Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0947/12
Data do Acordão:10/31/2012
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ASCENSÃO LOPES
Descritores:CONTAGEM DE PRAZO
TERMO INICIAL
CADUCIDADE DO DIREITO DE IMPUGNAR
Sumário:1) – Tendo o contribuinte optado por deduzir reclamação graciosa contra o acto de liquidação, o prazo para o impugnar judicialmente deixa de se contar da data limite para pagamento voluntário do tributo, passando a relevar a data do indeferimento (expresso ou silente) dessa reclamação.
2) – Se é proferida decisão na reclamação, o reclamante dispõe de 15 dias, contados da notificação da decisão, para deduzir impugnação - nº 2 do art. 102.º do Código CPPT; Se não é proferida decisão, há que aguardar pela formação do acto tácito de indeferimento e impugná-lo no prazo de 90 dias contados desse acto silente - alínea d) do nº 1 do art. 102.º do CPPT.
3) – A regra da al. e) do artº 279º do Código Civil, que dispõe que “o prazo que termine em domingo ou dia feriado transfere-se para o primeiro dia útil; aos domingos e dias feriados são equiparadas as férias judiciais, se o acto sujeito a prazo tiver de ser praticado em juízo” não se aplica ao termo inicial da contagem do prazo de impugnação.
4) - Tendo o contribuinte deixado ultrapassar o prazo de 90 dias contado do acto silente, nos termos ditos em 3), o qual é um prazo peremptório e de caducidade, e não tendo havido decisão expressa da reclamação, é intempestiva a impugnação judicial deduzida contra o acto de liquidação
Nº Convencional:JSTA000P14801
Nº do Documento:SA2201210310947
Data de Entrada:09/14/2012
Recorrente:A......, SGPS
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: 1- Relatório
A………, SGPS com o NIPC ………, com os demais sinais dos autos veio impugnar judicialmente a revisão oficiosa do acto tributário de autoliquidação de IRC relativa ao exercício de 2007, após formação de indeferimento tácito da reclamação graciosa que oportunamente apresentara do mesmo acto tributário.

