Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0423/14
Data do Acordão:07/02/2014
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ANA PAULA LOBO
Descritores:DÍVIDA FISCAL
PRAZO DE PRESCRIÇÃO
INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO
EFEITOS
DEVEDOR ORIGINÁRIO
RESPONSÁVEL SUBSIDIÁRIO
Sumário:I - O disposto no artº 48º, nº 3 da Lei Geral Tributária estabelece apenas uma condição de extensão dos efeitos da interrupção da prescrição da dívida tributária relativamente ao devedor originário ao devedor subsidiário e não um novo e mais curto prazo de prescrição em benefício do responsável subsidiário.
II - Sendo este citado depois do 5º ano posterior ao da liquidação mas antes de completado o prazo de oito anos contabilizados nos termos do disposto no nº 1 do artº 48º da Lei Geral Tributária não se completou, ainda, qualquer prazo de prescrição.
Nº Convencional:JSTA00068824
Nº do Documento:SA2201407020423
Data de Entrada:04/03/2014
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A.....
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF PORTO
Decisão:PROVIDO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT
Legislação Nacional:LGT98 ART48 N1 ART49.
CCIV66 ART326 N1 ART327.
L 53-A/06 DE 2006/12/29
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC0169/07 DE 2008/02/27
Referência a Doutrina:JORGE DE SOUSA - SOBRE A PRESCRIÇÃO DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA NOTAS PRÁTICAS 2ED PAG119.
Aditamento:
Texto Integral: Decisão recorrida – Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto
. 26 de Dezembro de 2013

(Julgou procedente a oposição, por prescrição, e determinou a extinção da reversão contra o oponente)

Acordam nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

A Representante da Fazenda Pública, veio interpor o presente recurso da sentença supra mencionada, proferida no âmbito do Processo de oposição n.° 3663/10.5 BEPRT, tendo, para esse efeito formulado, a final da sua alegação, as seguintes conclusões:

A. A decisão recorrida, concluiu pela verificação da prescrição da dívida exequenda e julgou procedente a oposição, determinando a extinção da reversão contra o oponente:

B. Considerando que o prazo de prescrição das dividas de IVA de 2002 em cobrança coerciva no processo de execução fiscal nº 3387200401005120, no montante de € 8.944,21 se iniciou em 01-01-2003,

C. Entendeu que tendo o revertido sido citado em 15-06-2010, data em que já haviam decorrido cinco anos após as liquidações, não lhe são oponíveis as causas de interrupção da prescrição relativamente à sociedade devedora originária, pelo que “a prescrição ter-se-á de contar ininterruptamente desde do ano civil seguinte àquele em que se verificou o facto tributário – artº 48º nº 1 LGT, 2ª parte.””Ora desde 01/01/2013 até ao presente - 26/12/2013 -, decorreram muito mais 8 anos, pelo que quanto ao oponente as dívidas prescreveram”.

D. Discordamos da interpretação que é dada pela douta sentença ao nº 3 do art.º 48º da LGT.

E. A obrigação tributária constitui-se com a ocorrência do facto tributário, daí que o início do prazo prescricional se reporte ao facto tributário, sendo irrelevante o momento em que se efectiva a liquidação do tributo.

F. No que respeita às dívidas de IVA de 2002, iniciando-se a contagem de prescrição em 01-01-2003, o prazo de oito anos só se completaria em 01-01-2011.

G. O prazo de prescrição, à face da LGT, é de 8 anos, tanto em relação ao devedor originário como ao devedor subsidiário.

H. A citação do revertido deu-se em 15-06-2010, antes de decorridos os 8 anos, evitando que prescrevesse quanto a ele, sem haver necessidade de atender às eventuais causas interruptivas do devedor originário – veja-se neste sentido o acórdão do STA nº 0489/13 de 26-06-2013, disponível em www. dgsi.pt.

