Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01064/12
Data do Acordão:01/16/2013
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:LINO RIBEIRO
Descritores:CONTRA-ORDENAÇÃO FISCAL
IMPOSTO NÃO RECEBIDO
NULIDADE INSUPRÍVEL
Sumário:I - O art. 79°, n° 1, do RGIT exige que a decisão de aplicação da coima há-de conter ou observar determinados requisitos, entre os quais, a descrição sumária dos factos e a indicação das normas violadas e punitivas, com vista a assegurar aos arguidos a possibilidade do exercício efectivo dos seus direitos de defesa, o que só poderá ser alcançado se o mesmo tiver conhecimento efectivo dos factos que lhe são imputados e das normas legais que em que se enquadram.
II - A decisão administrativa de aplicação da coima que se limita a indicar como normas violadas as constantes dos arts. 114°, n° 2, do RGIT, e 26°, n°4, do CIVA, omitindo qualquer referência ao art. 114°, n° 5, alínea a), do RGIT, não dá cumprimento às exigências do art. 79°, n° 1, alínea b), do RGIT, pondo em causa os direitos de defesa do arguido, pelo que enferma de nulidade insuprível, nos termos do disposto no art. 63°, n° 1, alínea d), do RGIT.
Nº Convencional:JSTA000P15130
Nº do Documento:SA22013011601064
Data de Entrada:10/12/2012
Recorrente:A...., LDA
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo


1.1. A A……., Lda, com os demais sinais nos autos, interpõe recurso jurisdicional da decisão Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria que atenuou especialmente a coima que lhe foi aplicada pela Administração Tributária no processo de contra-ordenação nº 13502009060704.0
Nas suas alegações, conclui o seguinte:
1. No caso subjudice, é inequívoco que não consta da decisão que aplicou a coima, nomeadamente da descrição sumária dos factos, o recebimento do imposto anterior à entrega à administração tributária da declaração periódica que aí vem referida, o que afasta a possibilidade de preenchimento da hipótese do art. 114°, n.º 2 do RGIT (que se reporta à conduta prevista no n.º 1 do mesmo artigo).
2. No que concerne ao preenchimento do tipo legal previsto nos n.º 1 e 2 do artigo 114° do RGIT a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a afirmar, de forma dominante e consolidada, que «a prévia dedução da prestação tributária não entregue constitui elemento essencial do tipo legal de contra-ordenação em causa e consequentemente para que se cumpra a “descrição sumária dos factos” que há-de constar da decisão administrativa de aplicação da coima, terá de haver referência, ainda que sumária, ao facto da prestação tributária ter sido deduzida» - conferir neste sentido Acórdãos de 21.04.2010, recurso 85/10, de 02.12.2009, recurso 887/09, de 18.11.2009, recurso 593/09, de 25.11.2009, recurso 624/09 e de 16.09.2009, recurso 540/09, todos in www.dgsi.pt.
3. Donde a decisão é nula, violando o art. 79º, n.º 2 do RGIT.
4. Sem prescindir: atendendo às circunstâncias do caso deve-se punir a recorrente com uma pena de admoestação, ex vi do disposto no artigo 51.º do RGCO, punição esta legalmente possível.

1.2. O Ministério junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido do provimento do recurso, dada a jurisprudência do STA já produzida sobre esta matéria.

