Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01050/10
Data do Acordão:01/26/2011
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:PIMENTA DO VALE
Descritores:RECLAMAÇÃO DE ACTO PRATICADO PELO ÓRGÃO DA EXECUÇÃO FISCAL
INSTITUTO DA VINHA E DO VINHO
REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA
REPRESENTAÇÃO EM JUÍZO
INSTITUTO PÚBLICO
Sumário:O Instituto da Vinha e do Vinho não é representado em juízo, nomeadamente, em reclamação de acto do órgão de execução fiscal que indeferiu o pedido de dispensa de prestação de garantia, pela Fazenda Pública, antes cabendo essa representação ao mandatário designado pelo seu Presidente.
Nº Convencional:JSTA00066784
Nº do Documento:SA22011012601050
Data de Entrada:12/30/2010
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A... E OUTRO
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL.
Objecto:SENT TAF VISEU PER SALTUM.
Decisão:PROVIDO.
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC FISCAL.
Legislação Nacional:CPPTRIB99 ART15 N1 A ART148 N2 A ART151 N1 ART152.
DL 46/2007 DE 2007/02/27 ART1 N1.
PORT 219-H/2007 DE 2007/02/28.
L 3/2004 DE 2004/01/15 NA REDACÇÃO DO DL 105/2007 DE 2007/04/03 ART1 N2 ART18 N3 ART21 N1 N N3 N4 ART50 N1.
LGT98 ART103 N1.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC806/07 DE 2007/11/07.; AC STA PROC1017/09 DE 2009/01/21.; AC STA PROC388/09 DE 2009/05/20.; AC STA PROC1129/09 DE 2010/01/13.; AC STA PROC968/07 DE 2008/02/13.
Referência a Doutrina:VITAL MOREIRA PROJECTO DE LEI QUADRO DOS INSTITUTOS PÚBLICOS PAG415.
FREITAS DO AMARAL CURSO DE DIREITO ADMINISTRATIVO VI 3ED PAG380.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam nesta Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
1 – O Representante da Fazenda Pública, não se conformando com a decisão do Mmº Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu que desatendeu a questão prévia suscitada pelo recorrente quanto à sua alegada ilegitimidade para representar em juízo o Instituto da Vinha e do Vinho (IVV), no âmbito de uma reclamação de acto do órgão de execução fiscal, deduzida por A…, melhor identificada nos autos, contra o despacho do Chefe do Serviço de Finanças de Tondela, que lhe indeferiu um pedido de dispensa de prestação de garantia, dele vem interpor recurso, formulando as seguintes conclusões:
a) Incide o presente recurso sobre o douto despacho de indeferimento da questão prévia da ilegitimidade da Fazenda Pública para representar em juízo o IVV, no âmbito de uma reclamação de actos do Órgão de Execução Fiscal;
b) Para cobrança de dívidas referentes à Taxa de Promoção sobre o Vinho e Produtos Vínicos devida ao Instituto da Vinha e do Vinho (IVV), do hiato temporal compreendido entre Janeiro a Março de 2008, foi instaurado, pelo Serviço de Finanças de Tondela, o processo de execução fiscal n.° 2704200801018426;
c) O órgão de execução fiscal, no âmbito desse processo executivo, indeferiu o pedido de dispensa de prestação de garantia, por considerar não se encontrarem reunidos os pressupostos que a tal permitissem;
d) Não se conformando com tal despacho de indeferimento usou a reclamante do presente meio processual, tendo, nesse seguimento, o Mmo Juiz a quo, notificado a Fazenda Pública para os efeitos consignados no art.° 278° n.° 2 do CPPT;
e) Por se considerar que nos termos da lei e à luz da Jurisprudência do STA o IVV, I.P. não pode ser representado em juízo pela Fazenda Pública, mesmo no caso, como o dos autos, de uma reclamação de actos do órgão de execução fiscal em processo de execução fiscal, levantou-se, nesse momento, a questão da ilegitimidade da Fazenda Pública para representar em juízo o IVV, I.P.;
f) Todavia, tal entendimento, não foi sufragado pelo Mmo Juiz a quo, que “desatendeu à questão prévia invocada pela Fazenda Pública pelo que a mesma deve apresentar a resposta nos termos para que foi notificada”;
