Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0856/15
Data do Acordão:10/01/2015
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:TERESA DE SOUSA
Descritores:EMPREITADA DE OBRAS PÚBLICAS
PREÇO PARCELAR
DECLARAÇÃO
FORMALIDADE NÃO ESSENCIAL
PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE
CAUSAS DE EXCLUSÃO
PROPOSTA
Sumário:I - A preterição da formalidade prevista no art. 60º, nº 4 do CCP, de apresentação da declaração de preços parciais, degrada-se numa mera irregularidade ou formalidade não essencial, desde que, comprovadamente, se conseguiu atingir a finalidade visada com a exigência de tal declaração, pela análise da lista de preços unitários conjugada com o mapa de quantidades.
II – Constituindo aquela declaração um elemento formal destinado a aferir se o concorrente detém os alvarás necessários à execução dos trabalhos de construção civil envolvidos, sendo possível através da análise conjugada dos elementos que instruíram a proposta atingir a finalidade pretendida com a junção daquela declaração, era desproporcional excluir a proposta face à sua falta.
III - Não se reportando a declaração prevista no art. 60º, nº 4 do CCP, a um verdadeiro atributo da proposta a considerar na respectiva avaliação e decisão de adjudicação, conforme os respectivos critérios, o CCP não contempla qualquer preceito que determine a exclusão da proposta por falta da indicação do referido elemento.
Nº Convencional:JSTA00069355
Nº do Documento:SA1201510010856
Data de Entrada:08/31/2015
Recorrente:A......., S.A.
Recorrido 1:ASSOC .............. E B......., S.A.
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC REVISTA EXCEPC
Objecto:AC TCAN
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR ADM ECON - EMP OBRAS PUBL CONCURSO.
DIR ADM GER.
Legislação Nacional:CCP ART60 N4 ART56 N2 ART57 ART81 ART146 N2 ART70 N2.
CPA ART5 N2.
CONST76 ART266 N2.
Jurisprudência Nacional:AC TCONTAS 10/2012 DE 2012/06/19.; AC STA DE 1986/02/20 IN AD 303 PAG364.
Referência a Doutrina:RODRIGO ESTEVES OLIVEIRA - ESTUDOS DA CONTRATAÇÃO PÚBLICA VOLI PAG110.
MÁRIO ESTEVES OLIVEIRA E RODRIGO ESTEVES OLIVEIRA - CONCURSOS E OUTROS PROCEDIMENTOS DE CONTRATAÇÃO PÚBLICA PAG228.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo

1. RELATÓRIO

A………., SA interpõe recurso, a fls. 922 dos autos, ao abrigo do art. 150º do CPTA, do acórdão do TCAN de 24.10.2014 (acórdão este cujas nulidades foram supridas por acórdão de 17 de Abril de 2015), que concedeu provimento a recurso de sentença do TAF de Braga que julgara procedente a acção de contencioso pré-contratual intentada pela ora recorrente contra a Associação …… — …………. e B………, SA, relativa à adjudicação da “Empreitada de Construção da área de Acolhimento empresarial ……….., ………………..”, revogando tal decisão.
As alegações de recurso apresentam conclusões do seguinte teor:

