Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0668/19.4BESNT
Data do Acordão:02/06/2020
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:CARLOS CARVALHO
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
APRECIAÇÃO PRELIMINAR
INCOMPETÊNCIA EM RAZÃO DO TERRITÓRIO
IMPUGNAÇÃO
NÃO ADMISSÃO DO RECURSO
Sumário:Não se justifica admitir o recurso de revista de acórdão do TCA que decidiu não admitir o requerimento de interposição de recurso dirigido a decisão de TAF que declarara ser territorialmente incompetente para conhecer de ação administrativa por esta decisão ser impugnável apenas através de reclamação para o Presidente do TCA respetivo e não através de recurso de apelação, dado que manifestamente não se descortina um qualquer problema com relevância social e jurídica ou que o mesmo se mostre complexo, nem que o seu tratamento e enquadramento tenha suscitado dúvidas ao nível da jurisprudência ou da doutrina ou se mostre necessário para uma melhor aplicação do direito.
Nº Convencional:JSTA000P25557
Nº do Documento:SA1202002060668/19
Data de Entrada:01/20/2020
Recorrente:A............, SOCIEDADE UNIPESSOAL, LDA.
Recorrido 1:SERVIÇO DE SAÚDE DA REGIÃO AUTÓNOMA DA MADEIRA, EPE
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em apreciação preliminar, na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:

1. «A…………, SOCIEDADE UNIPESSOAL, LDA», invocando o disposto no art. 150.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos [CPTA], peticiona a admissão do recurso de revista por si interposto do acórdão de 24.10.2019 do Tribunal Central Administrativo Sul [doravante «TCA/S»] [cfr. fls. 859/867 - paginação «SITAF» tal como as ulteriores referências à mesma, salvo expressa indicação em contrário], que decidiu «não admitir, por irrecorribilidade da decisão impugnada, o requerimento de interposição de recurso jurisdicional» dirigido à sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra [doravante «TAF/S»] nos autos de intimação para a prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões deduzidos contra «SESARAM - SERVIÇO DE SAÚDE DA REGIÃO AUTÓNOMA DA MADEIRA, EPE», e que havia julgado «procedente a exceção de incompetência do tribunal em razão do território» e, em consequência, determinado «a remessa do processo para o Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal».

2. Motiva a admissão do recurso de revista [cfr. fls. 875/912] na relevância jurídica do objeto de litígio e, bem assim, a necessidade de «uma melhor aplicação do direito», enunciando como questões a apreciar e que se mostram incorretamente julgadas a aplicação feita no acórdão sob recurso da solução prevista no art. 105.º, n.º 4, do CPC/2013 definindo a reclamação para o Presidente do TCA e não o recurso jurisdicional ao abrigo do disposto no art. 142.º, n.º 3, al. b), do CPTA como meio de impugnação das decisões de incompetência territorial proferidas pelos tribunais administrativos.

3. Não foram produzidas contra-alegações em sede de recurso de revista [cfr. fls. 916 e segs.].
Apreciando:

4. Dispõe-se no n.º 1 do art. 150.º do CPTA que «[d]as decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excecionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito».

5. Do referido preceito extrai-se, assim, que as decisões proferidas pelos TCA’s no uso dos poderes conferidos pelo art. 149.º do CPTA, conhecendo em segundo grau de jurisdição, não são, em regra, suscetíveis de recurso ordinário, dado a sua admissibilidade apenas poder ter lugar quando: i) esteja em causa apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, revista de importância fundamental; ou, ii) o recurso revelar ser claramente necessário para uma melhor aplicação do direito.