A petição de impugnação apresentada em 28/02/2012 foi indeferida liminarmente por extemporaneidade.
Não se conformando a ora recorrente dirigiu recurso para este STA no qual conclui do seguinte modo:
1a.- O prazo de impugnação judicial é um prazo substantivo e conta-se nos termos do art°. 279° do C.C. (art°. 20° do C.P.P.T.).
2a.- No dia 25 de novembro de 2011 (sexta-feira) formou-se a presunção do indeferimento tácito do pedido de revisão do ato tributário de autoliquidação do IRC relativo ao exercício de 2007, requerido pela recorrente em 25/05/2011 (art°. 57°, n°s. 1 e 5, da L.G.T.).
3a.- A recorrente dispunha de um prazo de 90 dias, contados a partir da formação da presunção do indeferimento tácito [art°. 102°, n° 1, al. d), do C.P.P.T.].
4a.- A formação da presunção do indeferimento tácito ocorreu no dia 25 de novembro de 2011, pelo que, atendendo ao disposto na al. b) do art°. 279° do C.C., o início da contagem do prazo de impugnação teria lugar no dia 26 de novembro de 2011 (sábado). Mas,
5a.- O início de um prazo para o exercício de um qualquer direito supõe que o titular o possa exercer desde esse momento e até ao seu termo. Na verdade,
6a.- Dizer-se que o prazo para o exercício de um direito se inicia, mas o titular do mesmo não o pode exercer a partir desse momento, é um absurdo. E,
7a.- Quando o intérprete, após a utilização das regras hermenêuticas, chegar a uma conclusão absurda, não deverá concluir pela consagração legislativa do absurdo, dado que deverá sempre presumir que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.
8a.- No caso 'subjudice' o Tribunal 'a quo' parece ter considerado que o início do prazo para a dedução da impugnação judicial teve lugar no dia 26 de novembro de 2011 (sábado), apesar da recorrente só no dia 28 de novembro de 2011 ter tido a possibilidade de apresentar a impugnação.
9a.- Com tal entendimento a recorrente não dispôs do prazo de 90 dias a que alude o art°. 102°, n° 1, do C.P.P.T. para deduzir a impugnação, mas apenas de 88 dias, tendo visto por isso o prazo legalmente fixado para o exercício do direito diminuído em dois dias.
10a.-Como a recorrente não pode ver diminuído o prazo legalmente fixado para o exercício do direito, o início da contagem do mesmo só teve lugar no dia 28 de novembro de 2011 - momento a partir do qual tinha a faculdade de, querendo, deduzir a impugnação.11a.- Foi com o propósito do titular do direito não ver reduzido o prazo legalmente estabelecido, que o legislador dispôs na al. e) do art°. 279° do C.C. que, terminando o prazo em domingo ou feriado, transfere-se para o primeiro dia útil. Assim,
12a.- Se essa é a "ratio" subjacente a tal preceito para o termo (final) do prazo, por identidade de razões sempre que por imperativo legal o início da contagem do prazo ocorrer em sábado, domingo ou feriado, esse início transferir-se-á para o primeiro dia útil, pois só desse modo se evitará que o prazo de impugnação fixado no art°. 102°, n° 1, al. d), do C.P.P.T. seja reduzido. Assim,
13a.- Iniciando-se a contagem do prazo de 90 dias para a impugnação no dia 28 de novembro de 2011, e, uma vez iniciada, a mesma é contínua e sem suspensões, o termo ocorreu no dia 25 de fevereiro de 2012 (sábado). Pelo que,
14a.- Por força do disposto no art°. 279°, al. e), do C.C., o termo transferiu-se para o primeiro dia útil seguinte, ou seja, 27 de fevereiro de 2012 - dia esse em que a recorrente apresentou a impugnação (estando por isso em tempo, contrariamente ao decidido).
15a.-Ao decidir de modo diverso o Tribunal 'a quo' incorreu em erro de interpretação e aplicação dos art°s. 20° e 102° do C.P.P.T. e do art°. 279° do C.C., os quais deverão ser interpretados nos termos preditos.
NESTES TERMOS, DEVE O PRESENTE RECURSO SER RECEBIDO, JULGADO PROCEDENTE E, POR VIA DISSO, SER PROFERIDO DOUTO ACÓRDÃO QUE REVOGUE A DECISÃO RECORRIDA E DECLARE QUE A IMPUGNAÇÃO A QUE SE REPORTAM OS PRESENTES AUTOS FOI INTENTADA EM TEMPO, INEXIS-TINDO A CADUCIDADE DO DIREITO DE AÇÃO.

Foram apresentadas contra-alegações com as seguintes conclusões:

