Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo | |
Processo: | 0983/10 |
Data do Acordão: | 03/22/2011 |
Tribunal: | 2 SECÇÃO |
Relator: | PIMENTA DO VALE |
Descritores: | IVA PRESCRIÇÃO INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO CITAÇÃO OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL MATÉRIA COLECTÁVEL REVISÃO A PEDIDO DO CONTRIBUINTE |
Sumário: | I - A citação do oponente para os termos da execução fiscal determina a interrupção da prescrição nos termos do disposto no artº 49º, nº 1 da LGT, com a consequente inutilização de todo o período de prescrição anteriormente decorrido (artº. 326, nº 1 do Código Civil). II - O pedido de revisão da matéria colectável não é factor interruptivo da prescrição, uma vez que tal efeito não lhe é conferido pelo artº 49º, nº 1 da LGT. III - Este preceito legal só contempla o pedido de revisão oficiosa da liquidação previsto no artº. 78º da LGT, o que é coisa diferente. |
Nº Convencional: | JSTA00066884 |
Nº do Documento: | SA2201103220983 |
Data de Entrada: | 12/09/2010 |
Recorrente: | A... |
Recorrido 1: | FAZENDA PÚBLICA |
Votação: | UNANIMIDADE |
Meio Processual: | REC JURISDICIONAL. |
Objecto: | SENT TAF SINTRA PER SALTUM. |
Decisão: | NEGA PROVIMENTO. |
Área Temática 1: | DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC FISCAL. |
Legislação Nacional: | LGT98 ART48 N1 ART49 N1 N2 ART78 ART91 ART92. L 100/99 DE 1999/07/26. L 53-A/2006 DE 2006/12/29. L 55-B/2004 DE 2004/12/30 ART40. CCIV66 ART326 N1 N2 ART327 N1. |
Referência a Doutrina: | LEITE DE CAMPOS E OUTROS LEI GERAL TRIBUTÁRIA ANOTADA 3ED PAG401. JORGE DE SOUSA SOBRE A PRESCRIÇÃO DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA NOTAS PRÁTICAS 2010 PAG57. |
Aditamento: | |
Texto Integral: | Acordam nesta Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1 – A…, melhor identificado nos autos, não se conformando com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, que julgou improcedente a oposição por si deduzida à execução fiscal n.º 1562200401024876, que corre termos no Serviço de Finanças de Sintra – 1, para cobrança de dívida de IVA, respeitante ao ano de 2000, no valor de € 167.278,44, dela vem interpor o presente recurso, formulando as seguintes conclusões: 1. - A douta sentença de fls.- dos autos violou o disposto nos art°s 48º, 49° e 91° da LGT; 2. - O pedido de revisão da matéria tributável, entregue em 21/11/2003, por força do disposto nos n°s 6 e 9, al. b), do art° 91° da LGT, deverá ser entendido como reclamação. 3. - A execução fiscal esteve parada mais de um ano, por facto não imputável ao sujeito passivo, entre 15/11/2004 e 25/09/2006; 4. - À data da paragem da execução fiscal já tinha ocorrido o factor interruptivo da prescrição; 5. - Esta paragem é relevante para a contagem do prazo prescricional, por força do disposto no art°49°, n°2 da LGT, aqui aplicável; 6. Deste modo, a partir de 16/11/2005 voltou a correr o prazo de prescrição, pelo que o novo tempo a partir daí, e somando com o tempo ocorrido até à data da autuação da execução, faz com que o prazo de 8 anos se tenha verificado na data de 31/05/2010; 7. - Encontra-se prescrita a dívida exequenda; 8. - Deve o Tribunal “ad quem” revogar a douta sentença proferida, nos presentes autos, e substitui-la por outra que julgue procedente a oposição à execução fiscal, por se encontrar prescrita a obrigação tributária Fazendo-se, assim, JUSTIÇA. Não houve contra-alegações. O Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que o recurso deve ser julgado improcedente, com base no sustentado entendimento de que o pedido de revisão da matéria tributável não deve ser entendido como reclamação e não se verificar a prescrição da dívida exequenda. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir. 2 – A sentença recorrida fixou a seguinte matéria de facto: A. Na sequência da emissão das ordens de serviço n.°s 78849 e 78850, o oponente foi sujeito a uma acção de inspecção externa para o ano de 2000, para o que lhe foi remetida carta aviso em 14/05/2003, recebida em 21/05/2003 (fls. 18 e artigo 8.° da petição inicial). B. Foi elaborado relatório final da inspecção, aprovado por despacho da Directora de Finanças Adjunta da Direcção de Finanças de Lisboa (DFL) datado de 10/10/2003, no qual se apurou IVA em falta para o ano de 2000 no valor de € 140.063,04, com base em métodos indirectos (fls. 23/26 do PAT apenso). C. No dia 22/10/2003, dois funcionários da DFL (com os nºs profissionais 1779 e 11959) contactaram pessoalmente o impugnante e deram-lhe conhecimento das conclusões do relatório de inspecção tributária supra referido (fls. 30/34). D. No dia 21/11/2003, o oponente requereu a revisão da matéria tributável (fls. 153/155). E. A Administração Fiscal enviou para a morada do oponente a liquidação de IVA n.