Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0156/22.1BALSB
Data do Acordão:05/24/2023
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CT
Relator:NUNO BASTOS
Descritores:IRC
IVA
AJUDAS DE CUSTO
NÃO TOMAR CONHECIMENTO
MÉRITO
Sumário:I - Constitui pressuposto da apreciação do mérito do recurso a que alude o artigo 25.º, n.º 2 do RJAT a identidade substancial entre a situação de facto apreciada na decisão arbitral recorrida e a que foi apreciada na decisão que lhe é oposta;
II - Não há identidade substancial de situações de facto se, ao indagar se os gastos com determinadas ajudas de custo preenchem os requisitos para que a sua dedução seja admitida, a decisão arbitral recorrida apreciou uma situação em que não foi possível estabelecer a conexão entre essas despesas e a atividade da empresa e a decisão arbitral fundamento apreciou uma situação em que essa conexão existia.
Nº Convencional:JSTA000P31020
Nº do Documento:SAP202305240156/22
Data de Entrada:11/27/2022
Recorrente:A...., S.A.
Recorrido 1:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
1. Relatório

A... S.A., com o número de identificação fiscal ..., com sede no B..., Loja ...28, ... ..., veio, ao abrigo do disposto no artigo 25.º, n.º 2, do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro [doravante “RJAT”], na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 119/2019, de 18 de Setembro, interpor recurso para o Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo do acórdão arbitral proferido em 24 de outubro de 2022 no processo n.º 100/2022-T CAAD, que julgou improcedente o pedido de pronúncia arbitral apresentado pela ora Recorrente, com vista à obtenção da declaração de ilegalidade do ato de liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (“IRC”) n.º ...04 e do respectivo ato de liquidação de juros compensatórios n.º ...31, referentes ao exercício de 2017, do ato de liquidação adicional de IRC n.º ...68 e do respectivo ato de liquidação de juros compensatórios n.º ...90 e ...91, referentes ao exercício de 2018, e dos atos de liquidação de Imposto sobre o Valor Acrescentado (“IVA”) n.ºs ...22, ...31, ...66, ...76, ...99, ...08, ...13 e dos respetivos atos de liquidação de juros compensatórios n.ºs ...44, ...45, ...46, ...47, ...48, ...49 e ...50, invocando oposição entre o ali decidido e o acórdão arbitral, proferido no processo n.º 101/2022-T.

Com a interposição do recurso apresentou alegações e formulou as seguintes conclusões:

«(…)

1) Perante a questão fundamental de saber se os gastos em apreço reúnem os pressupostos legais de dedutibilidade fiscal do n.º 1 do artigo 23.º do Código do IRC, a decisão arbitral recorrida (processo n.º 100/2022- T) e a decisão arbitral fundamento (processo n.º 101/2022-T) pronunciaram-se em sentido oposto.

2) Enquanto a decisão arbitral recorrida se manifestou no sentido de que os gastos relativos às ajudas de custo e abonos de kms atribuídos pela Recorrente a título de deslocações entre estabelecimentos pertencentes a outras sociedades do Grupo C... e nesta sede contestados, não são dedutíveis para efeitos do n.º 1 do artigo 23.º do Código do IRC, a decisão arbitral fundamento firmou que os gastos relativos às ajudas de custo e abonos de kms atribuídos pela Recorrente a título de deslocações entre estabelecimentos pertencentes a outras sociedades do Grupo C..., reúnem os pressupostos legais do n.º 1 do artigo 23.º do Código do IRC e, portanto, são dedutíveis fiscalmente.

3) Neste sentido, e na ausência de alteração substancial da regulamentação jurídica aplicável, as decisões arbitrais em confronto chegam a conclusões contrárias quanto à mesma questão fundamental de direito, apenas por força de uma diferente interpretação jurídica da norma geral de aceitabilidade dos gastos, prevista no n.º 1 do artigo 23.º do Código do IRC.

4) Daí que se conclua pela admissão do presente recurso para uniformização de jurisprudência regulado no artigo 152.º do CPTA, por remissão dos n.ºs 2 e 3 do artigo 25.º do RJAT, e fundado na oposição sobre a mesma questão fundamental de direito entre a decisão arbitral recorrida proferida em 24 de Outubro de 2022 no processo n.º 100/2022-T, e a decisão arbitral fundamento de 30 de Setembro de 2022, proferida no processo n.º 101/2022-T.

5) Em relação às ajudas de custo e abonos de kms atribuídos aos seus funcionários por deslocações efectuadas a estabelecimentos comerciais de outras sociedades do Grupo C..., estão cumpridos os requisitos de dedutibilidade do n.º 1 do artigo 23.º do Código do IRC.

6) Atendendo ao exposto, é manifesta a ilegalidade dos actos de liquidação de IRC referentes aos períodos de tributação de 2017 e 2018 por erro na aplicação do direito.

7) Estes gastos têm um nexo causal com a obtenção dos rendimentos sujeitos a IRC, já que sem eles não é possível assegurar as condições necessárias ao normal desenvolvimento das actividades de salão de cabeleireiro e estética em cada um dos estabelecimentos comerciais da Recorrente.

8) Assim, estão reunidos os pressupostos legais da dedutibilidade de gastos do n.º 1 do artigo 23.º do Código do IRC.

9) Por todo o exposto, devem as referidas correcções ser julgadas ilegais e consequentemente anulados os actos de liquidação que as materializam.».

Concluiu pedindo fosse o recurso admitido, fosse anulada a decisão recorrida e fosse emitido acórdão que decidisse a questão controvertida nos termos peticionados, com a consequente anulação das liquidações adicionais de IRC e IVA, relativas a ajudas de custo atribuídas aos seus funcionários a título de deslocações efetuadas para estabelecimentos comerciais de outras sociedades do grupo e aos abonos de quilómetros atribuídos aos seus funcionários para compensação e deslocação em viatura própria para estabelecimentos de outras sociedades do grupo, no montante total de € 75.430,72, com todas as consequências legais.

O recurso foi admitido, com efeito suspensivo da decisão arbitral recorrida.

Foi cumprido o disposto no artigo 25.º, n.º 5, do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária.

A Recorrida apresentou contra-alegações, que condensou nas seguintes conclusões:

I. Em causa no presente recurso está a decisão arbitral proferida no processo n.º 100/2022-T que julgou parcialmente procedente o pedido de anulação parcial dos atos de liquidação de IRC e de IVA, e respetivos juros compensatórios, respeitantes aos períodos de tributação de 2017 e 2018.

II. A Recorrente entende que a decisão arbitral recorrida colide frontalmente com a decisão arbitral fundamento, proferida no processo n.º 101/2022-T, a qual se pronunciou sobre idênticas correções efetuadas na esfera jurídica de outra empresa do grupo C....

III. O presente recurso incide sobre as seguintes correções:

«a) Correcções referentes a gastos com ajudas de custo pagas a colaboradores pela deslocação a estabelecimentos de outras empresas do Grupo C... – € 24.849,00 e € 41.314,60 relativos aos períodos de tributação de 2017 e de 2018 respectivamente;

b) Correcções referentes a gastos com abono de kms pela deslocação a estabelecimentos de outras empresas do Grupo C... – € 3.850,20 e de € 5.416,92 – relativos aos períodos de tributação de 2017 e de 2018, respectivamente.».

IV. A fundamentação legal que sustenta a decisão arbitral nos segmentos decisórios objeto do presente recurso, a cujo teor se adere, revela uma adequada interpretação do disposto no n.º 1 do art.º 23.º do CIRC, porquanto a Recorrente não logrou demostrar a necessária conexão entre os custos declarados e a realização dos proveitos.

V. Como bem salienta a decisão recorrida, a Recorrente assumiu que os custos foram suportados para disponibilização de colaboradores a entidades terceiras e que tais custos não foram, no exercício fiscal a que dizem respeito, objeto de faturação intra-grupo.

VI. Tendo o Tribunal arbitral perfilhado o correto entendimento de que os factos relevantes em matéria de determinação da matéria coletável do IRC devem ser examinados na ótica do interesse empresarial individual de cada sociedade, sem atender aos interesses particulares dos sócios ou das demais entidades do Grupo.

VII. E quanto à faturação às outras empresas do grupo, no ano de 2021, dos serviços prestados em 2017 e 2018, bem entende a decisão recorrida que tal solução não poderia ter qualquer efeito fiscal, por violação do disposto no n.º 2 do art.º 18.º do CIRC.

VIII. Assim, bem andou o tribunal a quo quando decidiu manter a correção efetuada pela Inspeção Tributária atinente à não dedutibilidade fiscal dos gastos com ajudas de custo pagas a funcionários, que se deslocaram para prestarem serviço a outras sociedades do Grupo, sem a Requerente ser ressarcida desses gastos (por redébito) e sem ter tirado proveito próprio, por via de obtenção de rendimento, nos termos do n.º 1 do art.º 23.º do CIRC, por tais gastos terem sido incorridos para interesse alheio (das restantes sociedades do Grupo),

IX. De igual forma, bem decidiu o Tribunal arbitral quando determinou, com a mesma fundamentação legal, a manutenção da correção respeitante aos abonos atribuídos para compensação por deslocação em viatura própria para estabelecimentos comerciais pertencentes a outras sociedades do Grupo C....

