Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0267/12.1BECBR
Data do Acordão:12/15/2022
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FRANCISCO ROTHES
Descritores:REVISÃO DA MATÉRIA COLECTÁVEL
DECISÃO
FUNDAMENTAÇÃO
Sumário:I - Na falta de acordo entre os peritos, o órgão competente para a fixação da matéria tributável não tem que apoiar-se nas razões dos peritos, motivo por que na fundamentação da sua decisão não fica limitado pelo leque dos fundamentos que, eventualmente, tenham sido aduzidos pelos peritos; como decorre da letra da lei, «resolverá, de acordo com o seu prudente juízo, tendo em conta as posições de ambos os peritos» (cfr. n.º 6 do art. 92.º da LGT), ou seja, tem apenas de levar em conta as posições dos peritos e não de aderir a qualquer dessas posições.
II - Deve considerar-se suficientemente fundamentado o acto da AT que dá a conhecer aos interessados as razões por que a autoridade administrativa actuou e actuou num determinado sentido, de modo a possibilitar-lhes uma opção consciente entre a aceitação da legalidade do acto e a sua impugnação.
Nº Convencional:JSTA000P30347
Nº do Documento:SA2202212150267/12
Data de Entrada:10/14/2022
Recorrente:A…………………
Recorrido 1:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:MAIORIA COM 1 VOT VENC
Aditamento:
Texto Integral:

1. RELATÓRIO

1.1 A acima identificada Recorrente interpôs recurso para este Supremo Tribunal Administrativo da sentença por que o Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, julgando parcialmente procedente a impugnação judicial, anulou as liquidações de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) respeitantes aos anos de 2005, 2006 e 2007 – efectuadas após a AT ter feito correcções à matéria tributável declarada, com recurso a métodos indirectos –, na parte respeitante ao valor dos baptizados que a AT considerou realizados e cujo valor entendeu ter sido omitido nas declarações de rendimentos e manteve os mesmos actos na parte respeitante aos casamentos cujo valor a AT também considerou ter sido omitido naquelas declarações.

1.2 O recurso foi admitido, com subida imediata e nos próprios autos e a Recorrente apresentou a motivação do recurso, que resumiu em conclusões do seguinte teor:

«1. O vício de falta de fundamentação verifica-se de forma cristalina no facto do Director de Finanças ter decidido o procedimento de revisão sem que o perito da AT tivesse manifestado a sua posição no debate contraditório.

2. Na verdade, não existindo acordo no prazo de 30 dias a contar do início do procedimento de revisão, o órgão competente para a fixação da matéria tributável decidirá, tendo de ter em conta, para fundamentar a decisão, as posições expressas pelos peritos.

3. “Esta referência às posições expressas pelos peritos e não também às expressas pelas partes no procedimento, significa que deverão ter-se em conta apenas as posições expressas pelos peritos, sendo irrelevantes as posições defendidas pelo próprio sujeito passivo e pela administração tributária no procedimento tributário, quando não tiverem sido corroboradas pelos peritos designados. Esta irrelevância das posições expressas pelas partes, tem como corolário que o valor a fixar para a matéria tributável não terá de ser fixado entre os valores indicados pelo contribuinte no pedido de revisão e pela administração tributária no acto que é objecto do pedido. No entanto, a obrigatoriedade de na fixação ter em conta as posições dos peritos e a relevância absoluta que à posição dos peritos é reconhecida no n.º 3 do art. 92º da LGT, em que se prevê que a sua posição é obrigatória nos casos de acordo, impõem, desde logo, que se conclua que a matéria colectável não poderá ser fixada em montante inferior ao menor nem superior ao mais elevado dos valores indicados pelos peritos” – Lei Geral Tributária Anotada e Comentada por Jorge Lopes de Sousa, Benjamim Silva Rodrigues, Diogo Leite de Campos, 4.ª Edição, Encontro da Escrita, anotação ao art. 92.º.

4. É errado o julgamento efectuado, pois que não se verifica na acta, transcrita na al. k) do probatório, qualquer posição do perito da AT, ou seja, INEXISTE!

5. E se inexiste, também não poderia o Director de Finanças, no despacho a que se refere o art. 92.º, n.º 6 da LGT, decidir de acordo com a posição do perito da AT. Decidiu chamando à colação o relatório de inspecção, o que poderia fazer, caso o perito da AT para o mesmo tivesse remetido, o que não foi feito.

6. Assim sendo, temos que a decisão proferida nos termos e para os efeitos do n.º 6 do art. 92.º da LGT, é ilegal pois que não tomou em consideração as posições dos peritos, estando infundamentada.