g) Não olvidamos nem tão pouco se coloca em causa que o despacho recorrido judicialmente pela A…, Lda. foi praticado pelo órgão de execução fiscal, (decisão de indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia, apresentado no âmbito de uma execução fiscal, instaurada pelo Serviço de Finanças de Tondela);
h) O que se questiona é o facto da representação em juízo do IVV, I. P., ainda que no âmbito de uma reclamação de actos do órgão de execução fiscal em processo de execução fiscal competir à Fazenda Pública em detrimento de mandatário especialmente designado para o efeito pelo Presidente daquele Instituto;
i) Porquanto, dispõe o art.° 15º, n.° 1, alínea a) do CPPT que compete à Fazenda Pública «representar a administração tributária e, nos termos da lei, quaisquer outras entidades públicas no processo judicial tributário e no processo de execução fiscal»;
j) De onde é legítimo extrair que ao representante da Fazenda Pública pode caber a representação de outras entidades públicas no processo judicial tributário e no processo de execução fiscal, apenas se e nos casos em que a lei lhe atribua essa mesma representação;
k) Nos termos do Decreto-Lei n.° 46/2007 de 27-02 e da Portaria n.° 219-H/2007 de 28-02, constata-se que o Instituto da Vinha e do Vinho é identificado como Instituto Público integrado na Administração Indirecta do Estado;
1) Por seu lado, dispõe o art.° 21.° n.° 3 da Lei n.° 3/2004, de 15 de Janeiro (denominada por Lei-Quadro dos Institutos Públicos) que “os institutos públicos são representados, designadamente em juízo, ou na prática de actos jurídicos, pelo presidente do conselho directivo, por dois dos seus membros, ou por mandatários especialmente designados”;
m) E nem se diga que esta regra é afastada pelo facto de estarmos perante uma reclamação judicial de actos praticados pelo órgão de execução fiscal;
n) De facto, não obstante ser o Chefe de Finanças de Tondela o autor do acto reclamado, a verdade é que esse acto foi praticado no âmbito de uma execução fiscal instaurada para cobrança de dívidas provenientes de “taxa de promoção” à qual ficam sujeitos «os vinhos e produtos vínicos produzidos no território nacional, bem como os produzidos noutros países e aqui comercializados»;
o) Ora, como refere o Insigne Conselheiro Jorge Lopes de Sousa a propósito da execução fiscal a requerimento do sub-rogado a que se refere o art.° 92° n.° 2 do CPPT, nessas situações “deverá ser ele e não o representante da Fazenda Pública, a entidade a notificar, nos termos do n.° 2 deste art.° 278°, pois a intervenção deste no processo de execução fiscal apenas se pode justificar nos casos em que estão em causa interesses da Fazenda Pública ou de entidades públicas”, desde que a representação destas últimas deva ser assegurada pela Fazenda Pública nos termos da lei, cfr. Jorge Lopes de Sousa, “Código de Procedimento e de Processo Tributário” (Lisboa 2007) p. 670;
p) Isto não obstante ser o órgão de execução fiscal a entidade responsável para a prática de todos os actos necessários ao regular desenvolvimento do processo executivo;
q) Aliás, é essa a posição da jurisprudência mais recente do Supremo Tribunal Administrativo, de que destacamos, por revestir particular acuidade no caso em apreço, (uma vez que se verifica, inclusive, a identidade dos intervenientes processuais aqui em causa) o Aresto proferido no recurso n.° 01129/09;
r) No citado Aresto a apresentação de resposta por parte da Fazenda Pública, além de enfermar de nulidade, determinou a anulação de todos os termos que lhe foram posteriores e acarretou a respectiva condenação em custas, tudo como se retira do predito Acórdão;
s) De referir que no Acórdão citado a Reclamante A… arguiu a nulidade da resposta apresentada pela Fazenda Pública com base na sua ilegitimidade passiva, no âmbito de uma decisão por parte do Serviço de Finanças de Tondela de instaurar a execução e mandar citar a Reclamante, no âmbito de um processo de execução fiscal instaurado para cobrança de dívidas ao IVV, I. P.;
t) Sendo que tal questão foi confirmada pelo Supremo Tribunal Administrativo;