X. Ao contrário da decisão fundamento que, com o devido respeito, ao decidir pela legalidade das correções em causa ignorou que os factos relevantes em matéria de determinação da matéria coletável do IRC devem ser examinados na ótica do interesse empresarial individual de cada sociedade, sem atender aos interesses particulares dos sócios ou das demais entidades do Grupo.

XI. A decisão fundamento ignorou que a Recorrente e as demais sociedades do Grupo são entidades jurídicas e económicas distintas, com obrigação de elaboração e apresentação de contas distintas e que, apesar das “relações de cooperação” existentes entre sociedades do Grupo, os resultados do alegado grupo de sociedades, nos exercícios de 2017 e 2018, não foram apurados, contabilisticamente, tendo em consideração a Consolidação de Contas, e fiscalmente, o Regime Especial de Tributação dos Grupos de Sociedades (RETGS).

XII. E mesmo no quadro da aplicação do RETGS, que in casu não foi adotado por opção da Recorrente, a lei não atribui ao grupo personalidade tributária e, também, no apuramento do imposto, a lógica do grupo não se reflete em todos os aspetos relevantes que têm a ver com relações intra-grupo.

XIII. Pelo que, para a determinação do lucro tributável concorrem apenas os gastos ou perdas e os rendimentos ou ganhos que respeitam exclusivamente a cada entidade.

XIV. A decisão fundamento errou quando adotou uma lógica de tributação de grupo societário, quando do que se tratava era de apreciar correções efetuadas no âmbito de uma ação de inspeção que visou a confirmação dos valores declarados em sede de IRC pela Recorrente na qualidade de sujeito passivo enquadrado, em sede de IRC, no regime geral de tributação.

XV. E laborando em tal erro considerou a decisão fundamento que havia sido demostrada a necessária conexão entre os custos declarados e a realização dos proveitos da Requerente, em clara violação do disposto no artigo 23.º do CIRC e em contradição com o a decisão recorrida.

XVI. Assim, a fundamentação legal que sustenta a decisão arbitral recorrida, a cujo teor se adere na totalidade, não padece de qualquer vício de ilegalidade, pelo que deve ser mantida.

XVII. Ao contrário da decisão fundamento, a qual, com o devido respeito, não se estriba na melhor interpretação do artigo do disposto no artigo 23.º do CIRC.

XVIII. Assim, por tudo o exposto, deve esse douto STA rejeitar o entendimento que sustenta a decisão fundamento, decidindo pela manutenção da decisão recorrida na ordem jurídica.».

O Digno Magistrado do M.º P.º foi notificado nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 146.º, n.º 1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos e lavrou douto parecer no sentido de não ser tomado conhecimento do objeto do recurso.

A Recorrente, tendo sido notificada do douto parecer a que alude o parágrafo anterior, veio insistir que a decisão arbitral recorrida colide frontalmente com a decisão arbitral fundamento na parte recorrida que, como salienta, diz apenas respeito às ajudas de custo pagas a colaboradores pela deslocação a estabelecimentos de outras empresas do Grupo C....

Com dispensa dos vistos legais, cumpre decidir, em conferência, no Pleno da Secção.


***

2. Dos fundamentos de facto

2.1. A decisão arbitral recorrida relevou e deu como provados os seguintes factos: «(...)

A. A Requerente exerce a atividade de “Salão de cabeleireiro”, a que corresponde o CAE 096021, estando enquadrada em sede de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) no regime normal com periodicidade mensal, e em sede de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) no regime geral de determinação do lucro tributável;

B. A Requerente tem dois estabelecimentos comerciais nos quais desenvolve as suas atividades e que se localizam no Centro Comercial B... e no D...;

C. A Requerente é uma das sociedades “operativas” do “Grupo C...”;

D. Em 2017 e 2018 o Grupo C... explorava, através de sociedades operativas (entre as quais a Requerente), 10 salões de beleza, designadamente no E..., Centro Comercial F..., Centro Comercial G..., H..., Centro Comercial I..., J... e K...;

E. O Grupo C... procurou desde o início da sua constituição obter benefícios de escala, através do aproveitamento de sinergias entre os vários estabelecimentos comerciais a nível operacional, financeiro, comercial, marketing, aquisição de mercadorias e equipamentos, entre outros;

F. Nesse âmbito, a Requerente disponibiliza funcionários dos seus dois estabelecimentos comerciais a outras sociedades do grupo e recebe igualmente funcionários destas sociedades;

G. No início de 2017, eclodiu no seio do Grupo C... um conjunto de conflitos que opuseram os sócios AA e BB aos sócios CC e DD, em resultado de desentendimentos quanto à estratégia de expansão e internacionalização da marca C...;

H. Tendo em consideração a referida situação de tensão e conflito, a sociedade L..., da qual são também sócios CC e DD, passou a desenvolver para o Grupo C... gestão administrativa, logística e armazenagem, limpeza, manutenção e conservação dos estabelecimentos comerciais;

I. Os conflitos legais que originaram a transferência de funções para a L..., por bloqueio legal de determinadas decisões, ficaram parcialmente resolvidos por via judicial em Setembro de 2019 tendo, entretanto, sido afastados definitivamente da administração e da gestão da holding os sócios AA e BB;

J. Conseguida a necessária decisão judicial favorável aos sócios CC e DD, a L... deixou de cobrar management fees ao Grupo C..., dado que a remuneração do trabalho de administração e gestão efetivamente prestados passou a ser realizada diretamente pelas empresas “operativas” do Grupo e pela holding;

K. A Requerente foi objeto de procedimento inspetivo externo aos exercícios de 2017 e 2018, de âmbito parcial, com incidência em IRC e IVA, levado a cabo pela Direção de Finanças de Lisboa ao abrigo das ordens de serviço n.ºs ...78 e ...79.

L. Na sequência da ação de inspetiva, promoveu a Inspeção Tributária as seguintes correções meramente aritméticas à matéria tributável de IRC do exercício de 2017, no valor de 93.764,03 € e do exercício de 2018, no valor de 181.944,39 €:

M. Em sede de IVA, foi apurado imposto em falta, no exercício de 2018, no montante de € 36.070,98, conexo com a correção em sede de IRC referente a gastos com fornecimentos e serviços externos pagos à empresa L...;

N. Na sequência da referida ação inspetiva, a AT procedeu à emissão do ato de liquidação de IRC n.º ...04 e respetivo ato de liquidação de juros compensatórios n.º ...31, referentes ao exercício de 2017, de que resultou um montante a pagar de € 21.270,33, do ato de liquidação adicional de IRC n.º ...68 e respetivo ato de liquidação de juros compensatórios n.º ...90, referentes ao exercício de 2018, de que resultou um montante a pagar de € 39.995,74, e dos atos de liquidação de IVA n.ºs ...22, ...31, ...66, ...76, ...99, ...08, ...13 e respetivos atos de liquidação de juros compensatórios n.ºs ...44, ...45, ...46, ...47, ...48, ...49 e ...50, referentes ao período de tributação de 2018, de que resultou um montante a pagar de € 31.723, no valor global a pagar de € 92.989,07;

O. Por não se conformar com tais atos, a Requerente deduziu Reclamação Graciosa, que veio a ser indeferida por despacho de 28 de Dezembro de 2021 do Senhor Diretor Adjunto da Direção de Finanças de Lisboa.».

2.2. A decisão arbitral fundamento relevou a matéria de facto que, a seguir, se transcreve parcialmente: «(...)

A) A Requerente exerce a atividade de “Salão de cabeleireiro”, a que corresponde o CAE 096021, estando enquadrada em sede de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) no regime normal com periodicidade mensal, e em sede de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas;

B) A Administração Tributária, ao abrigo das ordens de serviço n.ºs ...84 e ...01, efectuou uma acção inspectiva externa à Requerente, relativa aos exercícios de 2017 e 2018, de âmbito parcial, com incidência no Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) e Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA);

C) Nessa inspecção foi elaborado o Relatório da Inspecção Tributária (RIT) que consta do processo administrativo, em que se refere, além do mais, o seguinte:

