Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0454/11
Data do Acordão:05/25/2011
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:DULCE NETO
Descritores:EXECUÇÃO FISCAL
VENDA
DEPÓSITO DO PREÇO
NULIDADE PROCESSUAL
Sumário:Na venda em processo de execução fiscal a aceitação da proposta mais vantajosa que foi apresentada para a aquisição do bem penhorado depende do pagamento de, pelo menos, 1/3 do preço no acto de abertura e aceitação das propostas, em harmonia com o disposto na alínea e) do art. 256.° do Código de Procedimento e de Processo Tributário (na redacção anterior à Lei n.º 55-A/2010, de 31.12), implicando a falta de cumprimento dessa obrigação a aceitação da proposta de valor imediatamente inferior ou a determinação de que os bens voltem a ser vendidos, em conformidade com o disposto no n.º 3 do artigo 898.º do Código de Processo Civil.
Nº Convencional:JSTA00066994
Nº do Documento:SA2201105250454
Data de Entrada:05/05/2011
Recorrente:A...
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL.
Objecto:SENT TAF BRAGA PER SALTUM.
Decisão:PROVIDO.
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC FISCAL.
Legislação Nacional:CPC96 ART201 ART895 ART898 N3 ART909.
CPPTRIB99 ART253 ART256 E.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC740/08 DE 2008/09/24.; AC STA PROC1107/08 DE 2009/06/25.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
1. A…, com os demais sinais dos autos, recorre para o Supremo Tribunal Administrativo da decisão proferida pelo TAF de Braga que julgou improcedente a reclamação que apresentou na execução fiscal n.º 15/1993, instaurada no Serviço de Finanças de Valença contra B… e C…, tendo por objecto a decisão proferida em 20.12.2010 pelo Chefe do Serviço de Finanças, de indeferimento do protesto que apresentou no acto de abertura e aceitação de propostas em carta fechada para aquisição do imóvel penhorado, protesto com o qual pretendia que não fosse aceite a proposta apresentada por D… em virtude de este não estar presente no acto e não poder, assim, depositar imediatamente 1/3 do preço oferecido.
Terminou a sua alegação enunciando as seguintes conclusões:
1.ª O presente recurso vem interposto da douta sentença do TAF de Braga, de “10.3.2010” que indeferiu a pretensão do requerente, sendo que a mesma versa exclusivamente matéria de direito.
2.ª A reclamação por si deduzida e submetida à decisão do TAF de Braga sustentava-se nos fundamentos de facto e de direito dela constantes e que, aqui, por economia processual, se dão por reproduzidos (Doc.1).
3.ª A Douta decisão ora posta em crise viola a alínea e) do artº 256.º do CPPT uma vez que o acto do Sr. Chefe de Finanças que era posto em crise violava a lei [alínea e) do art.º 256.° do CPPT] e, por isso, enfermava de nulidade nos termos dos arts 201.º n.º 1 e 909.º, n.º 1, alínea c) do CPC.
4.ª Dispunha, à data, o artº 256.º, alínea e) do CPPT (note-se que actualmente se encontra cirurgicamente alterado) “A venda obedece ainda aos seguintes requisitos: e) O funcionário ... passará guias para o adquirente depositar a totalidade do preço, ou parte deste, não inferior a um terço..”, pelo que é evidente a violação pela decisão posta em crise do citado preceito normativo.
5.ª Jorge Lopes de Sousa, in CPPT, 5.ª edição, Vol II, pag. 573, em anotação a este artigo refere “Como resulta do preceituado nas alíneas e) e f) deste artigo, no processo de execução fiscal, o adquirente tem depositar pelo menos um terço do preço no acto de abertura das propostas...”.
6.ª Resulta óbvio e claro da norma legal citada que o proponente terá que depositar um terço da totalidade do preço.
7.ª Não terá sido por mero acaso que o legislador procedeu à alteração da citada norma na lei do OE/2011.
8.ª Sendo certo que o proponente tem que depositar no acto, pelo menos, um terço do preço, o não cumprimento desta obrigação só pode ter como consequência a não produção de efeitos do acto.
9.ª A existência de nulidade processual, susceptível de afectar o acto da venda, constitui uma causa de nulidade desta, nos termos do nº. 1 do artº 201.º e alínea c) do n.º 1 do artº 909.º do CPC.