I. Vem o presente recurso interposto do Acórdão proferido a 24 de Outubro de 2014 pelo Tribunal Central Administrativo Norte (TCAN), que julgou procedente o Recurso apresentado pela ASSOCIAÇÃO …….. — ……….., e a Contrainteressada a B………, S.A.;
II. Discordando da decisão em apreço, vem a Recorrente interpor Recurso de Revista;
III. Na verdade, o presente Recurso de Revista deverá ser admitido, uma vez que tal é, indubitavelmente, necessário para uma melhor aplicação do direito, uma vez que estamos perante a existência de duas decisões em sentido contrário;
IV. Não pode a ora Recorrente conformar-se com o teor do douto Acórdão, isto por duas razões:
a) O douto Acórdão Recorrido é nulo por omissão de pronúncia;
b) Não é de degradar em mera irregularidade a falta de entrega da declaração de Preços Parciais, ao abrigo da teoria das formalidades não essenciais;
V. Ao ter revogado a decisão proferida em primeira instância estava obrigado o TCAN a conhecer das questões, até então, prejudicadas, não se pronunciando, designadamente, quanto ao seguinte:
a) Os erros da proposta da contrainteressada;
b) A incongruência entre o plano de trabalhos e o mapa de quantidades;
c) A incongruência entre o plano de trabalhos e o plano de pagamentos;
d) O vício de falta de fundamentação do Relatório Final;
e) A errónea avaliação das propostas;
VI. Não o fazendo, o douto Acórdão é, por via disso, nulo por omissão de pronúncia;
VII. O artigo 60.º do CCP é uma norma injuntiva/imperativa que regula a indicação do preço nas propostas e que se aplica diretamente aos concorrentes, sem necessidade de estar prevista no programado procedimento;
VIII. Em caso de procedimento de formação de contrato de empreitada, o concorrente está obrigado a indicar na proposta os preços parciais
IX. A lei obriga os Concorrentes a entregar uma declaração/documento onde constem os preços parciais;
X. Com efeito, sendo a lista de preços parciais um documento e se, ao abrigo do artigo 60º, n.º 4, do CCP, os Concorrentes estão obrigados a entregar a lista de preços parciais com a proposta, conclui-se que, a lista de preços parciais é, de facto, um documento da proposta
Xl. Nesta conformidade, a sua falta equivale à falta de um documento da proposta
XII. Sendo, por isso, obrigatória a exclusão da proposta que não se acompanhe da declaração da lista de preços parciais, atento ao disposto no artigo 146º, n.º 2 alínea d) do CCP;
XlII. A teoria das formalidades não essenciais apenas opera quando a lei não disponha expressamente de outra forma, o que não é o caso;
XIV. Sendo, a entrega da declaração de preços parciais exigida por lei, manifestada num documento que deve acompanhar a proposta, a sua falta é cominada com a sanção de exclusão, por falta de um documento da proposta;
XV. Assim, a decisão tomada no Acórdão, é ilegal, porque proferida contra legem ou seja, em expressa violação do regime legal previsto, o que é vedado pela Constituição da República Portuguesa;
XVI. A entender-se que esta ilegalidade se degrada em mera irregularidade, estamos ignorar a lei, logo, temos um direito sem obrigação e aplicação, um direito inútil, onde conteúdo da norma é vazio, o que destrói o sistema jurídico e impede a realização da Justiça;
XVI. À luz dos valores da certeza e segurança jurídica e ponderados os princípios que norteiam a contratação pública, não se pode aceitar que a violação de uma norma seja ignorada, por considerar-se ser de degradar em não essencial a falta de entrega de um documento exigido por lei e sancionado com a exclusão;
XVIII. A norma do artigo 60º, n.º 4, do CCP é vinculativa/ imperativa/ /injuntiva, pelo que, já existe uma avaliação dos interesses e, consequentemente, já há uma ponderação contida na própria norma;
XIX. Não cabendo qualquer ponderação, do seu incumprimento, ao abrigo da teoria das formalidades não essenciais;
XX. A omissão de apresentação da lista de preços parciais invalida a proposta, traduzindo-se a graduação desta, com tal omissão, numa situação de favor, injusta e injustificada, relativamente ao concorrente faltoso, violadora de princípios fundamentais da Contratação Pública.

