economia processual referido aliás no douto Acórdão recorrido, face ao anterior conhecimento obtido pela autora na já referida ação executiva que, sob o número 1057/09-A, pende nesse Colendo Supremo Tribunal Administrativo e onde, pela via judicial foi chamada a pronunciar-se sobre tal ato que ali teve necessariamente que impugnar.
57. Principio da economia processual que, todavia, não pontificou naquela escolha da via da presente ação administrativa especial, além do mais pela imposição do princípio da adequação formal, perante o qual teve de ceder porquanto, à causa seu objeto e em razão das especificidades que a caracterizam, não poderiam deixar de se aplicar as exigências, a tramitação processual e os efeitos, próprios e privativos daquela forma de processo, como os adequados a prosseguirem o fim proposto com a respetiva interposição, e não alcançáveis com a impugnação levada a efeito na referida ação executiva, onde tal ato administrativo foi pretendido juntar para ali tão só ser usado como meio de, por «compensação» dar execução a douto Acórdão condenatório desse Colendo Supremo Tribunal Administrativo, ali título executivo naquela ação.
58. Princípio da adequação formal que, constitui, aliás, corolário do princípio da tutela jurídica efetiva, concretizado desde logo no preceito do n.º 2 do art. 2.º do CPTA, e de acordo com o qual «A todo o direito ou interesse legalmente protegido corresponde a tutela adequada junto dos tribunais administrativos, designadamente para o efeito de obter: ... d) A anulação ou a declaração de nulidade ou inexistência de atos administrativos …».
59. Princípio da adequação formal que assim impôs a interposição da presente ação administrativa especial, como meio autónomo de impugnação do ato administrativo em causa, em paralelo com a impugnação que, por força de incidente na mesma suscitado, teve a ora Recorrente de impugnar também na referida ação executiva n.º 1057/09-A.
60. Tendo sido assim, imprescindível, por força de tal incidente, impugnar, naquela ação executiva o ato administrativo em causa, desde logo por o mesmo ali constituir meio pretendido utilizado, pela Entidade ali Demandada para contrariar a Decisão proclamada no referido douto Acórdão condenatório que, como título ali executivo determinou o pagamento à ora Recorrente, e ali Autora, de determinada quantia em dinheiro que, agora por «compensação» feita através de tal ato administrativo ad hoc para o efeito praticado, pretende aquela Entidade vir então a cumprir.
61. Pois, tal como se escreve no Douto Acórdão Recorrido a págs. 7 «para atalhar a situação de especial gravidade do modo mais eficaz possível o CPTA confere ao interessado a possibilidade de, em qualquer das formas do processo executivo suscitar o incidente da invalidade dos atos administrativos praticados» e que a Administração venha invocar «no âmbito de um processo dirigido à execução de uma decisão proferida por um tribunal administrativo».
62. Todavia, a decisão que venha a ser proferida sobre o incidente de junção do referido ato administrativo, suscitado na referida ação executiva e que poderá levar, caso tal junção venha a ser admitida à apreciação da invalidade daquele ato, não pode produzir efeitos fora daquele processo em que foi suscitada, não podendo constituir caso julgado fora do âmbito daquela ação, nos termos aliás impostos pela norma do art. 96.º do CPC, aplicável ex vi art. 1.º do CPTA ou seja, o efeito decisório de tal apreciação não determina assim, a extinção, com a extensão que se pretende pela presente ação administrativa especial, daquele ato administrativo que porque ferido de absoluta ilegalidade não deve consequentemente figurar na respetiva ordem jurídica.
63. Pretendendo, pois, a Autora, ora Recorrente, ver apreciada e decidida a questão da invalidade do ato administrativo em causa, com efeitos que prevalecem na ordem jurídica em que o mesmo se insere e que extravasam assim, o âmbito e a extensão da referida ação executiva só suscetíveis de alcançar pela presente ação administrativa especial cuja decisão final, sobre tal questão, constituirá caso julgado material nos termos do art. 50.º do CPTA e art. 673.º do CPC aplicável ex vi art. 1.º do CPTA.
64. Verificando-se, por outro lado, uma discrepância entre os valores que, como efeitos decorrentes do próprio ato administrativo, cuja validade se pretende ver apreciada, estão em causa, quer como incidente na referida ação executiva, quer como questão de mérito e objeto principal na presente ação administrativa especial, pois que naquela ação se pretende levar a efeito «compensação» por valor muito inferior ao valor total imputado como correspondente «alegada dívida» da Autora, ora Recorrente, alegadamente geradora de alegado «Crédito» cuja inexistência na presente ação se pretende ver declarada.
65. A apreciação da invalidade do ato administrativo em causa, na presente ação administrativa especial contrariamente ao que se afirma no douto Acórdão recorrido extravasa, assim, as questões que, no âmbito da referida ação executiva ali deverão ser apreciados em razão daquela invalidade, ali tão só restringida à sua influência na possibilidade legal de decretamento da «compensação» ali requerida como forma ou providência de execução - cfr. art. 172.º, n.º 2 do CPTA - e que, como supra dito, contende com o decidido no douto Acórdão condenatório/título executivo.
66. Verificada, assim, de acordo com as regras, leis e critérios definidores e reguladores da competência dos Tribunais, a competência do Tribunal para apreciar e julgar na presente ação administrativa especial da invalidade do ato administrativo em causa, deve a mesma ser consequentemente declarada por decisão no presente recurso, com a consequente revogação da deliberação que no douto Acórdão recorrido o considerou para aquele efeito incompetente.
67. Competência assim atribuída ao Tribunal, pelas referidas determinantes legais, para apreciar e julgar sob a forma da ação administrativa especial da invalidade de ato administrativo impugnável ao qual é consequentemente conferida uma medida de jurisdição, para tal efeito, que jamais pode ser excluída ou por qualquer forma afastada em razão de competência que a lei atribui, por força do art. 96.º, n.º 1 do CPC aplicável ex vi art. 1.º do CPTA, ao Tribunal por onde corre a ação executiva - enquanto processo que julga uma causa principal com objeto e efeitos bem distintos e autónomos - para conhecer dos incidentes na mesma suscitados.
68. A competência dos dois Tribunais em causa constitui, aliás, corolário da importante dimensão em que se desdobra a tutela jurisdicional administrativa quando é, nomeadamente, chamada a pronunciar-se sob a proteção dos direitos e interesses individuais considerado imperativo pela Constituição da República, quer desde logo, na norma do seu art. 20.º n.ºs 4 e 5, quer no que tange especialmente à jurisdição administrativa na norma do seu art. 268.º, n.º 4 que, expressamente, impõe e determina que deve ser «... garantida aos administrados tutela jurisdicional efetiva dos seus direitos e interesses ...» (sublinhado nosso).
69. Imposição constitucional transposta para o CPTA que, em realização de tal dimensão subjetiva, salvaguarda a proteção dos direitos e interesses individuais dos administrados nas diferentes espécies e formas de processo no mesmo consagrada e estabelecidas como meio de tomar efetivamente concretizada a tutela jurisdicional dos particulares perante a administração.
70. O direito à tutela jurisdicional efetiva, amplamente definido no art. 2.º do CPTA e no art. 4.º do ETAF impõe, por outro lado, que os Tribunais Administrativos cumpram a obrigação de decidirem, com força de caso julgado as pretensões que lhe são regularmente deduzidas em juízo, isto é, as pretensões que forem apresentadas na observância dos pressupostos processuais de cujo preenchimento depende, nos termos da lei, a obtenção de uma pronúncia judicial sob o respetivo mérito e a possibilidade de fazer executar essas decisões (cfr. ob. cit. supra em 52.).