10.ª Como muito bem decidiu o STA no Douto Acórdão proferido no Proc. n° 0740/08 “Na venda em processo de execução fiscal, se é certo que a transmissão se opera com a aceitação da proposta, também é verdade que a mesma só se concretiza com o depósito imediato da totalidade do preço ou, pela menos de um terço dessa totalidade” e “Quer isto dizer que, para nós, a transmissão do propriedade, na execução fiscal, comporta sempre um elemento - a aceitação do proposto pelo proponente - mas complementada necessariamente com a entrega imediata de pelo menos um terço da valor da totalidade do preço” e, ainda “A não se entender assim, o comprador (então proponente) ficava, em processo de execução fiscal, numa situação claramente privilegiada, não se compaginando uma tal interpretação com os legítimos interesses da Fazenda Nacional”.
11.ª No mesmo sentido o acórdão do STA - Proc. n.º 01107/08 “Da conjugação de todos estes preceitos legais, somos levados a concluir que deve entender-se que, na venda em processo de execução fiscal, se é certo que a proponente tem que depositar um terço do preço, o não cumprimento desta obrigação só pode ter coma consequência a não produção de efeitos da venda, a aceitação da proposta de valor imediatamente inferior ou a determinação de que os bens voltem a ser vendidos mediante novas propostas em carte fechada um por negociação particular”.
12.ª Contrariamente à Lei e à jurisprudência do STA, decidiu o Tribunal recorrido que “Caso seja a melhor proposta, e não estando presente o proponente, nada impede que o bem a vender lhe seja adjudicado, por isso será lhe dado o prazo de 15 dias para depositar a totalidade do preço, ou parte dele, em cumprimento do disposto na alíneas e) do artº 256.° do CPPT”, razão pela qual deverá ser revogada a Douta Decisão posta em crise.
Pelo exposto, e com o Mui Douto suprimento de V. Ex.ªs deverá ser julgado procedente o presente recurso e em consequência ser revogado o acto posto em crise.
1.2. Não foram apresentadas contra-alegações.
1.3. O Exmo. Procurador-Geral-Adjunto emitiu douto parecer no sentido de que devia ser concedido provimento ao recurso e revogada a decisão recorrida, por entender, em suma, que:
«(...) a redacção do art.º 256° do Código de Procedimento e Processo Tributário (então em vigor) não permite a interpretação que lhe é dada pela sentença recorrida. É que a parte final daquele normativo pressupõe que se tenha efectuado o pagamento imediato referido na parte inicial da norma, sendo que a falta de tal depósito não permitirá que seja feito uso da notificação prevista na parte final da respectiva al. e).
Também o Cons. Jorge Lopes de Sousa sublinha no seu Código de Procedimento e Processo Tributário, anotado, 5ª edição, II vol. pag. 573, que do preceituado nas al. e) e f) daquele normativo resulta que «no processo de execução fiscal o adquirente tem de depositar pelo menos2 um terço do preço no acto de abertura das propostas, em operações de tesouraria, à ordem do órgão de execução fiscal».
Verifica-se, pois, a irregularidade processual denunciada.
Mas será que afecta o valor do acto?
Resulta do disposto nos arts. 257°, n° 1, al. c) do CPPT, 909º e 201° do CPC que pode ser requerida a anulação da venda se tiver ocorrido relativamente ao acto de venda ou aos actos preparatórios a ela respeitantes qualquer omissão de acto ou formalidade prescrita na lei, desde que a irregularidade possa ter influência na venda (nºs. 1 e 2 do último normativo referido).
A regra do artº 201º, n° 1 do Código de Processo Civil é a de que se a lei não prescrever expressamente que ele tem como consequência a invalidade do acto, o vício do acto processual só deve produzir nulidade quando dele resulte prejuízo para a relação jurídica contenciosa.
Ora não há dúvida que a irregularidade processual em causa pode ter influência na venda, na medida em que a falta de depósito daquela 1ª prestação faz incorrer o proponente, por imperativo da al. e) do art.º 256°, nas sanções cominadas no art.º 898° do Código de Processo Civil. E essas consequências podem ser a não produção de efeitos da venda, a aceitação da proposta de valor imediatamente inferior ou a determinação que os bens voltem a ser vendidos mediante novas propostas em carta fechada ou por negociação particular.
Termos em que somos de parecer que se verifica irregularidade com influência na decisão do processo, pelo que o recurso merece provimento, devendo ser revogada a sentença recorrida.».
1.4. Com dispensa dos vistos dos Exmºs Juízes Conselheiros Adjuntos, atenta a natureza urgente do processo, cumpre decidir as questões colocadas.