2. A decisão recorrida deu como assente os seguintes factos:

1) Em 14/12/2008, a Administração Tributária (AT) lavrou o auto de notícia de fls. 2, contra a arguida, por «falta de entrega da prestação tributária dentro do prazo» e «apresentação fora prazo D.P., c/ pagamento suficiente (M)», com a data da infracção de 03/12/2008, de onde se destaca: «Verifiquei, pessoalmente, na data e local referidos no quadro 03 [14/12/2008], que o sujeito identificado no quadro 01 [a arguida], entregou a declaração referida em 1 [Art° 27 n°1 e 41 n° 1 a) CIVA — Apresentação fora prazo D.P., c/pagamento suficiente (M)] e 3 [2008/02] do quadro 02 em data referido no ponto 4 [18/12/2008] também do quadro 02, “que constitui infracção” às normas previstas em 11 [Art° 27 n° 1 e 41 n° 1 a) CIVA — Apresentação fora prazo D.P., c/ pagamento suficiente (M)], punível pelas disposições referidas em 5 [artigos 114-2 e 26-4, do RGIT «falta de entrega da prestação tributária dentro do prazo» do mesmo quadro. (...)»;
2) Em 11/03/2009, a AA instaurou o presente processo de contra-ordenação (CO) — fls.1;
3) A Autoridade Administrativa (AA) levou ao conhecimento da arguida a comunicação de fls. 3, para exercer a sua defesa ou proceder a pagamento;
4) Em 26/04/2009, a AA proferiu a decisão condenatória, ora recorrida, de fls. 4 a 6, distribuída pelos capítulos «Descrição Sumária dos Factos (...); Normas infringidas/Normas Punitivas (constam as normas do auto de notícia, supra); Responsabilidade contra-ordenacional (...); Medida da Coima (...); e DESPACHO (…)», de onde se destaca: «Descrição Sumária dos Factos: Ao(À) arguido(a) foi levantado Auto de Notícia pelos seguintes factos: 1. Montante de imposto exigível: 25.666,38; 2. Valor da prestação tributária entregue: 25.666,38; 3. Valor da prestação tributária em falta: 0,00; 4. Data de cumprimento da obrigação: 03/12/2008; 5. Período a que respeita a infracção: 2008/02; 6. Termo do prazo para cumprimento da obrigação: 10/04/2008, os quais se dão como provados. Normas infringidas Art° 27° n°1 e 41, n° 1 a) CIVA — Apresentação fora prazo DP, c/pagamento suficiente (M) Normas punitivas Art° 114 n° 2 e 26 n° 4 do RGIT — Falta entrega prest. tributária dentro prazo (M) (...) Medida da Coima …. (Art° 27 do RGIT): (...) Actos de Ocultação — Não; Beneficio Económico - 0,00; Frequência da prática — frequente; Negligência — Simples; Obrigação de não cometer infracção — Não; Situação Económica e Financeira — Baixa; Tempo decorrido desde a prática da infracção 3 a 6 meses (...) DESPACHO Assim, tendo em conta estes elementos para a graduação da coima e de acordo.... aplico ao arguido a coima de Eur 5.857,07, cominada nos Arts (...)., (...»;
5) Em 26/04/2009, a AA levou ao conhecimento da arguida a decisão referida, pela comunicação de fls. 7;
6) Em 03/06/2009, a arguida apresentou o presente recurso — fls. 8 a 15;
7) Em 22/06/2009, a AA manteve a decisão onde menciona «Assim, verificou-se que a sociedade arguida nos presentes autos, entregou nos Cofres do Estado o IVA respeitante ao montante de €25.666,38 em 03/12/2008, fora do prazo legal. O termo para cumprimento da obrigação tributária terminava em 10/04/2008.» — fls. 19.