71. O art. 2.º, n.º 2 do CPTA, consagrando o princípio de que a todo o direito ou interesse legalmente protegido corresponde uma ação, estabelece de forma assim expressa que, como é consensual entre os administrativistas toda a situação jurídico administrativa subjetiva pode ser deduzida perante os Tribunais Administrativos onde, em sede de contencioso administrativo encontre a forma de processo que possibilite a sua adequada atuação processual, ou seja, em adequada tutela jurisdicional efetiva.
72. Mercê da concretização dos princípios supra referidos, levada a efeito pelas normas do ETAF e CPTA, é possível deduzir perante os Tribunais Administrativos as pretensões que, como in casu, tendo em vista a proteção e salvaguarda dos direitos e interesses legalmente garantidos, e quando as mesmas carecem de tutela jurisdicional com objeto, finalidade, alcance, efeitos diversos, devem ser deduzidos em diferentes sedes jurisdicionais administrativas capazes de garantir e assegurar a respetiva proteção, e onde a mesma não pode, consequentemente, e por nenhuma forma ser negada.
73. Pois, e como também se escreve na ob. cit. em 52. «Na medida em que exista uma situação carecida de tutela, o sistema do contencioso administrativo não pode deixar, por outro lado, de dispor das vias processuais adequadas à dedução em juízo de todo o tipo de pretensões» o que impõe e, aliás, «não impede que a dedução de certos tipos específicos de pretensões continue a depender do preenchimento de determinados pressupostos processuais ...» que uma vez preenchidos as fazem obrigatoriamente submeter às formas de processo estabelecidas especificamente para tal efeito.
74. Tudo assim significando que, uma vez preenchidos tais «pressupostos processuais» impostos para «certos tipos especiais de pretensões como as definidas para a ação administrativa especial, é consequentemente atribuída competência ao Tribunal onde foi admitida, não podendo o mesmo deixar de, sob aquela forma específica apreciar e julgar a causa que constitui o respetivo objeto.
75. A declaração de incompetência do Tribunal deliberada na Decisão constante do douto Acórdão recorrido, e que não assenta em qualquer fundamento legal que a permita, constitui, assim, indeferimento do pedido de realização do direito à tutela jurisdicional efetiva que, através da presente ação administrativa especial, a Autora, ora Recorrente pretende exercer e consequentemente negação da referida garantia que enquanto administrada e por força da citada norma do art. 268.º, n.º 4 da CRP lhe está expressamente conferida, para que possa assegurar a proteção dos seus direitos e interesses ilegitimamente lesados e ofendidos.
76. Consagrando, por outro lado, o art. 7.º do CPTA o principio pro actione, do qual decorre que «... em caso de dúvida os Tribunais [Administrativos] têm o dever de interpretar as normas processuais num sentido que favoreça a emissão de uma pronúncia sobre o mérito das pretensões formuladas" (in ob. cit. supra em 52.) e verificados que estão todos os requisitos e pressupostos que atribuem e conferem competência ao Tribunal para apreciar e julgar a questão da invalidade do ato administrativo em causa, impugnado pela presente ação administrativa especial, deve, assim ser consequentemente revogado o douto Acórdão que - e aqui expressamente de novo e por nenhuma forma se concedendo quanto às nulidades processuais e da decisão supra invocadas e arguidas - suporta assim decisão que declara a incompetência daquele Tribunal que determinou a absolvição do réu da instância.
77. Sendo consequentemente inconstitucional a interpretação, levada a efeito na Decisão constante do douto Acórdão recorrido das normas dos arts. 108.º, 110.º e 111.º do CPC que, feito em sentido que afastou a aplicação das normas processuais administrativas e civis supra expressamente em 38. citadas e aqui para o efeito reproduzidas que regulam e regem a competência dos Tribunais e que consequentemente levou à declaração da incompetência do Tribunal para apreciar e julgar a presente ação administrativa especial, violou os conceitos normativos que subjazem às normas dos arts. 268.º, n.º 4 e 20.º, n.ºs 4 e 5 da CRP a inconstitucionalidades que, por aplicação daquelas normas legais ou de quaisquer outras que, em interpretação no mesmo sentido venham para o efeito a ser aplicadas, o que aqui desde já se arguem.
78. E sendo ainda majoradamente inconstitucional por violação dos referidos conceitos normativos subjacente às citadas normas dos arts. 268.º, n.º 4 e 20.º, n.ºs 4 e 5 da CRP a interpretação levada a efeito na Decisão constante do douto Acórdão recorrido em aplicação das normas dos arts. 164.º, n.º 3, 167.º, n.º 1, 176.º, n.º 5, 179.º, n.º 2 e 158.º, n.º 2 do CPTA, bem como qualquer outra interpretação que, de quaisquer outras normas venha também a ser feita em sentido de, afastando igualmente a aplicação que é devida das normas legais supra em 52. citadas e em 77. reproduzidas, considera incompetente o Tribunal para apreciar e julgar a presente ação administrativa especial, em razão da competência atribuída ao Tribunal onde pende a ação executiva n.º 1057/09-A, em inconstitucionalidade que aqui também, consequentemente, se arguiu.
79. A revogação do douto Acórdão recorrido que, pelo presente recurso se pretende ver declarada com a consequente revogação da decisão no mesmo tomada e que fará assim, manter como se almeja a competência por lei atribuída e conferida ao Tribunal para apreciar e julgar a presente ação administrativa especial, poderá dar lugar, contudo, a eventual conflito positivo de competências em razão da verificada competência de dois Tribunais da mesma ordem jurídica - e ainda que com extensão e efeitos diversos - para a apreciação da questão da validade do ato administrativo em causa.
80. Conflito de competência que, suscitado, deverá ser resolvido nos termos legalmente impostos pelo art. 135.º do CPTA e pelas normas dos arts. 115.º e segs. do CPC aplicáveis também ex vi art. 1.º do CPTA suscitação que como impõe o n.º 3 daquele art. 115.º deve, contudo, aguardar a prolação da decisão a proferir no presente RECURSO”.
Termina peticionando que o presente recurso seja “… julgado procedente com todas as consequências legais, devendo com a consideração de todas as questões de constitucionalidade que ao longo do mesmo de forma assim processualmente adequada foram sendo suscitadas, nomeadamente ser: a) Declarada a nulidade processual operada por violação dos arts. 17.º do ETAF e 132.º do CPC relativa à composição e formação do Tribunal e que consequentemente o tomou inexistente; b) Declarada a nulidade processual operada por violação do art. 132.º do CPC relativa à prolação de decisão final que aquela norma legal impedia que fosse proferida; c) Declarada a nulidade processual operada por violação do art. 110.º, n.º 3 do CPC e concernente à declaração de incompetência relativa em momento processual não admitido por aquela norma; d) Declarada a nulidade da decisão operada por excesso de pronúncia prevista no art. 668.º, n.º 1, al. d) do CPC e resultante da violação das normas dos arts. 110.º, n.º 3 do CPC e 95.º, n.º 1 do CPTA; e) Declarada a nulidade da decisão operada por excesso de pronúncia prevista no art. 668.º, n.º 1 al. d) do CPC e resultante da violação das normas dos arts. 132.º do CPC e 95.º, n.º 1 do CPTA; f) Declarada a nulidade da decisão operada por falta de fundamentação prevista no art. 668.º, n.º 1 al. b) do CPC e operada por violação da norma do art. 94.º, n.º 2 do CPTA; g) Revogada a decisão que declarou o Tribunal incompetente para apreciar e julgar a presente ação administrativa especial.º 205/12; h) Revogada a decisão que absolve o Réu da instância …”.