I. Ao ter sido o responsável subsidiário, aqui oponente citado em 15-06-2010, os efeitos da interrupção que derivam da sua própria citação produzem os seus efeitos próprios, isto é, em relação a ele e também em relação ao devedor originário, por força da regra do n.º 2 do art. 48º da LGT.

J. No que respeita aos efeitos do decurso do prazo de cinco anos a que se refere o nº 3 do artº 48º da LGT entendeu a meritíssima Juiz a quo que “a interrupção da prescrição relativamente ao devedor principal não produz efeitos relativamente ao oponente se a sua citação como responsável subsidiário for efectuada após o 5º ano da data da liquidação.

K. Salvo o devido respeito, entendemos que a interrupção aí prevista é a relativa ao devedor principal (neste sentido veja-se o Acórdão do STA nº 01069/07 de 27-02-2008).

L. Neste caso, não se aplicará o disposto no art. 48°, n°3 da LGT, acima transcrito, pois não se está a considerar nenhuma causa interruptiva do devedor originário.

M. Como salienta o Cons. Jorge Lopes de Sousa, (Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, 2ª ed., 2010, p. 119.) que mesmo «no caso de a citação do responsável subsidiário ser posterior ao 5° ano, se ele for citado até ao fim do 8° ano a contar do início do prazo de prescrição, os efeitos da interrupção que derivam da sua própria citação produzem-se em relação a ele (e também em relação ao devedor originário, por força da regra do n° 2 do art. 48°).

N. O efeito daquele nº 3 do art. 48° é apenas de tornar irrelevante em relação ao responsável subsidiário as causas de interrupção que se verifiquem em relação ao devedor originário», sendo que esta interpretação é a que melhor se adequa à teleologia global do art. 48º da LGT, permitindo, aliás, a conjugação do estatuído nos seus nºs 2 e 3.

O. Ou seja, não fica afastada a necessidade de aferir se a citação do responsável subsidiário ocorre antes do termo do prazo de prescrição, aferindo esta (prescrição) também em função da causa interruptiva que é a própria citação do responsável subsidiário.

P. E o sentido e alcance deste preceito não podem ser fixados de forma isolada, mas atendendo a outros preceitos do próprio artigo 48º da LGT, em especial, o seu nº 2, que é inequívoco no sentido de que o prazo de prescrição é de 8 anos tanto em relação ao devedor originário como ao responsável subsidiário, sendo que, «a subordinação do efeito das causas interruptivas em relação aos responsáveis subsidiários não é um prazo especial de prescrição em relação ao responsável subsidiário».

Q. Pelo que não se verifica a invocada prescrição.

Requereu que seja revogada a sobredita sentença.

Foi emitido parecer pelo Magistrado do Ministério Público no sentido da procedência do recurso.

Mostram-se provados os seguintes factos com interesse para a decisão da causa:

A). Pelo serviço de finanças do Porto 4 foi instaurado o processo de execução fiscal nº 3387200401005120 e aps. contra “B………, Lda.” para cobrança de dívidas de IVA relativas ao ano de 2002, no montante total de €8.944,21, cf. fls. 55 dos autos.

B). As datas limite de pagamento do IVA relativo ao ano 2002, ocorreram em 31/10/2003, 15/11/2002, 30/06/2004 e 25/11/2004, cf. fls. 66 dos autos.

B). Por despacho de 04/05/2010 foi ordenada a reversão da referida execução contra o aqui Oponente, cf. fls. 63 dos autos.

C). Em 15/06/2010 o Oponente foi citado no processo de execução fiscal a que se reportam os presentes autos, por terceira pessoa, cf. fls. 55 e 64 a 67 dos autos;

D). A sociedade B…….. Lda., faz parte do agrupamento de empresas C………. que foi constituído em 16/02/1987, cf. fls. 20 e 21 dos autos.

E). O aqui Oponente, A…….., é o administrador do grupo C………, que se obrigava com a sua assinatura, cf. fls. 20 e 21 dos autos.