A) Vêm as presentes contra-alegações do recurso da impugnante da sentença que indeferiu liminarmente a presente impugnação por verificação da caducidade do direito de a deduzir.
B) Está patente no despacho de 14-03-2012, transcrito e dado como reproduzido na sentença em análise que: "... Nos presentes autos vem interposta impugnação judicial do indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa de acto tributário apresentado no serviço de finanças em 25/05/2011 (...) no caso dos autos o prazo de seis meses após a apresentação do pedido ocorre no dia 25/11/2011;
nos termos da alínea d) do n°1 do art.° 102° do CPPT, a impugnação judicial deve ser intentada no prazo de 90 dias, a partir da formação da presunção de indeferimento tácito, contando-se este prazo nos termos do art.° 20° do CPPT; a impugnante intentou a presente impugnação no dia 27/02/2012, cfr. f/s. 2, sendo que o prazo de noventa dias terminou no dia 24 de Fevereiro, sexta-feira."
C) Sendo que a Fazenda Pública concorda na totalidade com tal decisão.
D) Presume-se o indeferimento das petições entradas na AT, nos termos do n°5 do art.° 57° da LGT, se não merecerem qualquer resposta no prazo de seis meses, pelo que tendo a impugnante apresentado pedido de revisão oficiosa, a 25-05-2011, deu-se a formação da presunção do seu indeferimento tácito a 25-11-2011.
E) O meio de reacção adequado perante este "acto silente" é, ao abrigo do art.° 102°, n° 1 alínea d) do CPPT, a impugnação judicial, no prazo de 90 dias a partir da formação da presunção de indeferimento tácito.
F) O prazo de impugnação judicial conta-se nos termos do art.° 279° do CC, ex vi art.° 20° do CPPT, sendo, por isso, contínuo, sem interrupções ou suspensões, não se incluindo na sua contagem o dia em que ocorreu o evento a partir do qual o prazo começa a correr, logo, na situação decidenda, o prazo começa a correr a 26-11-2011, Sábado.
G) É pretensão da recorrente que este se inicie apenas a 28-11-2011, Segunda-feira, segundo uma muito própria e sui generis interpretação da alínea e) do art.° 279° do CC.
H) Dispõe tal normativo que: "O prazo que termine em domingo ou dia feriado transfere-se para o primeiro dia útil." (sublinhado nosso), sendo claro que apenas se reporta ao terminus do prazo e não já ao seu início.
l) Tanto a doutrina, veja-se a anotação n° 2 ao art.° 102° do Código de Procedimento e Processo Tributário Anotado e Comentado de Jorge Lopes de Sousa, 6a edição - Volume II, como a Jurisprudência do STA, nomeadamente o vertido nos Acórdãos de 12-10-2012, processo n°0449/11, e de 28-03-2012, processo n°01147, apenas e só aplicam a alínea e) do art.° 279° do CC ao fim do prazo.
J) Sob pena de, se desconsiderarmos o fim-de-semana do início do prazo termos de desconsiderar também os demais, transformarmos o prazo substantivo de apresentação da impugnação, num prazo regulado pelo CPA, mormente no seu art.° 72° alínea b), o que não se nos afigura ser o escopo do legislador.
K) Não aproveita à impugnante, dada a natureza do prazo de impugnação, o art.° 145°, n° 5 do CPC, pelo que, também, por esse facto, a presente impugnação considerar-se-á extemporânea.
L) Visto estarmos perante um prazo peremptório de exercício de um direito, de caducidade e de conhecimento oficioso, por versar direitos indisponíveis quanto à Fazenda Pública, vide art.° 333° do CC, o seu decurso extingue o direito de impugnar, nos termos dos art.°s 145°, n° 3 do CPC, 298°, n° 2, 331°, n° 1 e 333° do CC.
M) Face ao exposto, entende a Fazenda Pública que não estamos perante qualquer erro de julgamento na sentença recorrida.
Razão pela qual, não deve ser dado provimento ao recurso apresentado pela impugnante, devendo manter-se a sentença recorrida com as legais consequências.

O Ministério Público junto do STA teve vista dos autos e emitiu o seguinte parecer:

Recurso interposto por A………, SGPS:
Defende a recorrente, com base na aplicação do disposto no art. 279.° do C.C., para que remete o art. 20.° n.° 1 do C.P.P.T., ser de entender que o prazo de impugnação tributária previsto no dito art. 102.° n.° 1 só é contar a partir do 1.° dia útil seguinte ao do prazo de indeferimento tácito, resultando, em seu entender, até absurdo que o mesmo se pudesse iniciar logo a partir desse dia, sendo o mesmo um sábado.
Nos termos do art. 57.° n.° 3 da L.G.T., prevê-se que em matéria tributária os prazos sejam contínuos, sendo de contar nos termos do C.C.
E, em face do disposto no art. 57.° n.° 5 da L.G.T., com o decurso do prazo previsto no n.° 1, previsto para a decisão do procedimento, previu-se mesmo ser de presumir o indeferimento, nomeadamente, para efeitos do decurso no prazo de impugnar.
Contudo, os termos do art. 279.° do C.C., referido especificamente como aplicável ao procedimento tributário, por força do referido art. 20.° n.° 1, são susceptíveis de ter levado a recorrente a entender erradamente em sentido contrário ao que defende.
Com efeito, esse art. 20.° n.° 1 foi originado no ao tempo previsto no art. 28.° n.° 2 da L.P.T.A. - Dec.-Lei n.° 267/85, de 16 de Julho, referindo ser as suas regras aplicáveis ao procedimento tributário e ao processo de impugnação.
Aliás, actualmente encontram-se previstas regras diferentes no art. 58.° do C.P.T.A., aplicáveis em procedimento administrativo quanto a prazos de impugnação.
Aliás, conforme expresso na al. b) do n.° 4 desta disposição legal, a apresentação de impugnação pode ser julgada ainda como tempestiva, mesmo entendendo-se estar decorrido o prazo previsto, desde que "se demonstre, com respeito pelo contraditório, que, no caso concreto " foi "tempestiva apresentação da petição ", segundo o "exigível a um cidadão normalmente diligente", nomeadamente, por "atraso desculpável, atendendo a ambiguidade do quadro normativo aplicável", conforme expresso na al. b) do seu n.° 4, a apresentação de impugnação possa ser julgada como tempestiva.
Jorge Lopes de Sousa, em C.P.P.T. anotado e comentado, 2011, Áreas, vol I, p. 281 e ss. defende ser possível a aplicação por analogia de tal disposição.
Acresce que não se detecta que tenha já sido proferida decisão, pelo S.T.A., especificamente sobre as disposições em causa, pois os acórdãos que foram citados na resposta apresentada pela F.P. apenas se pronunciaram sobre questões próximas ou paralelas.
Concluindo, parece não haver razões para considerar a impugnação apresentada dentro do prazo previsto no art. 102.° n.° 1 do C.P.P.T..
Contudo, coloca-se à consideração se é de entender ter ocorrido um atraso desculpável com a apresentação efectuada, no referido quadro legal para que naquela disposição se remete, e tal como foi a mesma entendida, questão de que é de conhecer, nos termos do previsto no art. 58.° n.° 4 do C.P.T.A., aplicável por analogia.

