Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01208/12
Data do Acordão:01/09/2013
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:PEDRO DELGADO
Descritores:RECLAMAÇÃO DE ACTO PRATICADO PELO ÓRGÃO DA EXECUÇÃO FISCAL
INUTILIDADE SUPERVENIENTE DA LIDE
Sumário:I – A inutilidade superveniente da lide ocorre quando, por facto ocorrido na pendência da instância, a solução do litígio deixe de ter todo o interesse e utilidade, conduzindo, por isso, à extinção da instância (art.º 287º, al. e), do Código de Processo Civil).
II – Tendo sido proferida decisão expressa do órgão de execução fiscal Tributária sobre o requerimento de arguição de nulidade, na mesma data da apresentação de reclamação nos termos do artº 276º, nº 1 do Código de Procedimento e Processo Tributário, ficou sem objecto aquela reclamação, que tinha como principal desiderato suscitar a intervenção do tribunal, para, em face da inércia da Administração Fiscal, apreciar desde logo os invocados vícios em substituição do órgão de execução fiscal.
Nº Convencional:JSTA00068025
Nº do Documento:SA22013010901208
Data de Entrada:11/06/2012
Recorrente:A.... E OUTRA
Recorrido 1:AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF MIRANDELA
Decisão:NÃO TOMAR CONHECIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC FISCAL
Legislação Nacional:CPPTRIB99 ART2 E ART276 ART97 N1 ART277 N2 ART278 N4 ART277 N1 ART21 A
CPC96 ART137 ART287 E
LGT98 ART103 N2 ART57 N5
CPA91 ART135 ART133 N1 N2 D
CONST76 ART20 N1
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC0340/11 DE 2011/12/07; AC STA PROC0643/10 DE 2010/08/25; AC STA PROC0440/08 DE 2008/09/18
Referência a Doutrina:LEBRE DE FREITAS JOÃO REDINHA RUI PINTO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL ANOTADO I PAG512
FREITAS ROCHA LIÇÕES DE PROCEDIMENTO E PROCESSO TRIBUTÁRIO 4ED PAG357
JORGE DE SOUSA CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E PROCESSO TRIBUTÁRIO IV PAG271.
AROSO DE ALMEIDA FERNANDES CADILHA COMENTÁRIO AO CÓDIGO DE PROCESSO NOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS I PAG 247
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

I. A……….. e B………, melhor identificados nos autos, vêm recorrer para este Supremo Tribunal da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela de 17 de Setembro de 2012, que indeferiu a reclamação por eles apresentada contra a omissão de decisão do órgão de execução fiscal sobre o requerimento de arguição de nulidade praticada no processo de execução fiscal.