3. A Administração Tributária aplicou à recorrida a coima de €5.857,07, pelo facto de não ter entregue dentro do prazo devido – 10 de Abril de 2008 – a declaração periódica do IVA, infracção prevista nos artigos 27º, nº 1 e 41º, nº 1, al. a) do CIVA e punida nos artigos 114º, nº 2 e 26º, nº 4 do REGIT.
A recorrida impugnou judicialmente tal decisão, alegando que a mesma é nula por: (i) não ser admissível que indique a matéria de facto por remissão para o auto de notícia; (ii) não indicar as razões e circunstâncias concretas que devem contribuir para a fixação da coima, designadamente as que possam influir no grau de culpa e na graduação da coima; (iii) não se verificar a infracção prevista no nº 2 do art. 114º do REGIT, porque a norma não abrange na sua previsão as situações em que o imposto que deve ser entregue não está em poder do sujeito passivo, por não ter sido recebido, como foi o caso.
A sentença recorrida considerou que a decisão sancionatória não enferma de nulidade, porque: (i) “a decisão contém os elementos bastantes quer quanto aos factos típicos quer quanto à medida da coima, e esta, como também o auto de notícia, permitia e permitiu, a arguida aperceber-se de toda a imputação e defender-se dela”, (ii) porque o auto de notícia faz fé em juízo até prova em contrário (presunção iuris tantum), “não compete à AT/AA provar que o arguido não recebeu o IVA, mas, outrossim, compete ao arguido provar que não recebeu o IVA - e que não foi, assim, por culpa sua que não o entregou ao credor tributário”. Apesar disso, a sentença julgou que se verificam os pressupostos da atenuação especial da coima do nº 2 do art. 32º do REGIT, reduzindo-a para €2.566,64.
A recorrente insurge-se contra a sentença por entender que: (i) na “descrição sumária dos factos” que há-de constar da decisão que aplica a coima tem que haver referência ao facto da prestação tributária ter sido deduzida, e como tal não se verifica, não está demonstrado um elemento essencial do tipo legal de contra-ordenação; (ii) as circunstâncias do caso implicam a aplicação da pena de admoestação prevista no RGCO
Vejamos se existe o primeiro erro de julgamento, cuja procedência prejudica a apreciação da segunda questão.
Como a sentença reconhece, e resulta dos factos provados, nem o auto de notícia nem a decisão sancionadora fazem qualquer referência ao facto da arguida, ora recorrente, ter recebido e deduzido o IVA em data anterior à entrega da declaração periódica e do respectivo pagamento. Se este facto constitui um elemento constitutivo do ilícito contra-ordenacional previsto e punido nos nºs 1 e 2 do artigo 114º do REGIT, então não se pode dizer que a decisão que aplicou a coima contenha a “descrição sumária dos factos, em termos de se poder exercer efectivamente o direito de defesa.
A alínea b) do nº 1 do artigo 79º do REGIT estabelece, para além do mais, que a decisão que aplica a coima contém a «descrição sumária dos factos e indicação das normas violadas e punitivas». A doutrina e a jurisprudência interpretam este segmento normativo no sentido de que os factos a descrever, ainda que de forma sumária, são os “factos tipicamente ilícitos declarados puníveis pela norma fiscal”.
A jurisprudência deste Tribunal tem julgado, de forma reiterada, que “o requisito da decisão administrativa de aplicação da coima “descrição sumária dos factos”, constante da primeira parte da alínea b) do n.º 1 do artigo 79.º do RGIT, há-de interpretar-se em correlação necessária com o tipo legal de infracção no qual se prevê e pune a contra-ordenação imputada à arguida, pois que os factos que importa descrever, embora sumariamente, na decisão de aplicação da coima não são outros senão os factos tipicamente ilícitos declarados puníveis pela norma fiscal punitiva aplicada» (cfr. acs. de 29/4/2009, rec. nº 241/09, de 16/9/2009, rec. nº 540/09, de 16/9/2009, rec. nº 593/09, de 23/11/2011, rec. nº 855/11, de 26/09/2012, rec. nº 0729/12 e de 16/5/2012, rec. nº 0160/12).
Só com tal descrição é possível assegurar o direito de defesa, pois, como referem Jorge de Sousa e Manuel Simas Santos, «os requisitos previstos neste artigo (79º do REGIT) para a decisão condenatória do processo contra-ordenacional tributário visam assegurar ao arguido a possibilidade do exercício efectivo dos seus direitos de defesa, que só poderá existir com um conhecimento perfeito dos factos que lhe são imputados, das normas legais em que se enquadram e condições em que pode impugnar judicialmente aquela decisão” (Regime Geral das Infracções Tributárias, 4ª ed., Áreas Editora, Lisboa, 2010, p. 435).
A questão a decisão é pois a seguinte: a prévia dedução da prestação tributária não entregue constitui elemento constitutivo do tipo legal de contra-ordenação previsto nos nºs 1 e 2 do artigo 114º do REGIT?