u) Na decisão que motivou o presente recurso, a Fazenda pública arguiu a sua ilegitimidade passiva no âmbito de uma decisão de indeferimento de dispensa de prestação de garantia, no âmbito de um processo de execução fiscal instaurado para cobrança de dívidas ao IVV, I.P.;
v) Isto é, a factualidade aqui em causa é, na essência, a mesma, trata-se de actos praticados pelo órgão de execução fiscal no âmbito da respectiva tramitação do processo executivo;
w) Salvo melhor entendimento, não se vislumbra qualquer alteração de fundo entre a situação presente e aquela que foi objecto de análise no recurso n.° 01129/09, ambas derivaram de um despacho proferido por um Chefe do Serviço de Finanças no âmbito de uma execução fiscal instaurada para cobrança de dívidas ao IVV, I. P.;
x) Como pode ler-se no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, proferido no recurso n.° 0388/09 e ao qual aderiu inteiramente o Acórdão n.° 01129/09, “conjugando a alínea a) do n.° 1 do artigo 15.° do CPPT com as disposições da Lei-Quadro dos institutos públicos e as constantes da actual orgânica e estatutos do IVV, a representação em juízo do IVV cabe a mandatário especialmente designado para o efeito pelo Presidente do Instituto, mesmo no caso, como o dos autos, de uma reclamação de acto de órgão de execução fiscal em processo de execução fiscal (ao qual, não obstante correr a generalidade dos seus termos nos serviços de finanças, a lei atribui carácter judicial - cfr. o n.° 1 do art. 103.° da Lei Geral Tributária), carecendo o representante da Fazenda Pública de legitimidade para assegurar essa representação”;
y) Nestes termos, considerando que nos termos da lei e à luz da Jurisprudência do STA o IVV, I.P., ainda que no caso de uma reclamação de actos do órgão de execução fiscal, não pode ser representado em juízo pela Fazenda Pública, deve, para o efeito, ser declarada a nulidade da notificação da Fazenda Pública e ordenada a notificação do IVV, I.P. para querendo, apresentar a resposta a que alude o art.° 278° n.° 2 do CPPT.
Termos em que, nos melhores de direito e sempre com o mui Douto suprimento de Vossas Excelências, deve ser dado provimento ao presente recurso, ordenando-se a revogação da douta decisão recorrida e consequente substituição por outra que confirme a ilegitimidade da Fazenda Pública para representar em juízo o IVV, I.P, mesmo no caso, como o dos autos, de uma reclamação de actos do órgão de execução fiscal em processo de execução fiscal.
A recorrida contra-alegou, para concluir do seguinte modo:
A. Nos presentes autos, o acto praticado e do qual se reclama consubstancia uma decisão tomada pelo Senhor Chefe do Serviço de Finanças de Tondela - a decisão de indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia -, proferida no âmbito de uma competência que, alegadamente, lhe é própria, sendo, pois, a este órgão administrativo que é imputável o acto em crise nos autos de reclamação.
B. A legitimidade passiva nestes autos de reclamação não pode recair sobre o IVV, instituto público alheio ao acto praticado e que em nada influenciou a decisão tomada pelo órgão de execução fiscal.
C. A legitimidade passiva deverá recair sobre a Fazenda Pública, na figura do seu Ilustre Representante junto do Tribunal (cf. artigos 53.° e 54.° do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, 9.°, n.° 4 e 15.° do CPPT), como, desde logo, determina o próprio número 2 do artigo 278.° do CPPT.
D. É o órgão de execução fiscal - e não o IVV - quem assume a posição de contraparte na relação material controvertida dos presentes autos de reclamação de uma decisão de tal órgão.
E. O Acórdão de 13.01.2010, rec. 1129/09, em que este Venerando Tribunal concluiu, naquela concreta situação de reclamação de acto do órgão de execução fiscal submetida à sua apreciação, que o IVV não era representado em juízo pela Fazenda Pública, diz respeito a um acto do Chefe de Finanças bem diferente do acto de que aqui se reclama.