Terminam as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:
A) O Mm. Juiz a quo decidiu “retirar o carácter urgente ao processo”, porquanto, justifica, que o reclamante “limitou-se a concluir por esse tipo de prejuízo, sem invocar factos que, caso se provasse, confeririam ao processo carácter urgente”;
B) Confundindo a natureza urgente da reclamação com o regime da respetiva subida;
C) Na verdade, o nº 1 do artigo 278° do C.P.P.T. estabelece a regra geral da subida diferida a tribunal das reclamações das decisões do órgão de execução fiscal e o nº 3, as exceções àquela regra, admitindo a subida imediata nas situações aí tipificadas;
D) Sendo que o processo de reclamação, uma vez em fase judicial, tem sempre natureza urgente — cfr. o número 5 do artigo 278.°: «A reclamação referida no presente artigo segue as regras dos processos urgentes, tendo a sua apreciação prioridade sobre quaisquer processos que devam ser apreciados no tribunal que não tenham esse carácter.»;
E) O que poderia, portanto, estar em causa era, jamais a natureza urgente do processo, antes a imediata apreciação pelo Tribunal;
F) Decidindo como decidiu, violou a douta sentença recorrida o disposto naquele citado número 5 do artigo 278º do C.P.P.T;
SEM CONCEDER,
G) A verdade é que a apreciação imediata da reclamação jamais poderia, em qualquer caso, ser posta em causa nem é verdade que o reclamante não invocou factos que justificassem essa imediata apreciação;
H) O reclamante alegou que lhe havia sido — ilegalmente — penhorado um quinhão hereditário e que estava já marcada a venda;
I) E que, se a venda tivesse lugar, lesado ficaria o seu direito de propriedade.
J) Estes factos sobejam...;
K) A C.R.P. garante o direito à tutela judicial efetiva de direitos e interesses legítimos em matéria de contencioso administrativo (cfr. artº 268° nº 4), no qual se engloba o tributário;
L) O alcance da tutela judicial efetiva não se limita à possibilidade de reparação dos prejuízos provocados por uma atuação ilegal, comissiva ou omissiva, da AT, exigindo antes que sejam evitados os próprios prejuízos, sempre que possível;
M) Caso se entendesse que a reclamação obedeceria ao regime geral de subida diferida previsto no artigo 278°, n.º 1, do C.P.P.T., o que só por hipótese de raciocínio se concede, seria absolutamente inútil a sua apreciação, uma vez que aquilo que se pretendia impedir já se terá consumado;
N) Finalmente, na douta sentença recorrida, o Tribunal “indefere” a “reclamação apresentada”, mas o indeferimento — rectius, a improcedência — da reclamação não se prende nem pode ser a consequência direta de um juízo sobre o carácter urgente do processo ou sobre o regime de subida;
O) A improcedência depende, na verdade, de um juízo de mérito, que não existiu!
P) O único facto dado como não provado “com interesse para a decisão”, foi “que a penhora em causa cause ao Reclamante prejuízo irreparável”.
Q) Sendo que a parte dispositiva da decisão também apenas sobre este problema se debruça, pela forma já supra exposta;
R) Por conseguinte, o juízo de “indeferimento” da reclamação é nulo, por absoluta omissão de fundamentação.

II – Não foram apresentadas contra alegações.

III - O Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer no seguinte sentido:
«Recorrentes: A…………. e B………… Objecto do recurso: decisão de indeferimento liminar de reclamação apresentada contra omissão de decisão pelo órgão da execução fiscal sobre requerimento de arguição de nulidade praticada em processo de execução fiscal
Fundamentação
1. A reclamação prevista no art.276° CPPT não é o meio processual adequado à impugnação de conduta omissiva do órgão da execução fiscal, designadamente a ausência de pronúncia sobre requerimento de arguição de nulidade, sem prejuízo da possibilidade de intervenção directa do tribunal em caso de inércia da administração tributária na apreciação da arguição (cf. para desenvolvimento Jorge Lopes de Sousa Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado 6ª edição 2011 Volume IV pp. 271/272)
2. No caso concreto o pressuposto da admissibilidade da apreciação imediata da arguição de nulidade não se verifica porque o órgão da execução fiscal proferiu decisão expressa de indeferimento da arguição de nulidade na mesma data da apresentação da petição de reclamação, notificada ao mandatário judicial dos reclamantes (probatório nºs 8/9)
3. Neste contexto a instância de reclamação deve ser extinta por inutilidade superveniente da lide, resultante da prática de posterior acto expresso de indeferimento de pedido de declaração de nulidade, sem reacção processual conhecida dos recorrentes (art.287° al. e) CPC/art.2° al. e) CPPT)
Fica prejudicada a apreciação da questão da subida imediata da reclamação e da consequente tramitação urgente
Conclusão
O recurso não merece provimento.
A instância de reclamação deve ser extinta por inutilidade superveniente da lide.»

IV. Notificadas as partes para se pronunciarem, querendo, sobre a questão da inutilidade superveniente da lide suscitada pelo Ministério Público, veio o recorrente A………… dizer o seguinte:

