Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01087/14
Data do Acordão:04/15/2015
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CT
Relator:PEDRO DELGADO
Descritores:RECURSO POR OPOSIÇÃO DE ACÓRDÃOS
REQUISITOS
INSOLVÊNCIA
CRÉDITOS VENCIDOS APÓS DECLARAÇÃO DE INSOLVÊNCIA
Sumário:I - São requisitos dos recursos por oposição de acórdãos a que se aplica o ETAF de 2002:
– identidade da questão de direito sobre que recaíram os acórdãos em confronto, que supõe estar-se perante uma situação de facto substancialmente idêntica;
– que não tenha havido alteração substancial na regulamentação jurídica;
– que se tenha perfilhado, nos dois arestos, solução oposta;
– a oposição deverá decorrer de decisões expressas e não apenas implícitas.
II - Se não se verifica divergência de soluções quanto à mesma questão de direito, deve o recurso ser julgado findo, por falta dos pressupostos do recurso de oposição de acórdãos, nos termos do disposto no nº 5 do art. 284º do Código de Procedimento e Processo Tributário.
III - As obrigações tributárias vencem-se no termo do prazo legal para pagamento voluntário, à semelhança do que sucede com as obrigações jurídicas em geral, que só podem ser objecto de acção executiva quando sejam certas e exigíveis.
IV - Razão por que as dívidas provenientes de coimas e de IVA em causa nos autos se venceram no momento em que o credor adquiriu o direito de exigir o pagamento ao devedor, momento que não pode deixar de referir-se ao termo final do prazo para o seu pagamento voluntário, ou seja 07.01.2013 e 31.12.2012, respectivamente, altura em que a sociedade executada já fora judicialmente declarada insolvente.
Nº Convencional:JSTA00069151
Nº do Documento:SAP2015041501087
Data de Entrada:10/08/2014
Recorrente:Z..., S.A.
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC OPOS JULGADOS
Objecto:AC TCAN DE 2014/05/15
Decisão:FINDO.
NEGA PROVIMENTO.
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC FISCAL .
OPOS JULGADOS.
Legislação Nacional:ETAF02 ART17 N2 ART27 B.
LGT98 ART36 N1 ART77 N6.
CPPTRIB99 ART36 N1 ART37 N1 ART85 N1 N2 ART165 N1 A N4 ART180 N1 N6 ART276 ART284.
CPTA02 ART152.
CPA91 ART68 N1 A N2.
CPC13 ART188 N1 ART191 N2 ART195 N1 ART641 N5.
Jurisprudência Nacional:AC STAPLENO PROC0965/14 DE 2015/02/25.; AC STAPLENO PROC01463/13 DE 2014/10/15.; AC STAPLENO PROC0594/12 DE 2013/11/13.; AC STAPLENO PROC0932/12 DE 2012/12/12.; AC STAPLENO PROC01075/11 DE 2012/09/19.; AC STAPLENO PROC01030/10 DE 2012/11/18.; AC STAPLENO PROC0617/08 DE 2009/06/06.; AC STAPLENO PROC0460/07 DE 2008/05/21.; AC STAPLENO PROC0452/07 DE 2007/09/26.; AC STAPLENO PROC01149/02 DE 2003/05/07.; AC STAPLENO PROC035205 DE 2003/03/12.; AC STAPLENO PROC04295 DE 1999/03/07.; AC STAPLENO PROC028637 DE 1998/02/18.; AC STA PROC0903/14 DE 2015/03/04.; AC STA PROC0885/11 DE 2012/02/29.; AC STA PROC051/10 DE 2010/04/14.; AC STA PROC0981/10 DE 2011/04/06.; AC TCAN PROC02508/12 DE 2013/09/13.; AC TCAN PROC01096/11 DE 2011/10/12.
Referência a Doutrina:SALDANHA SANCHES - MANUAL DE DIREITO FISCAL 3ED COIMBRA EDITORA PAG255.
RUI DUARTE MORAIS - A EXECUÇÃO FISCAL 2ED ALMEDINA PAG34.
JORGE DE SOUSA - CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E DE PROCESSO TRIBUTÁRIO ANOTADO E COMENTADO 6ED VOLIII PAG321.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam no Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1 – Z………………, SA, inconformada com o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 15 de Maio de 2014 que julgou improcedente a reclamação por si deduzida contra o despacho que ordenou a penhora do veículo com a matrícula ……………., proferida pelo Serviço de Finanças de Valongo, no processo de execução fiscal nº 189920130100, vem nos termos dos artigos 26º, nº1, al. b) do ETAF, 280.º, nº2 e 284º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, interpor recurso para este Tribunal, por oposição com dois Acórdãos do Tribunal Central Administrativo Norte: o Acórdão de 13 de Setembro de 2013, proferido no âmbito do processo nº 02508/12 e o Acórdão proferido em 12 de Outubro de 2011, no âmbito do processo nº 1096/11.
