Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0486/11
Data do Acordão:06/02/2011
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:ROSENDO JOSÉ
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
PRESSUPOSTOS
Sumário:I - A interpretação do artigo 11º da Portaria n.º 799-B/2000, de 20 de Setembro, em conjugação com os artigos 27º e 29º do Decreto Regulamentar n.º 12-A/2000, de 15 de Setembro, de modo a esclarecer o que deve entender-se como “despesa efectuada e paga”, tendo em conta o limite temporal de 45 dias a que alude o primeiro diploma citado, coloca um problema de uniformidade no tratamento de questões semelhantes que pode repetir-se no âmbito da apresentação do saldo final das acções de formação profissional financiadas pelo Fundo Social Europeu.
II - A referenciada questão jurídica pode, eventualmente, envolver também a hierarquização das fontes normativas, no confronto dos diplomas apontados com o preceituado no Plano Oficial de Contabilidade, na legislação civil e fiscal, (alínea a) do n.º 1 do artigo 3º e alínea b) do n.º 1 do artigo 115º, ambos do CIRS, no n.º 1 do artigo 787º do Código Civil e nos n.º 1 e 2 do artigo 117º do Código das Sociedades Comerciais e alínea b) do n.º 1 do artigo 28º do CIVA, pelo que se considera justificada a admissão da revista, de modo a fazer intervir o órgão regulador do sistema de justiça administrativa com vista a uma melhor aplicação do direito.
Nº Convencional:JSTA000P12976
Nº do Documento:SA1201106020486
Recorrente:A...
Recorrido 1:MTSS E OUTRO
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Formação de Apreciação Preliminar
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do STA:
I – Relatório:
A…, Lda.,
intentou junto do TAF do Porto acção administrativa especial contra
MINISTÉRIO DO TRABALHO E DA SOLIDARIEDADE SOCIAL,
SECRETARIA DE ESTADO DO EMPREGO E FORMAÇÃO PROFISSIONAL,
GESTOR DA INTERVENÇÃO OPERACIONAL REGIONAL DO NORTE,
em que pediu a anulação do acto de 21/11/2006, do GESTOR DA INTERVENÇÃO OPERACIONAL REGIONAL DO NORTE, relativo ao pagamento de saldo final do financiamento n.º 1004, referente à medida 3.3, na parte em que considerou não elegíveis despesas efectuadas com formadores – Rubrica R2 -, no âmbito das acções de formação realizadas, e ainda a condenação da R. à adopção dos actos operacionais necessários para reconstituir a situação que existiria se o acto impugnado não tivesse sido praticado e, em consequência, reembolsar o A. da quantia de Euros 15.366,00.
Por Acórdão de 24/04/2009 o TAF concedeu provimento parcial à acção e anulou o acto impugnado, condenando a R. a emitir novo acto expurgado da ilegalidade.
Inconformados, os RR. interpuseram recurso jurisdicional para o TCA Norte que, por Acórdão de 10/12/2010, concedeu provimento ao recurso, revogou a decisão recorrida e julgou totalmente improcedente a acção.
É deste Acórdão que, nos termos do artigo 150º n.º 1 do CPTA, a A…, Lda. pede a admissão recurso de revista.
Para o efeito alega, em síntese:
a) O Acórdão recorrido incorre em erro de interpretação e aplicação da lei substantiva, confundindo elegibilidade de despesa e direito a reembolso;
b) A questão que se pretende ver esclarecida reconduz-se “(…) a saber se os pagamentos elegíveis feitos pelas entidades beneficiárias de financiamento ao abrigo do disposto no Decreto - Regulamentar n.º 12-A/2000, de 15 de Setembro e Portaria n.º 799-B/2000, de 20 de Setembro, devem ou não coincidir com a data de emissão dos respectivos recibos e se as despesas efectivamente realizadas, no período que decorre entre os 60 dias anteriores à data de apresentação do pedido de financiamento e o da data de apresentação do saldo final, são ou não reembolsáveis?”
O MINISTÉRIO DO TRABALHO E DA SOLIDARIEDADE SOCIAL, e a AUTORIDADE DE GESTÃO DO PROGRAMA OPERACIONAL REGIONAL DO NORTE, apresentaram contra-alegações nas quais pugnam, em síntese, pela não admissão do recurso, por não se verificarem os respectivos pressupostos legais e, quanto ao mais, pela manutenção da decisão recorrida.