As contra-alegações que apresenta a Recorrida ASSOCIAÇÃO …….. - ………., têm as seguintes conclusões:
1. A Recorrente fundamenta o seu pedido argumentando que existem, nos presentes autos, duas decisões em sentido contrário, a saber, a do TAF e a do TCAN, pelo que se torna necessária a admissão da revista para uma melhor aplicação do Direito.
2. Esta alegação é meramente conclusiva e parte de uma dada situação de facto que ocorre em milhares de processos e que, por este motivo, não pode suportar um recurso de natureza excepcional, sob pena de todas as decisões dos tribunais superiores que revogam decisões de tribunais inferiores servirem este efeito.
3. O acórdão sob recurso decidiu em linha com consolidada jurisprudência e doutrina relativo à teoria das formalidades não essenciais, pelo que deve o recurso interposto ser rejeitado por falta dos respectivos pressupostos legais de admissibilidade.
4. Com o CCP o concurso público deixou de requisitar de capacidade técnica e económico-financeira aos concorrentes para avaliação das propostas.
5. Nas empreitadas, os documentos indispensáveis ao, além da proposta de preço propriamente dita, a lista de preços unitários, plano de trabalhos e nalgumas situações o estudo prévio.
6. A ratio da norma do artigo 60º/ nº 4 do CCP permitir à entidade adjudicante verificar a adequação dos alvarás aos trabalhos o executar
7. A Recorrida não incluiu no Programa de Procedimento este documento por entender ser o mesmo desnecessário e porque na sua perspectiva trata-se de um documento respeitante à fase da habilitação.
8. O objectivo desta norma pode ser alcançado através do artigo 12º do D.L. nº 12/2004, de 09.01, que refere ser suficiente, para se considerar devidamente habilitado para a empreitada em causa, que fossem os concorrentes “empreiteiros” geral na categoria exigida em valor que cobrisse a sua proposta, o que o adjudicatário cumpria.
9. O objectivo do artigo 60º/nº 4 do CCP pode ainda ser atingido por via da conjugação da lista de preços unitários com o mapa de quantidades, ou até só com a análise da lista de preços unitários, o que foi feito pela Recorrida, que obteve esta informação deste modo.
10. A adjudicatária possuía alvará para executar todos os trabalhos, com excepção da 12.º subcategoria da 4 categoria, tendo em sede de habilitação junto a declaração prevista no artigo 81º/nº 3 do CCP.
11. A possibilidade de se atingir o fim de uma norma por outro meio traduz a consagração da teoria das formalidades não essenciais, pela qual se tem vindo a entender (tribunais, Tribunal de Contas e doutrina) que no caso: omissão da formalidade não impedir a consecução dos objectivos por outro via a invalidade degrada-se em mera irregularidade.
12. Em matéria de exclusão de concorrentes num procedimento concursal vigora o princípio da taxatividade, pelo qual só pode tomar-se tal decisão se o motivo estiver previsto no Programa de Procedimento ou em lei.
13. O artigo 60º/nº 4 do CCP não comina com exclusão a falta de apresentação do documento em causa.
14. Por via do artigo 57º do CCP a exclusão da proposta da adjudicatária só poderia ter lugar caso se considere a declaração em causa como constituindo um atributo da proposta
15. Em face dos documentos exigidos pelo ponto 17 do Programa de Procedimento constata-se que a declaração do artigo 60º/n 4 do CCP não contém qualquer aspecto relativo à proposta, isto é, a algum dos seus atributos.
16. A declaração a que se reporta o artigo 60º/nº 4 do CCP não revela nada que não resulte de nenhum outro documento, como o preço, o prazo de execução da obra, os preços unitários ou os equipamentos a afectar à obra.
17. A declaração em causa não releva para a apreciação da proposta, nada respeita ao modo como o adjudicatário vai executor a empreitada, isto é, trata-se de documento absolutamente inócuo para efeitos da al. b) do nº 1 do artigo 57º do CPP, que não tinha de ser exigido para aquele efeito, e, nessa medida, nunca poderia determinar e legitimar a exclusão de qualquer concorrente.
18. A declaração do artigo 60º/nº 4 do CCP não interfere com o preço, nem com o prazo, nem com a valia técnica da proposta (os subfactores deste factor são o modo de execução da obra, os meios humanos e técnicos a afectar à obra, os meios e equipamentos a afectar à obra, o sistema de gestão integrada de segurança, ambiente e qualidade na execução do obra e as medidas relativas à inovação, sustentabilidade e responsabilidade social).
19. A avaliação que o júri fez da proposta da adjudicatória não seria minimamente influenciada se o documento em causo tivesse sido solicitado pelo Programa de Procedimento e não junto pelo concorrente, pois aquele documento não contém informação que pudesse alterar a pontuação atribuído a qualquer um dos factores.
20. Poderá concluir-se com total segurança e certeza que a decisão final do procedimento seria a mesma e a adjudicação seria efectuada à adjudicatária, pelo que ao abrigo do princípio do aproveitamento do acto administrativo o acto impugnado deverá manter-se na ordem jurídica.
21. O acórdão recorrido decidiu correctamente, pelo que deve manter-se.

A formação a que se refere o art. 150º, nº 5 do CPTA acordou em Conferência, de 14 de Julho de 2015, admitir o recurso de Revista.
A Exma Procuradora–Geral Adjunta do Ministério Público, junto do Supremo Tribunal Administrativo emitiu Parecer a fls. 1072 a 1075 no sentido de ser de negar provimento ao recurso.
Sem vistos, cumpre agora decidir.