F). A presente oposição deu entrada em 07/09/2010, no serviço de finanças do Porto 4, cf. fls. 5 dos autos.

Questão objecto de recurso:

1- Prescrição da dívida tributária.

Em causa, nestes autos está a cobrança coerciva de dívida de Imposto sobre o valor acrescentado de 2002, cuja data limite de pagamento voluntário ocorreu em 15/11/2002, 31/10/2003, 30/06/2004 e 25/11/2004.
Ordenada a reversão da execução contra o recorrente em 2010, veio este a ser citado para a execução em 15/06/2010.
Em 1 de Janeiro de 1999 entrou em vigor a Lei Geral Tributária - entrado em vigor no dia 1 de Janeiro de 1999 - artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 398/97, de 17 de Dezembro - que no seu artº 48º, nº 1 estabelece que as dívidas tributárias prescrevem no prazo de 8 anos contados, a partir do início civil seguinte àquele em que se verificou, respectivamente a exigibilidade do imposto ou o facto tributar. Deste modo, por estar em causa Imposto sobre o valor acrescentado de 2002 o prazo de prescrição iniciou-se em 1 de Janeiro de 2003.
O prazo de oito anos indicado no artº 48º da Lei Geral Tributária completar-se-ia em 1 de Janeiro de 2011, sendo que o recorrente foi citado para a execução no ano anterior – 15 de Junho de 2010 –
Nos termos do disposto no artº 49º da Lei Geral Tributária a citação interrompe a prescrição, pelo que a citação do recorrente interrompeu o prazo de prescrição o que tem como efeito a inutilização para efeitos de prescrição, de todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do trânsito em julgado da decisão que puser termo ao processo executivo por força da aplicação subsidiária dos artº 326º, nº 1 e 327º do Código Civil.
A equiparação do regime de interrupção da prescrição dos processos tributários ao regime estabelecido no Código Civil só se aplica a partir da revogação do nº 2 do artº 49º da Lei Geral Tributária operada pela L 53-A/2006, de 29 de Dezembro que, na situação em análise não implica qualquer alteração ao prazo de prescrição.
O disposto no nº 3 do artº 49º da Lei Geral Tributária não tem qualquer préstimo para a presente situação.
Nos termos do nº 2 do mesmo artigo as causas de suspensão ou interrupção aproveitam igualmente ao devedor principal e aos responsáveis solidários e subsidiários, sendo certo que, nos termos do nº 3 a interrupção da prescrição relativamente ao devedor principal não produz efeitos quanto ao devedor subsidiário se a citação deste em processo de execução fiscal for efectuada após o 5º ano posterior ao da liquidação.
Contrariamente ao que parece ter sido entendido na decisão recorrida, o disposto no artº 48º, nº 3 da Lei Geral Tributária estabelece apenas uma condição de extensão dos efeitos da interrupção da prescrição da dívida tributária relativamente do devedor originário ao devedor subsidiário e não um novo e mais curto prazo de prescrição em benefício do responsável subsidiário. Sendo este citado depois do 5º ano posterior ao da liquidação mas antes de completado o prazo de oito anos contabilizados nos termos do disposto no nº 1 do artº 48º da Lei Geral Tributária não se completou, ainda, qualquer prazo de prescrição.
Fez, pois a sentença recorrida uma errada interpretação do artº 48º da Lei Geral Tributária, impondo-se a sua revogação.

Deliberação

Termos em que acordam os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e determinar a baixa dos autos ao Tribunal de 1ª instância para que aprecie os demais fundamentos da oposição.

Custas pelo vencido a final.

(Processado e revisto com recurso a meios informáticos (art. 131º nº 5 do Código de Processo Civil, ex vi artº 2º Código de Procedimento e Processo Tributário).

Lisboa, 2 de Julho de 2014. – Ana Paula Lobo (relatora) – Dulce Neto – Ascensão Lopes.