«O ora recorrente apresentou reclamação, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 276.° e ss. do CPPT, da omissão de decisão sobre o requerimento de arguição de nulidade remetido àquele órgão de execução fiscal a 13.06.2012.
O requerimento que capeava a reclamação e o articulado desta foram remetidos via fax ao Serviço de Finanças competente aos 04.07.2012, tendo sido simultaneamente remetido via postal sob o registo RC 9997 5326 9 PT, que foi recebido aos 05.07.2012 — cfr. o relatório de fax, o registo CTT e a print do site CTT, cujas cópias foram pelo recorrente oportunamente juntas aos autos.
Pelo que a reclamação chegou ao conhecimento do Serviço de Finanças reclamado no dia 04.07.2012.
A 06.07.2012, dois dias depois, portanto, a Fazenda proferiu um despacho que remeteu à mandatária do reclamante, aqui signatária, por via postal sob o registo RM 8624 1259 5 P1 naquele dia 06.07.2012 e foi recebida a 09.07.2012 — cfr. o print do site dos CTT que oportunamente o recorrente juntou aos autos.
Assim, na data em que deu entrada a reclamação, o reclamante ainda não tinha sido notificado do despacho de indeferimento em que se funda a suposta inutilidade superveniente da lide.
Por outro lado, não sem antes ressaltar a má fé da Fazenda, o despacho proferido a 06.07.2012 é, manifestamente, nulo, na medida em que o disposto 277.° número 2 e 278.°, número 4, a apresentação da reclamação, com requerimento de subida imediato, impede seja praticado pela órgão reclamado qualquer ato, que não a revogação do ato reclamado ou a remessa ao Tribunal.
Não pretenda, a Fazenda, sequer que o despacho de 06/07 constitua revogação do ato reclamado, até porque nele expressamente se alude à “reclamação (sic) apresentada em 14.06.2012”, i.e., ao requerimento de arguição de nulidade, ao qual se visava responder já depois de reclamada a omissão de pronúncia sobre tal requerimento!
Tão pouco se poderá aceitar que coubesse ao reclamante, que reclamara já da omissão de pronúncia, reclamar agora (pagando nova taxa de justiça) também de um ato positivo praticado dois dias depois da data da entrada daquela reclamação!!
Nem o princípio da legalidade nem o princípio da boa-fé nem a economia processual nem, finalmente, a equidade na repartição dos sacrifícios o permitiriam!
Aliás, note-se também o teor do despacho proferido o despacho proferido no dia 09.07.2012 pelo Serviço de Finanças reclamado - cuja cópia o recorrente oportunamente juntou aos autos — que afirma que “a reclamação (sic) apresentada nos termos do artigo 276.0 do CPPT(sic !!) foi indeferida por despacho de 05/07/2012 e que entretanto em 06/07/2012 a mandatária do executado reagiu para o Tribunal Tributário de 1.0 Instância”.
O que é simultaneamente falso, incompreensível, tecnicamente incorreto e ilegal, tanto mais que o órgão reclamado não tem poderes para se pronunciar quanto às reclamações apresentadas nos termos do artigos 276.° do CPPT!
Finalmente, como deixou já alegado na petição inicial, a omissão de despacho constitui, ela mesma, ato — omissivo — que lesa os direitos e interesses legalmente protegidos do contribuinte.
Acresce que, a administração fiscal está legalmente obrigada a pronunciar-se e sobre os requerimentos dos contribuintes e a decidir sobre o que lhe for requerido, no prazo de dez dias se outro não estiver especialmente previsto — cfr. os artigos 56.° e 57.° da L.G.T..
Sendo que também a mera omissão destes deveres de pronúncia e decisão constitui ato ilegal, independentemente da procedência das invocadas nulidades, que, porque interfere com a defesa do reclamante, a lei comina com a nulidade, nos termos do disposto no artigo 201.° do C.P.C. (ex vi do artigo 2.° do C.P.P.T.), ou, se assim não se entender, com a anulabilidade, por força do vício de violação e lei de que padece.
Dúvidas não podem, pois, restar de que uma omissão constitui, ela própria, atuação reclamável, na medida em que a atuação da Administração tanto pode ser comissiva como omissiva, sendo que ambas têm potencial para lesar os direitos e interesses dos contribuintes.
Neste sentido, veja-se o que vem entende o Conselheiro LOPES DE SOUSA 1: «(...) relativamente a omissões de atos não será possível, em princípio, reclamar imediatamente para o juiz, pelo que o interessado deverá fazer a respetiva arguição de nulidade perante o órgão de execução fiscal e só da decisão este que não satisfaça a sua pretensão poderá reclamar.
Porém, se ocorrer inércia da administração tributária em apreciar a arguição ou se se tratar de uma situação em que a omissão provoca, por si só, uma lesão imediata dos direitos do requerente, não poderá deixar de reconhecer-se a este interessado o direito de solicitar imediatamente a intervenção do Tribunal, como exige a garantia constitucional do direito à tutela judicial efetiva (art. 20.°, n.°1, da CRP).».
Neste pressuposto, o reclamante, ora recorrente, veio suscitar a intervenção do tribunal, não só para que apreciasse a ilegalidade da omissão, em si mesma lesiva, mas também, por economia processual, para que, substituindo-se ao órgão de administração fiscal, aprecie desde já os invocados vícios, sobre os quais este omitiu pronúncia e decisão, e que deverão levar à declaração de nulidade de todo o processado.
Pelo que, não se podia — como não se pode — admitir que o órgão de execução fiscal, procurando furtar-se à apreciação judicial da ilegalidade da sua atuação, pratique o ato já depois do momento em que lhe estava retirado o poder de apreciação e já nada mais podia fazer que não autuar a reclamação e remetê-la, com o processo de execução fiscal, ao Tribunal competente.
Nestes termos, o ato praticado pelo órgão de execução fiscal, no qual se pretende fundar a aparente inutilidade superveniente da reclamação e do presente recurso, é, na verdade, ato nulo, mantendo — reclamação e recurso — toda a utilidade»

