Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01292/15
Data do Acordão:09/19/2018
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:PEDRO DELGADO
Descritores:CUSTAS
BASE DE INCIDÊNCIA
TRIBUTÁVEL
VALOR DA CAUSA
Sumário:I - A alínea e) do artº 12º, nº 1 do Regulamento das Custas Processuais prevê a impossibilidade de determinação do valor da causa, e estatui que se atende ao valor indicado na linha 1 da tabela 1-B, sem prejuízo de posteriores acertos, quando o juiz vier a fixar definitivamente o valor.
II - Por outro lado a alínea f) do n.° 1 do mesmo normativo refere-se a processos cujo valor é fixado pelo juiz da causa com recurso a critérios indeterminados e não esteja indicado um valor fixo, e estatui que se atende ao valor indicado na linha 1 da tabela 1-B, sem prejuízo de posteriores acertos quando for definitivamente fixado o valor.
III - Tendo a autora indicado o valor da causa (€30.000,01) será esse o valor a considerar como base tributável para efeitos de Taxa de Justiça de acordo com a linha 6 da tabela I – (nível normal) anexa ao Regulamento das Custas Processuais (artº 11º do Regulamento das Custas Processuais), não sendo aplicáveis as normas específicas constantes das als. e) e f) do art.12° n°1 do Regulamento das Custas Processuais.
Nº Convencional:JSTA000P23599
Nº do Documento:SA22018091901292
Data de Entrada:10/09/2015
Recorrente:A... SA
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1 – A…………., SA, melhor identificada nos autos, vem recorrer para este Supremo Tribunal, da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto proferida em 06/01/2015, fls. 117 dos autos que, aplicou ao processo de intimação para comportamento, para efeitos de custas, a tabela I-A do regulamento das custas processuais e determinou o pagamento de um remanescente no valor de seis unidades de conta.
Termina as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:
«i. É entendimento do Tribunal a quo que é aplicável à intimação para comportamento a tabela I- A do Regulamento das Custas Processuais, enquanto a Recorrente entende, outrossim, que é aplicável a tabela I-B do mesmo regulamento.
ii. É esse, também, o entendimento do Centro de Estudos Judiciários: “No caso da intimação para um comportamento, o valor da taxa de justiça é o previsto na Linha 1 da Tabela I-B no valor de 0,5 UC; nos termos das disposições das alíneas e) e f) do artigo 12.º do RCP, n.º 2 do artigo 97.º-A e artigo 147.º do CPPT, sendo a taxa paga numa única prestação” (O referido entendimento encontra-se disponível, na integra em:

iii. Ao invés do decidido pelo Tribunal a quo, a Recorrente entendeu, de facto, que estava em causa um valor indeterminável - e daí que tenha optado pelo critério supletivo previsto no artigo 34º n.º 2 do CPTA ou seja valor superior ao da alçada do Tribunal Central Administrativo.
iv. Estando em causa o direito a decisão administrativa expressa, afigura-se que esse direito constitui um bem imaterial, de valor indeterminável — pelo que decidiu a Recorrente aplicar o sobredito critério supletivo fixado no artigo 34.º do CPTA, atribuindo ao processo o valor definido para acções de valor indeterminado - de € 30.000,01
v. Ao assim não decidir incorreu o Tribunal a quo em, erro de julgamento da matéria de direito — mormente por errada interpretação e aplicação do disposto nos artigos 12.º RCP e 34.º do CPTA — a implicar a anulação do despacho recorrido.
vi. De resto, a Intimante optou pela abordagem mais cautelosa, tendo em consideração que, no entendimento da nossa Doutrina, a intimação para comportamento não está sequer sujeita custas. (Cfr. Salvador da Costa, Regulamento das Custas Processuais Anotado e comentado, almedina, 2011, p.210).»

2 – Não foram apresentadas contra alegações.