7. Acresce que a falta de fundamentação já era verificável a montante, no que concerne ao exercício de 2007, quando no relatório (pág. 22) se refere: “Relativamente aos restantes casamentos (3) – presumindo-se de grande dimensão, conforme declarações de prestadores de serviços, designadamente ……………….. e ………………, considera-se o mesmo valor de 2006, ou seja, 20.000.00€”. Porquê, questiona-se.

8. E também relativamente ao exercício de 2005, quanto ao valor unitário considerado (pág. 19): “valor unitário de 14.000.00 € por cada evento – casamento –, valor declarado como pago ao sujeito passivo inspeccionado, com referência ao evento de 4-6-2005…”. Porquê este valor para todos os eventos?

9. Verifica-se, pois, a ocorrência do vício de falta de fundamentação.

10. Normas jurídicas violadas: arts. 268.º, n.º 3 da CRP; 77.º e 92.º, n.º 6 da LGT.

Termos em que e nos mais de direito deve o presente recurso ser provido e, consequentemente, revogada a sentença proferida, julgando-se a impugnação procedente, assim se fazendo justiça».

1.3 A AT não contra-alegou.

1.4 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, foi dada vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral-Adjunto emitiu parecer no sentido de que seja negado provimento ao recurso. Isto, após ter enunciado as duas questões a dirimir como respeitando à falta de fundamentação i) «da decisão do procedimento de revisão da matéria tributável, por entender que a mesma não se baseia no parecer do perito da Administração Tributaria, uma vez que este não foi emitido» e ii) dos «valores unitários utilizados para quantificar o valor dos casamentos ocorridos nos anos de 2005 e 2007».
Depois de analisar detalhadamente o vício invocado nas suas duas dimensões, concluiu:
«Em face do exposto afigura-se-nos que, tanto a decisão do procedimento de revisão da matéria tributável, como os critérios de quantificação da matéria tributável, se mostram devidamente fundamentados. No primeiro caso por a falta de menção expressa da posição do perito da AT na acta da reunião não ter qualquer repercussão na validade da decisão tomada, por a omissão de tais elementos se revelar impertinente no caso concreto e não se impor ao decisor a consideração de quaisquer elementos sobre os quais o perito tivesse que tomar posição. E no segundo caso por os valores unitários fixados para os serviços relativos aos eventos de “casamento” terem sido apurados com base em elementos objectivos fornecidos pelos diversos intervenientes nesses eventos.
Assim sendo, impõe-se a confirmação da sentença recorrida que assim o entendeu, por a mesma não padecer do vício de erro de julgamento que lhe é assacado pela Recorrente, cujo recurso deve ser julgado improcedente».

1.5 Cumpre apreciar e decidir, sendo que a questão a dirimir é a de saber se a sentença fez correcto julgamento quando considerou que não se verificava a invocada falta de fundamentação, nem quanto à decisão do procedimento de revisão da matéria tributável, nem quanto aos valores unitários utilizados para quantificar o valor dos casamentos ocorridos nos anos em causa.


* * *

2. FUNDAMENTAÇÃO

2.1 DE FACTO

2.1.1 O Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra deu como assentes os seguintes factos:

«A) Os Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Coimbra realizaram uma acção inspectiva à Impugnante, relativa aos anos de 2005, 2006 e 2007 – conforme documentos a folhas 113 a 127 do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido;

B) No âmbito da acção inspectiva a que se alude em A) foi elaborado “Projecto de Relatório de Inspecção Tributária”, datado de 27.04.2009 – conforme documento a folhas 132 e seguintes do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido;

C) Os Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Coimbra dirigiram à Impugnante e respectivos mandatários, no âmbito da acção inspectiva a que se alude em A), ofícios sob o assunto “(…) Projecto Relatório da Inspecção Tributária – Artigo 60.º da (…) (LGT) e Artigo 60.º do (…) (RCPIT)” – conforme documentos a folhas 128 a 131 do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido;

D) Em 15.05.2009 foi recebido na Direcção de Finanças de Coimbra, no âmbito da acção inspectiva a que se alude em A), requerimento em nome da Impugnante com vista a exercer o seu “direito de audição” – conforme documento a folhas 214 a 240 do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido;

E) No âmbito da acção inspectiva a que se alude em A) foi elaborado “Relatório de Inspecção Tributária” (RIT), datado de 22.05.2009, do qual consta conforme segue:

«(…)

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(…)

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(…)» – conforme documentos a folhas 241 a 321 do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido;

F) O relatório a que se alude em E) é integrado pelos anexos seguintes:
«(…)

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(…)» – conforme documentos a folhas 265 a 321 do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido;

G) A Direcção de Finanças de Coimbra remeteu aos mandatários da Impugnante, no âmbito da acção inspectiva a que se alude em A), ofício datado de 26.05.2009, sob o assunto “Notificação do Relatório de Inspecção Tributária (…)”, do qual consta conforme segue:

«(…)


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(…)» – conforme documentos a folhas 322 a 324 do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido;

