Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0818/16
Data do Acordão:07/07/2016
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:SÃO PEDRO
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
INTERPRETAÇÃO
ACÓRDÃO
TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO
Sumário:Não é de admitir recurso de revista cuja questão essencial se reconduz a uma contradição entre os fundamentos e decisão de um acórdão do TCA, fundada numa interpretação desse acórdão, que aquele Tribunal, sem evidenciar erro manifesto, afirma não ter feito.
Nº Convencional:JSTA000P20797
Nº do Documento:SA1201607070818
Data de Entrada:06/28/2016
Recorrente:ASSOC DE MUNICÍPIOS DO VALE DO SOUSA
Recorrido 1:A......, S.A. E B....., S.A.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Formação de Apreciação Preliminar – art. 150º, 1, do CPTA.
Acordam no Supremo Tribunal Administrativo (art. 150º, 1 do CPTA)

1. Relatório

1.1. A ASSOCIAÇÃO DE MUNICÍPIOS DO VALE DE SOUSA recorreu nos termos do art. 150º, 1, do CPTA, para este Supremo Tribunal Administrativo do acórdão do TCA Norte, proferido em 22-1-2016 que manteve a sentença proferida pelo TAF, a qual por seu turno julgou procedente a ACÇÃO ADMINISTRATIVA COMUM SOB A FORMA ORDINÁRIA e a condenou a pagar às autoras A……….S.A. e B……….SA uma remuneração suplementar pela alteração do destino previsto no contrato para recolha e transporte de resíduos sólidos celebrado entre ambos.
1.2. Justifica a revista por entender que a intervenção do STA é claramente necessária para uma boa aplicação do direito, tanto mais que permitirá evitar que uma entidade pública seja ilegitimamente condenada a pagar um montante que o próprio TCA Norte considera exagerado.

1.3. As recorridas pugnam pela não admissão da revista.

2. Matéria de facto
Os factos dados como provados são os constantes do acórdão recorrido para onde se remete.

3. Matéria de Direito

3.1. O artigo 150.º, n.º 1, do CPTA prevê que das decisões proferidas em 2ª instância pelo Tribunal Central Administrativo possa haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo «quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental» ou «quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito». Como decorre do próprio texto legal e a jurisprudência deste STA, tem repetidamente sublinhado trata-se de um recurso excepcional, como de resto o legislador cuidou de sublinhar na Exposição de Motivos das Propostas de Lei nºs 92/VIII e 93/VIII, considerando-o como uma «válvula de segurança do sistema», que só deve ter lugar, naqueles precisos termos.

3.2. Como decorre do ponto 17 das alegações do recorrente o objecto deste recurso baseia-se nos seguintes fundamentos:

a) As autoras estavam obrigadas a transportar, pelo preço contratual, os RSU para qualquer outro destino que lhes fosse determinado, desde que esse novo destino ficasse situado dentro do perímetro da área geográfica abrangida pelos três concelhos (Felgueiras, Lousada e Paços de Ferreira) e desde que não estivesse localizado a mais de 30 Kms do edifício de cada uma das três Câmaras Municipais.

b) Se o novo destino dos RSU ficasse a mais de 30 kms do edifício de cada uma dessas Câmara Municipais ou se ficasse situado fora da área geográfica abrangida pelos três Municípios, as Autoras teriam direito a receber, pelo preço acordado por Km suplementar, as quantias respeitantes aos Kms que ultrapassassem esses dois limites”.

Perante estes dois fundamentos esperava-se – continua a recorrente – que o TCA concedesse provimento ao recurso, substituindo a sentença recorrida por outra que determinasse “… o pagamento às autoras do Kms do transporte de RSU para os novos destinos que ultrapassassem os 30 kms de distância de cada uma das três Câmaras Municipais ou que fossem para além do limite da área geográfica dos três concelhos.”

Daí que, sendo o número de Kms suplementares por viagem para os novos destinos dos RSU a pagar às autoras segundo o critério do TAF de Penafiel diferente do número de Kms suplementares que, pelo critério do TCA Norte, elas teriam que receber, o TCA Norte não poderia confirmar a decisão.