Nos termos do n.º 5 do artigo 150º do CPTA, compete a esta formação averiguar se se verificam os pressupostos legais de que depende a admissão do recurso de revista nos termos do n.º 1 do da mesma norma.
II - Apreciação. Os Pressupostos da Revista.
O recurso de revista de decisões proferidas pelos TCA em segunda instância, terceira apreciação jurisdicional de uma causa administrativa, é rejeitado, como regra, pela lei de processo (CPTA), embora seja permitido, a título excepcional, que o STA admita esta terceira apreciação em recurso relativo a matéria de direito, exclusivamente naqueles casos em que estejam reunidos certos pressupostos que a lei (art.º 150.º n.º 1 do CPTA) aponta como índices de que a causa tem uma relevância superior ao comum. Tais pressupostos respeitam à natureza das questões sobre as quais versa o litígio, que devem atingir um grau de importância fundamental, de uma perspectiva jurídica ou social, ou mostrar-se claramente necessária a intervenção do STA para uma melhor aplicação do direito.
Assim, é mantido e aprofundado o princípio da apreciação jurisdicional das causas administrativas, como regra, apenas em duas instâncias. Na consecução deste objectivo concorrem com o disposto no art.º 150.º do CPTA, a previsão de revista “per saltum” do artigo 151.º, e a transformação do recurso para uniformização de jurisprudência num recurso do tipo acção revisiva, a ser interposto após o trânsito em julgado da decisão recorrida.
Na concretização dos conceitos relativamente indeterminados que a lei estabelece como orientação para a filtragem dos recursos de revista a admitir excepcionalmente, o STA tem vindo a entender que a relevância jurídica fundamental exigida pelo artigo 150º n.º 1 do CPTA se verifica, designadamente, quando a questão a apreciar seja de complexidade superior ao comum em razão da dificuldade das operações exegéticas a efectuar, de enquadramento normativo especialmente complexo, de ser necessário compatibilizar diferentes regimes potencialmente aplicáveis, bem como casos em que a questão se reveste de novidade, e relativamente à qual não tenha havido oportunidade de o STA se pronunciar.
Sobre a apreciação da relevância social fundamental, o STA tem entendido que este requisito se verifica, designadamente, nas situações em que esteja em causa questão que revele especial capacidade de repercussão no tecido social, ou expansão do interesse orientador da intervenção do Supremo relativamente a futuros casos análogos ou do mesmo tipo, ou seja, em que a utilidade da decisão extravasa os limites do caso concreto das partes envolvidas no litígio.
A admissão de revista para melhor aplicação do direito terá lugar, designadamente quando, em face das características do caso concreto, ele revele seguramente a possibilidade de ser visto como um tipo, contendo uma questão bem caracterizada passível de se repetir em casos futuros, e cuja decisão nas instâncias suscita fundadas dúvidas, nomeadamente por se verificar divisão de correntes jurisprudenciais ou doutrinais, sendo reconhecida ou previsível incerteza e instabilidade na resolução daqueles litígios, razões para se antever como objectivamente útil a intervenção do STA na qualidade de órgão de regulação do sistema, ou seja, com a finalidade conseguir o bom funcionamento do contencioso administrativo.
Vejamos, à luz desta orientação, se no presente caso estão preenchidos os pressupostos de que depende a admissão desta espécie.
Para o efeito, importa ter em conta alguns aspectos que resultam da matéria de facto dada por assente. Assim:
- A Recorrente apresentou candidatura ao Plano de Formação no âmbito do Programa Operacional da Região Norte – medida 3.3 – Promoção da Empregabilidade e do Emprego ao Nível Local, inserido nas Acções – Tipo 3.3.1.1 – Qualificação Profissional com Progressão Escolar e 3.3.1.4 – Especialização Profissional de Quadros Superiores, na qual solicitou o montante de Euros 1.414.294, 98.
- A candidatura foi aprovada, no montante de Euros 865.619,91, por decisão do Senhor Secretário de Estado Adjunto e do Trabalho, em 4/03/2005.
- Em 15/09/2006 a recorrente remeteu à estrutura de Apoio Técnico da Intervenção Sectorial Desconcentrada e do Emprego, Formação e Desenvolvimento Social, o pedido de pagamento de saldo final, no montante de Euros 641.165,70.
- Da análise desse pedido a entidade administrativa considerou não elegível, e portanto não reembolsável, o montante de Euros 16.362,75, referente a pagamentos da prestação de serviços dos formadores.