3 – O Exmº Procurador-Geral Adjunto veio apresentar parecer a fls. 247 e seguintes, com o seguinte teor:
«Objecto do recurso: decisão sobre matéria de custas proferida em 6 janeiro 2015 (fls.115 do processo de intimação para comportamento)
FUNDAMENTAÇÃO
1. A toda a causa é atribuído um valor certo, expresso em moeda legal, o qual representa a utilidade económica imediata do pedido; para o efeito das custas e demais encargos legais, o valor da causa é fixado segundo as regras estabelecidas na legislação respectiva (art.34° nºs 1 e 3 CPTA).
A recorrente aplicou o critério supletivo legal na indicação do valor da causa, na consideração de que, respeitando o objecto do processo a bens imateriais (intimação da Autoridade Tributária e Aduaneira para um comportamento), aquele valor deveria corresponder à alçada do TCA mais € 0,01 (art.34° nºs 21 e 2 CPTA; art.303° n°1 CPC vigente)
2. Salvo melhor apreciação, são inaplicáveis:
a) a norma específica constante do art. 12° n°1 al. e) RCP, na medida em que a sua previsão apenas abrange situações de manifesta impossibilidade de determinação inicial do valor da causa;
b) a norma específica constante do art.12° n°1 al. f). RCP, face à existência de critério supletivo legal que determina a valor da causa (art.34° n°2 CPTA; €30 000,01)
No sentido propugnado Salvador da Costa Regulamento das Custas Processuais anotado 2013 5ª edição pp.243/245)
Neste contexto não merece censura a decisão que fixou o valor da causa em €30 0000.01 e a taxa de justiça em 6 UC (Tabela 1 — A linha 6 anexa ao RCP) despacho fls. 108.
CONCLUSÃO
O recurso não merece provimento.
A decisão impugnada deve ser confirmada»

4 - Colhidos os vistos legais, cabe decidir.

5 – A decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal proferida a fls. 117, tem o seguinte teor:
«A fls. 113 e 114 do processo físico, veio a autora solicitar a reponderação” do despacho que antecede, nos termos do qual foi a mesma convidada a pagar o remanescente da taxa de justiça legalmente devida, correspondente a 6 UC, sob pena de desentranhamento da p.i.. Invoca, para o efeito, o entendimento do Centro de Estudos Judiciários, expresso em documento que junta, no sentido de que no caso da intimação para um comportamento, o valor da taxa de justiça é o previsto na Linha 1 da Tabela -A, no valor de 0,5 UC, nos termos das disposições das alíneas e) e f) do artigo 12.° do RCP, n.º 2 do artigo 97°-A e artigo 147.º do CPPT, sendo a taxa paga numa única prestação.”
Vejamos.
As alíneas e) e f) do n.º 1 do artigo 12.º do Regulamento das Custas Processuais reportam-se, respectivamente, aos casos de impossibilidade de determinação do valor da causa e de fixação pelo juiz desse mesmo valor por não-estar indicado: um - valor fixo.
Ora, dado que a autora indica um valor para a causa (€30.000,01), é manifesto que não estamos perante nenhuma das situações referidas, pelo que não aplicável o disposto naquelas alíneas. Aliás, diga-se que a própria autora efectuou o pagamento da taxa de justiça pela linha 6 da Tabela I-B, e não pela linha 1 que agora invoca:
Na falta de disposição especial para o efeito, é, antes, aplicável a Tabela I-A do Regulamento das Custas Processuais bem como a linha correspondente ao valor da causa indicado pela autora.
Assim, notifique a autora para vir aos autos, no prazo de dez dias, dar cumprimento ao determinado no despacho que antecede, sob pena de desentranhamento da p.i.»

6. Do objecto do recurso

6.1 Questão a decidir:
Reconduz-se a saber se padece de erro de julgamento o despacho interlocutório proferido em matéria de custas a fls. 117 dos autos, que julgou pela aplicação ao processo de intimação para comportamento, para efeito de custas, da Tabela I- A do Regulamento das Custas Processuais, e que, por via disso, determinou o pagamento de um remanescente no valor de seis unidades de conta, sob cominação de desentranhamento da petição inicial.

O recurso foi admitido na sequência de reclamação deduzida ao abrigo do artº 643º, nº 3 do Código de Processo Civil e por despacho do relator exarado a fls. 232/240, por se considerar que o despacho em causa face, até, à cominação nele substanciada e concretizada, não pode caracterizar-se como despacho de mero expediente mas sim como despacho que afecta os deveres ou interesses das partes e que inequivocamente pode interferir no resultado da lide, sendo recorrível nos termos do art. 285.º nº 2 do CPPT, por a sua não subida imediata comprometer o efeito útil do recurso.