2. Os Factos:

A decisão recorrida (complementada pelo acórdão que conheceu das nulidades) deu como assentes os seguintes factos:
1- A Autora é uma sociedade comercial anónima que se dedica, com carácter de habitualidade, por conta própria e escopo lucrativo à actividade de construção civil e obras públicas, entre outras.
2- A Ré tem como objecto promover o estudo, planeamento, construção, instalação e desenvolvimento ordenado no território de parques empresariais bem como apoiar a gestão e organização dos mesmos, com vista, designadamente à implementação sustentada de empresas em determinadas localizações
3- Por anúncio de procedimento nº 2410/2013, publicado no Diário da República, 11 Série, nº 94, de 16052013, foi aberto pela Ré procedimento de concurso público, tendo por objecto a “Empreitada de Construção da Área de Acolhimento Empresarial …………, ……………”.
4- Nos termos do ponto 17 do Programa de Procedimento, o critério de adjudicação acolhido no âmbito do procedimento foi o da proposta economicamente mais vantajosa, determinada pela utilização de quatro factores de avaliação: preço (40%), prazo (5%), garantia (5%) e valia técnica da proposta (50%) — cfr. doc. nº 1 junto com a p.i. cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
5- É o seguinte o teor do ponto 11 do Programa de Procedimento:
“11. Documentos que constituem a proposta:
A proposta será instruída com os seguintes documentos:
a. Declaração
b. emitida conforme Anexo 1;
b. Preço total e preços unitários, que não devem incluir o IVA;
c. Nota justificativa do preço proposto;
d. Memória descritiva e justificativa do modo de execução da obra;
e. Plano de Trabalhos, tal como definido no artigo 361.º do Código da Contratação Pública (CCP) que procederá à fixação da sequência e dos prazos parciais de execução de cada uma das espécies de trabalhos previstas e à especificação dos meios (mão-de-obra e equipamentos) com que o concorrente se propõe executa-los, bem como à definição do correspondente plano de pagamentos;
f. Curriculo vitae do director de obra, do técnico de saúde e segurança e do encarregado, onde conste a experiência em obras da mesma natureza e valor, que deve ser devidamente comprovada;
g. Lista dos equipamentos a afetar à obra e documentos comprovativos da sua propriedade e descrição do estado de conservação dos mesmos;
h. Documentação que justifique o preço anormalmente baixo apresentado, quando aplicável;
i. Sistema de gestão integrado de segurança, qualidade e ambiente adaptado à obra;
j. Documento onde constem as medidas propostas pelo concorrente relativo à inovação, sustentabilidade e responsabilidade social;
k. Quaisquer outros documentos que o concorrente apresente por os considerar indispensáveis para efeitos do disposto na parte final da alínea b,) do n.º 1 do artigo 57º do CCP, regulamentado pelo Decreto-lei n.º 18/2008, de 29 de Janeiro”.
6- O ponto 22 do Programa de Procedimento estabelece os documentos de habilitação a apresentar pelo adjudicatário, prevendo no seu n.º 3.º o alvará emitido pelo INCI, IP contendo as seguintes autorizações: “a. Empreiteiro geral da 2ª categoria (...), a qual tem de ser em classe correspondente ao valor global da proposta; b. Possuir a 1ª, 2ª, 3ª, 4ª, 7ª e 12ª subcategoria da 4ª categoria, em classe correspondente aos valores dos trabalhos”.
7- Apresentaram propostas, além do mais, a ora Autora e a ora Contra-interessada.
8- Com a sua proposta, a Contra-interessada apresentou lista de preços unitários - cfr. doc. 4 junto com a contestação da C.I. cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
9- Com a sua proposta, a Contra-interessada não apresentou a declaração prevista no artigo 60º, nº 4 do CCP.
10- Após a avaliação das propostas apresentadas, propôs a Ré a adjudicação da proposta da contra-interessada, que obteve a classificação de 93,75 pontos.
11- A proposta da Autora ficou em segundo lugar, com a pontuação atribuída de 91,25 pontos.
12- A Autora, em sede de audiência prévia ao relatório preliminar, requereu a exclusão da contra-interessada - cfr. doc. 2 junto com a p.i. cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
13- Em 12.11.2013, o Júri, por unanimidade, deliberou manter a decisão prevista no relatório preliminar e adjudicar a empreitada em causa à contra-interessada - cfr. doc. 3 junto com a p.i. cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
14- Por deliberação da Direcção da Ré, datada de 13.11.2013, foi autorizada a adjudicação à contra-interessada, nos termos do relatório final – cfr. doc. 4 junto com a p.i. cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
15- A Contra-interessada juntou, em sede de habilitação, declaração de compromisso - conforme doc. n.º 5 junto com a contestação da CI, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
16- No dia 13.12.2013, foi celebrado o contrato de empreitada entre a Ré e a Contra-interessada - cfr. doc. 1 junto com a contestação da CI cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
17- Em 19.12.2013, foi feita a consignação da empreitada, tendo sido dada a posse dos terrenos à Contra-interessada - cfr. doc 2 junto com a contestação da C.I cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
18- A petição inicial que originou os presentes autos foi remetida, via site, em 19.12.2013 - cfr. sitaf e fls. 1 do suporte físico.”.
19- No ponto 13.º do Programa de Concurso, sob a epígrafe “Propostas Variantes” consignou-se: «Não é admitida a apresentação pelos concorrentes de propostas variantes».
20- Dá-se aqui por integralmente reproduzido o teor das propostas apresentadas pela autora e pela contrainteressada – cfr. fls. P.A.;
21- A contrainteressada apresentou o plano de pagamentos, plano de trabalhos e mapa de quantidades que constam respetivamente 150 a 181, 182 a 191 e 202 a 207 dos autos, e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
22- A autora apresentou o plano de pagamentos, plano de trabalhos e mapa de quantidades, que constam do PA anexo, documento cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
23- Dá-se aqui por integralmente reproduzido o teor do documento de fls. 291 dos autos.
24- Dá-se aqui por integralmente reproduzido o teor do Relatório Preliminar de fls. 83 a 147 dos autos.
25- Dá-se aqui por integralmente reproduzido o teor do Relatório Final de fls. 71 a 78 dos autos.