H) Em 09.06.2009 foi recebida na Direcção de Finanças de Coimbra, “reclamação” em nome da Impugnante – conforme documentos a folhas 327 a 342 do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido;

I) A “reclamação” a que se alude em H) esteve na base da instauração de “processo de revisão da matéria colectável nos termos da Lei Geral Tributária”, em nome da Impugnante – conforme documento a folhas 343 do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido;

J) Em 25.06.2009 foi elaborada, no âmbito do “processo de revisão” a que se alude em I), acta da qual consta conforme segue:
«(…)

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(…)» – conforme documento a folhas 346 do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido;

K) Em 30.06.2009 foi realizada reunião de peritos, no âmbito do “processo de revisão” a que se alude em I), de cuja ata consta conforme segue:
«(…)

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(…)» – conforme documentos a folhas 349 a 351 do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido;

L) Em 14.09.2009 foi proferido pelo Director de Finanças de Coimbra, no âmbito do “processo de revisão” a que se alude em I), despacho sob o n.º 15/2009, do qual consta conforme segue:
«(…)


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(…)» – conforme documento a folhas 352 a 357 do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido;

M) A Direcção de Finanças de Coimbra remeteu aos mandatários da Impugnante, no âmbito do “processo de revisão” a que se alude em I), ofício datado de 08.10.2009, sob o assunto “Procedimento de revisão da Matéria Colectável. Decisão.”, do qual consta conforme segue:
«(…)

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(…)» – conforme documentos a folhas 358 a 360 do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido;

N) O ofício a que se alude em M) foi recebido em 09.10.2009 – conforme documentos a folhas 358 a 360 do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido;

O) Em 14.10.2009, a Autoridade Tributária emitiu em nome da Impugnante as liquidações de IRS n.ºs 2009 5004913243, 2009 5004913841 e 2009 5004914851, acrescidas de juros compensatórios, respeitantes aos anos de 2005, 2006 e 2007, respectivamente, das quais resultou um valor global a pagar de 21.398,21 euros, com data limite de pagamento ocorrida em 25.11.2009 – conforme documentos a folhas 3 a 17 do processo físico, cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido;

P) Em 03.02.2010 foi recebida no Serviço de Finanças da Figueira da Foz 2, “reclamação graciosa” em nome da Impugnante, contra as liquidações a que se alude em O) – conforme documentos a folhas 20 a 36 do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido;

Q) A “reclamação graciosa” a que se alude em P) correu os seus termos sob o processo n.º 3824201004000064, do Serviço de Finanças da Figueira da Foz 2 – conforme documento a folhas 18 do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido;

R) Em 26.02.2010 foi prestada, no âmbito do processo a que se alude em Q), informação da Divisão de Justiça Tributária, da Direcção de Finanças de Coimbra, da qual consta conforme segue:
«(…)
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(…)» – conforme documento a folhas 78 a 80 do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido;

S) Sobre a informação a que se alude em R) foi exarado despacho do chefe da Divisão de Justiça Tributária, da Direcção de Finanças de Coimbra, datado de 15.03.2010, com o seguinte teor:
«Confirmo o sentido proposto do pedido da R. ser indeferido, nos termos e com os fundamentos constantes da informação que segue.
Notifique-se nos termos e para efeitos do art. 60.º da LGT. (…)» – conforme documento a folhas 78 a 80 do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido;

T) A Divisão de Justiça Tributária, da Direcção de Finanças de Coimbra, remeteu à Impugnante, no âmbito do processo a que se alude em Q), ofício datado de 16.03.2010, do qual consta conforme segue:
«(…)

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(…)» - conforme documentos a folhas 81 e 81-verso do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido;

U) Em 06.04.2010 foi prestada, no âmbito do processo a que se alude em Q), informação da Divisão de Justiça Tributária, da Direcção de Finanças de Coimbra, da qual consta conforme segue:
«(…)

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(…)» - conforme documento a folhas 82 do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido;

V) Sobre a informação a que se alude em U) foi exarado despacho do chefe da Divisão de Justiça Tributária, da Direcção de Finanças de Coimbra, com o seguinte teor:
«Concordo, pelo que tornando agora definitivo o projecto de decisão em apreço e nos termos e com os fundamentos no mesmo já aduzidos INDEFIRO o pedido do(a) Reclamante.
Procedimentos consequentes.
(…)» – conforme documento a folhas 82 do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido;

W) A Divisão de Justiça Tributária da Direcção de Finanças de Coimbra remeteu aos mandatários da Impugnante, no âmbito do processo a que se alude em Q), ofício datado de 08.04.2010, do qual consta conforme segue:
«(…)

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(…)» – conforme documentos a folhas 83 e 83-verso do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido;