III. Descrição dos factos e fundamentos das correções meramente aritméticas à matéria coletável
III.I. Em sede de IRC
III.1.1. Gastos com o pessoal
III.1.1.1. Conta 63822-Ajudas de custo
1.De acordo com o extrato de conta foi contabilizado os montantes de € 25.802,20 e € 53.463,00 respetivamente, em 2017 e 2018, tendo como suporte documental uma "folha" (A4) correspondente a um mapa com a indicação do local onde foi prestado o serviço, o valor diário, o nome da funcionária e nem sempre indica o motivo da deslocação.
Esta sociedade está inserida num grupo de sociedades que comercializam a marca "C...", e que se encontram espalhadas pelo território nacional, através de vários estabelecimentos similares.
Nas referidas "folhas", aparecem serviços que foram prestados em locais onde se encontram estes estabelecimentos, nomeadamente, F..., G..., H..., D..., e I..., que nada têm a ver com os locais onde o sujeito passivo exerce a sua atividade e que pertencem a outras sociedades do grupo.
2. Do total contabilizado como gasto, verificou-se que os montantes de € 25.305,40 (anexo 3) e € 53.463,00 (anexo 4), respetivamente, em 2017 e 2018, dizem respeito a ajudas de custo de pessoal afeto à sociedade M..., que se deslocaram para lojas que pertencem a outras sociedades do "grupo", para prestar serviços, mas cujo serviço não foi faturado às mesmas, ou seja, houve o gasto, mas não houve o rendimento.
O nº1 do artigo 23º do CIRC estatui que "para a determinação do lucro tributável, são dedutíveis todos os gastos e perdas Incorridos ou suportados pelo sujeito passivo para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC".
Assim, são gastos dedutíveis aqueles que foram contraídos no âmbito do interesse da atividade da sociedade, com o intuito de obterem ou garantirem os rendimentos sujeitos a IRC.
Ora, no caso em apreço, o sujeito passivo suportou gastos com ajudas de custo pela deslocação dos seus funcionários, a lojas que pertencem a outras sociedades do grupo, para prestar serviços, não tendo o sujeito passivo faturado as ajudas de custo a essas sociedades nem tão pouco a cedência de pessoal, não tendo, consequentemente, repercutido esses gastos nas sociedades beneficiárias.
Assim, podemos concluir que o sujeito passivo suportou gastos, relativamente aos quais não foi possível estabelecer qualquer conexão entre os gastos suportados e os rendimentos obtidos ou garantidos pela M... SA sujeitos a IRC, motivo pelo qual, os montantes de € 24.305,40 e € 53.463,00, não são aceites fiscalmente dedutíveis à luz do nº1 do art.º 23º do CIRC.
2.No exercício de 2017, confrontando o valor de € 25.802,20 contabilizado nesta conta com as correções de € 25.305,40, existe uma diferença de € 496,80 que deveria ter sido contabilizado na conta 63821, pelo que a correção será quantificada no ponto seguinte.
III.1.1-2. Conta 63821-Abono kms
O sujeito passivo reconheceu na subconta 63821 - Abono kms, de acordo com os extratos de conta, os montante de € 5.275,80 e € 6.001,20, respetivamente, em 2017 e 2018, a título de compensação por deslocação em viatura própria do funcionário, tendo como suporte documental uma "folha" (A4) que corresponde a um mapa onde consta o nome da funcionária, a indicação dos locais de origem e destino, a justificação, os kms percorridos, não identificando a matrícula da viatura utilizada pelas funcionárias EE (NIF ...) e FF (NIF ...).
Da análise às referidas "folhas", e tal como sucedeu com as ajudas de custo, verificou-se que os montantes de € 2.922,48 (anexo 5) e € 3.249,00 (anexo 6), respetivamente, em 2017 e 2018, dizem respeito a deslocações de funcionárias desta sociedade para outras lojas (salões de cabeleireiro) pertencentes a outras sociedades do grupo C..., não tendo sido faturado às mesmas este serviço de deslocação do pessoal e/ou repercutido o referido gasto.
O nº 1 do artº 23º do CIRC estatui que "para a determinação do lucro tributável, são dedutíveis todos os gastos e perdas incorridos ou suportados pelo sujeito passivo para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC".
Assim, à semelhança do que ocorreu relativamente às ajudas de custo, podemos concluir que o sujeito passivo suportou gastos, relativamente aos quais não foi possível estabelecer qualquer conexão entre os gastos suportados e os seus rendimentos obtidos ou garantidos sujeitos a IRC, motivo pelo qual os referidos montantes de € 2.922,48 e € 3.249,00, não são aceites como fiscalmente dedutível à luz do nº 1 do art.º 23º do CIRC.
Relativamente aos abonos de kms atribuídos às funcionárias acima mencionadas, nos valores de €2.850,12 (anexo 7) e € 2.752,20 (anexo 8), respetivamente, em 2017 e 2018, não identificam a matrícula da viatura por si utilizada nas deslocações entre lojas desta mesma sociedade e para o armazém, o que contraria o disposto na alínea h), nº 1 do art.º 23ºA do CIRC, não sendo aceite fiscalmente aqueles gastos.
III.1.2. Fornecimentos e serviços externos
III.1.2.1. Ativos Fixos Tangíveis (anexo 9)
No decorrer do exercício de 2017, o sujeito passivo reconheceu como gasto o valor de € 6.690,00, contabilizado na conta 6238, através do documento Interno 120.002, titulado pela fatura ...27, datada de 11.12.2017, emitida pela sociedade N..., Lda, contribuinte ..., referente a 6 rampas de lavagem, a que corresponde um valor unitário de € 1.115,00.
De acordo com o Sistema de Normalização Contabilística (SNC), os ativos fixos tangíveis são recursos que a sociedade detém, com carácter de permanência ou continuidade, não se destinando a ser vendidos ou transformados no decurso das suas atividades normais, sendo usualmente destinados a serem utilizados na produção, fornecimento de bens e serviços, para arrendamento, ou para fins administrativos, na qual se espera uma utilização durante mais do que um período contabilístico - §6 da Norma Contabilística e de Relato Financeiro (NCRF) n.º 7.
Por outro lado, esta aquisição de bens, não satisfaz os critérios para serem considerados como gasto do exercício uma vez que, nos termos do art.º 33º do CIRC, apenas quando o custo unitário de aquisição do ativo sujeito a deperecimento não ultrapassar os € 1.000,00 é aceite a sua dedução integral no período de tributação em que seja reconhecido, exceto quando tais elementos fazem parte integrante de um conjunto que deva ser depreciado com um todo. E mesmo neste caso, a sua contabilização passará sempre por uma conta da classe 42-Ativo fixo tangível e nunca através de uma conta da classe 62, como se tratasse de um consumível. O gasto do exercício será assim o valor da amortização, conforme estatui o art.º 29º do CIRC.
A referida aquisição de "rampas de lavagem", reúne os critérios para ser considerada como um ativo fixo tangível, na medida em que seja provável que originem benefícios económicos futuros e que são fiavelmente mensuráveis, deverão ser objeto de capitalização, ou seja, reconhecidas como um ativo fixo tangível.
Dado que os referidos Ativos Fixos Tangíveis têm, normalmente, uma vida útil limitada, o custo de aquisição do ativo, são imputados como gasto no período de acordo com o respetivo uso (depreciação), tal como estatui o art.º 29º do CIRC.
Face ao exposto, verifica-se que o sujeito passivo reconheceu indevidamente, no exercício de 2017, o valor de € 6.690,00 correspondente ao gasto com a aquisição de bens, em vez de imputá-los ao correspondente valor do ativo e relevá-los, posteriormente, a gastos através das depreciações (durante a sua vida útil esperada).
Deste modo, o sujeito passivo não deu cumprimento às regras contabilísticas estabelecidas na NCRF 7 do Sistema Normalização Contabilístico, bem como, aos artigos 18.º e 29.º do Código do IRC conjugados com o artigo 1.º do Decreto-Regulamentar n.º 25/2009, pelo que mais não resta à Administração Tributária que desconsiderar fiscalmente esse montante nos termos das referidas normas.
III.1.2.2. Conta 6221-Trabalhos especializados (anexo 10)
De acordo com o extrato desta conta, foi contabilizado no ano de 2017, o valor de € 2.000,00, identificado internamente com o nº 50.038, titulado pela fatura ...50, datada de 04.05.2017, emitida pelo sujeito passivo O..., Lda, contribuinte ..., com a descrição "Prestação de serviços". Nos termos da alínea a), nº 2 do art.º 19º do CIVA, só confere direito a dedução do imposto mencionado em faturas passadas na forma legal, sendo o nº 5 do art.º 36º do CIVA, a norma que define quais são os elementos que as faturas devem conter, nomeadamente, entre outros, s quantidade e a denominação usual dos bens transmitidos ou serviços prestados (alínea b.).
Este conceito "vasto" de prestação de serviços descrito na fatura, não permite validar a natureza dos respetivos serviços e, consequentemente, se os mesmos têm conexão com a atividade empresarial da M... SA, e são necessários para obter ou garantir rendimentos sujeitos a IRC, pelo que mais não resta à Autoridade Tributária e Aduaneira, do que desconsiderar como fiscalmente dedutível tal gasto, no valor de € 2.000,00, nos termos do nº 1 do art.º 23º do CIRC. Em sede de IVA, a sua dedução não será aceite por força do disposto no nº 2 do art.º 19º do CIVA.
III.1.2.3. Faturas emitidas pela sociedade L..., Lda