- A recorrente exerceu o direito de resposta e, em 21/11/2006 o Senhor Gestor da Intervenção Operacional Regional do Norte emitiu despacho em que aprovou o pedido de pagamento efectuado pela recorrente, mas reduzido a Euros 621.494,46. A redução do montante aprovado para pagamento foi fundamentada, no essencial, da seguinte forma: “Atendendo a que a formação terminou a 2006/07/31 só são elegíveis as despesas pagas até 45 dias após, ou seja até 2006/09/14. Segundo o disposto no n.º 1 do artigo 11º da Portaria n.º 799-B/2000, de 20-09 os pedidos de pagamento de saldo final deverão ser apresentados nos 45 dias subsequentes à data de conclusão do projecto e constar de formulário próprio, acompanhado da listagem de despesas pagas (…). Não obstante, a entidade mencionar que as despesas, antes de receber o saldo final, já se iriam encontrar pagas, foi detectado que as transferências bancárias que ressarcem os formadores das suas dívidas só ocorreram após os 45 dias.”
Deste entendimento discorda a recorrente e sustenta que de acordo com o disposto no artigo 27º da Portaria n.º 799-B/2000, de 20 de Setembro, as entidades beneficiárias do financiamento têm direito ao reembolso das despesas efectuadas e pagas. Ficou provado nos autos que a despesa com os formadores no âmbito do plano de formação aprovado e financiado, foi efectivamente realizada, pois os citados formadores prestaram serviços até 31/07/2006 e os recibos respeitantes a tais serviços foram emitidos e entregues em data anterior a 14/09/2006, como reconheceu a Administração na informação que suportou o acto impugnado. No entanto, o acto impugnado considerou que a despesa em causa não era elegível para efeitos de reembolso, porquanto as transferências bancárias efectuadas pela recorrente para os formadores foram feitas após 14/09/2006 (em concreto realizaram-se um mês de pois) e assim, porque ultrapassaram os 45 dias a que alude o artigo 11º n.º 1 da Portaria 799-B/2000, de 20 de Setembro, não seriam reembolsadas.
Este é portanto o objecto do litígio: determinar se a despesa em que a recorrente incorreu para pagamento dos serviços prestados pelos formadores no âmbito da acção de formação aprovada pela entidade competente, deve ou não ser considerada como despesa paga, e portando reembolsável, à luz dos disposto no artigo 11º da Portaria n.º 799-B/2000, de 20 de Setembro, conjugada com o disposto nos artigos 27º e 29º do Decreto Regulamentar n.º 12-A/2000, de 15 de Setembro. Vejamos então o que determinam os preceitos legais citados:
Portaria n.º 799-B/2000, de 20 de Setembro
Artigo 11.º
Pedido de pagamento de saldo
1 - Os pedidos de pagamento de saldo final deverão ser apresentados nos 45 dias subsequentes à data de conclusão do projecto e constar de formulário próprio, acompanhado da listagem de despesas pagas referida na alínea b) do número anterior, referente ao período que medeia entre o último pedido de reembolso apresentado e o pedido de pagamento de saldo.
(…)
Decreto Regulamentar n.º 12-A/2000, de 15 de Setembro
Artigo 27.º
Financiamento das entidades titulares de pedido de financiamento
1 - A aceitação pelas entidades da decisão de aprovação do pedido de financiamento confere-lhes o direito à percepção de financiamento para a realização das respectivas acções.
2 - Sem prejuízo do disposto no artigo seguinte, as entidades têm direito, para cada pedido de financiamento, a:
a) Um adiantamento, logo que o projecto se inicie, de montante a definir no regulamento específico, tendo em conta, designadamente, o valor global do financiamento aprovado e o prazo de execução do projecto;
b) Para além do adiantamento previsto na alínea anterior, no caso de pedidos plurianuais, haverá lugar a mais um adiantamento por cada ano civil;
c) Ao reembolso das despesas efectuadas e pagas, com periodicidade mensal ou bimestral, desde que o somatório do adiantamento com os pagamentos intermédios de reembolso não exceda 85% do valor total aprovado.
d) Ao recebimento do saldo final, correspondente a 15% do montante total aprovado, nos termos constantes dos n.ºs 7, 8 e 9.
(…)
Elegibilidades
Artigo 29.º
Custos elegíveis
1 - Consideram-se custos elegíveis as despesas susceptíveis de financiamento nos termos da legislação comunitária e nacional relativa ao FSE e admissíveis no âmbito das intervenções operacionais.