3. O Direito

O presente recurso de revista vem interposto pela Autora da presente acção administrativa especial de contencioso pré-contratual, do acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte (TCAN) que, revogando o acórdão do TAF de Braga, julgou improcedente a referida acção intentada por “A.........., SA” contra a “Associação ............ – ..................”, sendo contra-interessada (CI) a aqui Recorrida, “B............., SA”.
Neste recurso a Autora imputou ao acórdão recorrido nulidade por omissão de pronúncia. Mais defende que não é de degradar em mera irregularidade a falta de entrega da declaração de Preços Parciais, ao abrigo da teoria das formalidades não essenciais.
A nulidade por omissão de pronúncia resultava de o acórdão recorrido não haver conhecido de questões cujo conhecimento em 1ª instância foi considerado prejudicado pela decisão que tomou, sendo tais questões atinentes ao vício de falta de fundamentação do Relatório Final; erros da proposta da contrainteressada; incongruência entre o plano de trabalhos e o mapa de quantidades; c) incongruência entre o plano de trabalhos e o plano de pagamentos e a errónea avaliação das propostas.
O Tribunal a quo tendo julgado verificada a nulidade de decisão invocada supriu-a, proferindo o acórdão de fls. 970 a 1000, conhecendo dos invocados vícios.
Face a este acórdão a Recorrente não usou da faculdade prevista no nº 3 do art. 617º do CPC, pelo que é de considerar que suprida a nulidade de decisão por omissão de pronúncia que era objecto do presente recurso de revista, neste apenas há que apreciar e decidir a questão de saber quais as consequências que resultam da falta de apresentação, com a proposta em concurso público, da declaração a que se refere o nº 4 do art. 60º do CCP, nomeadamente se esta norma é imperativa, e se, ao não ter sido observada devia ter determinado a exclusão da proposta.
O acórdão recorrido considerou que “na situação em causa, a falta de declaração de preços parciais não foi impeditiva, em função dos critérios de avaliação das propostas, da análise comparativa destas, pelo que, apesar da sua falta representar uma ilegalidade, por traduzir a violação ao comando inscrito no nº 4 do artigo 60º do CCP, a mesma não tem como efeito a invalidação da sua apresentação, atenta a teoria das formalidades não essenciais”.

