Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:056/13
Data do Acordão:06/18/2013
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:LINO RIBEIRO
Descritores:INTEMPESTIVIDADE
CONVOLAÇÃO
OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL
Sumário:I – A «convolação de processos» referida no nº 3 do artigo 97º da LGT e nº 4 do artigo 98º do CPPT tem como pressuposto que tenha havido erro na forma de processo escolhida.
II – A maior latitude do sentido da norma do nº 3 do artigo 97º da LGT relativamente à norma do nº 4 do artigo 98º do CPPT, aponta no sentido da «convolação» do processo abranger também as correcções processuais que se traduzam na transformação de uma forma do processo num acto processual, pelo menos nas situações em que processo de execução se encontra no tribunal.
III – Justificando-se a convolação em razões de economia processual, não se pode determinar a correcção da forma adequada quando logo se vislumbra que nessa forma não é impossível apreciar todas as causas em que se baseia o pedido formulado.
Nº Convencional:JSTA00068299
Nº do Documento:SA220130618056
Data de Entrada:01/15/2013
Recorrente:A...
Recorrido 1:INSTITUTO DE GESTÃO FINANCEIRA DA SEGURANÇA SOCIAL, I.P. - VILA REAL
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF MIRANDELA
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC FISCAL.
Legislação Nacional:CPPTRIB99 ART203 ART204 N1 D E I ART276 ART278 N3 ART98 N4 ART175.
LGT98 ART97 N3.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo


1.1 A…………………., identificado nos autos, interpõe recurso jurisdicional da decisão que, por extemporaneidade, indeferiu liminarmente a oposição à execução fiscal nº 1701200501007548, contra si revertida, por dívidas de contribuições à segurança social, no valor de €54.406,73.
Nas respectivas alegações, conclui o seguinte:
1 — A decisão recorrida foi no sentido de rejeitar liminarmente a oposição à penhora por ter sido deduzida fora do prazo.
2 — Em primeira e fundamental linha, pensa o recorrente que há erro de julgamento, por indevida interpretação e aplicação dos arts. 175° e 276° do CPPT, bem como os arts. 97°, nº 3 da LGT e 98°, nº 4 do CPPT.
3 — No nosso discernir, o Mmo. Juiz do Tribunal a quo tinha todos elementos necessários e suficientes para convolar a oposição em requerimento de invocação da prescrição, da caducidade do direito de liquidação e da inexigibilidade da dívida em cobrança por ilegitimidade da pessoa citada a juntar na execução fiscal que corre seus termos nos Serviços do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social de Vila Real.
4 — Como resulta do teor da oposição apresentada o oponente/recorrente fundamenta o seu pedido com base na prescrição da divida tributária, na caducidade do direito de liquidação e na inexigibilidade da divida em cobrança por ilegitimidade da pessoa citada, excepções que são de conhecimento oficioso.
5 — Conforme supra referido, o recorrente não põe em causa a caducidade do direito de o executado deduzir oposição, pelo decurso do prazo de oposição.
6 — No entanto, a extinção desse direito de deduzir oposição não obsta à possibilidade de exercer outro direito processual, que é o de suscitar a apreciação pelo órgão de execução fiscal das questões de conhecimento oficioso, mas com os efeitos próprios do uso deste meio processual e não com os efeitos que teria a invocação tempestiva desses fundamentos em oposição.
7 — O conhecimento da prescrição e da caducidade de liquidação do direito pelo órgão de execução fiscal pode ser feito a todo o tempo, oficiosamente ou a requerimento do contribuinte, nos termos dos arts. 175º e 276° do CPPT — Vide Acórdão do STA, de 18/02/2010, processo n°01087/09, in www.dgsi.pt.
8 — Assim e nos termos do artigo 97°, nº 3 da LGT e do artigo 98°, nº 4 do CPPT, sempre que o meio processual usado não for adequado segundo a lei, deverá ser ordenada a sua correcção ou convolação naquele que for o mais adequado.
9 — A convolação deverá ser admitida sempre que não seja manifesta a improcedência ou intempestividade do meio processual para que se convola.
10 — Assim, a oposição à penhora de bens, onde se alegue a questão da prescrição da dívida e da caducidade do direito de liquidação, ainda que extemporânea, deverá ser convolada em requerimento ao órgão de execução fiscal para que aprecie aquelas excepções, por serem questões de conhecimento oficioso.
11 — Pelo que, a douta sentença recorrida violou o princípio da celeridade da justiça tributária e aproveitamento da peça processual ao meio processual mais adequado (art° 97°, nº 3 da LGT e art° 98°, nº 4 do CPPT), ao rejeitar liminarmente a oposição em lugar de ordenar a sua remessa ao Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social de Vila Real onde corre termos a execução fiscal, para aí serem apreciadas as aludidas excepções de conhecimento oficioso.
12 — Assim não se tendo entendido e decidido, não se fez a melhor e mais correcta interpretação e aplicação ao caso sub judice das pertinentes disposições legais, nomeadamente, os arts. 175°, 276° e 98°, nº 4, todos do CPPT e art. 97°, nº 3 da LGT.