III.1.2.3.1. Introdução

Na análise efetuada aos gastos reconhecidos na contabilidade do sujeito passivo, nas várias divisionárias da subconta 62 - Fornecimentos e Serviços Externos, foram identificadas diversas faturas emitidas pelo fornecedor L..., Lda, (adiante designada por L... Lda) contribuinte ..., com sede na Rua ..., ... no ..., área do Serviço de Finanças de Porto 2.
Segundo a conservatória do registo comercial, pela inscrição ... AP ...25, foi constituída a sociedade L... Lda, com o capital social de € 5.000,00, tendo como sócios CC e DD, com uma quota de € 2.500,00 cada um.
Importa referir que, CC e DD, são os acionistas maioritários da sociedade C... SGPS, SA, que é a detentora do capital social de várias empresas denominadas "grupo C..." com várias lojas de salões de cabeleireira, entre as quais está a M... SA. Nos períodos económicos de 2017 e 2018, a sociedade L..., Lda emitiu várias faturas às empresas do grupo C..., entre as quais a M... SA, quer referente a serviços de gestão e administração, quer de serviços de logística, manutenção e deslocações, quer de serviços de limpeza e deslocações, quer de natureza diversa, tendo imputado a cada uma das referidas sociedades do grupo um valor proporcional ao seu volume de negócios.
No caso da M... SA, é relevante informar que esta sociedade emitiu em 29.12.2017 a fatura ...3, no valor de € 200.000,00 referente a serviços de consultadoria, que foram anulados através da nota de crédito, ..., datada de 23.03.2018, colocando-se de imediato as seguintes questões:
• O serviço foi prestado ou não?
• Quando é que o serviço foi prestado?
• Se o serviço foi prestado, quem o prestou?
• Se o serviço foi prestado porque é que foi anulado?
Pela análise efetuada constatou-se que a sociedade L..., Lda, nos exercícios em análise, apenas possuía três empregados dos quais dois estavam afetos aos serviços de limpeza e um à área da logística.
A sociedade L... Lda é uma sociedade marginal ao grupo de empresas lideradas pela sociedade C... SGPS SA, sendo que os únicos elos de ligação são os sócios e os gerentes.
A sociedade C... SGPS SA, é detentora da totalidade do capital de várias empresas que integram o universo do "grupo C...", entre as quais a P... SA.
As SGPS têm por objeto contratual a gestão de participações sociais de outras sociedades, como forma indireta de exercício de atividades económicas sendo-lhes ainda permitida a prestação de serviços técnicos de administração e gestão às empresas suas participadas, bem como a concessão de financiamentos dentro de determinados condicionalismos.
Da análise às faturas emitidas pela sociedade C... SGPS SA para a M... SA, verificou-se que no período de janeiro a agosto de 2017, dizem respeito a "serviços técnicos administrativos e gestão" e de setembro a dezembro 2017 e todo o ano de 2018, têm a descrição de "serviços administrativos e de contabilidade".

Importa ainda referir que:

• CC, é sócia gerente da sociedade L... Lda e, simultaneamente é administradora das sociedades C... SGPS SA e M... SA.
• DD, é sócio gerente da sociedade, L... Lda, é membro do conselho de administração da M... SA e administrador da C... SGPS SA, desde 31-12.2018.
•CC e DD, são não residentes no território nacional e não possuem representantes nomeados.
• CC e DD, não foram remunerados pelo exercício de qualquer atividade no território nacional.
Foram analisadas todas as faturas emitidas pela sociedade L..., Lda, reconhecidas na contabilidade do sujeito passivo, com o intuito de verificar o seu enquadramento quer em sede de IVA, quer em sede de IRC, face às dúvidas suscitadas.
III.1.2.3.2. Serviços de Gestão e Administrativos, colocação e disposição de pessoal (anexo 11)
De acordo com o extrato da conta 6221-Trabalhos especializados, foram contabilizadas as seguintes faturas emitidas, com a supracitada descrição, a saber:
[QUADRO]
Em cada uma das sociedades do grupo C... existem administradores cuja função é administrar esta sociedade, sendo, na M... SA, CC e DD. Estes dois administradores, curiosamente, também são sócios e gerentes da sociedade L..., Lda, sociedade que, tirando o facto de os sócios serem comuns, é alheia ao grupo C.... Face à factualidade descrita, não existe motivo pelo qual os serviços de gestão sejam faturados pela L... Lda, até porque, os gerentes desta sociedade são os mesmos que os administradores da M... SA. Não é possível distinguir quando é que os administradores do sujeito passivo estão ao seu serviço ou quando estão a gerir a sociedade por conta da sociedade L... Lda, sendo que não são remunerados por qualquer das sociedades.
Assim, uma vez que o sujeito passivo M... SA tem os seus próprios Administradores cuja função é administrar a sociedade, não se entende nem ficou demonstrado que as despesas com os referidos "serviços de gestão e administração" tituladas pelas faturas emitidas pelo sujeito L..., Lda, se enquadram e têm conexão com a atividade empresarial da M... SA, e consequentemente, são necessárias para obter ou garantir rendimentos sujeitos a IRC, pelo que, mais não resta à Autoridade Tributária e Aduaneira, do que desconsiderar como fiscalmente dedutíveis tais gastos, nos montantes de € 48.149,46 e de € 96.298,92,respetivamente, em 2017 e 2018, nos termos do nº1 do artigo 23º do Código do IRC.
III.1.2.2.3. Serviços de logística, manutenção e deslocações (anexo 12)
O sujeito passivo reconheceu na sua contabilidade, nas subcontas identificadas no quadro a seguir indicado, as faturas identificadas no mesmo quadro, correspondentes, segundo esclarecimento prestado pelo sujeito passivo, ao vencimento, encargos sociais, ajudas de custo e à compensação de kms, do funcionário GG, sendo que, o total dos gastos incorridos pela sociedade L..., Lda com o funcionário, foi imputado a cada uma das sociedades do grupo C..., proporcionalmente ao seu volume de negócios.
[QUADRO]
Na análise efetuada e fruto da experiência adquirida ao longo da análise do grupo constatou-se que a central de compras do grupo é a sociedade N..., Lda. É esta sociedade que adquire e vende os produtos de cabeleireiro às diferentes sociedades do grupo, possuindo, para o efeito, dois armazéns que arrendou à sociedade L... Lda.
GG, no decorrer do ano de 2017 e até ao mês de outubro, foi funcionário da N... Lda, sendo que, a partir do mês de novembro passou a trabalhar para a sociedade L... Lda. GG, auferiu, ainda, rendimentos da categoria B que lhe foram pagos pelo sujeito passivo no decorrer do ano de 2017.
GG, é o responsável por toda a logística, nomeadamente, desde a armazenagem dos produtos até à sua entrega nas várias lojas do grupo C....
Ora, sendo a sociedade N..., Lda, responsável pela logística do grupo e tendo o funcionário GG, trabalhado no decorrer do ano 2017 para as sociedades N..., Lda, L... Lda, A... SA e M... SA e no ano de 2018 para as sociedades L... Lda e A... SA, não se vislumbra o motivo pelo qual a sociedade L... Lda, fatura ao sujeito passivo os serviços de logística, manutenção e deslocações correspondentes ao trabalho desenvolvido pelo aludido funcionário, já que toda a logística passa pela sociedade N..., Lda.
Por outro lado, na análise efetuada, foi também identificada a contabilização na subconta 62267 várias faturas emitidas pelo fornecedor Q... Unipessoal,Lda, NIPC ..., referente à manutenção das lojas E... e R..., desconhecendo-se assim o motivo pelo qual a L... Lda, está a faturar ao sujeito passivo serviços de manutenção.
Em face do exposto, uma vez que não ficou comprovado que os gastos reconhecidos na contabilidade do sujeito passivo, nos montantes de € 2.059,71 e € 21.175,08, respetivamente, em 2017 e 2018, têm conexão com os rendimentos obtidos ou garantidos pela M... SA, mais não resta à Autoridade Tributária e Aduaneira, do que os desconsiderar como fiscalmente dedutíveis nos termos do nº1 do artigo 23º do Código do IRC.
III.1.2.2.4. Serviços de limpeza e deslocações (anexo 13)
O sujeito passivo reconheceu na sua contabilidade, nas subcontas identificadas no quadro a seguir indicado, as faturas ali mencionadas, correspondentes, segundo esclarecimento prestado pelo sujeito passivo, ao vencimento, encargos sociais, ajudas de custo e à ajudas de custo, das funcionárias HH, com o domicílio fiscal em ... e II, com o domicílio fiscal em ..., sendo que, o total dos gastos incorridos pelo sujeito passivo L..., Lda com as referidas funcionárias, foi imputado a cada uma das sociedades do grupo C..., proporcionalmente ao seu volume de negócios.
A L..., celebrou um contrato de trabalho por tempo indeterminado com as referidas 2 funcionárias, onde consta que foram admitidas com a categoria de "Auxiliar de limpeza" e o local de prestação de trabalho é na Av. ...-Quinta do Patino, em .... Para além do facto da funcionária II ter o domicílio em ..., quando as lojas onde presta "eventualmente" o serviço de limpeza localizam-se na área de Lisboa (... e ...), o contrato refere que o local da prestação do trabalho de "Auxiliar de limpeza" é em ..., na Quinta .... Também se desconhece a que se referem as deslocações.
Por outro lado, também se verificou a contabilização na mesma conta 6267, várias faturas emitidas pelo sujeito passivo S..., Lda, contribuinte ..., que tem por atividade a realização de serviços de limpeza.
[QUADRO]
Em face do exposto, uma vez que não ficou comprovado que os gastos reconhecidos na contabilidade, no montante total de € 1.845,69 e € 10.460,46, respetivamente, em 2017 e 2018, têm conexão com os rendimentos obtidos ou garantidos pela M..., SA, mais não resta à Autoridade Tributária e Aduaneira, do que os desconsiderar como fiscalmente dedutíveis nos termos do nº1 do artigo 23º do Código do IRC.
III.1.2.2.5. Imputação outros gastos 2018 - deslocações (anexo 14)
De acordo com o extrato da conta 6251-Deslocações e estadas, o sujeito passivo reconheceu na contabilidade o documento identificado internamente sob o n.º 120.086, que corresponde à fatura n.º ...4, emitida em 18-04-2019, por L... Lda, no montante de € 4.476,59, referente a imputação de outros gastos do ano de 2018, deslocações.
Notificado para justificar o montante contabilizado, o sujeito passivo esclareceu que as deslocações são custos associados à atividade das empresas do grupo, tendo, para o efeito, juntado um "quadro resumo" onde consta o valor e o tipo de serviço, tendo-se verificado custos dizem respeito a várias deslocações de avião, de refeições e de alojamento, totalizando € 12.873,15, que, majorado em 30% (lucro), perfaz o valor de € 16.735,10, que foi imputado a cada uma das sociedades do grupo C..., sendo que, o faturado à A... SA foi de € 4.476,59.
Considerando a atividade do sujeito passivo, que consiste em salões de cabeleireiro e estética, em que as deslocações são pouco relevantes, dado o exercício da atividade se circunscreve aos dois estabelecimentos que possui, e pelo facto de se desconhecer a que se referem concretamente aqueles gastos e quem foram os beneficiários dos mesmos, não é possível aferir se tais despesas se enquadram na atividade empresarial e são necessárias para obter ou garantir rendimentos sujeitos a IRC, pelo que, nos termos do nº1 do art.º 23º do CIRC, tais gastos, o montante de € 4.476,59 não são aceites como fiscalmente dedutíveis.
III.1.2.2.6. Imputação de outros gastos 2018 -material (anexo 15)
O sujeito passivo reconheceu como gasto, na subconta 6268-outros serviços, o montante de € 3.851,71, pelo documento identificado internamente sob o n.º 120.088, que corresponde à fatura n.º ...2, emitida em 18-04-2019, por L... Lda, referente a imputação de outros gastos do ano de 2018, materiais.
Notificado para justificar o montante contabilizado, o sujeito passivo esclareceu que correspondem a despesas referentes à aquisição de materiais que foram adquiridos para serem utilizados no armazém que pertence a todas as empresas do grupo, tendo para o efeito juntado um "quadro resumo" descritivo dos valores contabilizados, com o tipos de bens adquiridos, tendo-se constatado que dizem respeito à aquisição de ferramentas, utensílios, material de escritório e de informática e 1 telemóvel Iphone, no montante total de € 11.076,22 que majorado em 30% (lucro), perfaz o valor de € 14.399,09, que foi imputado a cada uma das sociedades do grupo C..., sendo que, o faturado à A... SA foi de €3.851,71.
Atendendo ao facto que não é possível identificar os bens em causa (exceto o telemóvel, que, por sua vez, está sujeito às regras estabelecidas no Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro), não é possível aferir se tais gastos estão conexos com a atividade do sujeito passivo e, consequentemente, se são gastos suportados com o intuito de obter ou garantir rendimentos sujeitos a IRC, pelo que os gastos contabilizados, no montante de € 3.851,71, não são aceites como fiscalmente dedutíveis, nos termos do nº1 do artigo 23º do Código do IRC.