X) Em 15.04.2010 foi recebido na Direcção de Finanças de Coimbra, “recurso hierárquico” em nome da Impugnante, contra o sentido do despacho a que se alude em V) – conforme documentos a folhas 87 a 103 do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido;

Y) Em 12.12.2011 foi prestada, no âmbito do “recurso hierárquico” a que se alude em X), informação da Divisão de Administração II, da Direcção de Serviços do IRS, da qual consta conforme segue:
«(…)

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(…)» – conforme documento a folhas 108 a 110 do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido;

Z) Sobre a informação a que se alude em Y) foi exarado despacho da Directora de Serviços do IRS, datado de 14.12.2011, com o seguinte teor:
«Concordo, pelo que com base nos fundamentos expressos nego provimento ao recurso. (…)» - conforme documento a folhas 108 a 110 do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido;

AA) A Divisão de Justiça Tributária, da Direcção de Finanças de Coimbra, remeteu à Impugnante, no âmbito do “recurso hierárquico” a que se alude em X), ofício datado de 02.01.2012, do qual consta conforme segue:
«(…)

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(…)» – conforme documentos a folhas 111 e 111-verso do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido;

BB) O ofício a que se alude em AA) foi recebido em 05.01.2012 – conforme documentos a folhas 111 e 111-verso do P.A., cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido;

CC) A petição inicial da impugnação foi remetida ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra em 10.04.2012 – conforme registo aposto no sobrescrito a folhas 39 do processo físico, cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido.
[…]».

2.1.2 A sentença recorrida deu como não provados os seguintes factos:

«1- Que nos anos de 2005 a 2007, a Impugnante contactou (evento a evento) com empresas organizadoras de eventos, no sentido de estas contratarem pessoas amigas para colaborarem consigo nestes eventos, de modo a ajudá-las, criando-lhes a possibilidade de ganharem algum dinheiro nestes trabalhos;

2- Que nos anos de 2005 a 2007, em alguns casos, os pais dos noivos pediram à Impugnante que contactasse com empresas organizadoras de eventos, de forma a que o preço a pagar pelos espaços fosse mais baixo que o normal;

3- Que nos anos de 2005 a 2007, a Impugnante sempre foi contratada para os eventos apenas na qualidade de cozinheira e que apenas recebeu para si as quantias respeitantes ao seu trabalho de cozinheira;

4- Que nos anos de 2005 a 2007, a Impugnante apenas auferiu para si quantias compreendidas entre 200€ e 300€ por cada evento, dependendo da quantidade e qualidade de comida a confeccionar;

5- Que nos anos de 2005 a 2007, em alguns casos, a Impugnante recebeu quantias referentes ao pagamento total do serviço apenas por se tratar de mera intermediária entre os pais dos noivos, os trabalhadores que colaboraram na realização dos eventos e as empresas organizadoras dos eventos;

6- Que nos anos de 2005 a 2007, em alguns casos, a Impugnante prestou os seus serviços de forma gratuita».