F. Nos autos em que foi proferido o citado Acórdão, reclamava-se do acto pelo qual o Senhor Chefe de Finanças instaurara as execuções fiscais aí em causa, acto que, como é sabido, mais não consubstancia do que o mero recebimento pelo órgão de execução do título executivo.
G. Nesse acto, compreende-se que a margem de apreciação por parte do Chefe de Finanças seja mínima, limitando-se a receber o título executivo e a lavrar despacho, que marcará o início do processo de execução, razão pela qual, numa reclamação judicial de tal acto, em que a reclamante venha apontar, por hipótese, a falta de um requisito essencial do suposto título executivo, poderá conceber-se que o emissor do documento tenha legitimidade para se representar em juízo, na discussão de tal questão.
H. Nos presentes autos, o acto de que se reclama é a decisão do Senhor Chefe de Finanças de indeferir o pedido de dispensa de prestação de garantia, estando bom de ver que o IVV não é - nem pode ser - ouvido em tal apreciação do pedido de dispensa de prestação de garantia, nem interveio ao longo do respectivo processo decisório.
I. O referido Chefe do Serviço de Finanças «faz parte de uma cadeia hierárquica e funcional que em juízo é representada pelo Exmo. Representante da Fazenda Pública».
Nestes termos e nos melhores de Direito, deverá ser negado provimento ao presente recurso, mantendo-se, consequentemente, inalterada a decisão posta em crise, com o que se fará a necessária e acostumada JUSTIÇA!
O Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que a decisão recorrida deve ser revogada e substituída por outra em que se declare a nulidade da notificação da Fazenda Pública (em representação do IVV, I.P) e os autos devolvidos ao Tribunal recorrido a fim de, aí, a reclamação seguir os seus trâmites, com notificação do IVV, IP, na pessoa do seu representante legal.
Atenta a natureza urgente do presente processo, não foram colhidos os vistos legais.
Cumpre decidir.
2 – A questão suscitada com o presente recurso não tem sido tratada de forma uniforme por esta Secção do STA.
Assim e no sentido de que a Fazenda Pública tem legitimidade para representar em juízo o Instituto da Vinha e do Vinho se pronunciaram os Acórdãos de 7/11/07, in rec. nº 806/07 e de 21/1/09, in rec. nº 1.017/09, este subscrito pelo agora Relator.
Em sentido contrário, pronunciaram-se os Acórdãos de 20/5/09, in rec. nº 388/09 e de 13/1/10, in rec. nº 1.129/09, este subscrito pelo Relator, que reviu, entretanto, a sua anterior posição, face à sua proficiente fundamentação jurídica, à qual nada se nos oferece acrescentar.
Por isso, limitar-nos-emos a acompanhar o que aí foi dito, com as necessárias adaptações, tendo em vista uma interpretação e aplicação uniformes do direito (cfr. artº 8º, nº 3 do CC).
Escreveu-se, então, nesse aresto, citando o predito Acórdão de 20/5/09 que “…Em situação semelhante à dos autos, mas no âmbito de um quadro normativo anterior à Lei quadro dos institutos públicos e aos actuais diplomas relativos à orgânica e Estatutos do Instituto da Vinha e do Vinho, pronunciaram-se os Acórdãos deste Tribunal de 7/11/2007 (rec. n.º 806/07) e de 21/1/2009 (rec. n.º 1017/08) no sentido de que a representação em juízo do Instituto da Vinha e do Vinho cabe ao Representante da Fazenda Pública, pois que os respectivos Estatutos, constantes ao tempo do Decreto-Lei n.º 99/97, de 26/4, seriam omissos quanto à atribuição de representação especial a outra entidade, decorrendo a legitimidade do representante da Fazenda Pública das disposições conjugadas dos artigos 15.º, n.º 1, alínea a), 148.º, n.º 2, alínea a), 151.º, n.º 1 e 152.º do CPPT.