3.3. O TCA Norte, confrontado com a arguição de nulidade por contradição entre os fundamentos e a decisão, veio a proferir acórdão em 20 de Maio de 2016, negando qualquer contradição, desde logo por não ter divergido totalmente da sentença do TAF de Penafiel, mas apenas num dos seus fundamentos.

Disse, neste acórdão o TCA Norte:
“(…)
De essencial é dito no acórdão deste TCA Norte:

“Do que ficou dito, extrai-se a seguinte conclusão: o preço acordado inicialmente comportava a alteração do destino final dos resíduos sólidos desde que este destino final não esteja situado a mais de 30 kms de qualquer dos edifícios das Câmaras Municipais contempladas pelo acordo, ou seja, dos concelhos de Felgueiras, Lousada e Paços de Ferreira, e que, em qualquer caso não ultrapasse o perímetro territorial destes 3 concelhos.

Entendimento que, de resto, as próprias autoras, ora recorridas, aceitam, como se pode verificar das conclusões f), g), i), j) l) a r) e, sobretudo da conclusão s) das contra-alegações.

No caso concreto nem o aterro da REBAT, situado no concelho de Celorico de Basto, nem o aterro do Rio Mau, em Penafiel, satisfazem estes limites contratuais pelo que a alteração do destino final implica, em qualquer desses casos, a reposição do equilíbrio financeiro, pelo acréscimo de remuneração.

Tal como decidido, neste aspecto fundamental, na decisão recorrida.”

Apenas se divergiu num dos fundamentos: enquanto o Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel sustentou que no acordo inicial, ou seja, sem necessidade de reposição do equilíbrio financeiro, estavam apenas previstas as ligações iniciais e prevista já em projecto, este Tribunal Central Administrativo Norte sustentou que “não teria qualquer sentido útil a referência à distância máxima de 30 kms porque as distâncias a percorrer já eram conhecidas em qualquer dos casos”.

Em todo o caso, a conclusão seria sempre a mesma, de reposição do equilíbrio financeiro, dado que qualquer dos destinos, diferentes dos inicialmente previstos e do que estava em projecto (fundamentos da sentença), estavam também fora do perímetro dos 3 concelhos (fundamento do acórdão).

(…)

Por isto concluiu este Tribunal, no acórdão agora posto em questão, que a sentença recorrida decidiu com acerto, embora divergindo de um dos fundamentos.
Discordando-se de um dos fundamentos, concluindo-se que, apesar disso, a decisão deveria ser a mesma, de parcial procedência da acção.
Poderá existir erro de interpretação e aplicação da lei no caso concreto. O que não existe – de todo - é qualquer nulidade no acórdão ora recorrido.
(…)”.

3.4. Como decorre da transcrição das questões suscitadas pela recorrente e do acórdão do TCA Norte que se pronunciou sobre a contradição entre os fundamentos e a decisão, o que está em causa é a eventual nulidade do acórdão recorrido, fundada na interpretação que dele faz a recorrente.

Considera a recorrente que o TCA Norte – em suma – entendeu que só havia direito a remuneração complementar por cada quilómetro que excedesse os 30 Kms constantes do contrato inicial.

Todavia o TCA Norte, ao pronunciar-se sobre a alegada contradição, não admitiu ter decidido nesses termos.
Portanto, a questão ora em causa diz respeito – no essencial – à interpretação do acórdão do TCA, num aspecto de tal modo específico e particular que não tem qualquer hipótese de se colocar em outros casos.

Não existe, por outro lado, qualquer questão jurídica subjacente ao presente litígio que justifique a intervenção do STA com vista a uma melhor interpretação do direito, desde logo, porque o que verdadeiramente está em causa é a interpretação de um acórdão, contra o entendimento que dele é feito pelos seus subscritores.

A interpretação que o TCA faz do seu acórdão não evidencia erro manifesto ou grosseiro.

Daí que não se verifiquem os pressupostos da admissão da revista excepcional.

4. Decisão

Face ao exposto não se admite a revista.

Custas pela recorrente.
Lisboa, 7 de Julho de 2016. – São Pedro (relator) – Vítor Gomes – Alberto Augusto Oliveira.