2- Mostram os autos que:
1) A petição de impugnação deu entrada no Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu via fax no dia 27/02/2012
2) Anteriormente a ora recorrente, em 25/05/2011, havia apresentado reclamação graciosa solicitando a revisão oficiosa do acto tributário de autoliquidação do IRC relativo a 2007.
3) Em 12/04/2012 o Mº Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu proferiu o seguinte despacho:
“Nos presentes autos vem interposta impugnação judicial do indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa de acto tributário apresentado no serviço de finanças em 25/05/2011, cfr. documento de fls. 40;
com o decurso do prazo de seis meses sem que a Administração se pronuncie, presume o indeferimento tácito da pretensão, artigo 57.°. nº 1 da LGT;
no caso dos autos o prazo de seis meses após a apresentação do pedido ocorre no dia 25/11/2011;
nos termos da alínea d), do n.° 1, do artigo 102.° do CPPT, a impugnação judicial deve ser intentada no prazo de 90 dias. a partir da formação da presunção de indeferimento tácito, contando-se este prazo nos termos do artigo 20.° do CPPT;
a Impugnante intentou a presente impugnação no dia 27/02/2012, cfr. fls.2, sendo que o prazo de noventa dias terminou no dia 24 de Fevereiro, sexta-feira.
Assim, afigura-se que à data de apresentação da impugnação havia caducado o direito de acção, pelo que, atento o disposto no artigo 3.° do CPC e por forma a evitar a prolação de decisões surpresa, notifique a Impugnante para, querendo, se pronunciar sobre a excepção de caducidade do direito de acção”.