Como resulta do despacho sindicado o tribunal a quo julgou ser aplicável ao processo de intimação para comportamento, para efeito de custas, a Tabela I-A, anexa ao Regulamento das Custas Processuais, por considerar que autora indicou um valor para a causa (€30.000,01), não se verificando nenhuma das situações em que são aplicáveis as alíneas e) e f) do n.º 1 do artigo 12.º do referido Regulamento, as quais se reportam, respectivamente, aos casos de impossibilidade de determinação do valor da causa e de fixação pelo juiz desse mesmo valor por não estar indicado um valor fixo.

Não conformada com tal entendimento a recorrente sustenta que devia ter sido aplicada a tabela I-B do mesmo regulamento porquanto, em sua tese, no caso de intimação para um comportamento, o valor da taxa de justiça é o previsto na linha 1 da Tabela I-B, no valor de 0,5 UC, nos termos das alíneas e) e f) do artº 12º do RCP, n.º 2 do artigo 97.º-A e artigo 147.º do CPPT, disposições aplicáveis às intimações para comportamento de valor indeterminável ou nos casos em que o valor venha a ser fixado pelo juiz caso o intimante não o faça.
Mais alega que «estava em causa um valor indeterminável - e daí que tenha optado pelo critério supletivo previsto no artigo 34º n.º 2 do CPTA ou seja valor superior ao da alçada do Tribunal Central Administrativo».

6.2 Apreciando
De harmonia com o disposto no artº 11º do RCP a base tributável para efeitos de taxa de justiça corresponde ao valor da causa, com os acertos constantes da tabela I, e fixa-se de acordo com as regras previstas na lei do processo respectivo.
No que concerne à fixação do valor em casos especiais dispõe o artº 12º do RCP o seguinte:
«1 - Atende-se ao valor indicado na l. 1 da tabela i-B nos seguintes processos:
a) Nos processos relativos à impugnação judicial da decisão sobre a concessão do apoio judiciário;
b) Nas intimações para prestação de informação, consulta de processos ou passagem de certidões;
c) Nos processos de contencioso das instituições de segurança social ou de previdência social e dos organismos sindicais, nos processos para convocação de assembleia geral ou de órgão equivalente, nos processos para declaração de invalidade das respectivas deliberações e nas reclamações de decisões disciplinares;
d) Nos recursos dos actos de conservadores, notários e outros funcionários;
e) Sempre que for impossível determinar o valor da causa, sem prejuízo de posteriores acertos se o juiz vier a fixar um valor certo;
f) Nos processos cujo valor é fixado pelo juiz da causa com recurso a critérios indeterminados e não esteja indicado um valor fixo, sem prejuízo de posteriores acertos quando for definitivamente fixado o valor.
2 - Nos recursos, o valor é o da sucumbência quando esta for determinável, devendo o recorrente indicar o respectivo valor no requerimento de interposição do recurso; nos restantes casos, prevalece o valor da acção.»

Pretende a recorrente que serão aplicáveis ao caso subjudice as alíneas e) e f) do artº 12º do RCP, disposições que entende aplicáveis às intimações para comportamento de valor indeterminável ou nos casos em que o valor venha a ser fixado pelo juiz caso o intimante não o faça.
Carece, porém, de razão legal.

