Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0491/11
Data do Acordão:03/28/2012
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:CASIMIRO GONÇALVES
Descritores:NOTIFICAÇÃO DA LIQUIDAÇÃO
VIA POSTAL
NOTIFICAÇÃO
NOTIFICAÇÃO PESSOAL
FALTA DE NOTIFICAÇÃO
Sumário:I - A liquidação adicional de IRS deve ser notificada ao sujeito passivo, por carta registada com aviso de recepção (art. 38° nº 1 do CPPT e arts. 65° nº 4, 66º e 149° nº 2 do CIRS), mas a entidade que dirige o procedimento pode ordenar que se proceda a notificação pessoal quando o entender necessário (nº 5 do art. 38° do CPPT).
II - A notificação pessoal de acto tributário, a realizar de acordo com as regras das citação, poderá ser efectuada de acordo com qualquer das modalidades de citação pessoal previstas no CPC, designadamente através de contacto pessoal do funcionário com o notificando, através da citação/notificação com hora certa e subsequentes termos legais aplicáveis (arts. 239°, 240° e 241° do CPC).
III - Para efeitos do disposto na al. e) do nº 1 do art. 195º do CPC (a que corresponde o também disposto no nº 6 do art. 190º do CPPT) cabe ao interessado o ónus de alegar e provar que não lhe é imputável o não conhecimento do teor do acto notificando.
Tendo ficado comprovado que o recorrente esteve ausente do país entre 16/12/2004 e 1/1/2005 e não tendo ficado demonstrado que a ausência se devesse a obstar a que o recorrente tomasse conhecimento da notificação da liquidação, também não pode concluir-se que não ficou demonstrado que o recorrente não chegou a ter conhecimento do acto por motivo que lhe não foi imputável.
Nº Convencional:JSTA000P13940
Nº do Documento:SA2201203280491
Data de Entrada:05/17/2011
Recorrente:A......
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

RELATÓRIO
1.1. A……… recorre da sentença que, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, julgou improcedente a oposição que deduziu à execução fiscal contra si instaurada por dívida de IRS referente a ano de 2000, no montante de € 61.313,89.

1.2. O recorrente termina as alegações formulando as conclusões seguintes:
A) Nos termos do disposto no art. 45º da LGT, o direito de liquidar impostos caduca se a notificação não for validamente notificada ao contribuinte no prazo de quatro anos, a contar do termo do ano em que se verificou o facto tributário, i.e., até 31 de Dezembro de 2004;
B) De acordo com o disposto nos arts. 65º, nº 2, 66º e 149º, nº 2 do CIRS, bem como nos termos do disposto no art. 38º da LGT, a decisão susceptível de alterar a situação tributária do contribuinte, designadamente a fixação ou alteração dos rendimentos tributáveis, deve ser notificada ao contribuinte por meio de carta registada com aviso de recepção;
C) Tais notificações poderão ser, no entanto, pessoais nos casos previstos na lei ou quando a entidade que a elas procede o entende necessário, sendo que, nos termos do nº 6 do art. 38º do CPPT, as notificações pessoais seguem os termos das citações pessoais, que por sua vez, e por via do disposto no art. 192º do CPPT, seguem os termos das citações pessoais previstas no CPC;
D) Nos termos do disposto no art. 239º do CPC “frustrando-se a via postal a citação é efectuada mediante contacto pessoal do solicitador de execução com o citando.”;
E) Com efeito, seria sempre necessário proceder à remessa de carta registada com aviso de recepção para proceder à citação pessoal do Recorrente e, apenas em caso de frustração desta, poderia ter sido ordenada a citação por contacto pessoal;
F) O Recorrente esteve ausente de Portugal desde o dia 16 de Dezembro de 2004 até ao dia 1 de Janeiro de 2005.
G) Dispõe o art. 190º nº 6 do CPPT, que só ocorre falta de citação quando o respectivo destinatário alegue e demonstre que não chegou a ter conhecimento do acto por motivo que lhe não foi imputável.
H) O Recorrente não podia prever a tentativa de notificação em causa nos presentes autos, na medida em que não tinha, sequer, qualquer expectativa em relação à existência do processo de execução fiscal que lhe fora instaurado.
I) Ora, não pode aceitar-se que, perante a total ausência de previsibilidade em relação à tentativa de notificação, a sua não realização, por motivo de ausência, no estrangeiro, seja tida como imputável ao recorrente.
J) Resulta provado dos presentes autos que o Recorrente se encontrava fora do país em gozo de férias de Natal com a família, sem que, à data da saída do país, o Recorrente pudesse prever ou antecipar a tentativa de notificação, não pode – sob pena de gritante violação dos direitos do Recorrente – concluir-se, como entendeu o Tribunal a quo.
K) Porque a imputabilidade do Recorrente dependeria, necessariamente, do pressuposto de que o Recorrente configurou a tentativa de notificação que, por acto seu, viria a impedir.
L) É manifesto que tal não sucedeu.
M) O Recorrente só assinou o aviso de recepção da notificação da liquidação referente ao IRS de 2000 remetida pela administração, apenas no dia 5 de Janeiro de 2005, apenas tendo tido conhecimento dos factos aqui em discussão quando regressou de viagem no dia 1 de Janeiro de 2005;
N) Nestes termos, só poderemos concluir pela falta de notificação, nos termos do art. 190º nº 5 do CPPT;
O) Por outro lado, verifica-se, também, existir uma ilegalidade dado que a citação por via postal não se havia frustrado previamente, atento o facto de a carta registada sob o nº RY.2525.3665.6PT, respeitante à liquidação de IRS de 2000, nunca ter sido remetida por correio anteriormente;
P) Assim, a notificação do Recorrente, por via de carta registada com aviso de recepção, apenas se efectuou no dia 5 de Janeiro de 2005, ou seja, após o prazo de caducidade da liquidação do imposto em causa.
Termina pedindo que a procedência do recurso e a consequente revogação da sentença, com as legais consequências.