III.1.2.2.7. Utilização de viaturas (anexo 16)

De acordo com o extrato da conta 6268-Outros serviços, o sujeito passivo reconheceu na contabilidade no ano de 2018, os documentos identificados no quadro a seguir indicado:
[QUADRO]
O sujeito passivo foi notificado para justificar os gastos contabilizados, tendo esclarecido que são gastos com viaturas que estão ao serviço das empresas do grupo.
As viaturas ..-UM-.., ..-VR-.. e ..-UG-.., são viaturas ligeiras de mercadorias, de marca ..., cujos averbamentos em nome da sociedade L... Lda, ocorreram em 27-04-2018, 28-03-2018 e 29-03-2018, respetivamente.
Não é conhecida a natureza dos gastos contabilizados, sendo que o sujeito passivo apenas referiu que os gastos são inerentes a viaturas ao serviço de empresas do grupo.
Não se sabe quem utiliza as viaturas, quando as utiliza e porque é que as utiliza.
Considerando que se constatou que:
• O sujeito passivo contabilizou como gasto, despesas inerentes à compensação por deslocação em viatura própria ao serviço da entidade patronal, de funcionárias de lojas, para se deslocarem ao armazém para ir "buscar produtos" (...), assim como, para as lojas, quer da A..., quer para outras do grupo C...;
• O sujeito passivo contabilizou como gasto faturas emitidas por L... Lda, inerentes à deslocação do funcionário GG, para a realização de serviços de manutenção e aprovisionamento;
• A atividade exercida pelo sujeito passivo, caraterizada pela deslocação dos clientes aos estabelecimentos que possui.
Não se vislumbra o motivo pelo qual a sociedade L... Lda, faturou ao sujeito passivo a utilização das citadas viaturas ou se o sujeito passivo as utilizou realmente.
Em face da factualidade descrita, uma vez que não ficou comprovado que os gastos reconhecidos na contabilidade do sujeito passivo, no montante total de € 2.995,97, referentes ao ano de 2018, têm conexão com os rendimentos por si obtidos ou garantidos sujeitos a IRC, mais não resta à Autoridade Tributária e Aduaneira, do que os desconsiderar como fiscalmente dedutíveis nos termos do nº1 do artigo 23º do Código do IRC.
(...)
III.1.4. Resumo correções ao lucro tributável
Em resultado dos procedimentos de inspeção realizados são propostas as seguintes correções:

1 . Correções ao lucro tributável

[QUADRO]