º 04024132 do ano de 2000, da qual resulta o montante a pagar de € 140.063,04 (cento e quarenta mil, sessenta e três euros e quatro cêntimos), indicando como data limite de pagamento o dia 30/04/2004, através de carta registada com aviso de recepção n.º RY905713317PT, devolvida por falta de reclamação no dia 13/02/2004 (fls. 36/38). F. A Administração Fiscal enviou para a morada do oponente a liquidação de juros compensatórios de IVA do 1. ° Trimestre de 2003, com o n. ° 04024128, da qual resulta o montante a pagar de € 7.732,25 (sete mil, setecentos e trinta e dois euros e vinte e cinco cêntimos), indicando como data limite de pagamento o dia 30/04/2004, através de carta registada com aviso de recepção n.° RY905714754PT, devolvida por falta de reclamação no dia 13/02/2004 (fls. 39/41). G. A Administração Fiscal enviou para a morada do oponente a liquidação de juros compensatórios de IVA do 2.° Trimestre de 2003, com o n. ° 04024129, da qual resulta o montante a pagar de € 7.107,72 (sete mil, cento e sete euros e setenta e dois cêntimos), indicando como data limite de pagamento o dia 30/04/2004, através de carta registada com aviso de recepção n.° RY905716097PT, devolvida por falta de reclamação no dia 13/02/2004 (fls. 42/44). H. A Administração Fiscal enviou para a morada do oponente a liquidação de juros compensatórios de IVA do 3.° Trimestre de 2003, com o n.° 04024130, da qual resulta o montante a pagar de € 6.496,62 (seis mil, quatrocentos e noventa e seis euros e sessenta e dois cêntimos), indicando como data limite de pagamento o dia 30/04/2004, através de carta registada com aviso de recepção n.° RY905717530PT, devolvida por falta de reclamação no dia 13/02/2004 (fls. 45/47). I. A Administração Fiscal enviou para a morada do oponente a liquidação de juros compensatórios de IVA do 4.° Trimestre de 2003, com o n.º 04024131, da qual resulta o montante a pagar de € 5.878,81 (cinco mil, oitocentos e setenta e oito euros e oitenta e um cêntimos), indicando como data limite de pagamento o dia 30/04/2004, através de carta registada com aviso de recepção n.° RY905718861PT, devolvida por falta de reclamação no dia 13/02/2004 (fls. 48/50). J. A Administração Fiscal enviou para a morada do oponente segunda notificação das liquidações referenciadas nos pontos E a I, através de carta registada com aviso de recepção n.º RS503459324PT, devolvida por falta de reclamação no dia 24/03/2004 (fls. 51/54). K. No dia 16/07/2004, para cobrança coerciva das dívidas provenientes das referidas liquidações foi instaurado no Serviço de Finanças de Sintra - 1 o processo de execução fiscal n.° 1562200401024876 (PEF apenso). L. A execução fiscal esteve parada entre 15/11/2004 e 25/09/2006 (PEF apenso). M. O oponente recebeu e assinou a citação pessoal para esta execução fiscal no dia 11/10/2006 (fls. 60/61). N. A presente oposição à execução fiscal deu entrada no Serviço de Finanças de Sintra - 1 no dia 10/11/2006 (fls. 3). 3 - A questão suscitadas com o presente recurso, aliás, de conhecimento oficioso, consiste em saber se a dívida exequenda se encontra prescrita. Desde logo e como vimos, importa referir que esta diz respeito a IVA, relativo ao ano de 2000. Sendo assim, o regime de prescrição aqui aplicável é o previsto na LGT, na redacção da Lei nº 100/99 de 26/7, uma vez que o regime consagrado na Lei nº 53-A/06 de 29/12 só entrou em vigor em 1/1/07. Dispõe, então, o artº 48º, nº 1 daquele diploma legal que “as dívidas tributárias prescrevem, salvo o disposto em lei especial, no prazo de oito anos contados, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu”. Por sua vez, estabelece o seu artº 49º, nº 1 que “a citação, a reclamação, o recurso hierárquico a impugnação e o pedido de revisão oficiosa da liquidação do tributo interrompem a prescrição”. E, no seu nº 2, acrescenta que “a paragem do processo por período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo faz cessar o efeito previsto no número anterior, somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após esse período ao que tiver decorrido até à data da autuação”. Posto isto e como vimos, está aqui em causa a cobrança de IVA relativo ao ano de 2000. Sendo assim, o prazo de prescrição começou a correr em 1/1/2001, tal como foi decidido na sentença recorrida e que não foi posto em causa pelas partes, por força da alteração que o artº 40º da Lei nº 55-B/04 de 30/12/04 introduziu ao referido nº 1 do artº 48º, que estabeleceu que o dito termo inicial do prazo de prescrição, para os impostos de obrigação única - como é o caso do IVA -, começou a contar-se a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou a exigibilidade do imposto. Pelo que, se tivesse corrido ininterruptamente, o prazo de prescrição terminaria em 31/12/09. Porém, no dia 16/7/04 foi instaurada a execução fiscal, facto este que, todavia, não assume qualquer relevância, uma vez que o predito artº 49º, nº 1 não lhe atribui efeito interruptivo. Entretanto, no