1.3. Não foram apresentadas contra-alegações.

1.4. O MP emite Parecer no sentido da improcedência do recurso, nos termos seguintes:
«1. O oponente foi notificado de liquidação de I.R.S. na modalidade de pessoal com hora certa, nos termos conjugados dos arts. 38º nº 6, 192º nº 1 do C.P.P.T., 239º e 240º do C.P.C..
Certo é que a mesma teve lugar por decisão do Chefe de Finanças de Sintra 1, tomada a 29/12/04.
Afigura-se, de acordo com decidido em 1ª instância, que a mesma não é de invalidar por não ter sido precedida de notificação por carta registada com aviso de recepção – aliás, consta que esta apenas chegou a ser enviada a 20/12/04.
Com efeito, é de entender que a notificação efectuada na dita modalidade de pessoal com hora resulta ainda admissível, face ao disposto no art. 38º nº 7 do C.P.P.T.
2. O oponente põe ainda em causa a sua validade, por não ter tomado efectivo conhecimento da mesma no dia 30/12/04 em face de se ter encontrado ausente do país, desde 16/12/04, só regressando a 1/1/05, após viagem que efectuou no dia anterior a partir de Buenos Aires.
Contudo, não ficaram a constar os motivos dessa ausência do país durante o período de 15 dias, relativamente ao que nada comunicou quanto à alteração de residência.
E certo que chegou a sugerir motivos relacionados com a ida à Argentina na altura do Natal a acompanhar o cônjuge que daí é natural.
Contudo, pelos vistos, não os logrou provar.
Neste contexto, face ao previsto nos nºs. 1 a 3 do art. 19º da L.G.T., é de admitir que o dito não efectivo conhecimento lhe seja imputável e não à administração fiscal que pela mesma diligenciava há 10 dias junto da sua residência.»