2. Correções ao calculo da tributação autónoma

[QUADRO]
III.2. Em sede de IVA (anexo 17)
O sujeito passivo reconheceu na contabilidade, na sob conta 24323132311 - IVA dedutível- OBS -Mercado Nacional - Taxa normal, os documentos identificados no quadro a seguir indicado, exercendo assim o direito à dedução do IVA mencionado nas respectivas faturas, emitidas pela sociedade L..., Lda, assim como, em uma fatura emitida pelo sujeito passivo O..., Lda, a saber:
[QUADRO]
De acordo com o que foi referido na análise efetuada em sede de IRC, não foi possível estabelecer qualquer conexão entre os gastos inerentes às faturas emitidas pela sociedade L..., Lda, reconhecidas na contabilidade do sujeito passivo, e os rendimentos obtidos ou garantidos pelo mesmo sujeitos a IRC, motivo pelo qual tais gastos foram desconsiderados como fiscalmente dedutíveis.
Na mesma linha de pensamento, o IVA mencionado nas aludidas faturas, relativamente ao qual o sujeito passivo exerceu o direito à dedução, não tem qualquer conexão com as operações realizadas pelo sujeito passivo sujeitas a imposto, dado que, tal como foi referido, a atividade exercida pelo sujeito passivo é de salão de cabeleireiro e estética.
Ora, o n.º 1 do artigo 20º do Código do IVA e a sua alínea a) determina que só pode deduzir-se o imposto que tenha incidido sobre bens ou serviços adquiridos, importados ou utilizados pelo sujeito passivo para a realização de transmissão de bens e prestação de serviços sujeitas a imposto, o que não foi o caso, já que, tal como foi referido, não foi possível estabelecer qualquer conexão entre o IVA deduzido constante das aludidas faturas e as vendas e prestações de serviços realizadas pelo sujeito passivo sujeitas a imposto.
Tendo em atenção a factualidade descrita, mais não resta à administração tributária do que excluir do direito à dedução do IVA mencionado nas supracitadas faturas, nos termos do n.º 1 do artigo 20º do Código do IVA.
Também se verificou, no ano de 2017, a dedução de IVA numa fatura passada não de forma legal, violando o disposto na alínea a), nº 2 do art.º 19º do CIVA.
Na verdade, o sujeito passivo reconheceu na subconta de IVA dedutível o documento identificado internamente com o nº 50.038, a que corresponde a fatura ...50, datada de 04.05.2017, emitida pelo sujeito passivo O..., Lda, contribuinte ..., cujo descritivo é "Prestação de serviços".
Ora, nos termos da alínea a), nº 2 do art.º 19º do CIVA, só confere direito a dedução do imposto mencionado em faturas passadas na forma legal, sendo o nº 5 do art.º 36º do CIVA, a norma que define quais são os elementos que as faturas devem conter, nomeadamente, entre outros, a quantidade e a denominação usual dos bens transmitidos ou serviços prestados (alínea b.) o que não acontece, já que a descrição da fatura é vaga e não permite estabelecer a conexão com as operações tributáveis realizadas pelo sujeito passivo.
O IVA indevidamente deduzido ascende a € 460,00 e € 40.240,89, respetivamente, em 2017 e 2018, de acordo com o seguinte quadro resumo, por período de imposto:
[QUADRO]
(...)
IX. Direito de audição (anexo 18)
O sujeito Passivo foi notificado para efeitos do direito de audição, nos termos do art.º 60º da Lei Geral Tributária e art.º 60º do R.C.P.I.T.A, para a sede da empresa, através do ofício nº ...92, datado de 27.01.2021, com o registo ..., e exerceu-o, tendo apresentado a seguinte fundamentação:
1.De facto, acontece que a Requerente não se limita a disponibilizar funcionários para outras lojas (suas ou do grupo), pois beneficia também da disponibilidade e da efetiva disponibilização de funcionários de outras lojas que se deslocam para as suas lojas – sitas na Grande Lisboa e no Grande Porto - e cujas ajudas de custo também não lhe são debitadas.
Dessa permuta a exponente obtém equivalentes benefícios para a sua atividade produtiva decorrentes da disponibilidade e da efetiva disponibilização, de funcionários - técnicos da sua área de atividade económica - de outras lojas de sociedades do Grupo C... SGPS, S.A.
Observa-se ainda que, conforme consta nos registos de V. Exas., para os quais remetemos, todas as sociedades do Grupo C... SGPS, S.A. apresentaram resultados positivos de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas.
Conclui-se que estes gastos devem ser fiscalmente aceites, nos termos e para os efeitos do artigo 23º, nº 1 do Código do IRC.
2.Quanto ao Ponto III.1.2.1.: não sendo aceite integralmente o gasto titulado pela fatura ...27, datada de 11.12.2017, deve ser aceite por estes serviços a respetiva depreciação do exercício. Ou seja, não podem V. Exas. proceder à desconsideração total do valor correspondente ao custo de aquisição suportado e reconhecido fiscalmente pela exponente (€6.690,00).
3. Quanto aos Pontos III.1.2.2. e III.2.: a descrição constante da fatura ...50, datada de 04.05.2017, emitida pelo contribuinte fiscal n.º ..., é suficiente para permitir determinar a natureza dos serviços prestados e o valor do gasto para efeitos de IRC; quanto ao IVA, apenas é exigível a referência aos serviços prestados para determinação da taxa (que, para serviços de arquitetura, é sempre de 23%). Logo, deve ser aceite fiscalmente o gasto suportado, bem como a dedução do correspondente IVA, pois o documento de suporte foi emitido em linha com os formalismos legalmente previstos.
4.Quanto aos Pontos III.1.3.2. e III.2.1.: porque os serviços de gestão e administração prestados pela L... Lda., que disso encarregou os seus Gerentes, foram no interesse da exponente e em conexão com a sua atividade produtiva, aí se incluindo, exemplificativa e sumariamente, os seguintes:
Planeamento estratégico e organizativo
Estratégias empresariais e de gestão
Estratégias comerciais e apoio à gestão técnica
Consultoria, orientação e assistência operacional nas seguintes áreas:
Planeamento, organização e controlo
Informação e Gestão
Gestão Financeira e processos de controlo orçamental Gestão de Recursos Humanos, incluindo Segurança e Higiene no Trabalho, contratação e cessação de vínculos laborais.
Gestão Comercial, políticas de marketing e comunicação, relações públicas e eventos.
Deve-se ter em conta que no período em análise nenhum desses Gerentes auferiu remuneração como Administrador da exponente ou de sociedades do Grupo C... SGPS, S.A.
5. Quanto ao Ponto III.1.2.2.3.: os serviços de logística, manutenção e deslocações prestados pela sociedade L... Lda., que apresentou os meios necessários para o efeito, foram no interesse da exponente e em conexão com a sua atividade produtiva, cumprindo apenas esclarecer que os pagamentos feitos pela exponente ao Senhor GG correspondem a serviços por ele prestados em nome individual.
6. Quanto aos Pontos III.1.2.2.4., III.1.2.2.5., III.1.2.2.6. e III.1.2.2.7.: os gastos com serviços de limpeza, deslocações e ferramentas foram debitados acessoriamente aos serviços indicados nos Pontos III.1.2.3.2. e III.1.2.2.3.
7. Quanto a todos os pontos acima referidos - e ainda quanto à anulação da fatura ...3 mencionada em III.1.2.3.1. - cumpre referir que as operações, entre partes relacionadas, foram devidamente reportadas no âmbito da Auditoria às Demonstrações Financeiras para a Certificação Legal de Contas, realizada pelo Revisor Oficial de Contas.
8. Mais se pede a audição das seguintes testemunhas, em data e local a notificar por V.Exas.: Senhora Dra. JJ, contabilista certificada, para a sede da exponente Senhor GG, para o respetivo domicílio fiscal.
Para audição da testemunha foi designado o dia 04.03.2021, pelas 10.00H, para a qual foi expedida notificação conforme ofício destes Serviços n.º 2791, datado de 23.02.2021.
Também foi notificada a sociedade a comunicar tal facto, através do ofício destes Serviços nº 2792,datado de 23.02.2021 Todavia, a sociedade enviou uma carta datada de 23.02.2021, a informar que na sequência da audição prévia apresentada ao projeto de relatório, vem solicitar para serem aproveitadas as declarações prestadas pela Dra. JJ, contabilista certificada, na qualidade de testemunha ouvida em D2.02.2021, no âmbito das ações inspetivas à A..., SA ,NIF ... (...79) e da sociedade P..., SA, NIF ... (Ol ...75/76) e assim a dispensar.
Dando seguimento ao solicitado pelo sujeito passivo, anexou-se ao presente relatório (anexo 18) as declarações prestadas em 02.02.2021, pela Dra. JJ, no âmbito do exercício do direito de audição das sociedades A..., SA e P..., SA, onde afirmou o seguinte:
1. Concordo e confirmo as alegações produzidas no direito de audição.
2. Quanto aos serviços de gestão e administração foram realizados por CC e

DD para as empresas do grupo C....