Antes da alteração efectuada na alínea a) do nº 5 do referido artigo 114º pela Lei nº 64-A/2008, de 31/12, pode dizer-se que se formou jurisprudência consolidada, unânime e uniforme, no sentido de que, seguindo o sumário de um recente acórdão do STA, de 26/9/2102, rec. nº 0729/12: (i) «o facto tipificado como contra-ordenação no nº 2 do art. 114º do RGIT é o tipificado no nº1 do mesmo preceito legal, mas cometido de forma negligente, constituindo seu pressuposto essencial a prévia dedução da prestação tributária não entregue»; (ii) «Não preenche o tipo legal de contra-ordenação previsto e punido nos números 1 e 2 do art. 114º do RGIT a falta de entrega da prestação tributária de IVA, pois no IVA a prestação a entregar é, não a prestação tributária deduzida, mas a diferença positiva entre o imposto suportado pelo sujeito passivo e o imposto a cuja dedução tem direito».
Por isso, concordando basicamente com os fundamentos arvorados naquela jurisprudência, é caso para se decidir sumariamente o recurso, tal como se exige no nº 3 do art. 8º do CCv e se permite nos arts. 94º nº 3 do CPTA e 713º nº 5 do CPC, tendo um vista a interpretação e aplicação uniforme do direito.
Assim sendo, explicita-se no referido acórdão n.º 0729/12 o seguinte:
“No que concerne ao preenchimento do tipo legal previsto nos n.º 1 e 2 do artigo 114.° do RGIT a jurisprudência deste Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a afirmar, de forma dominante e consolidada, que “a prévia dedução da prestação tributária não entregue constitui elemento essencial do tipo legal de contra-ordenação em causa e consequentemente para que se cumpra a “descrição sumária dos factos”, que há-de constar da decisão administrativa de aplicação da coima, terá de haver referência, ainda que sumária, ao facto da prestação tributária ter sido deduzida” – conferir, neste sentido, os Acórdãos de 21.04.2010, recurso 85/10, de 02.12.2009, recurso 887/09, de 18.11.2009, recurso 593/09, de 25.11.2009, recurso 624/09, de 16.09.2009, recurso 540/09, e de 23.11.2011, proc nº 0855/11, todos in www.dgsi.pt.
Com efeito e como se sublinha no Acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo, de 23.11.2011, “no âmbito do IVA fala-se de dedução de imposto relativamente ao imposto que o sujeito passivo tem a receber, nos termos dos arts. 19.º a 25.º do CIVA, não se referindo qualquer situação em que o sujeito passivo tenha de entregar imposto que tenha deduzido. De facto, no âmbito do referido direito à dedução, os sujeitos passivos não têm de entregar à administração tributária a prestação tributária que deduziram (o imposto que deduziram, à face da definição dada na alínea a) do art. 11.º do RGIT), mas, antes pelo contrário, apenas têm de fazer entrega do imposto na medida em que excede o IVA a cuja dedução têm direito, isto é, do imposto que não deduziram”.
Nesta sequência, tem-se entendido que as referências à “prestação tributária que nos termos da lei deduziu” e à “prestação tributária deduzida nos termos da lei”, que se utilizam no art. 114.º do RGIT, apenas abrangem situações em que o sujeito passivo procede à dedução do imposto, subtraindo-a de uma quantia global.
Por outro lado, a conduta de quem não entrega IVA liquidado nas facturas mas não recebido dos adquirentes das mercadorias ou utilizadores de serviços estava expressamente punida no art. 95º do CIVA, em que se previa como transgressão “a falta de entrega ou a entrega fora dos prazos estabelecidos de todo ou parte do imposto devido”.
Acontece que este art. 95º, inserido no Capítulo VIII do CIVA, está expressamente revogado pela alínea c) do art. 2º da Lei nº 15/2001, de 5 de Junho. Nas palavras de JORGE DE SOUSA e MANUEL SIMAS SANTOS (Regime Geral das Infracções Tributárias, 4ª ed., Áreas editora, Lisboa, 2010, pp. 814-815.), “(…) as referências à «prestação tributária que nos termos da lei deduziu» e à prestação tributária deduzida nos termos da lei», que se utilizam no art. 114º do RGIT, têm evidente alcance restritivo em relação à expressão «imposto devido», que era utilizado no referido art. 95º do CIVA, pois as primeiras apenas abrangem situações em que o sujeito passivo procede à dedução do imposto, subtraindo-a de uma quantia global”.
Em suma, a prévia dedução da prestação tributária não entregue constitui elemento essencial do tipo legal da contra-ordenação em causa e, consequentemente, para que se cumpra a “descrição sumária dos factos”, que há-de constar da decisão administrativa de aplicação da coima, terá de haver referência, ainda que sumária, ao facto da prestação tributária ter sido deduzida.
Ora, no caso dos autos, é inequívoco que não consta da decisão que aplicou a coima, nomeadamente da descrição dos factos, o recebimento do imposto anterior à entrega à administração tributária da declaração periódica que aí vem referida, o que afasta a possibilidade do preenchimento da hipótese tipificada no art. 114º, nº 2, do RGIT.
Como ficou consignado no Acórdão de 28/5/2008, “não tendo havido recebimento do imposto anterior à entrega à Administração Tributária da declaração periódica referida no ponto B) da matéria de facto fixada, está afastada a possibilidade de preenchimento da hipótese do art. 114º, nº 2, do RGIT (que se reporta à conduta prevista no nº1 do mesmo artigo)”.