1.5. Corridos os vistos legais, cabe decidir.

FUNDAMENTOS
2. Na sentença recorrida julgaram-se provados os factos seguintes:
A) Na sequência de acção de inspecção interna foi emitida liquidação oficiosa de IRS, referente ao ano de 2000, em nome do Oponente, no valor a pagar de € 60.725,35 – cfr. informação de fls. 43 e fls. 62;
B) Em 15/12/2004, o Chefe de Finanças do Serviço de Finanças de Sintra 1, emitiu mandado para que se proceda à notificação pessoal do Oponente, da liquidação de IRS, referente ao ano de 2000 – cfr. fls. 37 e 38;
C) Em 16/12/2004, foi emitida CERTIDÃO DE NOTIFICAÇÃO/CITAÇÃO COM HORA CERTA com o seguinte teor: “Certifico que tendo vindo hoje pelas 12.20 horas ao Largo ……… – ………, nº ……… em S. João das Lampas, a fim de notificar A………. Não pude levar a efeito a diligência em virtude de não ter encontrado o notificando/citando, nem qualquer parente ou vizinho.
Como me certifiquei, através da morada constante do NIF e/ou, junto da vizinhança que o notificando/citando, reside efectivamente na morada supra, onde se desloca a horas incertas ou apenas à noite, afixei na porta da sua residência, de acordo com o art. 240° do Código de Processo Civil, Nota com a indicação de que no dia 17, próximo às 15,00 horas, ali voltarei para o notificar.
Por ser verdade, passei a presente certidão, que vai assinada pela testemunha presente ……... e por mim ……...,” – cfr. fls. 64;
D) Em 17/12/2004, foi emitida CERTIDÃO DE VERIFICAÇÃO NOTIFICAÇÃO/CITAÇÃO com o seguinte teor: “Certifico que voltei hoje, pelas 15,00 horas, ao Largo ……… – ………, nº ……… em S. João das Lampas, residência de A……… notificado no processo indicado no mandado que antecede, a quem no dia 16/12/2004 deixei hora certa por nota afixada à porta da sua residência, e como ninguém atendeu depois de ter batido várias vezes à porta nem nenhum dos vizinhos se prestou a aceitar a transmitir a notificação ao destinatário, afixei à porta da residência do notificando uma nota do objecto da notificação datada de hoje e assinada por mim e pela testemunha ……... funcionário deste Serviço de Finanças, que me acompanhou nas diligências, que comigo vai assinar” – cfr. fls. 65;
E) Pelo ofício nº 20828 de 20/12/2004, foi enviada carta registada com aviso de recepção em nome de A………, para a morada de: Largo ……… – ………, nº ………, ………, 2705 S. João das Lampas, assinada pelo Chefe de Finanças do Serviço de Finanças de Sintra – 1, Por Delegação, o Adjunto, com o seguinte teor: “ASSUNTO: NOTIFICAÇÃO PESSOAL EFECTUADA NOS TERMOS DO ART. 240° DO C.P.CIVIL
Serve a presente para o informar que no dia 17/12/2004, foi efectuada a sua NOTIFICAÇÃO PESSOAL, para os termos do processo supra, por meio de Nota acompanhada do mandado de Notificação e Nota demonstrativa da liquidação de IRS do ano de 2000, colocados na caixa do correio da sua residência/domicílio fiscal, por ser o local mais adequado, em virtude de o não Ter encontrado na hora marcada no passado dia 16 do corrente, e nela e nos vizinhos não haver quem se prontificasse recebê-la, do teor do mandado de Notificação e Nota demonstrativa da Liquidação do IRS do ano de 2000, cujas cópias se juntam e cujos duplicados se encontram ainda ao seu dispor neste Serviço de Finanças” – cfr. fls. 67 e 68;
F) Em 29/12/2004, o Chefe de Finanças do Serviço de Finanças de Sintra 1, emitiu mandado para que se proceda à notificação pessoal do Oponente, da liquidação de IRS, da importância de 61.313,89 €, referente ao ano de 2000 – cfr. fls. 69 a 71;
G) Em 29/12/2004, foi emitida CERTIDÃO DE NOTIFICAÇÃO/CITAÇÃO COM HORA CERTA com o seguinte teor: “Certifico que tendo vindo hoje pelas 16,45 horas ao Largo ……… – ………, nº …….. em S. João das Lampas, a fim de notificar A………. Não pude levar a efeito a diligência em virtude de não ter encontrado o notificando/citando, nem qualquer parente ou vizinho.
Como me certifiquei, através da morada constante do NIF e/ou, junto da vizinhança que o notificando/citando, reside efectivamente na morada supra, onde se desloca a horas incertas ou apenas à noite, afixei na porta da sua residência, de acordo com o art. 240º do Código de Processo Civil, Nota com a indicação de que no dia 30, próximo às 12,00 horas, ali voltarei par o notificar.
Por ser verdade, passei a presente certidão, que vai assinada pela testemunha presente ……... e por mim ……... ” – cfr. fls. 73;
H) Em 30/12/2004, foi emitida CERTIDÃO DE VERIFICAÇÃO NOTIFICAÇÃO com o seguinte teor: “Certifico que voltei hoje, pelas 12,00 horas, ao Largo ……… – ………, nº ……… em S. João das Lampas, residência de A……… notificando no processo indicado no mandado que antecede, a quem no dia 29/12/2004 deixei hora certa por nota afixada à porta da sua residência, e como ninguém atendeu depois de ter batido várias vezes à porta nem nenhum dos vizinhos se prestou a aceitar a transmitir a notificação ao destinatário, afixei à porta da residência do notificando uma nota do objecto da notificação datada de hoje e assinada por mim e pela testemunha ……..., que me acompanhou nas diligências, que comigo vai assinar a presente certidão” – cfr. fls. 74;
I) Pelo ofício nº 00007 de 03/01/2005, foi enviada carta registada com aviso de recepção em nome de A………, para a morada de: Largo ……… – ………, nº ………, ………, 2705 S. João das Lampas, assinada pelo Chefe de Finanças do Serviço de Finanças de Sintra – 1, Por Delegação, o Adjunto, com o seguinte teor: “ASSUNTO: NOTIFICAÇÃO PESSOAL EFECTUADA NOS TERMOS DO ART. 240° DO C.P.CIVIL
Serve a presente para o informar que no dia 30/12/2004, foi efectuada a sua NOTIFICAÇÃO PESSOAL, para os termos do processo supra, por meio de Nota e Documentos anexos (Mandado de Notificação, Nota de Liquidação/Cobrança/Demonstração de Compensação) – relativos à Liquidação de IRS do ano 2000, colocados na caixa do correio da sua residência, por ser o local mais adequado, em virtude de o não ter encontrado na hora marcada no passado dia 29 de Dezembro de 2004, e nela e nos vizinhos não haver quem se prontificasse recebê-la, do teor do mandado de Notificação e Documentos juntos, cujas cópias se juntam, os quais se encontram ainda ao dispor neste Serviço de Finanças.” - cfr. fls. 75 e 76;
J) O Oponente assinou em 05/01/2005, o aviso de recepção da notificação, referida em I a informar “que havia sido notificado nos termos do art. 240° do CPC da fixação/alteração da liquidação do IRS de 2000” – cfr. fls. 76;
K) Em 12/07/2005, o Oponente foi citado da instauração do processo de execução fiscal para cobrança de dívida de IRS, referente ao ano de 2000, no montante de € 61.313,89 – cfr. fls. 77 a 79;
L) Em 05/08/2005, foram apresentados os presentes autos de oposição – cfr. carimbo, a fls. 2;
M) O Oponente esteve ausente de Portugal entre o dia 16/12/2004 e o dia 01/01/2005 – cfr. passaporte de fls. 8 a 26, especialmente a fls. 17;
N) O Oponente partiu no dia 31/12/2004 de Buenos Aires – cfr. passaporte de fls. 8 a 26, especialmente a fls. 17;
O) O Oponente quando regressou de viagem, em 01/01/2005, encontrou na sua caixa de correio:
1- aviso datado de 17/12/2004 deixado pelo carteiro de que havia duas cartas registadas com aviso de recepção para serem levantadas nos correios, com os registos nº RY.2524.1436.5 PT e nº RY.2525.8606.5 PT – cfr. fls. 27;
2- aviso datado de 21/12/2004 deixado pelo carteiro de que havia uma carta registada com aviso de recepção para ser levantada nos correios, com o registo nº RS.6510.6162.3 PT – cfr. fls. fls. 28;
3- aviso datado de 21/12/2004 deixado pelo carteiro de que havia uma carta registada com aviso de recepção para ser levantada nos correios, com o registo nº RS.6510.6116.9 PT – cfr. fls. 29;
4- nota – aviso objecto de notificação/citação (nos termos do art. 240º, nº 1 do Código de Processo Civil) com data de 16/12/2004, com o seguinte teor:
“Declara-se que são designadas as 15.00 horas do dia 17 do mês de Dezembro /2004, para o Senhor A……… aqui residente, comparecer à porta da sua residência a fim de ser verificada a NOTIFICAÇÃO/CITAÇÃO, para os termos do processo supra” – cfr. fls. 30;
5- nota de notificação por hora certa do teor do mandato de notificação relativo a liquidação de IRS de 2000, datada de 17/12/2004 – cfr. fls. 31;
6- nota – aviso objecto de notificação (nos termos do art. 240º, nº 1 do Código de Processo Civil) com data de 29/12/2004, com o seguinte teor:
“Declara-se que são designadas as 12.00 horas do dia 30 do mês de Dezembro/2004, para o Senhor A……… aqui residente, comparecer à porta da sua residência a fim de ser verificada a NOTIFICAÇÃO, para os termos do processo supra” – cfr. fls. 32;
7- nota de notificação por hora certa (nos termos do art. 240º, nº 3 do Código de Processo Civil) com data de 30.12.2004 com o seguinte teor:
“Para os devidos efeitos fica por este meio notificado, A………, aqui residente do teor do mandado de notificação referente à liquidação de IRS do ano de 2000, na importância de € 61.313,89, após efectuadas as devidas compensações, conforme nota de demonstração de compensação/aviso notificação de cobrança nº 200400001088562 e demonstração de liquidação de juros, juntos.
Esta nota vai ser afixada na porta do notificando supra em Largo ……… – ……… – ……… S. João das Lampas, nos termos do nº 3 do art. 240º do Código de Processo Civil.
A nota objecto da notificação encontra-se ainda ao seu dispor no Serviço de Finanças de Sintra, sito em Av. Movimento das Forças Armadas, 14, Portela de Sintra, 2710 – 431 Sintra” – cfr. fls. 33;
8- nota de liquidação de IRS de 2000, com o registo nº RY.2525.3665.6 PT, bem como cópia do mandado de notificação – cfr. fls. 37 e 38.