1.2. Não houve contra-alegações.
1.3. O Ministério Público emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso, por não haver condições para se convolar a acção de oposição noutra forma processual, dado serem vários os fundamentos invocados.

2. A decisão recorrida deu como assente os seguintes factos:

a) O oponente apresentou a petição inicial da oposição que consta de fls. 4 a 7, cujo teor aqui se dá por reproduzido;
b) O oponente foi citado para o FEF em 14/11/2008, data em que o próprio oponente assinou o aviso de recepção da citação (fls. 51 a 56 do apenso);
c) O oponente foi notificado da penhora do veículo em 27/7/2010 (fls. 43 a 45 e confissão do oponente).
d) A oposição foi apresentada em 30/9/10 (fls. 4 e 47 e confissão do oponente do requerimento de fls. 47).


3. O recorrente moveu uma acção de oposição à execução fiscal por dívidas de contribuições à segurança social, alegando como causa de pedir (i) a caducidade do direito de liquidação, por ter sido notificado como revertido em 27/7/2010, sendo as dívidas dos anos de 2002, 2003 e 2004, (ii) a prescrição da dívida exequenda, porque o prazo de prescrição, que é de cinco anos, interrompeu-se com a notificação para audiência prévia ocorrida em 4/8/2008, tendo o processo ficado parado por mais de um ano, o que levou a que já se tivesse ultrapassado aquele prazo, (iii) ilegitimidade da pessoa citada, por não ser o gerente de facto e de direito no período a que respeitam as dívidas.
A sentença recorrida indeferiu liminarmente a oposição, por intempestividade, dado se constatar que a acção foi introduzida em juízo em 30/9/2010, tendo o oponente sido citado em 14/11/2008, ou seja, muito para além do prazo de 30 dias previsto no artigo 203º do CPPT.
O recorrente, sem contesta a caducidade do direito de deduzir a oposição, considera ter havido erro de julgamento, porque a sentença deveria ter “convolado” a oposição em “requerimento” ao órgão de execução fiscal, uma vez que os fundamentos invocados são de conhecimento oficioso.
Não põe em causa a caducidade do direito de o executado deduzir oposição, pelo decurso do prazo de oposição, mas defende que “a extinção desse direito de deduzir oposição não obsta à possibilidade de exercer outro direito processual, que é o de suscitar a apreciação pelo órgão de execução fiscal das questões de conhecimento oficioso, mas com os efeitos próprios do uso deste meio processual e não com os efeitos que teria a invocação tempestiva desses fundamentos em oposição” (conclusão nº 6).
Todavia, não há qualquer erro de julgamento, porque não é possível efectuar a pretendida convolação.
Em primeiro lugar, o recorrente não foi claro na identificação do meio processual que pretendeu utilizar. Por um lado, refere-se sempre em «oposição à penhora», mas por outro, indica como fundamentos da pretensão as alíneas d), e) e i) do nº 1 do artigo 204º do CPPT. Ora, enquanto a forma processual «oposição» está prevista para a execução, para o acto de penhora está prevista a «reclamação» do artigo 276º e ss do CPPT. Se pretendia imputar as ilegalidades que invocou ao acto de penhora, então há erro no meio processual escolhido, pois só através do processo de reclamação prevista naqueles artigos, e não através da oposição, poderia obter a pretensão de anular a penhora.