V- Sem vistos, dada a natureza urgente do processo, cabe apreciar.

VI - Em sede factual apurou-se na primeira instância a seguinte matéria de facto com relevo para a decisão da causa:
1. Contra a originária executada C…………, Lda, NIPC ………, com sede na rua da ………, …….., Peso da Régua, foi instaurado o processo de execução fiscal nº 243720050100g184, por dividas de IRC, do ano de 2000, no montante de €52.701,58 — Fls. 1 do PA.
2. A executada foi citada em 12/07/2005 na pessoa de A…………, gerente da mesma -fls. 2 verso, do PA;
3. Em 09/02/2009 a AT procedeu à preparação para reversão contra responsáveis subsidiários — fls. 4 do PA;
4. Em 23/03/2009 foi concretizada a reversão contra os responsáveis subsidiários:
A…………, NIF: ……….., e B…………, NIF: ………. — fls. 16 do PA;
5. A citação pessoal em reversão do aqui Reclamante ocorreu em 13/05/2009 — fls. 29 do PA;
6. Dá-se aqui por reproduzido o doc. de fls. 44 do PA, com o seguinte destaque: “EDITAL//Faço saber que, nos termos do art.º 192 e n.º 3 do art.º 193 do (...) (CPPT), fica o Sr. A……….. (...), com último domicilio conhecido em Av. de ……, …. — ….., Peso da Régua, por este meio citado da execução (...) // Mais fica notificado, na qualidade de revertido, da penhora efectuada por estes Serviços de Finanças (...)”
7. Em 13/6/2012 vem o executado reclamar arguindo a nulidade de todo o processado relacionado com a citação, penhora e venda — fls. 104 a 117 do PA,
8. Em 5/7/2012 a sua pretensão foi indeferida por despacho do Chefe do SF de Peso da Régua, - Fls. 119 do PA;
9. A decisão foi notificada em 12/7/2012, na pessoa da sua Mandatária - 151 e fls. a ela apensadas;


VII- São as seguintes as questões trazidas pela recorrente à apreciação deste Supremo Tribunal:
1) saber se incorre em erro de julgamento a sentença recorrida ao decidir retirar o carácter de urgente ao processo, por entender que os ora recorrentes não invocaram na sua reclamação factos integradores de qualquer situação susceptível de causar prejuízo irreparável na previsão das várias alíneas do nº3 do artº 278º do Código de Procedimento e Processo Tributário e se, nessa medida, a sentença violou o disposto no artº 278º, nº 5 do Código de Procedimento e Processo Tributário;
2) saber se a decisão de indeferimento da reclamação é nula por «absoluta falta de fundamentação»;
3) saber se ocorre inutilidade superveniente da lide, relativamente à instância de reclamação, decorrente da prática de posterior acto expresso de indeferimento de pedido de declaração de nulidade.