3.1. Enunciando como questão a decidir a de saber se o oponente foi validamente notificado da liquidação do imposto exequendo (IRS relativo ao ano de 2000), dentro do prazo de caducidade, a sentença concluiu afirmativamente, com a seguinte fundamentação:
Do regime constante dos arts. 232º, nº 1, 240º e 241º, todos do CPC, aplicáveis ex vi do art. 2º, al. e) e 38º, nº 6, ambos do CPPT, resulta que a notificação por mandado pode ser efectuada em qualquer lugar onde seja encontrado o destinatário do acto, designadamente, na sua residência ou local de trabalho. E cumpridas as formalidades previstas nesses normativos, o art. 241º do CPC exige ainda, para a notificação atingir a perfeição, o envio de carta registada ao destinatário, “...comunicando-lhe a data e o modo por que o acto se considera realizado, o prazo para o oferecimento da defesa e as cominações aplicáveis à falta desta, o destino dado ao duplicado e a identidade da pessoa em que a citação foi realizada”.
E cumpridas estas exigências legais, o notificando considera-se notificado na data da afixação (cfr. art. 240º, nº 3 e 241º ambos do CPC).
No caso dos autos provou-se que:
- no cumprimento de mandado de notificação pessoal da liquidação adicional de IRS, relativa ao exercício de 2000, um funcionário e uma testemunha deslocaram-se à residência do oponente, pelas 16,45 horas do dia 29/12/2004. Por ninguém ter atendido e a casa se encontrar fechada, afixaram na respectiva porta a notificação com hora certa, com a indicação que voltariam no dia 30/12/2004, pelas 12,00 horas, para efectuarem a notificação no oponente ou nalguma pessoa indicada por ele, ou em qualquer pessoa presente no local;
- em 30/12/2004, deslocaram-se à residência do oponente, o funcionário acompanhado de uma testemunha, e emitiram certidão de notificação com o teor que consta da al. h) do Probatório;
- por ofício de 3/1/2005 foi enviada ao oponente carta registada com A/R, com o teor que consta da al. i) do Probatório.
Foram, portanto, cumpridas todas as formalidades previstas na lei, sendo o oponente considerado notificado da liquidação, no dia da dita afixação (30/12/2004) – art. 240º, nº 5 do CPC.
O destinatário presume-se notificado, salvo se alegar e demonstrar que não chegou a ter conhecimento do acto por motivo que não lhe foi imputável, nos termos do art. 190°, nº 6 do CPPT.
Embora tenha ficado provado que o oponente esteve ausente de Portugal entre os dias 16/12/2004 e 1/1/2005, o facto de ter estado ausente do país no dia 30/12/2004 - dia da notificação - é-lhe imputável e, por isso, não impeditivo de operar a notificação com hora certa nos termos supra expostos.
Assim sendo, a liquidação foi validamente notificada até 31/12/2004, não ocorrendo a falta de notificação da liquidação no prazo de caducidade.

3.2. Discorda o recorrente continuando a sustentar que a sentença sofre de erro de julgamento, dado que ocorre falta de notificação da liquidação aqui em causa, nos termos do nº 5 do art. 190º do CPPT.
A tese do recorrente substancia-se em três vertentes argumentativas:
a) A liquidação deve ser notificada por meio de carta registada com aviso de recepção (nos termos dos arts. 65º, nº 2, 66º e 149º, nº 2 do CIRS e 38º da LGT); podendo, também, ser utilizada a notificação pessoal (nos casos previstos na lei ou quando a entidade que a elas procede o entende necessário), forma de notificação esta que segue os termos da citação pessoal (nº 6 do art. 38º do CPPT), a qual, por sua vez e por via do disposto no art. 192º do CPPT, segue os termos das citação pessoal prevista no CPC.
Ora, nos termos do disposto no art. 239º do CPC “frustrando-se a via postal a citação é efectuada mediante contacto pessoal do solicitador de execução com o citando.”; e seria sempre necessário proceder à remessa de carta registada com aviso de recepção para proceder à citação pessoal do recorrente e, apenas em caso de frustração desta, poderia ter sido ordenada a citação por contacto pessoal.
b) O recorrente esteve ausente de Portugal desde o dia 16/12/2004 até ao dia 1/1/2005.
Ora, de acordo com o nº 6 do art. 190º do CPPT, ocorre falta de citação quando o respectivo destinatário alegue e demonstre que não chegou a ter conhecimento do acto por motivo que lhe não foi imputável. Porém, no caso, o recorrente não podia prever a tentativa de notificação em causa nos presentes autos, na medida em que não tinha, sequer, qualquer expectativa em relação à existência do processo de execução fiscal que lhe fora instaurado. E não pode aceitar-se que, perante a total ausência de previsibilidade em relação à tentativa de notificação, a sua não realização, por motivo de ausência, no estrangeiro, seja tida como imputável ao recorrente. A imputabilidade do recorrente dependeria, necessariamente, do pressuposto de que ele configurou a tentativa de notificação que, por acto seu, viria a impedir. Porém é manifesto que tal não sucedeu. O recorrente só no dia 5/1/2005 assinou o aviso de recepção da notificação da liquidação referente ao IRS de 2000 remetida pela AT e apenas teve conhecimento dos factos aqui em discussão quando regressou de viagem no dia 1/1/2005.
Por isso só pode concluir-se pela falta de notificação, nos termos do nº 5 do art. 190º do CPPT.
c) Por outro lado, também há uma ilegalidade dado que a citação por via postal não se havia frustrado previamente, atento o facto de a carta registada sob o nº RY.2525.3665.6PT, respeitante à liquidação de IRS de 2000, nunca ter sido remetida por correio anteriormente. Pelo que a notificação do recorrente, por via de carta registada com aviso de recepção, apenas se efectuou no dia 5/1/2005, ou seja, após o prazo de caducidade da liquidação do imposto em causa.