*

2.2 DE DIREITO

2.2.1 AS QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR

Na sequência de uma acção de fiscalização, a AT entendeu que as declarações de rendimentos da ora Recorrente – que considerou exercer a actividade de prestação de serviços da catering, socorrendo-se da colaboração de outros prestadores de serviços, sob as suas ordens –, relativamente aos exercícios dos anos de 2005 a 2007, não reflectiam a sua verdadeira situação patrimonial nem os resultados efectivamente obtidos com essa actividade, motivo por que procedeu à correcção do rendimento tributável declarado, com recurso a métodos indirectos, e, após ser decidido o pedido de revisão formulado por aquela sociedade ao abrigo do disposto no art. 91.º da Lei Geral Tributária (LGT), às consequentes liquidações adicionais de IRS e respectivos juros compensatórios.
A Recorrente impugnou judicialmente as liquidações, invocando como fundamentos do pedido de anulação, no que ora releva, o «vício de falta de fundamentação», i) quer em relação à decisão do procedimento de revisão da matéria tributável, por o Director de Finanças de Viseu «ter decidido o procedimento de revisão sem que o perito da AT tivesse manifestado a sua posição no debate contraditório», motivo por que tal decisão não pôde ter em conta o parecer do perito da AT, como o impõe o n.º 6 do art. 92.º da LGT («Na falta de acordo no prazo estabelecido no n.º 2, o órgão competente para a fixação da matéria tributável resolverá, de acordo com o seu prudente juízo, tendo em conta as posições de ambos os peritos»), ii) quer no que se refere aos valores unitários utilizados para quantificar o valor dos casamentos ocorridos nos anos de 2005 e 2007.
A Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra julgou improcedente o invocado vício de falta de fundamentação nas duas vertentes invocadas.
Quanto à falta de fundamentação da decisão do procedimento de revisão da matéria tributável, ficou dito na sentença:
«[...] considera este Tribunal, ao contrário do propugnado pela Impugnante, que o método indiciário de que a Autoridade Tributária lançou mão se encontra suficientemente motivado, e legitimado à luz do estatuído nos artigos 87.º, n.º 1, alínea b) e 88.º, alínea a), ambos da LGT.
Acresce que, perscrutado o teor da acta a que se alude em K) do probatório, respeitante a “reunião de peritos” realizada em 30.06.2009 no âmbito do procedimento de revisão da matéria colectável, resulta que a posição do perito da Autoridade Tributária se opõe à defendida pelo perito da contribuinte e, nessa medida, projecta-se na consideração de que a factualidade que serviu de base à tributação por métodos indirectos é “fidedigna”, e assim, idónea para sustentar o aludido método de tributação, não padecendo a decisão final proferida, que para aquela remete expressamente nem, consequentemente, as liquidações postas mediatamente em crise, do invocado vício de falta de fundamentação».
Quanto à falta de fundamentação assacada pela Impugnante aos valores estabelecidos para cada um dos casamentos, a sentença deixou dito:
«[…] no que tange à realização de casamentos nos anos em causa, extrai-se do RIT terem sido efectivamente tomadas por base declarações prestadas por noivos/pais dos noivos, assim como, por trabalhadores que prestaram serviços nesse tipo de eventos nos aludidos anos, seja para quantificar o número de eventos a considerar, seja para quantificar o valor pago pelos mesmos, sendo que, por referência a cada ano encontra-se efetuada no RIT a remissão para os autos de declarações que concretamente serviram de base à operação de quantificação levada a cabo, mais se considerando que o teor dos mesmos é passível de sustentar a sobredita operação.
Destarte, no que concerne com a realização de casamentos, considera este Tribunal que o critério de quantificação adoptado é racional e encontra-se suficientemente justificado, termos em que passou a pender sobre a Impugnante o ónus de demonstrar o invocado excesso de quantificação.
Perscrutada a factualidade provada não resulta, porém, evidenciado tal excesso de quantificação pelo que, na parte respeitante aos eventos em causa (casamentos) impõe-se concluir pela improcedência da pretensão da Impugnante».
A Impugnante discordou da sentença no que se refere ao julgamento relativo à falta de fundamentação, nas duas referidas vertentes, e dela recorreu para este Supremo Tribunal Administrativo.
A Recorrente sustenta que a decisão do Director de Finanças padece de ilegalidade, decorrente de falta de fundamentação, por «[…] ter decidido o procedimento de revisão sem que o perito da AT tivesse manifestado a sua posição no debate contraditório» (cfr. conclusão 1), situação que viola o disposto nos arts. 77.º e 92.º, n.º 6, da LGT, e art. 268.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa (CRP), pois que não consta da acta da reunião qualquer posição do perito da AT, «ou seja, INEXISTE» tal posição (cfr. conclusão 4). Mais sustenta que, inexistindo, como inexiste, posição assumida pelo perito da AT, «também não poderia o Director de Finanças, no despacho a que se refere o art. 92.º, n.º 6, da LGT, decidir de acordo com a posição do perito da AT» e que, ao decidir «chamando à colação o relatório de inspecção, o que poderia fazer, caso o perito da AT para o mesmo tivesse remetido, o que não foi feito» (cfr. conclusão 5), a decisão «proferida nos termos e para os efeitos do n.º 6 do art. 92º da LGT, é ilegal pois que não tomou em consideração as posições dos peritos, estando infundamentada» (cfr. conclusão 6).
No que se refere à quantificação da matéria tributável, na parte relativa aos valores unitários dos casamentos utilizados pela AT nos exercícios de 2005 e 2007, a Recorrente sustenta que a sentença fez errado julgamento quando a considerou devidamente fundamentada porque i) não se compreende (a fundamentação não permite que se alcancem os motivos) porque tal valor, relativamente ao ano de 2007, foi fixado em valor semelhante ao de 2006 (cfr. conclusão 7), nem porque o valor unitário considerado para cada casamento no ano de 2005 foi fixado em € 14.000 (cfr. conclusão 8).
Assim, as questões suscitadas pela Recorrente e que ora cumpre apreciar e decidir são as de saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento na medida em que considerou não verificado o erro de falta de fundamentação relativamente àqueles dois segmentos da decisão de fixação da matéria tributável.