Mas considerando os fundamentos alegados, não se pode dizer que o oponente escolheu uma forma processual errada para o tipo de providência requerida. A sua pretensão é a extinção da execução fiscal com fundamento na caducidade da liquidação, na prescrição da dívida e na ilegitimidade da pessoa citada, e o esquema processual que a lei fixa para a fazer valer em juízo é a oposição prevista nos artigos 203º a 213º do CPPT. Ora, se à tutela jurisdicional concretamente requerida corresponde a forma processual chamada «oposição», não há que convolar ou transformar essa tutela numa tutela de natureza diferente, para lhe fazer corresponder um meio processual mais adequado. A «convolação de processos» referida no nº 3 do artigo 97º da LGT e nº 4 do artigo 98º do CPPT tem como pressuposto que tenha havido erro na forma de processo escolhida. Como a forma processual escolhida mostra-se adequada à natureza dos fundamentos que servem de base à pretensão, não há que submeter a apreciação dessa pretensão a uma tramitação diferente.
Se a pretensão fosse a anulação do acto de penhora, naturalmente que haveria erro na forma de processo. Mas nesse caso, como ficou bem esclarecido na sentença recorrida, não se pode convolar a oposição em reclamação, dada a intempestividade do uso deste processo incidental. Para além de não haver fundamentos que sustentassem a ilegalidade do acto de penhora, designadamente os referidos nas alíneas do nº 3 do artigo 278º do CPPT, a petição inicial foi apresentada decorridos mais de 10 dias sobre a data da notificação da penhora: a notificação desse acto ocorreu em 27/7/2010 e a oposição deu entrada em 30/9/2010.
Em segundo lugar, relativamente aos fundamentos de conhecimento oficioso pelo órgão de execução, como é o caso da prescrição, até se poderia defender, como se vê em alguma jurisprudência, a convolação da forma de processo «oposição», num acto processual da execução fiscal, como é o caso de um «requerimento». A maior latitude do sentido da norma do nº 3 do artigo 97º da LGT relativamente à norma do nº 4 do artigo 98º do CPPT, aponta no sentido da «convolação» do processo abranger também as correcções processuais que se traduzam na transformação de uma forma do processo num acto processual, pelo menos nas situações em que processo de execução se encontra no tribunal.
Simplesmente, se o tribunal não pode conhecer desses fundamentos, incluindo mesmo a questão de saber se alguns deles são ou não de conhecimento oficioso, pois a oposição é intempestiva, também o órgão de execução não pode decidir se a execução se deve extinguir por caducidade do direito de liquidação e por ilegitimidade da pessoa citada. A pretensão do oponente não tem como único fundamento a prescrição, para a qual o órgão de execução está legitimado a conhecer (art. 175º do CPPT), mas inclui também causas extintivas cujo conhecimento estão fora do seu alcance. Justificando-se a convolação em razões de economia processual, não se pode determinar a correcção da forma adequada quando logo se vislumbra que nessa forma não é impossível apreciar todas as causas em que se baseia o pedido formulado. A cumulação ilegal de causas de pedir constitui assim um obstáculo ao conhecimento pelo órgão de execução do pedido de extinção da execução, o que inviabiliza a convolação.
Esta solução, que é a mais ajustada ao desenvolvimento normal da instância executiva, em nada prejudica o direito do executado em solicitar ao órgão de execução a declaração de prescrição da dívida exequenda. Na realidade, no caso da prescrição, podendo ser conhecida oficiosamente pelo órgão de execução fiscal (artigo 175.º do CPPT), sempre assistirá à recorrente a possibilidade de requerer a extinção da execução com esse fundamento, daí abrindo a possibilidade de reclamação para o tribunal no caso do pedido ser indeferido, nos termos do artigo 276.º do CPPT.


4. Pelo exposto, acordam em negar provimento ao recurso.
Custas pelo recorrente.
Lisboa, 18 de Junho de 2013. – Lino Ribeiro (relator) – Dulce Neto – Isabel Marques da Silva.