3.3. As questões a apreciar no presente recurso são, portanto, as de saber se se verificam os apontados erros de julgamento.
Vejamos.

4.1. A liquidação adicional de IRS deve ser notificada ao sujeito passivo, por carta registada com aviso de recepção (art. 38° nº 1 do CPPT e arts. 65° nº 4, 66º e 149° nº 2 do CIRS).
Mas a entidade que dirige o procedimento pode ordenar que se proceda a notificação pessoal quando o entender necessário (nº 5 do art. 38° do CPPT).
E foi o que no caso sucedeu. Em 15/12/2004, o Chefe do Serviço de Finanças de Sintra-1, emitiu mandado para que se procedesse à notificação pessoal do oponente, da liquidação de IRS, referente ao ano de 2000 (cfr. al. B) do Probatório).
E posteriormente, em 29/12/2004, a mesma entidade emitiu mandado para que se procedesse à notificação pessoal do oponente, da liquidação (demonstração de compensação) de IRS – cfr. al. F) do Probatório.

4.2. Alega o recorrente que, dado o disposto no art. 239º do CPC (frustrando-se a via postal a citação é efectuada mediante contacto pessoal do solicitador de execução com o citando) seria sempre necessário proceder à remessa de carta registada com aviso de recepção para proceder à citação pessoal do recorrente e, apenas em caso de frustração desta, poderia ter sido ordenada a citação por contacto pessoal.
Mas não é assim.
Como se disse, o nº 5 do art. 38º do CPPT permite que a entidade que dirige o procedimento ordene que se proceda a notificação pessoal quando o entender necessário.
E estando a notificação por carta registada com aviso de recepção expressamente prevista no n° 1 do art. 38º do CPPT como a forma normal de proceder às notificações aí indicadas, então, como também salienta o Cons. Jorge Lopes de Sousa, (In Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, Vol. I, 6ª edição, 2011, anotação 5 ao art. 38º, pp. 373.) deve entender-se que a «notificação pessoal, que se efectua como a citação pessoal, é a que é feita através do contacto pessoal com o notificando ou aquela que é feita em pessoa diversa do notificando, encarregada de lhe transmitir o conteúdo do acto, que nos casos expressamente previsto na lei, é equiparada à citação pessoal, presumindo-se, salvo prova em contrário, que o citando dela teve oportuno conhecimento [art. 233º, nº 2, al. c) e nº 4 do CPC]» pelo que «esta referência à notificação pessoal, feita no nº 5 (para situações especiais previstas na lei ou extraordinárias em que a administração tributária considere necessário), se reportará às notificações através de contacto pessoal com o notificando ou com pessoa encarregada de lhe transmitir a citação, nos casos previstos na lei, à semelhança do que se prevê para as citações», sendo que ela se justificará, «para além dos casos em que a lei a preveja especialmente» também «nos casos em que houver dificuldade em fazer a notificação por outra forma ou não houver a certeza se foi realizada uma notificação.»
Note-se, aliás, que, apesar de no CPC se prever que a citação mediante contacto pessoal com o citando só deve ocorrer se se frustrar a via postal (cfr. nºs. 1 e 8 do art. 239º do CPC), o CPPT não contém tal exigência, apenas prevendo, para as notificações, que a entidade competente que dirige o procedimento pode ordenar que se proceda à notificação pessoal, quando o entender necessário (citado nº 5 do art. 38º do CPPT).
No caso, vem provado que em 15/12/2004 o Chefe do Serviço de Finanças de Sintra-1, emitiu mandado para que se procedesse à notificação pessoal do oponente, da liquidação de IRS, referente ao ano de 2000, bem como que, posteriormente, em 29/12/2004, a mesma entidade emitiu novo mandado para que se procedesse à notificação pessoal do oponente, da liquidação (demonstração de compensação/nota de cobrança) de IRS – cfr. als. B) e F) do Probatório.
Ora a escolha da notificação pessoal pela entidade competente da administração tributária, para transmitir ao destinatário o conteúdo do acto tributário, constitui manifestação do exercício de um poder discricionário que deve ponderar a eficácia no cumprimento do objectivo visado; escolha que, no caso, é irrelevante dado que, tratando-se de notificação de uma liquidação adicional de IRS, se não tivesse sido ordenada aquela forma de notificação, a mesma deveria ser notificada ao sujeito passivo por carta registada com aviso de recepção (art. 38° nº 1 e 5 primeiro segmento CPPT; arts. 65° nº 4, 66º e 149° nº 2 CIRS).
Pelo que não procede, nesta parte, a alegação de falta de notificação.