3. Quanto aos serviços de logística e manutenção, o funcionário GG era quem fazia a distribuição dos produtos pelas lojas, bem como, toda a logística. Quanto às faturas emitidas por KK, a manutenção era apenas do ar condicionado e canalização. A manutenção do GG era diferente, nomeadamente, mudar uma rampa de lavagem, lâmpadas, pequenos trabalhos nas lojas, etc...
O GG a partir de outubro de 2017, deixou de ser funcionário da N..., passando a ser da L..., e a partir desta data, foi faturado os serviços de logística e manutenção às empresas do grupo C..., pois era mais vantajoso ser a L... a faturar este serviço do que uma empresa externa de logística.
A partir de outubro 2017, as empresas do grupo passaram a adquirir todos os produtos, exceto da ... que continuaram a ser comprados pela N..., devido a um contrato celebrado entre ambas. Os produtos ficavam armazenados nos armazéns da L... que foram arrendados à N..., até final de 2017. Em 2018, os armazéns deixaram de ser arrendados à N....
O GG é quem distribuí todos os produtos pelas lojas.
4. A imputação de outros gastos (deslocação e material), são despesas comuns a todas as empresas do grupo C..., sendo imputadas em função do volume de negócios.
5. Nos serviços de limpeza, as 2 funcionárias fazem este serviço para todas as empresas do grupo, sendo imputado o valor em função do volume de negócios
6. A L... é a proprietária das viaturas que as coloca à disposição das empresas do grupo, ficando mais vantajoso do que fazer um contrato de renting.
Analisando a fundamentação, temos:
1. O facto do sujeito passivo M..., SA, disponibilizar funcionários para outras lojas que não lhe pertencem e, receber pessoal de outras sociedades do grupo C..., esta "permuta" não lhe confere a faculdade de não faturar os respetivos serviços, face ao disposto na alínea b), nº1 do art.º 29º do Código do IVA que estatui da obrigatoriamente de emitir uma fatura por cada transmissão de bens ou prestação de serviços, independentemente da qualidade do adquirente dos bens ou destinatário dos serviços, sendo o imposto exigível no momento da sua realização, conforme dispõe alínea b), nº 1 do art.º 7.º do CIVA.
Cada sociedade do grupo C... tem a sua personalidade jurídica e obrigações fiscais, não podendo ser tratada como se fosse apenas uma, em que todas as funcionárias das lojas lhe pertencessem. Por outro lado, independentemente de ser obrigatório a emissão de uma fatura por cada prestação de serviço, os valores dos referidos serviços em cada uma das sociedades é diferente, não podendo haver a compensação que o sujeito passivo pretende.
2. O sujeito passivo pretende que seja aceite a depreciação do bem que foi contabilizado como gasto na conta 6238 e não foi aceite fiscalmente.
Ora, tal pretensão não pode ser aceite, uma vez que o nº 3 do artº 1º do DL 25/2009, dispõe que "As depreciações e amortizações só são aceites para efeitos fiscais desde que contabilizadas como gastos no mesmo período de tributação ou em períodos de tributação anteriores".
Ora, o sujeito passivo, no exercício em análise, não reconheceu na contabilidade qualquer depreciação do bem em causa, pelo que nos termos do citado artigo não pode ser considerada como gasto como o sujeito passivo pretende.
3. O sujeito passivo afirma que é suficiente a descrição na fatura de "Prestação de serviços" para permitir determinar a natureza dos serviços prestados e o valor do gasto para efeitos de IRC; quanto ao IVA, apenas é exigível a referência aos serviços prestados para determinação da taxa (que, para serviços de arquitetura, é sempre de 23%). Logo, deve ser aceite fiscalmente o gasto suportado, bem como a dedução do correspondente IVA, pois o documento de suporte foi emitido em linha com os formalismos legalmente previstos.
Como foi referido no projeto do relatório, nos termos da alínea a), nº 2 do art.º 19º do CIVA, só confere direito a dedução do imposto mencionado em faturas passadas na forma legal, sendo o nº 5 do art.º 36º do CIVA, a norma que define quais são os elementos que as faturas devem conter, nomeadamente, entre outros, a quantidade e a denominação usual dos bens transmitidos ou serviços prestados (alínea b.).
Assim, ao contrário do que é referido pelo sujeito passivo, o documento suporte não foi emitido em linha com os formalismos legais.
O controlo a efetuar pela AT não se prende apenas com a taxa aplicável, mas também com a aferição dos serviços em concreto, a fim de permitir validar a sua natureza e, consequentemente, se os mesmos têm conexão com a atividade empresarial.
Assim, não pode ser aceite a pretensão do sujeito passivo.
4.Quanto aos serviços de gestão e administração (III.1.3.2), o sujeito passivo apenas fez considerações do que é a gestão numa empresa. No projeto de relatório nunca foi posta em causa a função de gestão, mas sim de quem a executa. A sociedade M... tem os seus próprios Administradores cuja função é gerir/administrar esta sociedade, que também são sócios e gerentes da sociedade L..., Lda, que é alheia ao "grupo C..., pelo que não existe motivo pelo qual os serviços de gestão sejam faturados pela L... Lda, quando a própria sociedade M... SA tem os seus administradores.
A testemunha indicada pelo sujeito passivo no exercício do direito de audição, Dra. JJ, que, desde já se diga, que não é mais do que a contabilista certificada da sociedade e a pessoa nomeada como sua representante para as relações com a Administração Tributária nos termos do artigo 52º do RCPITA, apenas adiantou que os serviços de gestão e administração foram realizados por CC e DD para as empresas do grupo C....
5. Nos serviços de logística e manutenção, referiu serem no interesse da atividade produtiva e que os pagamentos ao funcionário GG correspondem a serviços por ele prestados em nome individual.
A testemunha, Dra. JJ, esclareceu que GG, a partir de outubro de 2017, deixou de ser funcionário da N..., passando a ser da L..., pelo que os serviços de logística e manutenção passaram a ser faturados às empresas do grupo C.... Adiantou que a partir daquela data, as empresas do grupo C... passaram a adquirir todos os produtos, exceto da ... que continuaram a ser comprados pela N..., sendo que as mercadorias adquiridas eram guardadas no mesmo armazém.
Ainda segundo a testemunha, a manutenção do GG consistia em mudar rampas de lavagem, trocar de lâmpadas e outros pequenos trabalhos realizados nas lojas.
Da análise às compras de mercadorias no ano de 2018, verificou-se que as adquiridas à sociedade N... apenas representam apenas 3% do total, as restantes compras foram efetuadas a outros fornecedores.
Assim, sendo a distribuição das mercadorias/produtos às lojas realizada por GG conforme declarou a Dra. JJ, que, nesta data, era funcionário da L..., aceita-se a pretensão do sujeito passivo relativamente aos gastos imputáveis com a logística e manutenção, no ano de 2018, no montante de €21.175,08.
No entanto, no ano de 2017, o gasto é titulado por uma fatura emitida em 28.03.2018, com a descrição de "serviços efetuados em 2017", desconhecendo-se quais os serviços prestados e a que período dizem respeito, ou seja, se foi antes ou após a saída de GG de funcionário da N..., cabendo a esta suportar os encargos dos seus trabalhadores e dos serviços que contrata, uma vez que as mercadorias são vendidas com uma margem de lucro, não devendo a M... SA suportá-lo.
Face ao exposto, é aceite a pretensão do sujeito passivo relativamente ao ano de 2018.
6. Quanto aos Pontos III.1.3.4., III.1.3.5., III.1.3.6 e III.1.3.7., apenas referiu tratar-se de gastos com deslocações e ferramentas que foram debitados acessoriamente aos serviços indicados nos Pontos III.1.3.2. e III.1.3.3.
A testemunha acrescentou que a imputação de gastos (deslocação e material) e de limpeza, são despesas comuns a todas as empresas do grupo, sendo faturado em função do volume de negócios.
No caso das viaturas, as mesmas estão à disposição das empresas do grupo C..., ficando mais vantajoso do que fazer um contrato de renting.
No entanto, não especificou qual a natureza dos serviços necessários à empresa, uma vez que se está perante um salão de cabeleireiros.
7.Conclusão
Face ao exposto, é atendida a pretensão do sujeito passivo relativamente aos gastos dos serviços de logística e manutenção, no ano de 2018, no valor de € 21.175,08 e o respetivo IVA dedutível no valor de €4.870,27.
Relativamente às restantes propostas de correção, não foram trazidos novos dados relevantes que contrariassem a fundamentação das correções que constam no projeto de relatório, pelo que se mantêm as mesmas.
8. Resumo
8.1. Correções ao lucro tributável
Em resultado do procedimento de inspeção realizado em sede de IRC, e atendendo ao direito de audição, são propostas as seguintes correções:
[QUADRO]
8.2. Correções em sede de IVA
Face ao exercício do direito de audição e respetiva análise, o IVA indevidamente deduzido, foi em 2017 e 2018, respetivamente, de € 460,00 e € 35.370,62 de acordo com o seguinte quadro:
[QUADRO]
O IVA indevidamente deduzido ascende a € 460,00 e € 35.370,62, respetivamente, em 2017 e 2018, de acordo com o seguinte quadro resumo, por período de imposto:
[QUADRO]
Assim, para conclusão dos procedimentos de inspeção realizados, vão ser elaborados os respetivos documentos de correção (DCU) e levantados os autos de notícia, pelas infrações praticadas em sede de IRC e IVA, em cada um dos anos de 2017 e 2018.

D) Na sequência da acção inspetiva, a Administração Tributária emitiu

– a liquidação adicional de IRC n.º ...38 e as liquidações de juros compensatórios n.º ...60 e ...61 e a demonstração de acerto de contas de IRC n.º ...81 referentes ao exercício de 2017;

– a liquidação adicional de IRC n.º ...66 e as liquidações de juros compensatórios n.º ...66 e ...67 e a demonstração de acerto de contas de IRC n.º ...10, referentes ao exercício de 2018;

– as liquidações de IVA n.º ...10, ...16, ...44, ...49, ...66, ...69, ...73, as demonstrações de acerto de contas de n.º ...92, n.º ...94, n.º ...96, n.º ...98, n.º ...00, n.º ...02, n.º ...04, e as liquidações de juros compensatórios n.º ...33, ...34, ...35, ...36, ...37, ...38, ...39, e das respectivas demonstrações de acerto de contas n.º ...93, n.º ...95, n.º ...97, n.º ...99, n.º ...01, n.º ...03, n.º ...05 e ainda a liquidação de IVA n.º ...10, todos referentes ao período de tributação de 2018;

E) Em 16-08-2021, a Requerente apresentou reclamação graciosa das liquidações, tendo-lhe sido notificado - o respectivo projecto de indeferimento, que consta do processo administrativo, para exercício do direito de audição (documento n.º ... junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido e processo administrativo);

F) A reclamação graciosa não foi decidida até 21-02-2022, data em que foi apresentado o pedido de constituição do tribunal arbitral que deu origem ao presente processo;

G) No dia 23-05-2022, a Subdiretora-Geral da Área de Gestão Tributária do IR proferiu despacho que determinou a revogação parcial do acto de liquidação n.º ...38, relativo ao período tributário de 2017, na parte respeitante ao gasto, no valor de € 669,00, correspondente ao Ativo Fixo Tangível e ao gasto referente ao serviço de arquitetura (artigo 9.º da Resposta da Autoridade Tributária e Aduaneira e documento junto em 26-09-2022);