Face às conclusões de recurso e à posição do Ministério Público neste Supremo Tribunal Administrativo impõe-se, apreciar previamente a questão da inutilidade superveniente da lide, quer por razões lógicas quer por razões de economia processual, e antes mesmo da apreciação da também suscitada questão da eventual nulidade da sentença recorrida, na parte relativa ao indeferimento da reclamação de actos do órgão de execução fiscal por total carência de fundamentação.
Com efeito a verificar-se a invocada inutilidade superveniente da lide, não tem qualquer interesse apreciar a eventual nulidade da sentença, vício esse cujo conhecimento, nestas circunstâncias, não é forçosamente prioritário e poderá considerar-se prejudicado, tendo em atenção o disposto no artº 137º do Código de Processo Civil que impõe a opção pela via processualmente mais económica.(Ver neste sentido Código de Procedimento e Processo Tributário anotado de Jorge Lopes de Sousa, vol. II, pags. 373-374.)

VIII - Da inutilidade superveniente da lide, relativamente à instância de reclamação de actos do órgão de execução fiscal.
No seu parecer de fls. 148 o Exmº Procurador-Geral Adjunto neste Supremo Tribunal Administrativo sustenta que a instância de reclamação deve ser extinta por inutilidade superveniente da lide, resultante da prática de posterior acto expresso de indeferimento de pedido de declaração de nulidade, sem reacção processual conhecida dos recorrentes (art.287° al. e) CPC/art.2° al. e) CPPT).
Argumenta o ilustre magistrado do Ministério Público que a reclamação prevista no art.276° CPPT não é o meio processual adequado à impugnação de conduta omissiva do órgão da execução fiscal, designadamente a ausência de pronúncia sobre requerimento de arguição de nulidade, sem prejuízo da possibilidade de intervenção directa do tribunal em caso de inércia da administração tributária na apreciação da arguição.
E concluiu que, no caso concreto o pressuposto da admissibilidade da apreciação imediata da arguição de nulidade não se verifica porque o órgão da execução fiscal proferiu decisão expressa de indeferimento da arguição de nulidade na mesma data da apresentação da petição de reclamação, notificada ao mandatário judicial dos reclamantes.

Vejamos, pois.
Como é sabido a inutilidade superveniente da lide ocorre quando, por facto ocorrido na pendência da instância, a solução do litígio deixe de ter todo o interesse e utilidade, conduzindo, por isso, à extinção da instância (art.º 287º, al. e), do Código de Processo Civil).
A inutilidade ou impossibilidade superveniente da lide dá-se quando, por facto ocorrido na pendência da instância, a pretensão do autor não se pode manter, por virtude do desaparecimento dos sujeitos ou do objecto do processo, ou se encontra fora do esquema da providência pretendida. Num e noutro caso, a solução do litígio deixa de interessar – além, por impossibilidade de atingir o resultado visado; aqui, por ele já ter sido atingido por outro meio - José Lebre de Freitas, João Redinha, Rui Pinto, Código de Processo Civil anotado, vol 1, anotação 3 ao art. 287.º, pág. 512