A alínea e) do artº 12º, nº 1 do Regulamento das Custas Processuais prevê a impossibilidade de determinação do valor da causa, e estatui que se atende ao valor indicado na linha 1 da tabela 1-B, sem prejuízo de posteriores acertos, quando o juiz vier a fixar definitivamente o valor.
Entendemos, tal como esclarece Salvador da Costa no seu Regulamento das Custas Processuais anotado (5ª edição, Almedina, pags. 243/244) a propósito daquela al. e), que se trata «de um normativo residual geral de determinação do valor da causa, em que é manifesta a impossibilidade de o determinar oportunamente, ou seja, de modo a poder realizar-se o prévio pagamento da taxa de justiça».
De facto, como refere aquele autor, «o juiz tem obrigatoriamente de fixar o valor da causa lato sensu para efeitos processuais, (…) e o sistema contém, em regra, mecanismos tendentes à sua fixação em qualquer das espécies processuais, designadamente por referência ao valor da alçada da Relação, como é o caso, por exemplo, das ações de estado e das do foro administrativo relativas a bens imateriais e a normas emitidas, apesar de a lei considerar as últimas de valor indeterminável.
Há porém, algumas espécies processuais em que, pela sua estrutura, não é inicialmente possível determinar o valor definitivo da causa, por exemplo, nos casos das ações de liquidação ou similares. Mas, nesses casos, as partes fixam-lhe um valor provável, com base no qual, provisoriamente, se procede à liquidação e ao pagamento da correspondente taxa de justiça. Isso significa que o normativo em análise se configura assaz residual e de âmbito muito limitado. É configurável, porventura, a sua aplicação às ações do foro laboral cuja causa de pedir seja a invalidade do termo aposto ao contrato de trabalho a prazo e o pedido seja concernente à reintegração do autor, e nas ações especiais por acidente de trabalho, no caso de o acidentado e a seguradora, ou o empregador, conforme os casos, terem aceitado, na fase conciliatória, estar o primeiro curado sem qualquer desvalorização, mas em que o processo deva prosseguir na fase contenciosa, para se apurar, em virtude da discordância deles a esse propósito, se o acidente é ou não de natureza laboral. É para essas hipóteses residuais e outras, que rege o normativo em análise, caso em que a parte paga inicialmente a taxa de justiça correspondente a meia unidade de conta e deve proceder posteriormente ao pagamento da taxa de justiça remanescente, logo que o juiz fixe um valor certo para a causa, procedimento ou incidente.»

Por outro lado a também invocada alínea f) do n.° 1 do mesmo normativo refere-se a processos cujo valor é fixado pelo juiz da causa com recurso a critérios indeterminados e não esteja indicado um valor fixo, e estatui que se atende ao valor indicado na linha 1 da tabela 1-B, sem prejuízo de posteriores acertos quando for definitivamente fixado o valor.
Como igualmente sublinha aquele autor (ob. citada, pags. 244/245) «parece que a lei pretende reportar-se a casos como os do processo de impugnação de atos cujo valor não seja determinável e que deva ser fixado pelo juiz, tendo em consideração a sua complexidade e a situação económica do impugnante, previstos no nº 2 do artº 97º-A do CPPT, e de acções para o reconhecimento de direitos ou interesses legítimos, a que alude o artº 145º daquele Código.
Tendo em conta a letra da lei e o seu contexto, não parece que a ausência de indicação de um valor fixo a que se reporta tenha em vista a indicação da lei, mas antes a indicação das partes.
Nesta perspectiva, sempre que o juiz deva determinar o valor da causa com base em critérios indeterminados, importa distinguir os casos em que as partes indicaram ou não determinado valor processual para a causa.
No caso afirmativo é a esse valor que se deve atender; na hipótese negativa deve considerar-se o valor da causa a que o normativo em análise se reporta, sem prejuízo de posteriores acertos no caso de haver decisão definitiva sobre o valor.»

Ora no caso vertente a recorrente aplicou o critério supletivo legal na indicação do valor da causa, na consideração de que, respeitando o objecto do processo a bens imateriais (intimação da Autoridade Tributária e Aduaneira para um comportamento), aquele valor deveria corresponder à alçada do TCA mais € 0,01 (art.34° nºs 21 e 2 CPTA; art.303° n°1 CPC vigente)
Portanto no caso subjudice não está em causa a hipótese em que as partes não indicaram o valor da causa nem que seja manifesta a impossibilidade de o determinar oportunamente, de modo a poder realizar-se o prévio pagamento da taxa de justiça.
Daí que, como bem sustentam a decisão recorrida e o Exmº Procurador-Geral Adjunto no seu parecer, será esse o valor a considerar, não sendo aplicáveis as normas específicas constantes das als. e) e f) do art.12° n°1 do Regulamento das Custas Processuais.
Como o recorrente indicou o valor da causa (€30.000,01) será esse o valor a considerar como base tributável para efeitos de Taxa de Justiça de acordo com a linha 6 da tabela I – A (nível normal) anexa ao Regulamento das Custas Processuais (artº 11º do Regulamento das Custas Processuais).
O despacho recorrido, que decidiu neste pendor, não merece censura, pelo que improcederá o presente recurso.

7. Decisão
Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo negar provimento ao recurso.
Custas pela recorrente.

Lisboa, 19 de Setembro de 2018. – Pedro Delgado (relator) – Ascensão Lopes – Isabel Marques da Silva.