Vejamos então:

Estabelece-se no referido art. 60º, nº 4 do CCP que, em caso de procedimento de formação de contrato de empreitada, o concorrente deve indicar na proposta os preços parciais dos trabalhos que se propõe executar correspondentes às habilitações contidas nos alvarás, para efeitos da verificação da conformidade desses preços com a classe das respectivas habilitações.
Ora, como resulta do probatório (ponto 9), efectivamente, a CI, aqui Recorrida não apresentou a declaração prevista no art. 60º, nº 4 do CCP, pelo que incumpriu o disposto naquele preceito.
No entanto, a ilegalidade, verificada com tal incumprimento, tem que ser aferida tendo em conta se os objectivos prosseguidos pelo legislador foram realizados de outro modo.
Tal vem sendo o entendimento do Tribunal de Contas, tendo-se expendido no acórdão nº 10/2012, de 19/6, recurso ordinário nº 30/2011-R (processo de fiscalização prévia nº 450/2011), a propósito desta matéria o seguinte:
«Nesta matéria é preciso ter presente, como já tem observado este Tribunal em várias decisões, que frequentemente é possível deduzir os valores pretendidos da própria lista de preços unitários ou de outros elementos da proposta.
Como é preciso ter em conta que, se não estivermos perante verdadeiros atributos da proposta a considerar na respectiva avaliação e decisão de adjudicação, conforme o respectivo critério, o CCP não contempla norma que permita a exclusão da proposta por falta da indicação dos elementos referidos no artigo 60.º, n.ºs 4 e 5”».
No caso em apreço, por um lado, não há dúvida de que a declaração em causa apenas visa dar cumprimento ao nº 4 do art. 60º do CPP, não se reportando a atributos da proposta (cfr. arts. 56º, nº 2 e 57º, nºs 1, 2 e 3 do CCP).
Isto é, tal documento diz respeito à fase de “habilitação”, apenas destinado ao adjudicatário, na qual este tem que apresentar a declaração e documentos indicados no nº 1 alíneas a) e b) do nº 1 do art. 81º do CCP e ainda os alvarás ou títulos de registo emitidos pelo Instituto da Construção e do Imobiliário, IP, indicados no nº 2 do mesmo preceito, para se verificar se possui “…habilitações adequadas e necessárias à execução das obras a realizar…” (e o programa de procedimento remetia precisamente para esta fase de habilitação a verificação do alvará, no respectivo ponto 22 – cfr. 6 do probatório).
Por outro lado, o objectivo visado pelo nº 4 do art. 60º do CCP, que é o de permitir à entidade adjudicante, perante os documentos que o adjudicatário apresente em cumprimento daquele art. 81º, avaliar se este tem, ou não, as habilitações necessárias à execução da obra, foi atingido pela análise da lista de preços unitários conjugada com o mapa de quantidades.
Foi o que o júri do concurso explicitou na análise da pronúncia em sede de audiência prévia (que integra o Relatório Final), nos seguintes termos, «No caso, embora a regra não tenha sido cumprida, os objetivos prosseguidos pelo legislador foram realizados através da apresentação do resumo da lista de preços unitários nos termos da alínea b) do ponto 11 do programa de procedimento. Esta declaração permitirá que seja verificada a adequação dos alvarás e das respetivas classes aos trabalhos de construção a realizar e que o contrato seja celebrado com a certeza de que o concorrente detém os alvarás necessários à execução dos trabalhos de construção civil envolvidos (o mapa de quantidades está organizado por especialidades e, dentro destas, por capítulos)».
Estamos, pois, perante uma situação em que a jurisprudência do Tribunal de Contas expressa no aresto acima citado tem plena aplicação.
Tal jurisprudência traduz a teoria das formalidades não essenciais que, segundo expende Rodrigo Esteves de Oliveira, in Estudos de Contratação Pública, I, pág. 110, se trata de «Um outro mecanismo destinado a atenuar o desvalor normalmente associado à inobservância de uma formalidade consiste na denominada teoria das formalidades (não) essenciais. Há muito adoptada pela jurisprudência e doutrina, inclusive em matéria de contratação pública, a referida teoria diz-nos que uma formalidade essencial (cuja preterição conduz em princípio à invalidade do acto) se degrada em não essencial (em mera irregularidade, portanto, sem afectar a validade do acto), quando, num determinado caso, a sua omissão não tenha impedido a consecução dos objectivos ou valores jurídicos que ela se destinava a servir, realizados por outra via». Invoca este Autor, entre outros, o acórdão deste STA de 20.02.1986, in AD 303, pág. 364, «…onde se salienta que é irrelevante a falta de cumprimento de formalidades uma vez que se tenham atingido os objectivos que com elas se visava preparar».