No caso subjudice o recurso vem interposto da sentença do TAF de Mirandela que indeferiu a reclamação apresentada pelos recorrentes contra a omissão de decisão do órgão de execução fiscal sobre o requerimento de arguição de nulidade praticada no processo de execução fiscal.
Como se alcança do respectivo texto a sentença recorrida julgou não ser o momento para conhecer do mérito da reclamação deduzida porquanto o reclamante se terá limitado a invocar o prejuízo irreparável «sem invocar factos que, caso se provassem, confeririam ao processo carácter urgente» - cf. sentença a fls. 111.
Importa sublinhar que resulta desde logo da petição inicial que o objecto da reclamação era a omissão de decisão da Administração Fiscal sobre um requerimento de arguição de nulidade remetido pelo recorrente A……….. ao órgão de execução fiscal no âmbito do processo de execução fiscal nº 2437200501009184.
Ora, como bem nota o Exmº Procurador-Geral Adjunto a reclamação prevista no art.276° CPPT não é o meio processual adequado à impugnação de conduta omissiva do órgão da execução fiscal, designadamente a ausência de pronúncia sobre requerimento de arguição de nulidade.
Efectivamente decorre do artigo 276º do Código de Procedimento e Processo Tributário que são susceptíveis de reclamação para o tribunal tributário de 1.ª instância. as decisões proferidas pelo órgão da execução fiscal e outras autoridades da administração tributária que no processo afectem os direitos e interesses legítimos do executado.
Também o artº 97º, nº 1 do mesmo diploma legal prevê, como parte integrante do chamado processo judicial tributário, o recurso, no próprio processo, dos actos praticados na execução fiscal.
E o artº 103º, nº 2 da Lei Geral Tributária garante aos interessados o direito de reclamação para o juiz da execução fiscal dos actos materialmente administrativos praticados por órgãos da administração tributária, nos termos do número anterior. Do ponto de vista orgânico, os actos susceptíveis de reclamação serão, pois, aqueles que se exteriorizem mediante decisões proferidas pelo órgão de execução fiscal e outras autoridades da Administração Tributária e, do ponto de vista material, devem ser actos que afectem os direitos e interesses legítimos do executado (Neste sentido Joaquim Freitas Rocha, Lições de Procedimento e Processo tributário, 4ª edição, pag. 357.).
Por isso, concordamos com Jorge Lopes de Sousa quando, no seu Código de Procedimento e Processo Tributário, Vol. IV, pag. 271, escreve que nenhuma das referidas normas fornece suporte consistente para defender a possibilidade de reclamação perante a mera omissão de actos que o interessado entenda que deviam ser praticados e que o não foram.
E também subscrevemos a jurisprudência deste Supremo Tribunal Administrativo vem entendendo que relativamente a omissões de actos não será possível em princípio reclamar imediatamente para o juiz - são exemplos disso os Acórdãos 340/11 de 07.12.2011, 643/10 de 25.08.2010, e 440/08 de 18.09.2008, todos in www.dgsi.pt.
Isto, porém, em princípio, pois que, como sublinha o referido autor (Ob. citada, pag. 271.), casos há em que a inércia da administração tributária em apreciar a arguição poderá provocar, só por si, uma lesão imediata dos interesses do requerente, e, nessas hipóteses, não poderá deixar de reconhecer-se aos interessados o direito de solicitarem imediatamente a intervenção do tribunal, como exige a garantia constitucional do direito à tutela judicial efectiva (art. 20°, n.° 1, da CRP).
Ainda assim sempre se dirá que constitui pressuposto da admissibilidade da apreciação imediata da pretensão do reclamante uma omissão da Administração Tributária que lese imediatamente os seus interesses.
Ora no caso em apreço o objectivo do reclamante, encontra-se expresso nos arts.27º e 28º da petição inicial, onde exarou que era sua intenção «suscitar a intervenção do tribunal, não só para que aprecie a ilegalidade da omissão, em si mesma lesiva» (…) «mas também, por economia processual, para que, substituindo-se ao órgão de administração fiscal, aprecie desde já os invocados vícios, sobre os quais este omitiu pronúncia e decisão, e que deverão levar à declaração de nulidade de todo o processado».
Porém, como resulta do resulta do probatório (pontos 8 e 9), e assertivamente nota o Exmº Procurador-Geral Adjunto, aquele pressuposto de admissibilidade não se verifica porquanto o órgão de execução fiscal proferiu decisão expressa de indeferimento da arguição de nulidade na mesma data da apresentação da petição de reclamação (5/7/2012) (Pese embora os recorrentes refiram no seu requerimento de fls. 153 e segs. que o despacho do órgão de execução fiscal foi proferido em 6.07.2012, o que resulta do probatório é que tal despacho data de 05.07.2012, constatando-se dos autos apensos – fls. 150 e segs. - que o ofício com a respectiva notificação foi expedido em 06.07.2012, para o recorrente e em 09.07.2012, para a respectiva mandatária.), decisão essa que foi notificada em 12/7/2012, na pessoa da sua mandatária.