Das disposições legais acabadas de citar, apenas interessa especificamente considerar aqui o artigo 15.º, n.º 1, alínea a) do CPPT, pois que a aplicação de nenhuma das demais é questionada nem se lhes imputa qualquer violação.
Ninguém contesta nos autos que o pedido de dispensa de prestação de garantia e cujo indeferimento foi determinada por força de acto administrativo (vide fls. 42 e 43 dos autos), se deva fazer na execução fiscal instaurada pelo serviço de finanças territorialmente competente ou que o conhecimento dos incidentes judiciais ou as acções de impugnação deste processo executivo sejam da competência dos tribunais tributários. Questionada é apenas a legitimidade do Representante da Fazenda Pública para intervir em reclamação judicial em representação do IVV.
Dispõe o artigo 15.º, n.º 1, alínea a) do CPPT, sob a epígrafe, Competência do representante da Fazenda Pública que, (C)ompete ao representante da Fazenda pública nos tribunais tributários: a) (R)epresentar a administração tributária e, nos termos da lei, quaisquer outras entidades públicas no processo judicial tributário e no processo de execução fiscal, donde é legítimo extrair que ao representante da Fazenda Pública pode caber a representação de outras entidades públicas no processo judicial tributário e no processo de execução fiscal, mas parece que apenas se e nos casos em que a lei lhe atribua essa representação.
Ora, tal não sucede no caso do IVV, como demonstraremos de seguida.
O Instituto da Vinha e do Vinho tem a natureza de instituto público integrado na administração indirecta do Estado (cfr. o art. 1.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 46/2007, de 27 de Fevereiro), sendo a sua orgânica actual a constante do Decreto-Lei n.º 46/2007 e os actuais Estatutos os que constam da Portaria n.º 219-H/2007, de 28 de Fevereiro.
Em nenhum dos dois diplomas específicos actualmente em vigor relativos ao Instituto da Vinha e do Vinho se encontra disposição que atribua ao representante da Fazenda Pública a representação do instituto, sendo certo que neles não se encontra igualmente qualquer disposição relativa à representação em juízo desta entidade.
Mas desta omissão não decorre que tal representação caiba ao representante da Fazenda Pública. Tendo o IVV a natureza de instituto público, é-lhe aplicável a Lei-Quadro dos Institutos Públicos - Lei n.º 3/2004, de 15 de Janeiro, republicada em anexo ao Decreto-Lei n.º 105/2007, de 3 de Abril -, e integralmente, pois que a sua regulamentação específica foi já objecto de revisão posteriormente à data de entrada em vigor daquela lei (cfr. o art. 50.º, n.º 1 da citada Lei n.º 3/2004).
Ora, nos termos da citada Lei-Quadro, que determina que as disposições dela constantes são de aplicação imperativa e prevalecem sobre as normas especiais actualmente em vigor, salvo na medida em que o contrário resulte expressamente da presente lei (cfr. o n.º 2 do seu artigo 1.º) a competência para constituir mandatários do instituto, em juízo e fora dele, incluindo com o poder de substabelecer é atribuída ao conselho directivo (cfr. a alínea n) do n.º 1 do artigo 21.º da citada Lei), estabelecendo ainda que os institutos públicos são representados, designadamente em juízo ou na prática de actos jurídicos, pelo presidente do conselho directivo, por dois dos seus membros, ou por mandatários especialmente designados directivo [cfr. o n.º 3 do artigo 21.º da citada Lei, com origem no n.º 3 do art. 18.º do projecto de lei-quadro dos institutos públicos da autoria de Vital Moreira, onde se anotava destinar-se este preceito a regular a sensível matéria da representação legal do instituto - cfr. VITAL MOREIRA, «Projecto de Lei-Quadro dos Institutos Públicos», in Ministério da Reforma do Estado e da Administração Pública/Grupo de Trabalho para os Institutos Públicos, Relatório e proposta de lei-quadro sobre os Institutos Públicos, Lisboa, Setembro 2001. p. 415), prevendo-se a final que sem prejuízo do disposto na alínea n) do n.º 1, o conselho directivo pode sempre optar por solicitar o apoio e a representação em juízo por parte do Ministério Público, ao qual compete, nesse caso, defender os interesses do instituto (cfr. o n.º 4 do artigo 21.º da referida Lei).