4) Em 12/04/2012 foi proferido despacho de indeferimento liminar da petição do seguinte teor:
“APRECIAÇÃO LIMINAR:
Veio '"A………., SGPS, S.A" demais identificada nos autos, impugnar a liquidação de IRC do ano de 2007.
Por se afigurar a perspectiva da apreciação liminar foi a Impugnante instada a pronunciar-se, como decorre do despacho antecedente, com o seguinte teor:
"Nos presentes avios vem interposta impugnação judicial do indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa de acto tributário apresentado no serviço de finanças em 25/05/2011, cfr. documento de fls. 40;
com o decurso do prazo de seis meses sem que a Administração se pronuncie, presume o indeferimento tácito da pretensão, artigo 57.°, n.° 1 da I.GT;
no caso dos autos o prazo de seis meses após a apresentação do pedido ocorre no dia 25/11/2011; nos termos da alínea d), do n. ° 1. do artigo 102. ° do CPPT, a impugnação judicial deve ser intentada no prazo de 90 dias, a partir da formação da presunção de indeferimento tácito, contando-se este prazo nos termos do artigo 20, ° do CPPT;
a Impugnante intentou a presente impugnação no dia 27/02/2012, cfr. fls. 2. sendo que o prazo de noventa dias terminou no dia 24 de Fevereiro, sexta-feira.
Assim, afigura-se que à data de apresentação da impugnação havia caducado o direito de acção, pelo que, atento o disposto no artigo 3.° do CPC e por forma a evitar a prolação de decisões surpresa, notifique a Impugnante para, querendo, se pronunciar sobre a excepção de caducidade do direito de acção. "
Reagiu a Impugnante, a qual sem questionar a premissas factuais consignadas no transcrito despacho questionou a contagem inicial por entender que deve aplicar-se ao início do prazo o que se aplica quanto ao termo, ou seja o previsto na al. c) do artigo 279° do Código Civil. Neste caso concreto tendo-se o indeferimento tácito verificado no dia 25-05-2011, sexta feira, o início do prazo não deve entender-se como ocorrendo no dia 26 Sábado, mas tão só no dia 28, segunda feira, por ser o primeiro dia útil. Assim sendo os 90 dias atingir-se-iam em 26 de Fevereiro, Domingo (a Impugnante disse 25 Sábado o que para o caso é indiferente) podendo o acto ser praticado, tempestivamente, nos termos da al. e) da norma e diploma já referidos, no primeiro dia útil, o dia 27, segunda feira.
O labor argumentativo da Impugnante alicerçou-se também no entendimento de que a ratio da norma a que vimos aludindo tanto se aplica ao termo como ao início do prazo pois que o pretendido é que o prazo ocorra sempre que efectivamente, o acto possa ser praticado, ou seja nos dias em que a Secretaria judicial estiver em funcionamento.
Compreendendo o esforço na defesa do entendimento propugnado temos que ter presente que a referida argumentação para além de, no limite, poder criar dificuldades insuperáveis pois como compreendê-la relativamente a todos os Sábados. Domingos e feriados que decorrem ao longo do prazo e, por outro lado como ultrapassar a expressa redacção legal que fala apenas ''O prazo que termine...", não dizendo "o prazo que se inicie". Há ainda uma referência ao efectivo funcionamento das Secretaria judiciais que começa a ficar desajustado e que deverá levar à alteração da norma a que vimos aludindo pois as Partes têm a oportunidade de, via fax ou correio electrónico, remeter as suas peças independentemente do dia e hora de funcionamento daquelas. Veja-se o caso dos presentes autos em que a petição inicial foi remetida, via fax às 22hs32m. vide fls. 2 do processo físico, 1a folha da petição inicial.
A caducidade do direito de impugnar, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 493°, n° 1 e 3. 496°, ambos do Código de Processo Civil, 333° do Código Civil e 2 al. e) do CPPT, constitui excepção peremptória, de conhecimento oficioso. O seu conhecimento e, desde já se adianta, a sua procedência prejudica a análise de outras questões. O prazo para deduzir impugnação é de natureza substantiva, contínuo e contado de acordo com as regras do art. 279° do Código Civil (CC) e art.° 20° n.° 1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT). No sentido acabado de referir veja-se entre outros o Ac. do STA de 14-01-2004, in Proc. 01208/03 in WWW .dgsi.pt.
Como já supra se disse a Impugnante não questionou as premissas factuais consideradas no despacho que se transcreveu, pelo que aqui se dão por reproduzidas.

Resulta do vindo de referir que apesar da ponderação e análise que nos mereceu a argumentação da impugnante ela não permitiu alterar o entendimento que expressamos no despacho transcrito, ou seja a verificação da caducidade do direito de impugnar. Assim, sem necessidade de mais considerandos, indefiro liminarmente a impugnação por verificação da caducidade do direito de a deduzir.
Custas a cargo da Impugnante, pelo mínimo”.