4.3. O recorrente alega, igualmente, que esteve ausente de Portugal desde o dia 16/12/2004 até ao dia 1/1/2005, pelo que, atendendo ao disposto no nº 6 do art. 190º do CPPT (ocorre falta de citação quando o respectivo destinatário alegue e demonstre que não chegou a ter conhecimento do acto por motivo que lhe não foi imputável) e uma vez que não podia prever a tentativa de notificação em causa nos presentes autos, na medida em que não tinha, sequer, qualquer expectativa em relação à existência do processo de execução fiscal que lhe fora instaurado, ocorre, então, no caso vertente, a falta de notificação.
Vejamos.

4.3.1. À notificação aqui em causa são aplicáveis as regras da citação pessoal, (No sentido de que, determinada que esteja, pela entidade competente da AT a efectivação da notificação por meio de contacto com o notificando, se aplicam a esta notificação pessoal, as regras da citação que constam do art. 190° do CPPT e do CPC, para que remete o nº 1 do art. 192º do CPPT, se pronuncia o Cons. Lopes de Sousa (ob. cit., I Vol., 6ª edição, 2011, pp. 373 e 374): «As regras da citação pessoal previstas no CPC não são menos exigentes do que as impostas para a notificação: relativamente à carta registada com aviso de recepção, prevista no n° l deste art. 38° como o meio mais solene de notificação dos actos tributários, está também prevista como uma forma de citação pessoal, no art. 233°, n° 2, alínea b) do CPC; no que concerne ao contacto pessoal com o destinatário, previsto na alínea c) do mesmo número, trata-se de uma forma mais onerosa, em termos de dispêndio de meios humanos dos serviços públicos que têm de efectuar a citação, pelo que a sua previsão na lei tem necessariamente subjacente a sua presumível maior idoneidade para garantir a comunicação com o destinatário. Sendo assim, deverá entender-se que a possibilidade de optar pela notificação pessoal se aplica mesmo nos casos em que a lei prevê a utilização de outros meios de notificação, designadamente os previstos no n° l deste art. 38°, apesar de aí se referir que «as notificações são efectuadas obrigatoriamente por carta registada».
Com efeito, a razão de ser de tal obrigatoriedade é, manifestamente, impedir a utilização de meios menos idóneos de efectuar as notificações, pelo que a razão de ser dessa imposição não abrange as situações em que se optar por uma forma de comunicação que, na perspectiva legislativa, é tanto ou mais eficiente de comunicação. Assim, tendo em consideração que «cessante ratione legis cessat eius dispositio (lá onde termina a razão de ser da lei termina o seu alcance)», deverá interpretar-se restritivamente a referência à obrigatoriedade da utilização da carta registada com aviso de recepção, feita no n° l deste art. 38°, como não afastando a possibilidade de utilização das regras da citação pessoal, nos termos dos nºs. 5 e 6.
Por outro lado, estas notificações pessoais, a realizar de acordo com as regras das citações pessoais, poderão ser efectuadas de acordo com qualquer das modalidades de citação pessoal previstas no CPC, designadamente a citação através de contacto pessoal do funcionário com o citando e a citação com hora certa ou através de afixação com posterior advertência (arts. 239°, 240° e 241° do CPC).» (Ibidem, I Vol., 6ª edição, 2011, pp. 373 e 374).
Ou seja, do mesmo modo que a entrega ao notificando de carta registada com aviso de recepção constitui uma modalidade de notificação pessoal (al. b) do nº 2 do art. 233° do CPC), também a notificação com hora certa é legalmente equiparada à notificação pessoal e aplicável aos actos tributários (cfr. o art. 240° nº 6 do CPC e o citado nº 6 do art. 38° do CPPT).) pelo que, nos termos do nº 6 do art. 38º do CPPT (que manda aplicar a esta modalidade de notificação pessoal as regras sobre a citação pessoal), se aplica o regime decorrente dos arts. 233º a 241º do CPC, uma vez que o CPPT apenas prevê o modo como deve fazer-se a citação pessoal em sede de execução fiscal. Há, então, que apelar (como, aliás, também sucede relativamente à própria execução fiscal - cfr. nº 1 do art. 192º do CPPT) ao que o CPC dispõe sobre tal matéria.
A modalidade de citação pessoal mediante contacto pessoal do funcionário judicial com o citando está prevista na al. c) do nº 2 do art. 233º do CPC. E o nº 4 deste mesmo artigo equipara à citação pessoal, «nos casos expressamente previstos na lei», «a efectuada em pessoa diversa do citando, encarregada de lhe transmitir o conteúdo do acto, presumindo-se, salvo prova em contrário, que o citando dela teve oportuno conhecimento».
Por sua vez, o nº 5 do art. 240º do CPC também considera como citação pessoal a citação com hora certa, a qual só pode ter lugar quando se confirme a residência do citando no local, e o citando aí não seja encontrado.
E de acordo com o regime constante dos vários números deste art. 240º, bem como do art. 241º, ambos do CPC, deve, naquele caso (confirmada que seja a residência do citando no local e este aí não seja encontrado) ser procurada a pessoa que esteja em melhores condições de lhe transmitir a hora certa ou, caso tal seja impossível, é deixado aviso com indicação dessa hora.
Se, à data e hora indicada, de novo o citando não for encontrado, nem pessoa que possa transmitir-lhe a citação, esta faz-se mediante afixação de nota de citação.
E cumpridas estas formalidades, para que a citação/notificação fique perfeita, é enviada carta registada ao citando/notificando, dando conta do ocorrido, no prazo de dois dias úteis.
No caso, não é questionada a observância destes requisitos previstos na lei para a notificação operada (sendo que a inobservância de algum desses requisitos ou a existência de alguma irregularidade a eles atinente, a ter ocorrido, sempre teria que ser arguida e alegada pela parte interessada).
E de acordo com a factualidade provada (que o recorrente não questiona) o funcionário da AT encarregue da notificação, aquando da sua primeira visita, consignou que na residência do oponente não se encontrava ninguém presente, tendo afixado na porta desta residência a indicação da hora certa. E no dia e hora marcados, mais uma vez verificou que ninguém se encontrava presente na residência do oponente, nem era possível a colaboração de terceiros, pelo que afixou a notificação na porta da sua residência, na presença da testemunha indicada.
E por fim, foi enviado em 3/1/2005, ofício registado com aviso de recepção, comunicando ao oponente que se procedera à sua notificação nos termos descritos.