Por despacho de 19 de Agosto de 2014, a fls. 307/315 dos autos, o Exmº Relator do TCA Norte, veio admitir o recurso, ordenando a notificação das partes para apresentarem alegações, nos termos e no prazo referido no nº 3, do artigo 282º, ex vi nº5, do artigo 284º, ambos do CPPT.

A recorrente apresentou a fls. 344/364 alegação tendente a demonstrar alegada oposição de julgados, formulando as seguintes conclusões:
«a) O acórdão recorrido defende que “a reclamante não pode invocar directamente neste tribunal e nesta reclamação o julgamento dessa alegada nulidade processual, sem que a tenha requerido anteriormente ao órgão de execução fiscal”;
b) Porém, decorre do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, processo n.º 02508/12.6BEPRT, de 13.09.2013 que “a nulidade de falta de citação pode ser conhecida pelo Tribunal sem que o órgão de execução fiscal sobre ela se tenha pronunciado, se invocada na reclamação prevista no artigo 276.° do CPPT - Acórdão disponível em www.dgsi.pt
c) À (Sic) que distinguir a falta de citação com a nulidade da citação, dado que se tratam de figuras distintas, com prazos de arguição diferentes;
d) “A primeira pode ser arguida até ao trânsito em julgado da sentença, a segunda dentro do prazo de oposição. E para além disso, a primeira é do conhecimento oficioso, enquanto que, a segunda só é conhecida pelo Tribunal caso seja arguida pelo interessado”;
e) “Se a falta de citação é do conhecimento oficioso significa que deve ser conhecida independentemente de arguição. E deve ser conhecida ou pelo órgão de execução fiscal, na fase em que o processo executivo corre no serviço de finanças, ou pelo juiz na fase em que o processo tramita no Tribunal”- cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, processo n.º 02508/12.63[PRT, de 13.09.2013;
f) Ora, o juiz apenas acede ao processo executivo na sequência da instauração de um processo de reclamação da decisão do órgão de execução fiscal previsto no artigo 276.º do CPPT;
g) Se, como é o caso, é interposta reclamação de uma decisão a nulidade da citação/notificação, o juiz deve dela conhecer. Até porque o processo de execução fiscal é um processo judicial, conforme o disposto no artigo 103.º da Lei Geral Tributária;
h) “Mas, independentemente de a nulidade ser do conhecimento oficioso ou não, o que é decisivo para aferir do modo da sua arguição, é saber se a parte põe em causa um determinado acto do órgão de execução fiscal, ou se pura e simplesmente arguiu a nulidade por falta de citação ou qualquer outra nulidade. No primeiro caso, o meio processual próprio é a reclamação prevista no artigo 276.º do CPPT, a nulidade funciona como vício invalidante do acto (Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 24-07-2013, recurso n.º 1211/13). Na segunda hipótese, e aplicando-se a doutrina do acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo atrás referido, a nulidade deve ser arguida perante o órgão de execução fiscal” - cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, processo n.º 02508/12.6BEPRT, de 13.09.2013;
i) Ora, na reclamação apresentada, a ora Recorrente não se limita apenas a arguir a nulidade de falta de citação/notificação, pondo ainda em causa um acto do órgão de execução fiscal que ordenou a penhora do veículo com matrícula …………..;
j) Assim, a reclamação nos termos do artigo 276.º do CPPT constitui o meio processual adequado para arguir a nulidade da citação/notificação;
k) Nos termos do disposto no art.º 88°, n.º 1 do CIRE” [a] declaração de insolvência determina a suspensão de quaisquer diligências executivas ou providências requeridas pelos credores da insolvência…”;
l) O mesmo estabelece o n.º 1 do artigo 180.º do CPPT;
m) Porém, o n.º 6 do artigo 180.º do CPPT estabelece que o disposto neste artigo não se aplica aos créditos vencidos após a declaração de falência ou de despacho de prosseguimento da acção de recuperação da empresa, que seguirão os termos normais até à extinção da execução”;
n) Desta forma, o que releva para o caso é saber se o crédito dos presentes autos se venceu antes ou depois da declaração de insolvência;
o) “A este respeito, o Prof. Saldanha Sanches distinguia o vencimento da pretensão tributária do vencimento da obrigação de cumprir. O primeiro ocorreria quando decorresse o prazo previsto na lei para a formação do facto tributário e o segundo quando ocorresse o facto de que a lei faz depender a formação da dívida do imposto — cfr. «Manual de Direito Fiscal», 3 edição, Coimbra Editora, pág. 255;