DECIDINDO NESTE STA

A questão suscitada pela recorrente consiste em saber quando se inicia a contagem do prazo de impugnação no caso de a presunção do indeferimento tácito ocorrer num dia não útil ou o início do prazo ocorrer também em dia não útil. A saber: fim de semana (sábado ou domingo) ou dia feriado. Se no próprio dia da formação da presunção de indeferimento, se no 1º dia útil seguinte.
Sustenta a sua posição na ideia de que o início de um prazo para o exercício de um qualquer direito supõe que o titular o possa exercer desde esse momento e até ao seu termo o que não sucede no seu modo de ver quando o prazo se inicia num dia não útil.
Afigura-se-nos que não lhe assiste razão e que a decisão recorrida não só se sustenta em fundamentação consistente como até desmonta as dificuldades que a recorrente ergue em abono da sua tese.

A legislação que interessa para dirimir a dúvida suscitada é a seguinte:
alínea d) do nº 1 do art. 102.º do CPPT;
nº 2 do art. 102.º do CPPT.
artigo 57.º, nºs 1, 3 e 5 da LGT).
al. e) do artº 279º do Código Civil

Como se decidiu no acórdão deste STA de 12 de Outubro de 2011 tirado no recurso 0449/11, tendo a contribuinte optado por deduzir reclamação graciosa contra o acto tributário de liquidação, o prazo para o impugnar judicialmente deixa de se contar da data limite para pagamento voluntário do tributo, passando a relevar a data do indeferimento (expresso ou silente) dessa reclamação. Todavia, há que distinguir duas situações:
− se não for proferida decisão na reclamação, há que aguardar pela formação do acto tácito de indeferimento e a partir daí o reclamante dispõe do prazo de 90 dias, contados desse acto silente, para deduzir impugnação - alínea d) do nº 1 do art. 102.º do CPPT;
− se for proferida decisão na reclamação, o reclamante dispõe de 15 dias, contados da notificação dessa decisão, para deduzir impugnação - nº 2 do art. 102.º do CPPT.
No presente caso, não consta dos autos que até ao momento em que foi apresentada a impugnação tenha sido proferido qualquer acto expresso de indeferimento da reclamação, pelo que a impugnação apenas poderia ter por objecto a ficção desse indeferimento (acto tácito), que se formou com o decurso do prazo legal de decisão (seis meses, de harmonia com o disposto no artigo 57.º, nºs 1 e 5 da LGT).
E porque sem acto expresso se torna insustentável a instauração de impugnação, por carência de objecto, a presente impugnação estava inevitavelmente sujeita ao prazo de interposição previsto na alínea d) do n.º 1 do artigo 102.º do CPPT, isto é, ao prazo de 90 dias contados da exacta data da formação da presunção de indeferimento tácito, independentemente de ser dia útil ou não. Como se refere na sentença recorrida se fosse de desconsiderar o sábado em que se iniciou o decurso do prazo de 90 dias para impugnar então teríamos de desconsiderar todos os outros dias não úteis que se verificaram ao longo deste prazo. Também a regra da al. e) do artº 279º do Código Civil, que dispõe que o prazo que termine em domingo ou dia feriado se transfere para o primeiro dia útil e que aos domingos e dias feriados são equiparadas as férias judiciais, aplica-se, apenas, ao termo fixado para a prática de um acto em juízo como resulta expressamente do seu teor literal e não ao seu início.
Mostrando o probatório que a reclamação foi instaurada em 25/05/2011, cfr. documento de fls. 40, com o decurso do prazo de seis meses sem que a Administração se tenha pronunciado, presume-se o indeferimento tácito da pretensão, seis meses depois ou seja no dia 25/11/2011. Assim devendo a impugnação judicial ser intentada no prazo de 90 dias a partir desta última data, os quais se contam nos termos do artigo 20º do CPPT o prazo terminava em 24/02/2012 (sexta feira) e a impugnação só foi apresentada no dia 27/02/2012, cfr. fIs. 2.
Conclui-se, como se concluiu na decisão recorrida, que o prazo de 90 dias para impugnar terminava em 24/02/2012, sendo intempestiva a impugnação apresentada. Destacamos o acerto da mesma decisão quando rebate a tese da recorrente do seguinte modo:
“O labor argumentativo da Impugnante alicerçou-se também no entendimento de que a ratio da norma a que vimos aludindo tanto se aplica ao termo como ao início do prazo pois que o pretendido é que o prazo ocorra sempre que efectivamente, o acto possa ser praticado, ou seja nos dias em que a Secretaria judicial estiver em funcionamento.
Compreendendo o esforço na defesa do entendimento propugnado temos que ter presente que a referida argumentação para alem de, no limite, poder criar dificuldades insuperáveis pois como compreendê-la relativamente a todos os Sábados. Domingos e feriados que decorrem ao longo do prazo e, por outro lado como ultrapassar a expressa redacção legal que fala apenas ''O prazo que termine...", não dizendo "o prazo que se inicie". Há ainda uma referência ao efectivo funcionamento das Secretarias judiciais que começa a ficar desajustado e que deverá levar à alteração da norma a que vimos aludindo pois as Partes têm a oportunidade de, via fax ou correio electrónico, remeter as suas peças independentemente do dia e hora de funcionamento daquelas. Veja-se o caso dos presentes autos em que a petição inicial foi remetida, via fax às 22hs32m. vide fls. 2 do processo físico, 1a folha da petição inicial”.