2. Na sentença recorrida deu-se como assente a seguinte matéria de facto:
1. Por despacho de 20.10.2010, do Chefe de Finanças de Valença, foi indeferida a reclamação do ora reclamante, conforme documento de fls. 37 dos autos que aqui se dá por integralmente reproduzido para os efeitos legais;
2. No âmbito do processo de execução fiscal n.º 15/1993, foi anunciada a venda, através de editais, do artº 1558°, fracção EZ, descrita na Conservatória do Registo predial com o n.º 97/19980420 EZ (fls. 2 dos autos);
3. Em 15.12.2010, foram abertas as propostas, no Serviço de Finanças de Valença, na qual estava presente E…, em representação do ora reclamante, e F… (fls. 36 dos autos);
4. Foram apresentadas propostas por A…, G…, D…, e por H…;
5. A proposta mais vantajosa foi a proposta submetida pela Internet pelo contribuinte n.º ... D…, o qual não se encontrava presente no acto de abertura das propostas;
6. O Reclamante, através da sua representante, apresentou, no acto, reclamação pondo em causa a aceitação da proposta vencedora dado que não estando presente o proponente, um dos pressupostos constante no edital é de que no acto da aceitação das propostas tem que obrigatoriamente ser depositado no mínimo 1/3 no acto da aceitação (fls. 36 dos autos);
7. A reclamação foi apreciada, pelo Chefe de Serviços de Valença, em 20.12.2010, na qual considerou que "(...) As normas constantes da 1.8 parte da alínea e) do art.° 256.° do CPPT só podem ser entendidas no caso de o proponente se encontrar presente. Não estando presente será notificado para, no prazo de 15 dias, efectuar o pagamento da totalidade do preço nos termos da 2.° parte do referido preceito. Sendo certo que a venda só se concretiza com o depósito da totalidade do preço e dos impostos incidentes sobre o acto. Inexistindo assim qualquer nulidade nos termos do art.° 201.° e 909.° do CPC.(...)” - fls. 37 dos autos que se aqui se dá por integralmente reproduzido para os efeitos legais;
8. O presente acto foi notificado ao Reclamante, através da mandatária, em 23.12.2010 (fls. 38 e 39 dos autos);
9. A fracção EZ, descrita na Conservatória do Registo Predial com o n.º 97/19980420 EZ ainda não foi vendida;
10. A presente reclamação foi interposta em 27.12.2010.
3. As questões em análise no presente recurso são as de saber se a aceitação da proposta mais vantajosa para venda do bem penhorado em processo de execução fiscal depende de o respectivo proponente estar presente no acto de abertura e aceitação das propostas para que possa proceder ao depósito imediato de uma quantia não inferior a 1/3 da totalidade do preço oferecido, e a de saber quais as consequências da falta desse depósito imediato.
Na execução fiscal aqui em causa o Chefe do Serviço de Finanças procedeu à abertura das cinco propostas apresentadas para a aquisição do imóvel penhorado, tendo concluído que a mais vantajosa era a que fora submetida via internet por D…, secundada pela proposta de A…. Segundo consta da respectiva acta, a fls. 36, «pela representante do proponente A… foi apresentada reclamação pondo em causa a aceitação da proposta vencedora dado que não estando presente o citado proponente, um dos pressupostos constante no edital é de que no acto da aceitação das propostas tem que obrigatoriamente ser depositado o mínimo de 1/3 do preço. Como o proponente não está presente não dá cumprimento aos normativos legais e anunciados, violando assim o acto de aceitação da proposta as normas constantes do CPPT. Pelo Chefe do Serviço de Finanças foi dito que remete a decisão para posterior momento, a qual será notificada ao reclamante.».
Posteriormente, em 20.12.2010, o Chefe do Serviço de Finanças indeferiu esse protesto/ reclamação, com a seguinte argumentação (fls. 37): «No acto da abertura e apreciação das propostas, apenas se encontrava presente a representante legal do proponente A…, com procuração nos autos. Por esta, nos termos do art.° 895.° do CPC, foi deduzida reclamação quanto à aceitação da proposta, cujos fundamentos foram exarados em acta a fls. (...) Alega, em síntese, que consta do edital publicitativo da venda a obrigatoriedade de depósito no acto de, pelo menos 1/3 do valor oferecido, pelo que, não estando presente o proponente e não cumprindo, por isso, o que se refere, não deverá ser aceite a proposta deste, mas sim a do seu representado.