1.5. Devidamente notificado o R., aqui ora recorrido, não veio produzir contra-alegações [cfr. fls. 546 e segs.].

1.6. Dispensados os vistos cumpre apreciar e decidir.



2. DAS QUESTÕES A DECIDIR
Em suma e segundo uma ordem lógica de decisão constituem objeto de apreciação nesta sede:
- Nulidade processual operada por violação dos arts. 17.º e 60.º do ETAF e 132.º do CPC [na redação então vigente e anterior à reforma operada pela Lei n.º 41/2013 tal como todas as demais referências feitas salvo expressa indicação em contrário] [correspondente ao atual art. 125.º do CPC/2013] [relativa à composição e formação do Tribunal e à prolação de decisão final que aquele art. 132.º impedia que fosse proferida];
- Nulidade processual por efeito da infração art. 110.º, n.º 3, do CPC [mercê da declaração de incompetência relativa em momento processual não admitido pela referida norma];
- Nulidade da decisão operada por falta de fundamentação [art. 668.º, n.º 1, al. b), do CPC e operada por violação da norma do art. 94.º, n.º 2, do CPTA];
- Nulidade da decisão operada por excesso de pronúncia [art. 668.º, n.º 1, al. d), do CPC e resultante da: i) violação das normas dos arts. 110.º, n.º 3, do CPC e 95.º, n.º 1, do CPTA; e ii) da violação das normas dos arts. 132.º do CPC e 95.º, n.º 1, do CPTA];
- Erro de julgamento dado discordar do decidido por entender haver violação dos arts. 02.º, n.º 2, 07.º, 46.º do CPTA, 108.º, 110.º e 111.º do CPC, bem como uma interpretação inconstitucional dos referidos preceitos e dos arts. 164.º, n.º 3, 167.º, n.º 1, 176.º, n.º 5, 179.º, n.º 2, e 158.º, n.º 2, todos do CPTA em infração dos comandos constitucionais insertos nos arts. 20.º, n.ºs 4 e 5, e 268.º, n.º 4, da CRP [cfr. alegações e demais conclusões supra reproduzidas].
Face ao que se mostra decidido, com trânsito, nos autos de execução de julgado sob o n.º 1057-A/09 importa, como ponto prévio, aferir da formação de caso julgado no quadro da presente ação.



3. FUNDAMENTAÇÃO
3.1. DE FACTO
Resulta como assente da decisão judicial impugnada e da análise dos autos o seguinte quadro factual:
I) Em 19.12.2008, o «PGR» aplicou à A. a pena de demissão.
II) Inconformada, esta intentou, neste Supremo, ação administrativa especial impugnando essa decisão mas sem êxito já que, por Acórdão de 26.01.2012, a ação foi julgada improcedente [Proc. n.º 450/09].
III) Decisão que, tendo sido objeto de recurso, aguarda que o mesmo seja decidido.
IV) Consta do Acórdão do Pleno, de 20.01.2011, proferido no processo n.º 1057/09, que a A./Reclamante “depois de lhe ter sido aplicada a pena disciplinar de demissão, com efeitos a partir de 2009.01.23, requereu ao Sr. Procurador-Geral da República, a atribuição de subsídio de desemprego”.
V) Pretensão que foi indeferida “por duas razões: (i) por não estarem reunidos todos os pressupostos legais de atribuição do subsídio, de acordo com o previsto nos artigos 9.º/1 e 11.º da Lei n.º 11/2008, de 20.02; (ii) por não caber aos Serviços da Procuradoria-Geral da República a decisão sobre a atribuição e o pagamento do subsídio de desemprego à Autora”.
VI) A A. intentou, então, em 28.10.2009, a ação administrativa especial de condenação à prática de ato devido.
VII) A qual, tendo sido julgada procedente, determinou a condenação do “Sr. Procurador-Geral da República a ordenar o processamento e pagamento do subsídio de desemprego à Autora através dos Serviços da Procuradoria-Geral da República”.
VIII) Decisão que o Acórdão do Pleno, de 20.01.2011, confirmou.
IX) Não tendo o «PGR» cumprido espontaneamente essa decisão a A. requereu a sua execução.
X) No decurso desse processo executivo foi elaborada, em 22.11.2011, na Procuradoria-Geral da República, a Informação que consta de fls. 86 a 89, que se dá como reproduzida, onde, além do mais, se propôs que fosse “proferido despacho que determine a reposição da quantia recebida ao longo do período de afastamento do serviço, por força de condenação judicial, por compensação relativamente ao crédito da Lic. A……. sobre o subsídio de desemprego, decorrente da condenação da Procuradoria-Geral da República no seu pagamento” - (vd. ponto 5).
XI) Compensação que deveria ser “operada relativamente às prestações vencidas e respetivos juros de mora, calculados à taxa legal” e que “o crédito remanescente da Procuradoria-Geral da República deve ser amortizado por compensação, em prestações mensais e sucessivas, a deduzir nas prestações vincendas de igual ao montante mensal destas, até ao termo final da obrigação de pagamento do subsídio de desemprego, se entretanto nada vier a obstar, designadamente o cumprimento da pena principal, que constitui causa de suspensão de tal obrigação - cfr. art. 50.º, al. c), do DL n.º 220/2006, de 3/11” (vd. pontos 6 e 7).