Acresce dizer que não procede a argumentação do recorrente quando, notificada para se pronunciar sobre a questão da inutilidade superveniente da lide, sustenta que aquela decisão expressa de indeferimento padece de nulidade na medida em que, face ao disposto no artº 277º, nº 2 e 278º, nº 4 do Código de Procedimento e Processo Tributário, em face da apresentação da apresentação da reclamação com o requerimento de subida imediata, o órgão de execução fiscal já nada mais podia senão autuar a reclamação e remetê-la, com o processo de execução fiscal, ao tribunal competente.
Não é essa a leitura que resulta do disposto no artº 277º, nº 2 do Código de Procedimento e Processo Tributário.
Desde logo, de acordo com este normativo, na sequência da apresentação da reclamação e da sua junção ao processo de execução fiscal, o órgão da execução fiscal, se foi o autor do acto reclamado, pode revogá-lo no prazo de 10 dias.
E se a revogação for efectuada após o prazo aplicável para esse efeito, o acto de revogação enfermará, não de nulidade, mas de mera de ilegalidade, por violação da norma que estabelece o prazo de reclamação.
Este acto de revogação, sendo um acto praticado no processo de execução fiscal, pode também ser impugnado através de nova reclamação. Mas se o acto de revogação não for impugnado no prazo de reclamação previsto no n. 1 do art. 277. do CPPT, consolidar-se-á a revogação, pelo que a reclamação que foi interposta do primeiro acto ficará sem objecto e extinguir-se-á, por impossibilidade superveniente da lide( Neste sentido, Jorge Lopes de Sousa, ob. citada, pag. 293.).
Também no caso subjudice a prática do acto omitido após o prazo de indeferimento tácito (que é de 10 dias para a prolação de despachos no processo de execução fiscal de acordo com o disposto nos atrs. 57º, nº 5 da Lei Geral Tributária e 21º, al.a) do Código de Procedimento e Processo Tributário) constituirá mera ilegalidade, fundamento de anulabilidade.
Como é sabido constitui ilegalidade e, consequentemente vício do acto administrativo ou acto tributário, qualquer ofensa dos princípios ou normas jurídicas aplicáveis, que poderá envolver a anulabilidade, a nulidade ou a inexistência.
A nulidade constitui o regime de excepção, ao passo que a anulabilidade é o regime regra. É o que se depreende do disposto no artigo 135.° do CPA, segundo o qual são anuláveis os "actos administrativos praticados com ofensa dos princípios ou normas jurídicas aplicáveis para cuja violação se não preveja outra sanção." (Cf., neste sentido Mário de Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, vol. I, pag. 247).
Dispõe, por sua vez art. 133º nºs 1 e 2 al. d) do Código de Processo Administrativo são nulos os actos a que falte qualquer dos elementos essenciais ou para os quais a lei comine expressamente essa forma de invalidade, nomeadamente os actos que ofendam o conteúdo essencial de um direito fundamental.
Porém, esses actos hão-de ser aqueles que contendem com os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos.
Mas não aqueles que contendem com o princípio da legalidade, como sucede no caso em apreço em que está em causa a prática de acto após o decurso do prazo legal de decisão.
Ora resulta dos autos que o despacho do Chefe do Serviço de Finanças de Peso de Régua de 05.07.2012, que procedeu ao indeferimento de pedido de declaração de nulidade, não foi objecto de reacção processual por parte dos recorrentes, nomeadamente através de reclamação nos termos e no prazo do artº 277º, nº 1 do Código de Procedimento e Processo Tributário, como aliás os mesmos admitem (fls.154), consolidando-se na ordem jurídica como caso decidido.
Neste contexto, tendo sido proferida decisão expressa da Administração Tributária sobre o requerimento de arguição de nulidade ficou sem objecto a reclamação, que tinha como principal desiderato suscitar a intervenção do tribunal, para, em face da inércia da Administração Fiscal, apreciar desde logo os invocados vícios em substituição do órgão de administração fiscal,
O que implica a inutilidade superveniente da lide e consequente extinção da instância, nos termos do disposto nos arts. 287, al. e) do Código de Processo Civil e 2º.al. e) do Código de Procedimento e Processo Tributário.
Procede, pois, a questão prévia suscitada pelo Exmº Procurador-Geral Adjunto, ficando prejudicado o conhecimento das demais questões suscitadas.
IX. Decisão
Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em não tomar conhecimento do presente recurso jurisdicional, e em julgar extinta a instância por inutilidade superveniente da lide arts. 287, al. e) do Código de Processo Civil e 2º.al. e) do Código de Procedimento e Processo Tributário).

Sem custas, uma vez que a inutilidade não se verificava à data da reclamação.
Lisboa, 9 de Janeiro de 2013. – Pedro Delgado(relator) – Valente Torrão – Ascensão Lopes.