H) A Requerente tem como accionista única a sociedade C... SGPS, SA, NIPC ... e é uma das sociedades operativas do Grupo C..., grupo este que foi criado na década de 1990 por CC e DD (Relatório da Inspecção Tributária);

I) Em 2017 e 2018, a Requerente tinha dois estabelecimentos comerciais de salão de cabeleireiro e estética nos quais desenvolvia as suas actividades e localizados no Centro Comercial E... e no Centro Comercial R... (Relatório da Inspecção Tributária);

J) Os sócios CC e DD tomaram desde sempre as principais decisões quanto à estratégia do Grupo C..., assumindo o cargo de administradores das várias sociedades “operativas” que compõem o Grupo (depoimento de parte);

K) Os sócios AA e BB, apesar de terem ocupado o cargo de administradores das sociedades “operativas” não tinham funções relevantes de gestão operacional (depoimento de parte);

L) Os sócios CC e DD não auferiam qualquer remuneração directa pelo exercício das funções de administração e gestão do Grupo C... (depoimento de parte e da testemunha LL);

M) À margem da holding e das sociedades “operativas”, os sócios CC, DD, AA e BB detêm cada um directamente uma participação de 25% no capital social da sociedade N..., Lda. (“N...”)».


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3. Dos fundamentos de Direito

Vem o presente recurso interposto da decisão arbitral proferida no processo n.º 100/2022-T, do CAAD, numa parte da mesma que julgou improcedente o pedido de pronúncia arbitral, ou seja, na parte referente às «ajudas de custo e das despesas com abonos de kms atribuídos aos funcionários da Recorrente, por deslocações efectuadas para estabelecimentos comerciais de outras sociedades do Grupo C...» (cit. ponto 16.º das doutas alegações de recurso).

A Recorrente não se conforma com o assim decidido por entender que a decisão arbitral recorrida «colide frontalmente» com a decisão arbitral proferida no âmbito do processo n.º 101/2022-T (que indica como «decisão arbitral fundamento»), que também correu termos junto do CAAD.

Processo que, como refere no ponto 17.º das doutas alegações de recurso, opunha a AT à “M... S.A.” que, tal como a ora Recorrente, pertence ao Grupo C..., e sofreu as mesmas correções em sede de IRC, no âmbito de um procedimento inspectivo aos mesmos anos.

Invocou como fundamento da admissibilidade do recurso o artigo 25.º, n.º 2, do RJAT.

Decorre do sobredito que o presente recurso tem na sua base a oposição de julgados e tem como objetivo fundamental a uniformização de jurisprudência.

Sendo que a apreciação do mérito da decisão recorrida depende da verificação de um conjunto de pressupostos substantivos. Ou seja, o Supremo Tribunal Administrativo só uniformiza jurisprudência sobre a questão suscitada no recurso depois de se assegurar da verificação desses pressupostos.

Que, no essencial se destinam a confirmar que a questão suscitada nas duas decisões (a decisão recorrida e a decisão fundamento) é substancialmente idêntica e que a resposta que neles foi dada a essa questão é diversa e contraditória.

Ou seja, identidade substancial da questão suscitada e decisão contraditória quanto a essa questão.

Ora, a Recorrente entende que a questão suscitada em cada uma das decisões em confronto é idêntica porque (i) as Requerentes eram sociedades anónimas do mesmo grupo, domiciliadas em Portugal, geridas pelas mesmas pessoas e tendo a mesma realidade empresarial (ii) exerciam a mesma atividade (iii) foram inspecionadas aos mesmos exercícios e com o mesmo âmbito (iv) as correções foram equivalentes (v) a fundamentação foi a mesma e (vi) a defesa apresentada contra elas foi a mesma (ver ponto 42.º das doutas alegações).

Concluindo, a partir daí, que as decisões em confronto partiram de «factualidades em tudo idênticas» (ponto 43.º).

Na verdade, não é assim. Para que se possa concluir que a factualidade subjacente aos arestos em confronto é idêntica é também necessário que sejam idênticos os factos apurados nas próprias decisões arbitrais, ao menos na parte que releva para o recurso.

Porque, se assim não for, a divergência não assenta apenas numa diferente interpretação das regras de direito, mas também numa diferente interpretação dos factos.

Ora, na decisão arbitral recorrida, foi entendido que não era possível estabelecer a conexão dos custos suportados pela disponibilização de colaboradores a entidades terceiras e a atividade da ali Requerente (ora Recorrente) porque tal não decorria dos elementos contabilísticos e dos suportes documentais e não era possível concluí-lo apenas a partir do facto de a Requerente também ir beneficiar com isso ao receber funcionários de outras empresas do grupo.

Ou seja, o Tribunal Arbitral entendeu ali que não havia, desde logo, factualidade suficiente para deduzir que essa conexão existia.

Já na decisão arbitral fundamento, foi entendido que da prova ali produzida resultava que a ali Requerente suportava essas despesas no seu interesse, na medida em que elas tinham como contrapartida cedências de pessoal também gratuitas, feitas por outras sociedades do grupo. E que, por isso, não se podia concluir pela falta de conexão entre essas despesas e a atividade da ali Requerente.

Ou seja, o Tribunal Arbitral entendeu ali que havia factualidade suficiente para concluir que as cedências de um lado eram contrapartida das cedências do outro e que, por isso, não havia uma cedência de pessoal gratuita mas uma permuta de pessoal.

Tendo sido por essa razão que concluiu que não podia concluir-se pela falta de conexão entre as despesas, de um lado, e a atividade, do outro.

E o que daqui retiramos é que na decisão arbitral recorrida e na decisão arbitral fundamento foram tiradas diferentes ilações dos factos que em cada uma delas foram apurados.

E que foram essas diferentes ilações de facto que determinaram a divergência nas decisões.

Contrapõe a Recorrente, quando confrontada com o parecer do Ex.mo Senhor Procurador-Adjunto onde era colocada precisamente esta questão, que o M.ºP.º compara fundamentos de diferentes correções.

Não há confusão nenhuma. Só foi comparada a fundamentação dos dois arestos respeitante às ajudas de custo com deslocações – ou compensação por deslocações – a estabelecimentos comerciais pertencentes a outras sociedades do grupo.

Do exposto deriva que, ao contrário do que alega a Recorrente, as situações de facto apuradas não são substancialmente idênticas.

Duas observações finais a este respeito.

A primeira observação para dizer que as diferenças não se esgotam nas ilações tiradas de factos dados como provados em cada um dos processos. Porque são também diferentes os próprios factos que foram ali dados como provados, eles próprios resultantes da diversa atividade instrutória, tendo sido relevada na decisão arbitral fundamento prova testemunhal que, no caso da decisão arbitral recorrida, nem sequer foi considerada (tanto quanto pudemos apurar, porque também não foi produzida).

A segunda, para observar que, na própria fundamentação do recurso, a Recorrente apela a um diferente julgamento de facto. Assim, a Recorrente começa por se queixar da descontextualização «jurídico-factual» da atividade inspetiva (que, todavia, a decisão arbitral recorrida acompanhou). Prossegue dizendo que não foi afastada a presunção da veracidade e empresarialidade das ajudas de custo. Avança apelando a um conjunto de factos que na decisão arbitral recorrida não foram sequer considerados (ver pontos 63.º e seguintes das doutas alegações de recurso) e remata dizendo que é notória e evidente a conexão entre os gastos suportados e os rendimentos obtidos. Tudo questões que não podem ser resolvidas apelando apenas a razões de direito.

Tanto basta para concluir que não estão reunidos os indicadores de que depende a apreciação do mérito do recurso.


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5. Conclusão

5.1. Constitui pressuposto da apreciação do mérito do recurso a que alude o artigo 25.º, n.º 2 do RJAT a identidade substancial entre a situação de facto apreciada na decisão arbitral recorrida e a que foi apreciada na decisão que lhe é oposta;

5.2. Não há identidade substancial de situações de facto se, ao indagar se os gastos com determinadas ajudas de custo preenchem os requisitos para que a sua dedução seja admitida, a decisão arbitral recorrida apreciou uma situação em que não foi possível estabelecer a conexão entre essas despesas e a atividade da empresa e a decisão arbitral fundamento apreciou uma situação em que essa conexão existia.


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6. Decisão

Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam os juízes do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em não tomar conhecimento do mérito do recurso.

Custas pela RECORRENTE.

Registe, notifique e comunique ao CAAD.

Lisboa, 24 de maio de 2023. - Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos (relator) – Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia – Isabel Cristina Mota Marques da Silva – Francisco António Pedrosa de Areal Rothes – José Gomes Correia – Joaquim Manuel Charneca Condesso – Aníbal Augusto Ruivo Ferraz – Gustavo André Simões Lopes Courinha – Paula Fernanda Cadilhe Ribeiro – Pedro Nuno Pinto Vergueiro.