XII) E que, se essa proposta merecesse a concordância superior, deveria ser enviada “ao processo 1057/09-A, a correr termos no STA, cópia desta Informação e do despacho a proferir ...” bem como ser remetida cópia “... do despacho que venha a determinar a compensação de créditos à Caixa Geral de Aposentações para os efeitos tidos por convenientes (Antiguidade e Aposentação)...” (vd. pontos 8 e 9).
XIII) Na primeira página desta Informação o Sr. Procurador-Geral da República proferiu o despacho impugnado que é do seguinte teor:
Concordo. (…) Determino a restituição da quantia recebida pela Lic. A……. por compensação de créditos, nos termos propostos. (…) Proceda-se em conformidade com o sugerido nos artigos 8.º e 9.º da informação. (…) 22-12-2011”.
XIV) Inconformada, a ali Exequente, aqui A., instaurou esta ação administrativa especial pedindo (1) a declaração de nulidade do despacho transcrito no anterior em XIII) e (2) a declaração de inexistência do crédito que esteve na base da prolação desse despacho.
XV) E impugnou, no processo executivo, que o mesmo lhe pudesse ser junto por considerar que ele não tinha qualquer influência na marcha deste processo.
XVI) A A. deduziu, em 16.05.2012, pela motivação aduzida a fls. 02 a 42 dos autos apensos sob o n.º 205-A/12 e cujo teor aqui se dá por reproduzido, incidente de suspeição relativamente aos Juízes Conselheiros Adérito da Conceição Salvador dos Santos e Luís Pais Borges;
XVII) Tal incidente de suspeição referido em XVI) foi indeferido por despacho, datado 28.05.2012, prolatado pelo Juiz Conselheiro Presidente do Supremo Tribunal Administrativo [cfr. fls. 47/47 v. dos autos apensos sob o n.º 205-A/12 e cujo teor aqui se dá por reproduzido];
XVIII) A A., inconformada com aquela decisão, veio arguir, primeiramente, nulidades à mesma que foram desatendidas pelo despacho de 22.06.2012, tendo, de seguida, interposto, em 11.07.2012, recurso para o Tribunal Constitucional [«TC»], recurso este que foi admitido por despacho, datado de 13.07.2012, no qual foi fixado efeito suspensivo ao mesmo [cfr. fls. 51/153 dos autos apensos sob o n.º 205-A/12 e cujo teor aqui se dá por reproduzido];
XIX) Sobre o recurso referido em XVIII) recaiu decisão sumária do Juiz Conselheiro no «TC», datada de 12.11.2012, a “não tomar conhecimento do objeto do recurso” [cfr. fls. 158/162 dos autos apensos sob o n.º 205-A/12 e cujo teor aqui se dá por reproduzido];
XX) De novo inconformada com aquela decisão sumária a A. reclamou para a Conferência nos termos do art. 78.º-A, n.º 3, da LTC, tendo sobre a reclamação recaído acórdão, datado de 15.01.2013, a confirmar aquela decisão, acórdão esse que foi objeto de pedido de aclaração, deduzido em 06.02.2013, o qual foi desatendido pelo acórdão de 20.03.2013, transitado em julgado em 11.04.2013 [cfr. fls. 165/251 dos autos apensos sob o n.º 205-A/12 e cujo teor aqui se dá por reproduzido];
XXI) Entretanto e no quadro da presente ação administrativa findos os respetivos articulados veio a ser proferido despacho pelo Relator, datado de 26.06.2012, donde, em suma, se extrai e se decidiu que “atenta a evidente dependência desta ação relativamente ao citado processo executivo e não sendo absolutamente certo que se verifique a repetição de causas, suspendo a instância nos termos do art. 279.º/1 do CPC até que a legalidade da compensação seja decidida na ação executiva” [cfr. fls. 423/424 dos presentes autos e cujo teor aqui se dá por reproduzido];
XXII) Objeto de impugnação aquela decisão para a Conferência por parte da A., aqui recorrente, veio a ser proferido acórdão por este Supremo, datado de 11.10.2012, a revogar o despacho reclamado e a absolver o Réu da instância, acórdão no qual intervieram, tal como resulta do “termo da sessão de julgamento”, “além do Relator, os Excelentíssimos Conselheiros, Santos Botelho e Adérito Santos” [cfr. fls. 434/444, 468/478 dos presentes autos e cujo teor aqui se dá por reproduzido];
XXIII) Por deliberação do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais de 19.03.2013 “… Dr. José Manuel da Silva Santos Botelho, juiz conselheiro, provido a título definitivo na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo, e a exercer funções como Vice-Presidente do Supremo Tribunal Administrativo - desligado do serviço para efeitos de aposentação/jubilação. (…) Dr. Adérito da Conceição Salvador dos Santos, juiz conselheiro, provido a título definitivo na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo - desligado do serviço para efeitos de aposentação/jubilação …” [cfr. DR. II.ª série, n.º 63, de 01.04.2013].