2 - Consideram-se como custos elegíveis, no âmbito de um pedido de financiamento, as despesas realizadas no período que decorre entre os 60 dias anteriores à data da apresentação do pedido de financiamento e o da data de apresentação do saldo. (Negrito nosso)
(…)
Este o enquadramento legal da questão que a recorrente pretende ver apreciada em recurso de revista. Vejamos como decidiram as instâncias.
O TAF deu razão à Recorrente, considerando que o montante em causa é custo elegível para efeitos de financiamento prévio, à luz do artigo 29º do Decreto Regulamentar n.º 12-A/2000, de 15 de Setembro, embora o dissídio respeite ao pedido de pagamento de saldo final, regulado pelo disposto no artigo 11º da Portaria n.º 799-B/2000. Para além disso o TAF considerou:
“ … à luz dos princípios e conceitos contabilísticos do Plano Oficial de Contabilidade, da legislação civil e fiscal, (alínea a) do n.º 1 do artigo 3º e alínea b) do n.º 1 do artigo 115º, ambos do CIRS, n.º 1 do artigo 787º do Código Civil, n.º 1 e 2 do artigo 117º do Código das Sociedades Comerciais e alínea b) do n.º 1 do artigo 28º do CIVA), o PAGAMENTO ocorre no ACTO DE APRESENTAÇÃO DO RECIBO que é a prova documental suficiente e bastante para suportar a quitação da dívida.
(…), considerando que não se mostra minimamente adquirida ou demonstrada que a entidade demandada tenha questionado a extemporaneidade na apresentação dos recibos apresentados pela Autora ( o que importa admissão tácita da tempestividade dos mesmos), perante o quadro legal traçado, somos a considerar que a entidade demandada, no tocante ao momento em que se deve considerar efectuado o pagamento de despesas, perfilhou um entendimento manifestamente contrário ao bloco legal aplicável.
Ao perfilhar entendimento contrário ao bloco legal aplicável, inquinou irremediavelmente o acto impugnado de VÍCIO DE VIOLAÇÃO DE LEI, o que importa a anulabilidade do mesmo.”
O TCA, procurou apoio no seu Acórdão anterior de 30/04/2009, Proc. n.º 01146/07.0BEBRG e concluiu assim:
“… os recibos das despesas que se pretendem elegíveis devem ser contemporâneos com o respectivo pagamento.
Ou seja, para que as despesas efectuadas pela entidade beneficiária do financiamento possam ser consideradas elegíveis para reembolso, o seu pagamento efectivo deve ocorrer, pelo menos, em data anterior ao do pedido do reembolso, se não antes, isto é, respeitando os prazos legalmente estabelecidos.
Na verdade, toda a argumentação expendida a propósito do pagamento por cheque serve-nos de linha orientadora para se poder chegar à conclusão de que o pagamento não pode nunca ocorrer em momento posterior ao da apresentação do respectivo pedido de reembolso, como foi o caso dos autos, independentemente da data em que foi emitido o recibo.
(…)
Ora, no caso dos autos o que se provou é que a recorrida só fez as transferências bancárias respeitantes aos recibos que apresentou para efeitos de financiamento em data posterior a essa apresentação, sendo certo, que estava na sua disponibilidade fazer, ou não, a transferência em momento anterior, não tendo o credor qualquer poder sobre o recebimento efectivo da quantia em momento anterior.
Não há aqui que fazer apelo às normas fiscais vertidas na decisão recorrida, uma vez que a legislação especial que regula esta matéria é clara em referir que os reembolsos só devem ocorrer relativamente àquelas despesas que anteriormente tenham sido efectivamente realizadas, considerando-se os meios de pagamento efectivamente utilizados pelo beneficiário do reembolso e que permitam ao credor entrar na posse imediata da quantia a que têm direito.”
Vejamos se a questão controvertida justifica a admissão do recurso excepcional do artigo 150º n.º 1 do CPTA.
A questão aqui colocada não recebe, por parte dos normativos legais aplicáveis directamente, uma resposta clara.