dia 11/10/06, o oponente foi citado para os termos da execução (vide al. M) do probatório), sendo certo que, nesta altura, o prazo de prescrição ainda estava a decorrer. Tal facto, por força do predito artº 49, nº 1 tem efeito interruptivo da prescrição, inutilizando, assim, todo o tempo decorrido anteriormente, não começando a correr novo prazo, igual ao primitivo, enquanto não transitar em julgado a decisão que puser termo ao processo, como bem se anota na sentença recorrida (cfr. artºs 326º, nºs 1 e 2 e 327º, nº 1 do CC e Jorge Sousa, in Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, ed. 2010, pág. 57). É certo que este processo de execução esteve parado, por facto não imputável ao oponente, no período compreendido entre 15/11/04 e 25/9/06 (vide al. L) do probatório). Todavia este facto não assume qualquer relevância para a contagem do prazo de prescrição, “porquanto à data da mesma não havia ainda ocorrido o factor interruptivo da prescrição não se verificando a degeneração do efeito interruptivo em suspensivo, a que alude a norma acabada de citar”, como bem se anota na sentença recorrida. Neste contexto, encontrando-se eliminado todo o prazo de prescrição decorrido até à citação da execução fiscal, sendo certo, como vimos, que um novo prazo de prescrição só se iniciará após o trânsito em julgado da decisão que lhe ponha termo, impõe-se concluir que a obrigação tributária de IVA do ano 2000 não se encontra, neste momento, prescrita, conforme se entendeu na sentença recorrida. 4 - Alega, porém, o recorrente que, tendo deduzido, em 21/11/03, pedido de revisão da matéria tributável (vide al. D) do probatório), este pedido “é um facto interruptivo da prescrição”, resultando tal efeito da lei, já que estamos perante uma “reclamação” à luz do artº 91º, nºs 6 e 9, al. b) da LGT. Mas não tem razão. Desde logo e muito embora esta alegação se fique pelo seu enunciado e não venha acompanhada de qualquer argumento demonstrativo da sua bondade, como bem salienta o Exmº Procurador-Geral Adjunto, no seu parecer, sempre acrescentaremos que o entendimento de que o pedido de revisão da matéria colectável constitui causa interruptiva de prescrição não encontra qualquer correspondência na letra do predito artº 49º, nº 1 da LGT. Com efeito, ali se refere expressamente que só o pedido de revisão oficiosa da liquidação interrompe a prescrição. Ora, o pedido de revisão de fls. 153 a 155 foi reclamado nos termos do disposto no artº 91º, nº 3 da LGT, como dele consta e não do artº 78º da LGT. E só este último preceito é potencialmente abrangente de actos de liquidação ou mesmo de fixação da matéria colectável. Só que a revisão da matéria colectável a que se reporta o predito artº 91º é distinta da prevista no artº 78º. Neste “está-se perante um meio procedimental de obter a correcção de uma prévia decisão final de um procedimento (de liquidação ou de fixação da matéria colectável, se ela tiver autonomia), enquanto que naqueles artigos 91.º e 92.º está-se numa fase anterior à decisão final do procedimento, sendo aquela revisão uma fase da formação dessa decisão final” (Diogo Leite Campos, Benjamim Rodrigues e Jorge Sousa, in LGT anotada, 3ª ed., pág. 401). Por outro lado, quer da letra de um quer de outro dos referidos artigos nada nos permite concluir que o pedido de revisão equivale à “reclamação”, como também pretende o recorrente. Aliás, se assim fosse, não era necessário, por que repetitivo, o legislador fazer referência, no artº 49º, nº 1, a reclamação e revisão oficiosa da liquidação. O termo “reclamação” usado nos nºs 6 e 9, al. b) do artº 91º da LGT tem apenas a ver com o “pedido de revisão” e não com qualquer meio de procedimento tributário, como claramente resulta do seu teor. De qualquer forma, sempre esta questão, qualquer que seja a solução adoptada, é perfeitamente inútil para o desfecho do caso. Com efeito, à conclusão de que a obrigação tributária não está prescrita se chega mesmo que se considerasse o pedido de revisão da matéria colectável, por si só ou por que equivalente à reclamação, como sua causa interruptiva, já que e como vimos supra, quando foi efectuada, posteriormente, a citação do oponente para os termos da execução fiscal esta tem o seu efeito interruptivo próprio, eliminando para a prescrição todo o tempo já decorrido, sendo indiferente que existisse um período que já estava eliminado pelo efeito interruptivo/suspensivo que pudesse vir a ter esse pedido de revisão da matéria colectável. Impõe-se, deste modo, concluir que não está ainda prescrita a dívida exequenda, não merecendo censura a sentença recorrida que assim julgou. 5 – Nestes termos, acorda-se em negar provimento ao presente recurso e manter a sentença recorrida. Custas pelo recorrente, fixando-se a procuradoria em 1/6. Lisboa, 22 de Março de 2011. – Pimenta do Vale (relator) – António Calhau – Casimiro Gonçalves. |