É certo que no caso de vir a ser proferido acto expresso de indeferimento da reclamação, o contribuinte pode ainda deduzir impugnação judicial no prazo de 15 dias contados da notificação desse indeferimento, em conformidade com o disposto no artigo 102.º nº 2 do CPPT. Todavia, até lá, não poderá apresentar impugnação judicial, não só por carência de objecto (falta de acto expresso impugnável) como por esse prazo pressupor, necessariamente, um acto de notificação, que constitui o termo inicial do prazo de 15 dias para deduzir impugnação e sem o qual o prazo não pode principiar. De outro modo estaria o Recorrente a obter um alargamento artificioso do prazo de dedução de impugnação, sem qualquer previsão para o seu terminus.
Na consideração de que:
O prazo para deduzir impugnação é de natureza substantiva, contínuo e contado de acordo com as regras do art. 279° do Código Civil (CC) e art.° 20° n.° 1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).
A caducidade do direito de impugnar, constitui excepção peremptória, de conhecimento oficioso, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 493°, n° 1 e 3, 496°, ambos do Código de Processo Civil, 333° do Código Civil e 2 al. e) do CPPT.
Somos a concluir que improcedem, todas as conclusões da alegação do presente recurso sendo de confirmar a decisão recorrida. Anota-se, ainda, que não foi alegado qualquer justo impedimento susceptível de fazer alterar a posição supra assumida por este Tribunal.
Preparando a decisão alinhamos as seguintes proposições:
1) – Tendo o contribuinte optado por deduzir reclamação graciosa contra o acto de liquidação, o prazo para o impugnar judicialmente deixa de se contar da data limite para pagamento voluntário do tributo, passando a relevar a data do indeferimento (expresso ou silente) dessa reclamação.

2) – Se é proferida decisão na reclamação, o reclamante dispõe de 15 dias, contados da notificação da decisão, para deduzir impugnação - nº 2 do art. 102.º do Código CPPT; Se não é proferida decisão, há que aguardar pela formação do acto tácito de indeferimento e impugná-lo no prazo de 90 dias contados desse acto silente - alínea d) do nº 1 do art. 102.º do CPPT.

3) – A regra da al. e) do artº 279º do Código Civil, que dispõe que “o prazo que termine em domingo ou dia feriado transfere-se para o primeiro dia útil; aos domingos e dias feriados são equiparadas as férias judiciais, se o acto sujeito a prazo tiver de ser praticado em juízo” não se aplica ao termo inicial da contagem do prazo de impugnação.

4) Tendo o contribuinte deixado ultrapassar o prazo de 90 dias contado do acto silente, nos termos ditos em 3), o qual é um prazo peremptório e de caducidade, e não tendo havido decisão expressa da reclamação, é intempestiva a impugnação judicial deduzida contra o acto de liquidação.

4. DECISÃO:

Termos em que, face ao exposto, acordam os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso.

Custas a cargo da Recorrente.

Lisboa, 31 de Outubro de 2012. - Ascensão Lopes (relator) - Pedro Delgado - Casimiro Gonçalves.