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3.2. DE DIREITO
Presente o quadro factual antecedente passemos, então, à apreciação das questões que constituem objeto desta instância de recurso, começando pelo ponto prévio atrás enunciado.

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3.2.1. DO DECIDIDO NO PROCESSO N.º 1057-A/09 E SEUS REFLEXOS

I. No âmbito dos autos em referência e na sequência do contraditório que se seguiu à junção do requerimento de fls. 390/398 no qual se comunicou a emissão do despacho do «PGR», datado de 22.11.2011, com o qual o mesmo determinava a execução da decisão judicial anulatória [acórdão do Pleno deste Supremo de 20.01.2011], a ali exequente, ora A., veio apresentar resposta [cfr. fls. 406/473] na qual conclui peticionando, nomeadamente, que “devem ser: a) Declarados nulos e de nenhum efeito os atos administrativos que integram os documentos juntos a fls. 375/396 dos autos; b) Declarada a inexistência da dívida imputada à Autora e do Crédito de que a Procuradoria-Geral da República alegadamente se considera titular através dos atos administrativos que integram os documentos juntos a fls. 375 a 396 dos autos e que se impugnam; c) Declarada como de nenhum efeito para a verificação da existência da dívida da Autora e do crédito de que a Procuradoria-Geral da República alegadamente se considera titular através dos documentos juntos a fls. 375 a 396 dos autos e que se impugnam, a certidão donde consta o valor correspondente à quantia recebida pela Autora a título de remunerações no período compreendido entre 13 de julho de 2004 a 23 de janeiro de 2009; d) Ordenada a anulação de todos e quaisquer efeitos que os atos administrativos que integram os documentos juntos a fls. 375 a 396 dos autos e que se impugnam, tenham feito produzir e, nomeadamente, os que decorram do envio de documentação e de cópia daqueles atos à Caixa Geral de Aposentações …”.

