Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0170/17.9BEBRG
Data do Acordão:01/11/2019
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:MADEIRA DOS SANTOS
Descritores:APRECIAÇÃO PRELIMINAR
FUNDO DE GARANTIA SALARIAL
EXTEMPORANEIDADE
PEDIDO
Sumário:Não é de admitir a revista do acórdão que afirmou a legalidade do acto impugnado – o qual indeferiu o pedido de pagamento de créditos laborais pelo FGS porque fora deduzido mais de um ano após a cessação do contrato de trabalho – se a crítica fundamental formulada pela recorrente consistir na falta de uma «reapreciação oficiosa» (prevista no art. 3º, n.º 3, do DL n.º 59/2015, de 21/4) que era alheia ao tipo legal do acto emitido.
Nº Convencional:JSTA000P24052
Nº do Documento:SA1201901110170/17
Recorrente:A..........................
Recorrido 1:FUNDO DE GARANTIA SALARIAL
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em apreciação preliminar, no Supremo Tribunal Administrativo:
A…………………………., identificada nos autos, interpôs a presente revista do acórdão do TCA Norte que, revogando a sentença anulatória e condenatória do TAF de Braga – proferida numa acção interposta pela aqui recorrente contra o Fundo de Garantia Salarial, o Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, IP, e o Instituto de Segurança social, IP, com vista a anular o acto que indeferira o seu pedido de pagamento de créditos laborais e a condenar a Administração a reapreciar o mesmo pedido – julgou a acção totalmente improcedente.

A recorrente pugna pela admissão da revista por ela recair sobre uma questão importante e mal decidida pelo tribunal «a quo».
Não houve contra-alegação..

Cumpre decidir.
Em princípio, as decisões proferidas em 2.ª instância pelos TCA’s não são susceptíveis de recurso para o STA. Mas, excepcionalmente, tais decisões podem ser objecto de recurso de revista em duas hipóteses: quando estiver em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, assuma uma importância fundamental; ou quando a admissão da revista for claramente necessária para uma melhor aplicação do direito («vide» o art. 150º, n.º 1, do CPTA).
Confrontada com a cessação do seu contrato de trabalho, ocorrida em 11/5/2012 por iniciativa do administrador da insolvência da entidade patronal, a autora e aqui recorrente requereu em 11/6/2012 que o FGS lhe pagasse os seus créditos laborais. Mas tal pretensão foi indeferida em 10/12/2013, dado que o plano adoptado no âmbito do processo de insolvência previa a regularização desses créditos.
Em 21/4/2015, foi publicado o DL n.º 59/2015, que instituiu um novo regime do FGS. Porque a entidade patronal devedora foi objecto, em 12/11/2015, de declaração de insolvência, a recorrente pediu de novo, em 17/3/2016, que o FGS satisfizesse os seus créditos laborais. Mas esta pretensão foi indeferida em 3/10/2016, com o fundamento de que há muito decorrera o prazo para o efeito – de um ano após a cessação do contrato.
A recorrente instaurou então a acção dos autos para anular o acto de 3/10/2016, já que este desconsiderou que o seu primitivo pedido – formulado em 11/6/2012 – devia ser alvo da «reapreciação oficiosa» prevista no art. 3º, n.º 3, al. b), do DL n.º 59/2015.
O TAF anulou o acto impugnado e, ainda, o de 10/12/2013, condenando a Administração a reapreciar o pedido de 11/6/2012. Mas o TCA considerou que a anulação desse acto inicial constituía um excesso de pronúncia; e, relativamente ao acto posterior, o único atacado na petição, afirmou a sua legalidade e julgou a lide totalmente improcedente.
Na presente revista, a recorrente nega a nulidade da sentença, entrevista pelo TCA. E clama pela necessidade de se submeter o caso à «reapreciação oficiosa» «supra» referida, sob pena de ocorrer uma clamorosa injustiça.
Mas o TCA decidiu bem a questão da nulidade da sentença. Na medida em que a acção dos autos tinha por objecto o acto de 3/10/2016, estava vedado ao TAF anular o acto de 10/12/2013 – sob pena de incorrer em excesso de pronúncia.
E o acórdão recorrido também andou bem ao considerar legal o acto impugnado, já que este respondeu a um pedido de pagamento de créditos laborais formulado mais de um ano após a cessação do respectivo contrato. Convém, aliás, notar o seguinte: tendo em conta o que a recorrente requerera, o acto impugnado inscreveu-se num tipo legal alheio à «reapreciação oficiosa» prevista no art. 3º, n.º 3, do DL n.º 59/2015; e, enquanto tipicamente estranho a esse assunto, não podia o acto ser ilegal por desconsideração dele. Ora, tudo isto sugere já a desnecessidade de se rever o aresto «sub specie».
A recorrente considera-se incompreensivelmente lesada pelo facto do dito art. 3º, n.º 3, al. b) só impor a reapreciação oficiosa dos requerimentos apresentados após 1 de Setembro de 2012; pois essa solução legal excluiu o requerimento dela – formulado em 11/6/2012, mas susceptível de oferecimento já dentro daquele período. No entanto, duas coisas há a dizer sobre este problema: «primo», é claro que a Administração não podia – sob pena de agir «contra legem» – reapreciar «ex oficio» o requerimento que a recorrente deduzira em 11/6/2012; «secundo», o assunto – que só poderia resolver-se a favor da recorrente se a restrição temporal prevista no art. 3º, n.º 3, al. b), ferisse a Constituição – está fora do «thema decidendum» dos autos por extravasar da índole do acto nele impugnado. Portanto, a «quaestio juris» relacionada com a reapreciação oficiosa não justifica o recebimento do recurso.
Deve, pois, prevalecer «in casu» a regra da excepcionalidade das revistas.

Nestes termos, acordam em não admitir a revista.
Custas pela recorrente, sem prejuízo de apoio judiciário de que beneficia.
Porto, 11 de Janeiro de 2019. Madeira dos Santos (Relator) – Costa Reis – António São Pedro.