Sem razão como se verá.
As normas constantes da 1ª parte da alínea e) do art. 256.° do CPPT só podem ser entendidas no caso de o proponente se encontrar presente. Não estando presente será notificado para, no prazo de 15 dias, efectuar o pagamento da totalidade do preço nos termos da 2ª parte do referido preceito. Sendo certo que a venda só se concretiza com o depósito da totalidade do preço e dos impostos incidentes sobre o acto.
Inexistindo assim qualquer nulidade nos termos do art.° 201.º e 909.º do CPC.
Mas mesmo que existisse nunca teria como consequência a aceitação da proposta do A…, antes se impondo a marcação de nova venda, nos termos do art.° 898.° n°. 3 do CPC. (...)
Nestes termos indefere-se a reclamação apresentada e, consequentemente, mantém-se a decisão de aceitação da proposta do D….».
Desta decisão, que manteve o acto de aceitação da proposta apresentada via internet, foi interposta reclamação para Tribunal, tendo o Representante da Fazenda Pública informado que em face da dedução desta reclamação o proponente vencedor não chegou a ser notificado para depositar a totalidade do preço, pelo que a venda ainda não se concretizou (cfr. fls. 64).
Segundo o Reclamante, a decisão deve ser anulada porquanto a aceitação da proposta mais vantajosa sem o pagamento de, pelo menos, 1/3 do preço, viola o disposto na alínea e) do artigo 256.º do CPPT, devendo ser aceite a proposta por si apresentada ou, em alternativa, determinada nova venda. Terminou pedindo que fosse «dado provimento à presente reclamação e, consequentemente, ser aceite a proposta do reclamante ou que o bem volte a ser colocado à venda (n.º 3 do art.º 898.º do CPC.)».
A decisão recorrida julgou improcedente a reclamação, argumentando que «(...)Da conjugação do art.º 253.° e art.° 256.° do CPPT, não resulta a obrigatoriedade dos proponentes estarem presentes no acto de aberturas de propostas. Embora os editais refiram que no acto da venda deverá ser depositado a importância de 1/3 do valor, não se pode concluir que a presença é obrigatória. Na modalidade da venda por propostas em carta fechada, quem apresenta propostas de aquisição de bem penhorado não está obrigado a comparecer no acto de abertura das mesmas para que a sua proposta seja considerada. Caso seja a melhor proposta, e não estando presente o proponente, nada impede que o bem a vender lhe seja adjudicado, para isso será lhe dado, no prazo de 15 dias, para depositar a totalidade do preço, ou parte dele em cumprimento do disposto no alínea e) do art.° 256.° do CPPT.(...)».
Discordando do assim decidido, vem o Recorrente sustentar que a sentença incorreu em erro de julgamento por errada interpretação do artigo 256.º, alínea e), do CPPT.
Vejamos.
Esta Secção do Supremo Tribunal Administrativo pronunciou-se já várias vezes sobre a interpretação do artigo 256.º, alínea e), do CPPT, na redacção anterior à Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro (Orçamento de Estado para 2011), designadamente nos acórdãos proferidos em 24.09.2008 e em 25.06.2009, nos Proc. n.º 0740/08 e n.º 1107/08, respectivamente, no sentido de que ela obriga ao depósito imediato da totalidade do preço pelo proponente vencedor, ou, pelo menos, de uma parte deste, não inferior a um terço, sob pena de a venda não poder produzir efeitos e ter de ser aceite a proposta de valor imediatamente inferior ou ter de ser determinado que os bens voltem a ser vendidos mediante novas propostas em carta fechada ou por negociação particular.
Não descortinamos razões para divergir desse entendimento, pelo que seguiremos de perto a motivação jurídica do acórdão de 25.06.2009, onde ficou escrito o seguinte:
«A norma que aqui está em causa é a do artº 256º, al. e) do CPPT que dispõe que “o funcionário competente passará guia para o adquirente depositar a totalidade do preço, ou parte deste, não inferior a um terço, em operações de tesouraria, à ordem do órgão de execução fiscal, e, não sendo feito todo o depósito, a parte restante será depositada no prazo de 15 dias, sob pena das sanções previstas no processo civil”.