Como se reconhece no acórdão de 16/1/2012, proferido no rec. nº 0160/12, a nova redacção dada ao art. 114º, nº 5, alínea a), do RGIT, pela 64-A/2008, de 31 de Dezembro, ao fazer equivaler à falta de entrega da prestação tributária a falta de entrega total ou parcial do imposto devido que tenha sido liquidado ou que devesse ter sido liquidado em factura ou documento equivalente, teve como objectivo alargar a previsão legal de molde a abarcar todas as condutas omissivas da obrigação tributária, independentemente do recebimento do imposto por parte do adquirente dos bens ou serviços.
Mas, no caso dos autos, para além dessa nova norma ser posterior aos factos imputados à recorrente, a decisão administrativa de aplicação da coima limita-se a indicar como normas violadas as constantes dos arts. 114º, nº 2, do RGIT, e 26º, nº 4, do CIVA, omitindo qualquer referência ao art. 114º, nº 5, alínea a), do RGIT, não dando assim cumprimento às exigências do art. 79º, nº 1, alínea b), do RGIT, pondo em causa os direitos de defesa do arguido. Se as normas que enquadram as condutas consideradas ilícitas não são correctamente referenciadas ou são omitidas, fica desta forma impossibilitado o arguido de dirigir a sua defesa contra tais preceitos.
Se em causa estivesse uma contra-ordenação “omissiva pura”- como a do n.º 1 do artigo 116.º do RGIT (“falta ou atraso de declarações”), em que o facto tipicamente ilícito consistisse apenas em “não fazer algo a que se estava legalmente obrigado a fazer dentro de determinado prazo” -, poder-se-ia entender estar cumprido o requisito legal da decisão de aplicação da coima “descrição sumária dos factos” (artigos 63.º, n.º 1, alínea d), primeira parte e 79.º, n.º 1, alínea b) do RGIT) se nesta fosse indicado correctamente qual o dever omitido e qual o momento (o termo do prazo) em que tal dever devia ter sido cumprido.
Acontece que, no caso, a infracção imputada à arguida não se basta com uma pura omissão de um dever de agir, contém na sua descrição típica, para além disso, um elemento adicional, que, ao constituir um pressuposto da punição, tem de estar suportado em factos descritos na decisão de aplicação da coima: o de que a prestação não entregue se trate de uma “prestação tributária deduzida nos termos da lei.
Assim, a prévia dedução da prestação tributária não entregue constitui elemento essencial do tipo legal de contra-ordenação em causa e consequentemente para que se cumpra a “descrição sumária dos factos” que há-de constar da decisão administrativa de aplicação da coima, terá de haver referência, ainda que sumária, ao facto da prestação tributária ter sido deduzida.
A decisão recorrida, ao julgar compete ao arguido provar que não recebe o IVA, porque o auto de notícia faz fé em juízo até prova em contrário - prova juris tantum - pressupõe que esse facto não é um elemento constitutivo da contra-ordenação que deva figurar na decisão que aplica a coima. Mas, como vimos, não é esse o sentido com que a jurisprudência tem interpretado o nº 1 e 2 do artigo 114º do REGIT, pelo que confirma-se o erro de julgamento.
E assim sendo, em face de tudo o que vai exposto, não pode ter-se como adequadamente cumprido o requisito a que alude a alínea b) do art. 79º do RGIT (descrição sumária dos factos e indicação das normas violadas e punitivas), omissão essa que constitui nulidade insuprível 8art. 63º, nº 1, alínea d), do RGIT) devendo desta forma improceder o presente recurso jurisdicional.

4. Nestes termos, acordam os Juízes da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo e, dando provimento ao recurso, revogar a decisão recorrida e, consequentemente, anular a decisão administrativa que aplicou a coima à recorrente.

Sem custas.

Lisboa, 16 de Janeiro de 2013. - Lino Ribeiro (relator) – Dulce Manuel Neto – Isabel Marques da Silva.