2.2.2 DA FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO DA DECISÃO DO PROCEDIMENTO DE REVISÃO

2.2.2.1 Lida a decisão por que o Director de Finanças de Viseu decidiu o procedimento de revisão – que a sentença transcreveu na alínea L) dos factos provados –, verificamos que a mesma dá cabal cumprimento às exigências de fundamentação, quer quanto à opção pela tributação por métodos indirectos, quer quanto ao critério de quantificação da matéria tributável.
Note-se que nada obsta a que essa fundamentação se faça por remissão, designadamente para o relatório da fiscalização tributária (cfr. n.º 1 do art. 77.º da LGT), como aconteceu, em parte, no caso.
A decisão deu integral cumprimento às exigências de fundamentação que, nunca podemos olvidá-lo, são instrumentais, ou seja, se destinam, essencialmente e no que ora releva ( A fundamentação visa também assegurar a transparência da actividade administrativa e, assim e de modo geral, assegurar que esta respeita os princípios constitucionais a que está subordinada pelo n.º 2 do art. 266.º de CRP e, no que respeita à Administração tributária, também pelo art. 55.º da LGT. ), a permitir aos interessados conhecer as razões por que a autoridade administrativa actuou e actuou num determinado sentido, de modo a possibilitar-lhes uma opção consciente entre a aceitação da legalidade do acto e a sua impugnação.
A nosso ver, em face da fundamentação externada pelo Director de Finanças de Viseu, a ora Recorrente ficou perfeitamente habilitada a conhecer os motivos por que a AT considerou inviável a determinação directa e exacta da matéria tributável e que a levaram à determinação por métodos indirectos, bem como os motivos por que a matéria tributável foi fixada nos valores em que o foi e, assim, ficou também perfeitamente habilitada a fazer a sua opção, que foi no sentido da impugnação judicial.
Será que, como alega a Recorrente, o Director de Finanças não poderia ter remetido para o relatório da inspecção tributária – a menos que o perito da AT tivesse, por seu turno, remetido para esse relatório – e que, ao fazê-lo, não tendo tomado em consideração as posições dos peritos, tanto mais que a posição do perito da AT “inexiste”, a decisão do procedimento enferma de falta de fundamentação?
Antes do mais, diremos que, embora a Recorrente pretenda enquadrar a questão sob a perspectiva da falta de fundamentação, a sua alegação não se reconduz a esse vício. Tal alegação não se situa no âmbito da fundamentação formal do acto administrativo, não se refere à falta ou insuficiência dos motivos externados em ordem à compreensão dos motivos que determinaram a prática daquele acto com aquele concreto conteúdo; essa alegação refere-se a um suposto vício (preterição de formalidade legal?) por o Director Distrital de Finanças ter decidido sem que se verificasse um pressuposto para a decisão, qual seja a emissão de parecer pelo perito da AT.
Mas, essa alegação afigura-se-nos desprovida de validade; senão vejamos:
Que não houve acordo, afigura-se-nos irrefutável: a acta da reunião diz expressamente que «Na condução do procedimento o perito da Administração Tributária procurou o estabelecimento de um acordo, o qual não foi possível concretizar» [cfr. facto provado sob a alínea k) dos factos provados].
A leitura da acta permite-nos também saber as razões porque não foi obtido o acordo: a posição assumida na reunião pelo perito da Contribuinte («não reconhece como fidedigna a factualidade que serviu de base à tributação por métodos indirectos, porquanto as declarações prestadas pelas pessoas inquiridas não são verdadeiras») inviabilizou a discussão sobre a validade do método utilizado na quantificação da matéria tributável e sobre a correcção dessa quantificação. Ao pôr em causa a veracidade das referidas declarações, o perito da Contribuinte põe em causa os próprios pressupostos para a tributação por métodos indirectos ( Tenha-se presente que, após a entrada em vigor da LGT (e contrariamente ao que acontecia anteriormente, cfr. art. 84.º do Código de Processo Tributário), abriu-se a possibilidade em sede de revisão da matéria colectável fixada por métodos indirectos se discutir, não só a quantificação da matéria colectável, mas também a qualificação dos factos tributários e os próprios pressupostos de aplicação dos métodos indirectos (cfr. art. 91.º, n.º 14, da LGT). Assim, o procedimento de revisão abrange não só as operações de quantificação através de métodos indirectos, mas também a decisão de os utilizar.).
Perante essa tomada de posição por parte do perito da Contribuinte e a verificada inviabilidade do acordo, podemos intuir, sem grande esforço de exegese, que a posição do perito da AT foi de sentido oposto, ou seja, no sentido de que tais declarações eram fidedignas e justificam a tributação por métodos indirectos. Como bem disse a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra: «Perscrutado o teor da acta a que se alude em K) do probatório, respeitante a “reunião de peritos” realizada em 30.06.2009 no âmbito do procedimento de revisão da matéria colectável, resulta que a posição do perito da Autoridade Tributária se opõe à defendida pelo perito da contribuinte e, nessa medida, projecta-se na consideração de que a factualidade que serviu de base à tributação por métodos indirectos é “fidedigna”, e assim, idónea para sustentar o aludido método de tributação».
Podemos, pois, saber qual o sentido da posição assumida pelo perito da AT, não sendo sustentável a posição da Recorrente, quando sustenta a “inexistência” de tal posição.
Seja como for, contrariamente ao que parece entender a Recorrente, o órgão competente para a fixação da matéria tributável na falta de acordo dos peritos não tem que apoiar-se nas razões dos peritos e na escolha dos fundamentos para a sua decisão não fica limitado pelo leque dos que, eventualmente, tenham sido aduzidos pelos peritos. Como decorre da letra da lei «resolverá, de acordo com o seu prudente juízo, tendo em conta as posições de ambos os peritos» (cfr. n.º 6 do art. 92.º da LGT), ou seja, tem apenas de levar em conta as posições dos peritos e não de aderir a, ou rejeitar, qualquer dessas posições. Que assim é resulta inequivocamente do n.º 7 do mesmo art. 92.º da LGT, que especifica a obrigação de o fazer quando intervier perito independente («Se intervier perito independente, a decisão deve obrigatoriamente fundamentar a adesão ou rejeição, total ou parcial, do seu parecer»). Esta norma seria desnecessária se essa obrigação também existisse quando não intervém perito independente.
Assim, o recurso não pode ser provido com base no erro de julgamento que a Recorrente assaca à sentença quanto ao vício de falta de fundamentação da decisão por que o Director de Finanças de Viseu fixou a matéria tributável.