4.3.2. Sendo, portanto, aplicáveis à notificação aqui em causa as regras da citação pessoal, a falta de notificação (que não a nulidade da mesma) poderá, então, ocorrer caso se verifique alguma das situações previstas no art. 195º do CPC.
Ora, no caso, porque o acto não foi completamente omitido, nem ocorreu erro na identidade do notificando, nem se empregou a notificação edital, nem a notificação foi feita após falecimento do notificando (cfr. as als. a) a d) do nº 1 do art. 195º do CPC), resta, então, verificar se pode ter-se como verificada a situação prevista na al. e) do nº 1 deste mesmo art. 195º, correspondente, aliás, ao que se dispõe também no nº 6 do art. 190º do CPPT: há falta de citação (notificação pessoal, no caso dos autos) quando se demonstre que o destinatário da mesma não chegou a ter conhecimento do acto, por motivo que lhe não foi imputável.
Refira-se que estas disposições pressupõem que tenha sido praticado um acto de citação (notificação pessoal), com observância dos requisitos previstos na lei (ou seja, têm-se em vista situações em que o acto foi efectivamente praticado, em conformidade com o preceituado na lei para o tipo de citação/notificação e de situação em que ela é efectuada, mas não foi praticado na própria pessoa do notificando/citando ou, tendo-o sido, este não tomou conhecimento do acto) sendo à administração tributária, naturalmente, que incumbe demonstrar que ele foi praticado.
No caso, o recorrente sustenta que só em 1/1/2005 tomou conhecimento do acto (logo que chegou a Portugal), pelo que, não tendo chegado a ter conhecimento do acto de liquidação até 31/12/2004, por motivo que lhe não foi imputável (até porque não podia prever a tentativa de notificação aqui em causa) daí pretende retirar a consequência da falta de notificação da liquidação no prazo de caducidade.
Na tese da sentença o facto de o oponente ter estado ausente do país no dia 30/12/2004 (dia da notificação), é-lhe imputável e, por isso, «não impeditivo de operar a notificação com hora certa nos termos supra expostos».
E na mesma linha segue o douto Parecer do MP para quem, apesar de se ter provado a ausência do oponente entre o dia 16/12/2004 e o dia 01/01/2005 e apesar de este ter alegado que tal ausência se ficou a dever a ter ido à Argentina na altura do Natal a acompanhar o cônjuge que daí é natural, nem sequer ficaram provados os motivos da ausência.
Vejamos.
Sendo certo que, como aponta o Cons. Lopes de Sousa (Ob. cit. III Vol. 6ª ed., anotação 5 ao art. 190º, p. 365.) o ónus de alegação e prova de que não teve conhecimento do acto, que é imposto ao citando no n° 6 do art. 190° do CPPT, incide apenas sobre o não conhecimento do teor do acto e não sobre a sua efectivação ou não, constata-se que, no caso presente, ficou efectivamente provado que o destinatário da notificação não chegou a ter conhecimento do acto até, pelo menos, 1/1/2005.
Ponto é que, para os efeitos pretendidos pelo recorrente, tenha também ficado demonstrado que esse não conhecimento ocorreu por motivo que lhe não foi imputável.
Ora, no caso, da provada ausência do notificando emerge desde logo uma impossibilidade, «a se» (decorrente da ausência), de receber a notificação, independentemente do carácter voluntário ou involuntário dessa ausência (isto é, das razões que a determinam), sem que, por outro lado haja sido feita prova de que a mesma ocorresse para, precisamente, determinar aquela impossibilidade de tomar conhecimento do acto (neste caso, haveria de concluir-se que o não conhecimento do acto se ficara a dever a motivo imputável ao notificando). E isto, independentemente da relevância da ausência do recorrente, desde o dia 16/12/2004 até ao dia 01/01/2005, por ter estado fora de Portugal, quanto à notificação operada nos termos em que o foi, dado que sempre lhe seria impossível cumprir a «intimação» para estar presente na residência (substanciada na comunicação de que o funcionário voltaria a proceder à notificação no dia seguinte àquele em que teve lugar a primeira tentativa de notificação) a fim de ser notificado nesse dia seguinte (29/12/2004, data para a qual o sr. funcionário deixou a nota de notificação com hora certa). (Na verdade, o regime legal atinente a esta forma de notificação/citação também pressupõe que o notificando/citando pode cumprir tal «intimação», ou seja, pressupõe que ele, podendo (porque disso tem conhecimento) estar presente na hora que foi designada, não está porque não o pretende. Daí que, remetida posterior carta registada, a notificação/citação seja reportada à data da hora certa designada (arts. 240º e 241º do CPC).)
De todo o modo, volvendo ao caso vertente, e mesmo considerando as naturais exigências de prova que este tipo de situações reclama, por forma a impedir que relevem eventuais estratégias destinadas a evitar a notificação, tendo ficado comprovado que o recorrente esteve ausente do país entre 16/12/2004 e 1/1/2005, que partiu no dia 31/12/2004 de Buenos Aires (als. M e N do Probatório) e que, quando regressou de viagem, em 1/1/2005, encontrou na sua caixa de correio as cartas, avisos e notas discriminados na al. O do Probatório, e não tendo ficado demonstrados quaisquer outros factos relacionados com os motivos desta ausência, nomeadamente que a mesma se devesse a obstar a que o recorrente tomasse conhecimento da notificação da liquidação aqui questionada (ainda assim, o recorrente alegou que a ausência se ficou a dever a ter ido à Argentina na altura do Natal a acompanhar o cônjuge que daí é natural, mas esta factualidade não foi julgada provada na sentença) também não pode, sem mais, concluir-se que não ficou demonstrado que o recorrente não chegou a ter conhecimento do acto por motivo que lhe não foi imputável.
Na verdade, o recorrente provou que na data da notificação, nem estava na sua residência nem ali podia estar, porque, embora por decisão sua, estava impossibilitado disso. Só que esta voluntariedade inerente ao acto de se ausentar não pode, por si só, determinar a conclusão de que ficou demonstrado que o recorrente não chegou a ter conhecimento do acto, por motivo que lhe foi imputável, tanto mais que, apesar de estarmos perante liquidação adicional, também a Fazenda não alegou nem demonstrou que tivesse, anteriormente, ocorrido notificação para outro acto procedimental (por exemplo notificação anterior relacionada com eventual direito de audição) que pudesse indiciar que o recorrente podia e devia prever a iminência da notificação ora questionada.