Em anotação a este artigo, escreve Jorge Sousa, in CPPT, 5ª ed., vol. II, pág. 573, que, “como resulta do preceituado nas alíneas e) e f) deste artigo, no processo de execução fiscal o adquirente tem de depositar pelo menos um terço do preço no acto de abertura das propostas, em operações de tesouraria, à ordem do órgão de execução fiscal, e, não sendo feito todo o depósito, a parte restante será depositada no prazo de 15 dias, que pode ser prorrogado pelo órgão de execução fiscal até seis meses…, sob pena das sanções previstas na lei processual civil”.
Daqui resulta que, no acto de abertura das propostas, o adquirente terá que depositar, pelo menos, uma quantia não inferior a um terço da totalidade do preço.
Já vimos, que tal não aconteceu, uma vez que aquele esteve ausente nesse momento.
Quais as consequências?
Na execução comum, o problema está resolvido, uma vez que o proponente/adquirente deve necessariamente juntar à proposta, como caução, cheque visado ou garantia bancária, correspondente a 20% desse valor, sem o que a sua proposta não será admitida - artº 897º, nº 1 do CPC.
Isto não é assim, já o vimos, no processo de execução fiscal, já que o adquirente é obrigado a depositar pelo menos um terço do preço no acto de abertura das propostas.
Estabelece o artº 898º, nº 3 do CPC, que “ouvidos os interessados na venda, o agente da execução pode, porém, determinar, no caso previsto no n.º 1, que a venda fique sem efeito, aceitando a proposta de valor imediatamente inferior ou determinando que os bens voltem a ser vendidos mediante novas propostas em carta fechada ou por negociação particular, não sendo o proponente ou preferente remisso admitido a adquiri-los novamente e perdendo o valor da caução constituída nos termos do n.º 1 do artigo 897.º”.
Da conjugação de todos estes preceitos legais, somos levados a concluir que deve entender-se que, na venda em processo de execução fiscal, se é certo que o proponente tem que depositar um terço do valor do preço, o não cumprimento desta obrigação só pode ter como consequência a não produção de efeitos da venda, a aceitação de proposta de valor imediatamente inferior ou a determinação que os bens voltem a ser vendidos mediante novas propostas em carta fechada ou por negociação particular.
Contudo, não foi isto que aconteceu no caso em apreço.
Já vimos que o proponente, que apresentou a sua proposta, não depositou no acto qualquer importância. Não obstante, a administração tributária notificou aquele para fazer o depósito da totalidade do preço, no prazo de 15 dias, o que veio realmente a acontecer e em consequência do que lhe adjudicou o imóvel penhorado.
Por isso e na sequência da falta de pagamento do preço da venda, a omissão dos actos referidos no predito artº 898º, nº 3, podendo ter influência na decisão do processo, não pode deixar de considerar-se nulidade processual (cfr. artº 201º, nº 1 do CPC), que afecta os actos que deles dependem, designadamente os relativos á venda.
A existência de uma nulidade processual susceptível de afectar o acto da venda, constitui uma causa de nulidade desta, nos termos do referido nº 1 do artº 201º e da al. c) do nº 1 do artº 909º do CPC, aplicáveis por força do disposto na al. c) do nº 1 do artº 257º do CPPT.
Assim, têm de ser anulados todos os actos posteriores ao despacho que ordenou a venda por propostas em carta fechada, relativos ao acto da venda. A não se entender assim, o comprador/proponente ficava, no processo de execução fiscal, em situação claramente privilegiada, não se compaginando tal interpretação com os legítimos interesses da Fazenda Pública.».
É este entendimento que ora se reitera.
Neste contexto, e visto que a venda judicial não chegou a ser efectuada, não tendo sido, sequer, notificado o proponente D… para proceder ao depósito do preço, bastará anular a decisão reclamada com fundamento na sua ilegalidade por ofensa da norma contida no artigo 256.º, alínea d), do CPPT, ou preterição de formalidade prescrita na lei, não sendo necessário anular quaisquer actos posteriores ou recorrer ao regime contido no artigo 201.º do CPC.
Da anulação do acto reclamado resulta o dever, para o órgão da execução, de proferir novo despacho, de deferimento do protesto/reclamação formulado pelo proponente A…, com a consequente obrigação de cumprimento do disposto no n.º 3 do artigo 898.º do CPC, aceitando a proposta por este apresentada (por ser a de valor imediatamente inferior) ou determinando que os bens voltem a ser vendidos.
4. Nestes termos, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e julgar totalmente procedente a reclamação, com a consequente anulação do acto reclamado.
Sem custas.
Lisboa, 25 de Maio de 2011. – Dulce Neto (relatora) – Valente TorrãoAntónio Calhau.