II. Por sua vez e na sequência da junção de requerimento do «PGR» contendo despacho, datado de 22.03.2012, a retificar o despacho de 22.11.2011 [cfr. fls. 578/590], foi aberto contraditório no âmbito do qual a ali exequente veio responder.

III. No decurso dos ulteriores termos onde se perspetivou e discutiu a possibilidade de suspensão dos mesmos autos face à propositura da presente ação [cfr. despacho do Relator de fls. 696/699] veio a ser proferida decisão sumária pelo Relator, datada de 06.11.2012 [cfr. fls. 815/823], na qual se afirmou, no que para aqui importa considerar, que a “… A. … vem no presente processo pedir a execução do acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo de 7.4.2010, proferido no processo n.º 1057/09, em que foi decidido «condenar o Senhor Procurador-Geral da República a ordenar o processamento e pagamento do subsídio de desemprego à Autora através dos Serviços da Procuradoria-Geral da República» e «anular os atos impugnados, como efeito direto da referida condenação»”, que em “23.11.2011, invocando os arts. 8.º, n.º 4, alíneas a) e c) e 165.º, n.º 1, do CPTA, o Senhor Procurador-Geral da República veio juntar ao processo os documentos que constam de fls. 391-399 em que, em suma, determina a compensação do crédito da Requerente resultante da decisão condenatória proferida no processo principal com um crédito que o Senhor Procurador-Geral da República entende ter sobre a Requerente resultante de quantias que lhe pagou no período de 17.7.2004 a 23.1.2009, período esse em que entende que a Requerente terá estado a cumprir antecipadamente uma pena acessória de proibição do exercício de atividades compreendidas na função pública, que lhe veio a ser aplicada por decisão judicial transitada que refere ter transitado e julgado em 15.11.2011”, que a Requerente se pronunciou e concluiu peticionando nos termos já supra reproduzidos, sendo que, após fixação da factualidade apurada, delimitou as questões a decidir nos seguintes termos “está em causa a execução do julgado por este Supremo Tribunal Administrativo (…) que decidiu «… condenar o Senhor Procurador Geral da República a ordenar o processamento e pagamento do subsídio de desemprego à autora (ora exequente) através dos serviços da Procuradoria - Geral da República». (…) A entidade executada, na sua oposição não contesta a obrigação, mas através do despacho do Senhor Procurador Geral da República de 22.11.2011 foi ordenada a compensação das obrigações emergentes do acórdão condenatório (subsídio de desemprego) com o crédito emergente de quantias, de montante superior, indevidamente recebidas pela exequente. Foi, assim, proferido um despacho em 22.11.2011 (mais tarde, em 22.3.2012 retificado quanto aos valores) justificativo do não pagamento das quantias em que a executada foi condenada a pagar. (…) Da prolação deste despacho resultam essencialmente, dois problemas: (i) saber se a sua legalidade pode ser apreciada no processo executivo; (ii) na afirmativa averiguar se tal despacho deve manter-se ou não. (…) Relativamente à primeira questão entende-se que a mesma deve ser conhecida neste processo. (…) É verdade que se trata de um ato posterior ao acórdão exequendo e que, portanto, a sua validade não depende nem está conexionada com o título executivo. (…) Mas também é verdade que a exequente intentou ação própria impugnado esse despacho e que aí se decidiu ser este processo executivo o local processualmente adequado a discutir a questão (cfr. fls. 811). (…) Deste modo, até para evitar que em ambos os processos se decline a oportunidade para decidir a questão, é mais razoável apreciar, nestes autos, a validade daquele despacho. Por outro lado, o art. 172.º, 2 do CPTA refere-se em concreto aos casos em que a compensação é requerida, permitindo desse modo que tal tipo de questões caiba no objeto da presente execução para pagamento de quantia certa. (…) Assim apreciaremos a questão que, em boa verdade, é a única questão em aberto, isto é, saber se no caso podia ou não operar a compensação tal como decidiu a entidade executada através de ato administrativo. (…) O despacho de 22.11.2011 (mais tarde retificado, em 22.3.2012 quanto aos valores) tem a fundamentação constante de fls. 385 a 388. (…) Julgamos que o despacho em causa não pode manter-se na ordem jurídica por (ii) não ser exata a fundamentação legal em que se sustenta e (ii) por ter sido proferido sobre matéria jurisdicional”.

IV. Assim, e em sede de motivação deste juízo considerou, por um lado, que o apelo fundamentador do ato no art. 36.º do DL n.º 155/92 se revelava incorreto já que não poderia “ser invocada para justificar a compensação, pois é uma norma meramente descritiva dos três modos legalmente possíveis de repor dinheiros públicos” e que no “presente caso não se pretendem compensar abonos da mesma natureza, pois num caso o crédito é de subsídio de desemprego e no outro caso o crédito é de abonos alegadamente pagos de forma indevida, não sendo portanto um dos casos em que, expressamente, a reposição possa ser feita através da compensação”.