4.3.3. Acresce que o nº 3 do art. 268º da CRP garante o direito à notificação, remetendo para a lei apenas a sua “forma”, ou seja, o procedimento pelo qual deve a notificação ser efectuada, impondo que as notificações de actos que afectem a esfera jurídica dos administrados não sejam meramente ficcionadas, mas tendencialmente efectivas.
Com efeito, como (reportando-se, embora, às notificações por via postal e ao disposto nos nºs 1 e 2 do art. 39º do CPPT e no nº 6 do art. 49º da LGT) se exara no ac. deste STA, de 2/3/2011, rec. nº 967/10 «… o nº 3 do artigo 268º da Constituição da República Portuguesa, sob a epígrafe “Direitos e garantias dos administrados” (que os contribuintes são igualmente), estabelece que “os actos administrativos estão sujeitos a notificação aos interessados, na forma prevista na lei”, sendo o direito à notificação uma garantia procedimental não impugnatória dos contribuintes (cfr. JOSÉ CASALTA NABAIS, Direito Fiscal, 5ª ed., Coimbra, Almedina, 2009, p. 370), que se destina não apenas a levar ao seu conhecimento o acto praticado, como também a permitir-lhes reagir contra ele em caso de discordância. Por isso o nº 1 do artigo 36º do CPPT estabelece que “os actos em matéria tributária que afectem os direitos e interesses legítimos dos contribuintes só produzem efeitos em relação a estes quando lhes sejam validamente notificados”.
Assim, embora o nº 1 do artigo 39º do CPPT contenha uma presunção de notificação, esta presunção deve ter-se como ilidível, e foi elidida no caso dos autos, por demonstração de que a notificação se efectuou efectivamente em data posterior (…).
Do mesmo modo, o nº 6 do artigo 45º da LGT, que estabelece que para efeitos de contagem do prazo de caducidade “as notificações sob registo consideram-se validamente efectuadas no 3º dia posterior ao do registo ou no 1º dia útil seguinte a esse, quando esse dia não seja útil”, deve ser interpretado como estabelecendo mais uma presunção iuris tantum, neste caso de válida notificação da liquidação, e não como norma imperativa – que se afiguraria de constitucionalidade muito duvidosa em face do nº 3 do artigo 268º da Constituição da República, pois que a norma constitucional garante o direito à notificação, remetendo para a lei apenas a sua “forma”, ou seja, o procedimento pelo qual deve a notificação ser efectuada, impondo que as notificações de actos que afectem a esfera jurídica dos administrados não sejam meramente ficcionadas, mas tendencialmente efectivas…».
Embora, como se referiu, esta doutrina se reporte às notificações por via postal e ao disposto nos nºs 1 e 2 do art. 39º do CPPT e no nº 6 do art. 49º da LGT, no caso, não deixa também de ser aplicável a referência constitucional nela salientada, sendo que da prova dos autos resulta efectivamente que o recorrente não chegou a tomar conhecimento do acto até ao termo do dia 31/12/2004, por motivo que lhe não foi imputável e que, por isso, a liquidação não foi validamente notificada no prazo da respectiva caducidade.

4.4. Neste contexto, portanto, a sentença recorrida, que concluiu que o facto de ter estado ausente do país no dia 30/12/2004 - dia da notificação - é imputável ao oponente e, por isso, não impeditivo de operar a notificação com hora certa (o que determina, consequentemente, que a liquidação haja sido validamente notificada até 31/12/2004, não ocorrendo a falta de notificação da liquidação no prazo de caducidade), enferma do erro de julgamento que o recorrente lhe imputa e não pode manter-se.

5. E, assim sendo, fica prejudicada a apreciação da questão (suscitada nas Conclusões O e P do recurso), respeitante à ilegalidade decorrente do facto de a citação por via postal não se ter frustrado previamente (devido ao facto de a carta registada sob o nº RY.2525.3665.6PT, respeitante à liquidação de IRS de 2000, nunca ter sido remetida por correio anteriormente), daí pretendendo retirar a conclusão de que a notificação, por via de carta registada com aviso de recepção, apenas ter ocorrido no dia 5/1/2005, ou seja, após o prazo de caducidade da liquidação do imposto em causa.

DECISÃO
Nestes termos acorda-se em, dando provimento ao recurso, revogar a decisão recorrida e julgar procedente a oposição.
Sem custas.
Lisboa, 28 de Março de 2012. - Casimiro Gonçalves (relator) – Ascensão Lopes – Dulce Neto.