Esta disciplina legal constante da Lei quadro dos institutos públicos, e como se disse aplicável ao IVV, bem se justifica atendendo à natureza jurídica destas entidades, pois que, como ensina FREITAS DO AMARAL (Curso de Direito Administrativo, volume I, 3.ª ed., 2006, p. 380), os institutos públicos (são) entidades juridicamente distintas do Estado e os seus órgãos dirigentes são, em princípio, órgãos do instituto público e não órgãos do Estado; o seu pessoal é privativo do instituto público, não é funcionalismo do Estado; as suas finanças são para-estaduais, não são finanças do Estado; o seu património é próprio, não é património do Estado. Ora, sendo pessoas jurídicas distintas do Estado, com personalidade jurídica própria não obstante integrarem a administração estadual indirecta, o que é adequado à sua natureza é que sejam representadas em juízo pelos seus órgãos próprios ou por quem por eles for designado.
Deve, aliás, observar-se que esta foi, a orientação assumida por este Tribunal relativamente à representação em juízo em oposição à execução fiscal do “Instituto do Emprego e da Formação Profissional, I.P.” (Acórdão de 13 de Fevereiro de 2008, rec. n.º 968/07) e ao “Instituto de Financiamento e Apoio ao Desenvolvimento da Agricultura e Pescas - IFADAP” (Acórdão de 31 de Janeiro de 2008) e que aqui sufragamos igualmente, não obstante estar em causa uma reclamação judicial e não uma oposição e ser outro o Instituto Público em causa.
Pode, pois, concluir-se, conjugando a alínea a) do n.º 1 do artigo 15.º do CPPT com as disposições da Lei-Quadro dos institutos públicos supra reproduzidas e as constantes da actual orgânica e estatutos do IVV, que a representação em juízo do IVV cabe a mandatário especialmente designado para o efeito pelo Presidente do Instituto, mesmo no caso, como o dos autos, de uma reclamação de acto de órgão de execução fiscal em processo de execução fiscal (ao qual, não obstante correr a generalidade dos seus termos nos serviços de finanças, a lei atribui carácter judicial – cfr. o n.º 1 do art. 103.º da Lei Geral Tributária), carecendo o representante da Fazenda Pública de legitimidade para assegurar essa representação...”.
E assim se decidindo, não pode ter acolhimento o argumento invocado quer pelo Mmº Juiz “a quo”, quer pela recorrida, de que a situação a que o acórdão que temos vindo a citar respeita não é similar à dos presentes autos.
Com efeito, o que está em causa numa e noutra situação é a (i)legitimidade da Fazenda Pública para representar em juízo o IVV e não para executar os actos processuais próprios da execução fiscal - no caso a apreciação do pedido de dispensa de prestação de garantia -, na medida em que esta, por força de lei, deve correr seus termos nos Serviços de Finanças respectivo e cuja decisão daqueles actos é da competência do Chefe dos referidos Serviços, como aliás se reconhece na decisão recorrida - o que são coisas bem diferentes.
Tem, pois, razão a recorrente quanto à questão suscitada, pelo que, carecendo o Representante da Fazenda Pública de legitimidade para assegurar a representação em juízo do Instituto da Vinha e do Vinho, anular-se-á, não apenas a resposta da Fazenda Pública, de fls. 73 e segs. à reclamação deduzida, mas também os termos posteriores da presente reclamação judicial, “para salvaguarda do princípio do contraditório e suprimento da ilegitimidade da parte”.
O recurso merece, pois, provimento.
3 – Nestes termos, acorda-se em conceder provimento ao presente recurso, anular todo o processado a partir do despacho que ordenou a citação da Fazenda Pública para contestar, devendo os autos baixarem à primeira instância para citação do Instituto da Vinha e do Vinho.
Custas pela recorrida, apenas neste Supremo Tribunal, uma vez que contra-alegou.
Lisboa, 26 de Janeiro de 2011. – Pimenta do Vale (relator) – António Calhau – Casimiro Gonçalves.