O financiamento do plano de formação aprovado pela autoridade administrativa competente para desenvolvimento dos programas de formação profissional encontra-se regulado pelo Decreto Regulamentar n.º 12-A/2000, de 15 de Setembro, o qual, de acordo com o disposto no seu artigo 1º, vem regular os apoios a conceder às acções a financiar pelo Fundo Social Europeu (FSE), designadamente no âmbito da formação profissional, da inserção no mercado de trabalho e dos apoios ao emprego. De acordo com o n.º 2 deste artigo 1º do diploma citado, as suas disposições aplicam-se, igualmente, “ (…) aos apoios a atribuir às acções que contribuam para a consecução dos objectivos das referidas no número anterior e se desenvolvam, nomeadamente, no contexto dos processos de promoção do acesso à qualificação, de acompanhamento pós-formação, de acompanhamento pós-colocação e de desenvolvimento de estudos e recursos didácticos.”
A questão jurídica controversa respeita à interpretação a conferir ao artigo 11º da Portaria citada, em conjugação com os artigos 27º e 29º do Decreto Regulamentar que disciplina a matéria, de modo a esclarecer o que deve entender-se como “despesa efectuada e paga”, tendo em conta o limite temporal de 45 dias a que alude a Portaria n.º 799-B/2000, de 20 de Setembro.
Na óptica da recorrente releva a data dos recibos emitidos pelos formadores, muito embora o concreto movimento bancário respectivo só se tenha efectuado depois do aludido prazo de 45 dias.
O recorrente tinha pedido informação junto da entidade administrativa competente, no sentido de esclarecer o que deveria ser entendido como despesa efectivamente paga, ainda que o movimento bancário viesse ocorrer após a respectiva apresentação junto da administração (cfr. doc. 1 junto ao articulado de revista). A resposta da administração foi (cfr. doc. 2 junto ao articulado de revista): “(…) a regulamentação sobre a matéria abordada na sua questão apenas obriga a que estejam compreendidas no período de elegibilidade a contabilização da factura e recibos relativos às despesas correspondentes às actividades financiadas e ocorridas nesse período, não relevando para efeitos de elegibilidade, o momento em que se efectue o respectivo movimento bancário, sendo o recibo (ou outro documento de quitação fiscalmente aceite) o documento comprovativo do pagamento de determinada quantia.
Deste modo, é entendimento deste instituto, de que deverá considerar-se efectivamente paga, e como tal elegível (…) a despesa cuja factura e recibo estejam contabilizados no período de elegibilidade.”
Esta informação teria sido prestada em consonância com as orientações do Senhor Presidente do Instituto de Gestão do Fundo Social Europeu, pelo ofício de 7/12/2006 (ref. N.º 55/2006/UCA), e ainda pelo ofício do I.E.F.P. 2983/IEFP – CD, de 7/12/2006 (junto com a p.i), em que se considera, à luz do Plano Oficial de Contas, que o pagamento ocorre no acto de apresentação do recibo.
Do exposto resulta que a interpretação que a Administração conferiu à parte do texto “despesas efectuadas e pagas” a que alude o artigo 11º da Portaria n.º 799-B/2000, de 20 de Setembro, coloca um problema de uniformidade no tratamento de questões semelhantes que pode repetir-se.
Importará também saber se o bloco de legalidade invocado pelo TAF para dar provimento à pretensão tem ou não um papel a desempenhar na interpretação da citada norma.
A questão pode, eventualmente, envolver também o problema de hierarquia das fontes normativas, no caso da Portaria n.º 799-B/2000, de 20 de Setembro e do Decreto Regulamentar n.º 12-A/2000, de 15 de Setembro, em confronto com o preceituado em diplomas como o Plano Oficial de Contabilidade, a legislação civil e fiscal, (alínea a) do n.º 1 do artigo 3º e alínea b) do n.º 1 do artigo 115º, ambos do CIRS, n.º 1 do artigo 787º do Código Civil, n.º 1 e 2 do artigo 117º do Código das Sociedades Comerciais e alínea b) do n.º 1 do artigo 28º do CIVA).
As regras sobre o apuramento da conta final de acções de formação devem ser claras e previsíveis de modo a tutelar a confiança dos agentes económicos e devem ser aplicadas de modo uniforme, garantindo igualdade de tratamento e regras limpas, capazes de assegurar a sã concorrência.
Pelo exposto é de considerar justificada a admissão da revista, de modo a fazer intervir o STA, enquanto regulador do sistema de justiça administrativa, para garantir uma melhor aplicação do direito.
III – Decisão:
Em conformidade com o exposto, nos termos do n.º 1 e n.º 5 do artigo 150º do CPTA, acordam em admitir a revista.
Custas pelo recorrente, digo, sem custas nesta fase.
Lisboa, 2 de Junho de 2011. – Rosendo Dias José (relator) – Pais Borges – Costa Reis.