É, precisamente, este o caso em apreço em que a preterição da formalidade prevista no art. 60º, nº 4 do CCP, de apresentação da declaração de preços parciais, se degradou numa mera irregularidade ou formalidade não essencial, uma vez que, comprovadamente, se conseguiu atingir a finalidade visada com a exigência de tal declaração, pela análise da lista de preços unitários conjugada com o mapa de quantidades, tal como entendeu o acórdão recorrido.
Igualmente, a aplicação do princípio da proporcionalidade que vincula a actuação administrativa com expressa previsão constitucional (art. 266º, nº 2 da CRP) e legal (art. 5º, nº 2 do CPA), sendo também um princípio geral de direito comunitário, tem inteira aplicação na contratação pública e conduz à mesma conclusão de que a irregularidade detectada não deve determinar a exclusão da proposta.
Como referem Mário Esteves de Oliveira e Rodrigo Esteves de Oliveira, in Concursos e outros Procedimentos de Contratação Pública, pág. 228, sobre a aplicação deste princípio no âmbito da contratação pública: «(…) sendo verdade que o campo privilegiado de sua actuação se situa no seio das relações jurídicas materiais, não deixa ele, por isso, de ter também importantes projecções e consequências nas relações procedimentais de contratação pública.
O que se exige então à entidade adjudicante (e ao júri), por força dele, é que, considerando a função e objectivos do procedimento em causa, não adopte medidas restritivas da concorrência sem justificação suficiente e adequada para o efeito – exigência que vale desde logo na definição das condições de acesso ao procedimento, na fixação do prazo para apresentação de propostas.
(…)
No plano procedimental propriamente dito, exige-se o mesmo ao órgão adjudicante ou ao júri, impondo-se-lhe que avalie sempre ponderadamente a adequação e proporcionalidade dos meios utilizados em relação aos fins prosseguidos, por exemplo, (…), na valorização de irregularidades das propostas e da escolha da medida mais adequada ao caso (a exclusão de uma proposta ou candidatura por razões meramente formais e de pormenor relativas ao modo de apresentação de propostas, por exemplo, pode ser desproporcionada), …».
Ora, no caso da falta da declaração em apreço, não respeitando a mesma aos atributos da proposta, mas antes constituindo um elemento formal destinado a aferir se o concorrente detém os alvarás necessários à execução dos trabalhos de construção civil envolvidos, sendo possível através da análise conjugada dos elementos que instruíram a proposta atingir a finalidade pretendida com a junção daquela declaração, era desproporcional excluir a proposta, tal como foi entendido.
Ao que acresce que, não se reportando a declaração prevista no art. 60º, nº 4 do CCP, a um verdadeiro atributo da proposta a considerar na respectiva avaliação e decisão de adjudicação, conforme os respectivos critérios, o CCP não contempla qualquer preceito que permita a exclusão da proposta por falta da indicação do referido elemento.
Com efeito, dispõe o art. 146º, nº 2, alínea d) do CCP que o júri deve propor a exclusão das propostas que não sejam constituídas por todos os documentos exigidos nos termos do disposto no artigo 57º, nº 1 do CCP.
E, na alínea b) do nº 1 do referido art. 57º contempla-se como documentos da proposta aqueles que em função do objecto do contrato a celebrar e dos aspectos da sua execução submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, contenham os atributos da proposta, de acordo com os quais o concorrente se dispõe a contratar.
Por sua vez, a alínea o) do referido art. 146º, nº 2 prevê que o júri proponha a exclusão das propostas cuja análise revele alguma das situações previstas no nº 2 do art. 70º.
Ora, a declaração contemplada no art. 60º, nº 4 do CCP não está abrangida em qualquer uma das alíneas do nº 2 do art. 70º do CCP, pelo que, face à taxatividade das causas de exclusão da proposta não pode considerar-se que a falta de tal elemento determine a exclusão da proposta.
Nestes termos, improcede o presente recurso, devendo o acórdão recorrido ser confirmado.

Pelo exposto, acordam em:
a) – negar provimento ao recurso, confirmando o acórdão recorrido;
b) – condenar a Recorrente nas custas, dispensando-se as partes do pagamento do remanescente da taxa de justiça, ao abrigo do disposto no art. 6º, nº 7 do RCP.

Lisboa, 1 de Outubro de 2015. – Teresa Maria Sena Ferreira de Sousa (relatora) – José Francisco Fonseca da Paz – Maria do Céu Dias Rosa das Neves.