6. Como vimos o «TAF/S» julgou-se incompetente em razão do território [cfr. fls. 631/637] e dessa decisão a aqui Recorrente, inconformada, interpôs recurso jurisdicional dirigido ao «TCA/S» o qual não admitiu «por irrecorribilidade da decisão impugnada», o referido requerimento de interposição de recurso, para o efeito sustentando que a «decisão que declara a incompetência territorial do tribunal para conhecer de ação administrativa não admite recurso jurisdicional, apenas sendo impugnável através de reclamação para o Presidente do TCA respetivo (cfr. art. 105.º, n.º 4, do CPC)», sendo que, in casu, não se mostrava possível «convolar o requerimento de interposição do recurso jurisdicional em reclamação» visto tal requerimento não ter dado «entrada dentro do prazo da reclamação, o qual é de 10 dias (cfr. art. 29.º, n.º 1, do CPTA)».

7. A alegação expendida pela recorrente não se mostra persuasiva, tudo apontando, presentes o quadro normativo em crise e os contornos do caso sub specie, no sentido de que o acórdão sob recurso decidiu com acerto, mostrando-se o seu julgamento assente numa plausível fundamentação jurídica do mesmo quadro normativo e da devida concatenação/articulação entre CPC e CPTA e do que são na economia de meios e de procedimentos as de formas de reação conferidas às partes.

8. Com efeito, importa notar que, por um lado, na previsão da al. d) do n.º 3 do art. 142.º do CPTA estamos em face de decisões que põem «termo ao processo sem se pronunciarem sobre o mérito da causa», o que envolve juízos de procedência de questões que obstem ao conhecimento do objeto do processo, designadamente as decisões que declarem a absolvição da instância por qualquer dos fundamentos indicados no art. 89.º do CPTA ou qualquer outro que resulte da lei processual civil, situações em que não se insere a decisão de incompetência em razão do território que conduz tão-só à remessa dos autos para o tribunal competente [cfr. art. 14.º do CPTA] e que, por outro lado, a regra inserta no n.º 4 do art. 105.º do CPC constitui uma das alterações introduzidas pela Lei n.º 41/2013 ao CPC visando a simplificação processual e a tomada de decisões mais céleres nesta matéria, constando da «Exposição de Motivos» do Projeto que à «semelhança do que está previsto para a resolução de conflitos de competência, estabelece-se que o meio impugnatório adequado para questionar a decisão que aprecie a competência relativa do Tribunal é, não a via de recurso, mas a reclamação para o presidente do tribunal superior, propiciando a resolução célere de todas as questões suscitadas, nomeadamente, em sede fixação da competência territorial».

9. De notar que não se revela, verdadeiramente, um problema jurídico complexo, tanto mais que a sua solução não envolve a aplicação e concatenação de diversos e intrincados regimes legais e institutos jurídicos, nem o seu tratamento e enquadramento geral tem suscitado dúvidas ao nível da jurisprudência [mormente, a dos TCA’s que se mostra disponibilizada nas bases jurídicas-documentais] ou da doutrina [cfr., entre outros, João Correia, Paulo Pimenta e Sérgio Castanheira, in: «Introdução ao Estudo e à Aplicação do Código de Processo Civil de 2013», pág. 29; Paulo R. Faria e Ana Luísa Loureiro, in: «Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil», vol. I (2013), pág. 116] que se tem sido produzidas.

10. Por fim e em termos das consequências que derivam do que foi decidido as mesmas reconduzem-se a o processo prosseguir noutro tribunal, sem que daí decorram quaisquer restrições ou prejuízos em sede de tutela jurisdicional da e para a aqui Recorrente.

11. Assim, tudo conflui para a conclusão de que a presente revista mostra-se inviável, não se justificando submetê-la à análise deste Supremo, impondo-se in casu a valia da regra da excecionalidade supra enunciada.

DECISÃO
Nestes termos e de harmonia com o disposto no art. 150.º do CPTA, acordam os juízes da formação de apreciação preliminar da Secção de Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal em não admitir a revista.
Custas a cargo da recorrente. D.N..
Lisboa, 6 de fevereiro de 2020. – Carlos Carvalho (relator) – Teresa de Sousa – Madeira dos Santos.