2.2.2.2 Quanto à invocada falta de fundamentação dos valores unitários utilizados para a quantificação da matéria tributável relativamente aos casamentos nos anos de 2005 e 2007, de € 14.000 e € 20.000, respectivamente, sustenta a Recorrente que não se percebe a razão de fixação de tais valores. No primeiro caso (2005), porque não se percebe a extensão do valor pago num evento aos demais; no segundo caso, porque não se alcançam as razões porque o valor por evento fixado em 2006 foi aplicado em 2007.
A decisão de fixação da matéria tributável remeteu para o relatório dos Serviços de Inspecção, dos quais decorre que o valor de € 14.000 fixado para os eventos de casamento realizados no ano de 2005 foi apurado com base nas declarações prestadas por um adquirente desses serviços, de que o preço praticado por pessoa foi de € 50 euros, sendo que esse evento foi considerado de média dimensão, por nele terem estado presentes 280 convivas.
Os Serviços de Inspecção consideraram o valor deste tipo de evento como transponível para os demais eventos, cujo número foi fixado em 7, por ser este o número mínimo referido pelas pessoas ouvidas em declarações e que foram ou outros prestadores de serviços ou clientes.
Quanto ao valor unitário por casamento fixado em 2007 (€ 20.000), resulta do mesmo relatório que este valor foi apurado tendo em consideração o valor pago num dos eventos e que, partindo das declarações das pessoas ouvidas (adquirentes do serviço e outros prestadores de serviços) e do preço de € 50 por pessoa, valor praticado no evento realizado em 2005 e supra mencionado, se concluiu corresponder a 400 convivas, que foi caracterizado como evento de grande dimensão.
Ou seja, o valor unitário dos referidos eventos foi fixado partindo do valor pago pelos clientes por cada conviva (€ 50) e da caracterização do evento como de média ou grande dimensão, correspondendo estes a cerca de 280 e 400 convivas (foram fixados individualmente outros valores para os eventos cujo valor foi fornecido especificamente pelo adquirente dos serviços), caracterização esta feita tendo em consideração os elementos fornecidos por prestadores de serviços ao sujeito passivo.
A quantificação respeita, pois, o critério fixado pela alínea d) do n.º 1 do art. 91.º da LGT e, em face dos elementos utilizados, afigura-se-nos que a AT satisfez o ónus de fundamentação que sobre ela recaía: é perfeitamente perceptível como foram apurados tais valores, os quais assentam em elementos objectivos fornecidos pelos intervenientes nos eventos. Como bem referiu a sentença recorrida, «no que tange à realização de casamentos nos anos em causa, extrai-se do RIT terem sido efectivamente tomadas por base declarações prestadas por noivos/pais dos noivos, assim como, por trabalhadores que prestaram serviços nesse tipo de eventos nos aludidos anos, seja para quantificar o número de eventos a considerar, seja para quantificar o valor pago pelos mesmos, sendo que, por referência a cada ano encontra-se efetuada no RIT a remissão para os autos de declarações que concretamente serviram de base à operação de quantificação levada a cabo, mais se considerando que o teor dos mesmos é passível de sustentar a sobredita operação».
Entendemos, assim, que a quantificação da matéria tributável não padece do vício que lhe é assacado pela Recorrente, por se mostrar suficientemente fundamentada, dando cabal resposta às exigências do art. 77.º da LGT, motivo pelo qual se concorda com a sentença recorrida na conclusão de que «o critério de quantificação adoptado é racional e encontra-se suficientemente justificado» (bem assim como com a afirmação de que «passou a pender sobre a Impugnante o ónus de demonstrar o invocado excesso de quantificação»).
O recurso também não pode ser provido com base no erro de julgamento que a Recorrente assaca à sentença quanto ao vício de falta de fundamentação da quantificação da matéria tributável.