V. E, por outro lado, que “as regras gerais da compensação de créditos, afastam a possibilidade da executada justificar a compensação” já que não se enquadrava no art. 853.º, n.º 1, al. b), do CC visto os créditos não terem “a mesma natureza o subsídio de desemprego é parcialmente impenhorável, nos termos do art. 824.º do Código de Processo Civil”, para além de que, nos termos do art. 847.º, n.º 1, al. a) do CC, “é requisito da compensação (além de outros) ser o crédito do devedor que quer fazer operar a compensação «exigível judicialmente e não proceder contra ele exceção perentória ou dilatória de direito material»” e “no presente caso, o crédito da entidade executada só revestiria essa qualidade se tivesse sido reconhecido no processo penal onde a arguida foi condenada na pena acessória”. Ora “é ao tribunal que compete ordenar as «providências necessárias para a execução da pena acessória» (art. 409º do CPP)” e “só o tribunal judicial que aplicou a medida de coação e mais tarde a pena acessória tem competência para a liquidar e decidir as questões relativas à sua execução”, pelo que “[n]ão pode pois a Procuradoria - Geral da República decidir esta questão através de um ato administrativo, pois está em causa uma questão jurisdicional a decidir no respetivo processo. Tratando-se da liquidação da pena acessória e, portanto, de uma matéria clara e indiscutivelmente jurisdicional”, termos em que “[d]o exposto decorrem duas coisas: (i) o ato administrativo que decidiu uma questão de natureza jurisdicional é nulo [art. 133.º, 2, a) do CPA] e nada tendo sido referido no processo penal sobre a questão, (ii) o crédito invocado pela entidade executada não é judicialmente exigível”.

VI. Conclui-se decisoriamente no sentido de “a) Declarar a nulidade do despacho de 22.11.2011, retificado pelo despacho de 22.3.2012; (…) b) Julgar improcedente a oposição à execução, por não ser legal a invocada compensação de créditos; (…) c) Julgar procedente a pretensão executiva devendo, em consequência, a entidade executada dar integral cumprimento ao acórdão condenatório no prazo máximo de 20 dias”.

VII. Esta decisão, objeto de reclamação para a Conferência, foi totalmente confirmada pelo acórdão da Secção de 26.02.2013 e, por sua vez, este acórdão foi mantido, igualmente, pelo acórdão do Pleno deste Supremo de 13.11.2014, sendo que dos seus termos e no que releva se extrai “[é] sabido que a compensação é um meio do devedor «se livrar de uma obrigação por extinção simultânea do crédito equivalente de que disponha sobre o seu credor» (…) e que o mesmo pode ser usado sempre que se verifiquem os requisitos legais que o legitimam, mesmo que a outra parte esteja em desacordo ou se oponha a que o seu crédito possa ser extinto dessa forma. Importa, por isso, ser exigente na apreciação da verificação dos requisitos que a consentem visto que, se assim não for, poder-se-á permitir que um dos credores se sirva, de forma ilegítima e sem fundamento legal, de uma forma da extinção do seu crédito não prevista para a sua concreta situação, com prejuízo do outro credor. (…) Entre os impedimentos ao uso desse meio encontra-se a impenhorabilidade dos créditos obstáculo que, no entanto, desaparece se ambos forem da mesma natureza [art. 853.º/1/b) do CC]. Deste modo, o despacho aqui impugnado só terá cobertura legal se for de concluir que os créditos da Exequente e da PGR não só eram impenhoráveis como tinham a mesma natureza. (…) É inquestionável que os créditos da Exequente decorrem de subsídios de desemprego que o Recorrente foi condenado a pagar-lhe e que os créditos deste resultaram de abonos e vencimentos que a PGR lhe pagou num determinado período sem que ela tivesse direito aos mesmos. Como também se não discute que os créditos decorrentes de vencimentos e de prestações sociais são impenhoráveis [art. 824.º/1/a) e b) do CPC]. (…) Daí que, não se podendo extinguir por compensação os créditos impenhoráveis, exceto se ambos forem da mesma natureza, importa saber se, para os presentes efeitos, o crédito do Recorrente era impenhorável e se, para além disso, tinha a mesma natureza do crédito da Exequente. (…) ninguém duvida de que os créditos aqui em causa se fundam em distintos direitos - num caso no direito a uma prestação social no outro no direito de reaver uma quantia indevidamente paga - e que ambos se destinam a acudir a diferentes situações. (…) Por outro lado, atenta a sua natureza o crédito da PGR não pode, para os efeitos previstos no art. 824.º do CPC, ser qualificado como um crédito decorrente de vencimentos o que nos leva a concluir que o mesmo não só não é um crédito impenhorável como também não tem a mesma natureza do crédito exequendo. (…) Tanto basta para se concluir que a PGR não podia fazer extinguir o seu crédito por compensação com o crédito da Exequente”.