2.2.3 CONCLUSÕES

Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões:

I - Na falta de acordo entre os peritos, o órgão competente para a fixação da matéria tributável não tem que apoiar-se nas razões dos peritos, motivo por que na fundamentação da sua decisão não fica limitado pelo leque dos fundamentos que, eventualmente, tenham sido aduzidos pelos peritos; como decorre da letra da lei, «resolverá, de acordo com o seu prudente juízo, tendo em conta as posições de ambos os peritos» (cfr. n.º 6 do art. 92.º da LGT), ou seja, tem apenas de levar em conta as posições dos peritos e não de aderir a qualquer dessas posições.

II - Deve considerar-se suficientemente fundamentado o acto da AT que dá a conhecer aos interessados as razões por que a autoridade administrativa actuou e actuou num determinado sentido, de modo a possibilitar-lhes uma opção consciente entre a aceitação da legalidade do acto e a sua impugnação.


* * *

3. DECISÃO

Em face do exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência, em negar provimento ao recurso.

Custas pela Recorrente.


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Lisboa, 15 de Dezembro de 2022. - Francisco António Pedrosa de Areal Rothes (relator por vencimento) - Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos -Pedro Nuno Pinto Vergueiro (vencido, nos termos da declaração que se segue)


Voto do Ex.mo Senhor Conselheiro Pedro Vergueiro:

«Voto de Vencido
Não acompanho a decisão que fez vencimento nos autos.
Na situação dos autos, não resultando da matéria de facto assente que o perito da Administração Tributária tenha adoptado qualquer posição sobre o pedido de revisão da matéria tributável ou emitido qualquer parecer, a questão que se coloca consiste em saber em que termos essa omissão inquina a validade do procedimento e designadamente da decisão tomada pelo Director de Finanças sobre a matéria tributável fixada.
E neste domínio, tem razão a Recorrente quando refere que o Director de Finanças, no despacho a que se refere o art. 92º nº 6 da LGT, também não poderia decidir de acordo com a posição do perito da AT, sendo que, como se alcança da referida decisão, a mesma limitou-se a sancionar os elementos vertidos no relatório dos Serviços de Inspecção, pelo que, a decisão proferida nos termos e para os efeitos do nº 6 do art. 92º da LGT, é ilegal pois que não tomou em consideração as posições dos peritos, estando infundamentada.
Diga-se ainda que a realidade apontada nos autos encontra paralelo naquela outra situação, de que dá nota o Ac. deste Supremo Tribunal de 09-10-2019, Proc. nº 0112/09.0BEVIS 0631/17, www.dgsi.pt, em que o Director de Finanças se limita a enunciar a posição dos peritos indicados pelo sujeito passivo e pela AT, sem expressar concordância com os fundamentos do parecer emitido pelo perito indicado pela AT, pelo que também não observa os requisitos legais da fundamentação formal da decisão do procedimento (art. 77º nº 1 LGT), pois que não basta a simples decisão de deferimento/indeferimento do pedido formulado pelo sujeito passivo, nem a remissão implícita para o parecer do perito indicado pela administração tributária, perante a exigência legal de fundamentação expressa, ainda que por mera declaração de concordância, até porque a decisão de indeferimento, apesar de concordante com o sentido do parecer do perito da administração tributária, poderia invocar fundamentos distintos, úteis ao sujeito passivo para um posterior exercício esclarecido do direito de impugnação judicial da liquidação adicional do Imposto, ou seja, neste contexto, a decisão de indeferimento proferida no procedimento enferma de insuficiência de fundamentação, porque inidónea para esclarecer concretamente a motivação do acto, equivalente à falta de fundamentação.
Deste modo, nas duas situações apontadas, quer pela ausência de tomada posição sobre o pedido de revisão da matéria tributável ou emissão de qualquer parecer, quer pela sua total desconsideração, a decisão do Director de Finanças proferida no procedimento enferma de insuficiência de fundamentação, porque inidónea para esclarecer concretamente a motivação do acto, equivalente à falta de fundamentação, pelo que, daria provimento ao recurso nesta parte, com a consequente revogação da sentença recorrida e a natural procedência da presente impugnação judicial no domínio apontado e anulação das liquidações impugnadas nesse âmbito e julgaria prejudicado o conhecimento do outro vício invocado.
Lisboa, 15 de Dezembro de 2022
Pedro Vergueiro»