VIII. A A., tal como deriva dos factos apurados [cfr. n.º XIV)], com os mesmos fundamentos e motivação que haviam sido aduzidos nos autos de execução em referência, instaurou, em 23.02.2012, a presente ação administrativa especial peticionando, nomeadamente, que seja “a) Declarado nulo e de nenhum efeito o ato administrativo que consistiu no Despacho do Procurador-Geral da República de 22.11.2011 exarado sob a informação da mesma data e que daquele ato faz parte integrante (…); b) Declarada a inexistência da dívida imputada à Autora e do Crédito de que a Procuradoria-Geral da República alegadamente se considera titular através do ato administrativo que pela presente ação administrativa se impugna; c) Declarada como de nenhum efeito para a verificação da existência da dívida da Autora e do crédito de que a Procuradoria-Geral da República alegadamente se considera titular através do ato administrativo que pela presente ação administrativa se impugna, a certidão donde consta o valor correspondente à quantia recebida pela Autora a título de remunerações no período compreendido entre 13 de julho de 2004 a 23 de janeiro de 2009; d) Ordenada a anulação de todos e quaisquer efeitos que o ato administrativo que pela presente ação administrativa se impugna tenha feito produzir e, nomeadamente, os que decorram do envio de documentação e de cópia daquele ato à Caixa Geral de Aposentações …”.

IX. Presentes os fundamentos e pretensões que se mostram deduzidos nos autos em questão e aquilo que se mostra decidido com trânsito em julgado nos autos de execução sob o n.º 1057-A/09 dúvidas não podem existir quanto a que se formou caso julgado no segmento relativo à impugnação e pretensão invalidatória dirigida contra o ato praticado pelo aqui R. em 22.11.2011 [retificado em 22.03.2012] [als. a) e d) dos pedidos formulados em ambos os processos] e que tal importa, nos autos sub specie e na verificação daquela exceção, a absolvição da instância [cfr. arts. 493.º, 494.º, al. i), 495.º, 497.º, 498.º todos do CPC/2007, atuais arts. 576.º, 577.º, al. i), 578.º, 580.º, 581.º, todos do CPC/2013, ex vi art. 01.º do CPTA].

X. E quanto aquilo que a A./recorrente destaca como segmento pretensivo autónomo relativo à declaração de inexistência da dívida imputada à A. fundada no crédito de que o R. seria titular face à mesma [als. b) e c) dos pedidos formulados] afigura-se-nos ocorrer, igualmente, formação de caso julgado.

XI. Com efeito, como se extrai, desde logo, do teor das alíneas b) e c) da pretensão da A. o mesmo é deduzido sem uma efetiva autonomia quanto ao pedido impugnatório referido na alínea a) já que formulado por referência e numa íntima conexão quanto ao mesmo e onde busca fundamentação.

XII .É que as pretensões de declaração de inexistência de dívida imputada à A. e do correspondente crédito de que se arroga a «PGR» ser titular face à mesma são-no “através do ato administrativo que pela presente ação administrativa se impugna”, ou seja, tais pedidos sobre a inexistência de dívida estão totalmente coligados, conexionados, com os atos administrativos impugnados que integram os documentos identificados.

XIII. Ora, esses atos, esse ato e sua retificação, foram declarados nulos por pronúncia jurisdicional deste mesmo Pleno proferida nos autos de execução sob o n.º 1057-A/09, pronúncia essa transitada em julgado, pelo que, neste momento, não se mostra vigente na ordem jurídica qualquer alegação por parte da Procuradoria-Geral sobre imputação de dívida à A. e verificação de dívida através dos documentos juntos e integrantes dos atos administrativos impugnados, porquanto estes foram julgados nulos, não subsistindo mais, mormente, enquanto lastro onde assentasse a declaração de dívida.

XIV. E era por referência à dívida aí feita constar que se mostram deduzidos os pedidos de declaração de inexistência e de falta de produção de efeitos, pelo que, desaparecendo a sua fonte e base de sustentação, não existirá mais na ordem jurídica, frise-se, qualquer constatação ou declaração de dívida que se imponha ou reclame o seu afastamento por parte da A. através duma nova pronúncia jurisdicional já que afastada está pela decisão judicial supra aludida.

XV. Por isso se entende que o tribunal da execução não tenha sentido necessidade de qualquer explicitação, porquanto ao haver julgado e declarado a nulidade do despacho e sua retificação, nada mais haveria a apreciar nessa vertente já que tudo resulta eliminado.

XVI. Assim, não persiste ou resta qualquer objeto da presente ação que não tenha sido julgado, pelo que ocorre a exceção de caso julgado, porquanto as partes são as mesmas, o pedido é o mesmo, e há identidade de causa de pedir, pois procede do mesmo facto jurídico [cfr. arts. 493.º, 494.º, al. i), 495.º, 497.º, 498.º todos do CPC/2007, atuais arts. 576.º, 577.º, al. i), 578.º, 580.º, 581.º, todos do CPC/2013, ex vi art. 01.º do CPTA].

XVII. Nessa medida e considerando tudo o atrás exposto, procedente que se mostra o ponto prévio fica prejudicado o conhecimento do recurso jurisdicional.



4. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes do Pleno da Secção de Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em:
a) Julgar verificada na ação administrativa especial sub specie a exceção de caso julgado e, consequentemente, absolver o R. da presente instância;
b) Julgar prejudicado o conhecimento do recurso jurisdicional.
Custas a cargo da A..
D.N..


Lisboa, 02 de julho de 2015. – Carlos Luís Medeiros Carvalho (relator) – Alberto Augusto Andrade de Oliveira – Vítor Manuel Gonçalves Gomes – Alberto Acácio de Sá Costa Reis – Jorge Artur Madeira dos Santos – António Bento São Pedro – Teresa Maria Sena Ferreira de Sousa – José Francisco Fonseca da Paz – José Augusto Araújo Veloso – Maria Benedita Malaquias Pires Urbano – Ana Paula Soares Leite Martins Portela – Maria do Céu Dias Rosa das Neves.