p) À luz desta distinção, o decurso do prazo previsto na lei para a formação do facto tributário e para a declaração da obrigação tributária importaria o vencimento da obrigação acessória de apresentar essa declaração, mas não o vencimento da obrigação principal de pagar o imposto, a qual estaria dependente de um outro facto - pressuposto: a liquidação e sua notificação ao sujeito passivo. Até lá, o sujeito passivo saberia que ocorrera um facto relevante para efeitos tributários, mas não saberia as suas implicações no plano da quantificação da obrigação tributária;
q) Porém, esta distinção já não faz sentido relativamente aos tributos que, como o I.V.A., devam ser autoliquidados. Nestes casos, o decurso do prazo importa não apenas o vencimento da obrigação de apresentar a declaração periódica, como a obrigação de liquidar o montante devido e enviar o respectivo meio de pagamento, sem qualquer necessidade de interpelação (nome técnico-jurídico que se dá ao acto pelo qual o credor exige ou reclama do devedor o cumprimento da obrigação);
r) Estas obrigações tributárias têm muito maior afinidade com as obrigações de prazo certo a que alude o artigo 805.º, n.º 2, alínea a), do Código Civil, visto que o seu vencimento não depende de interpelação e resulta directamente da lei;
s) É certo que a Administração Tributária, quando confrontada com o incumprimento dos deveres, não está habilitada — na maioria dos casos — a exigir sem mais o cumprimento da obrigação, tendo que efectuar, por sua vez, uma liquidação adicional ou oficiosa, conforme os casos. O que acontecerá em alguns casos porque o credor Estado desconhece o valor exacto da prestação do devedor e noutro por mera extensão das garantias de defesa. Mas a liquidação substitutiva tem aqui mais afinidades com o incidente de liquidação executiva a que alude o artigo 805.º do C.P.C. Do que se trata aqui não é já determinar o valor com vista ao cumprimento, mas de substituir o devedor na aferição do valor de uma prestação que não cumpriu;
t) De todo o exposto decorre que a utilização da expressão «vencimento» e «créditos vencidos» se adapta mal às especificidades da obrigação tributária e justifica, em parte, que não seja utilizada na sua caracterização na L.G.T;
u) O que nos leva a outra conclusão, mais interessante para a resolução do litígio: a de que o legislador utilizou o termo «créditos vencidos» no artigo 180°, n.º 6, do C.P.P.T., não para remeter para um conceito tributário (que não existe) ou tão pouco para um conceito civil (que não se lhe acomoda), mas para remeter para a legislação das falências. Ou seja: «créditos vencidos após a declaração de falência» para efeitos deste dispositivo legal são aqueles que, à luz da lei falimentar, só venham a vencer-se após a declaração de falência;
v) Ora, é aqui que releva o artigo 91°, n.º 1, do C.I.R.E.: resulta claramente deste dispositivo legal, que todas as obrigações da insolvente geradas em data anterior à declaração de insolvência e não subordinadas a condição suspensiva se consideram vencidas nesta data.
Ou seja, para efeitos desta lei, créditos vencidos são todas as obrigações do insolvente constituídas em data anterior à declaração de insolvência, independentemente de se encontrarem sujeitas a prazo ou a termo (certo, incerto, legal, convencional ou natural), ou o seu vencimento estar dependente da vontade do devedor (obrigações cum voluerit) ou da possibilidade do devedor (obrigações cum potuerit) [cfr. Maria Rosário Epifânio, in «Os Efeitos Substantivos da Falência», Publicações Universidade Católica, pág. 201]. Excluem-se, por ressalva expressa do legislador, as obrigações subordinadas a condição suspensiva;
w) As obrigações subordinadas a condição suspensiva são as que, à data da declaração de falência e por vontade das partes, estavam dependentes de um acontecimento futuro e incerto — cfr. artigo 270.° do Código Civil. Não são, assim, obrigações condicionais aquelas cujos efeitos estão dependentes de uma condição por exigência da lei (também designadas na doutrina por condições impróprias);
x) Pelo que as obrigações tributárias — cujos elementos essenciais não podem ser alterados por vontade das partes (cfr. artigo 36°, n.º 2, da L.G.T.) — nunca poderiam ser consideradas obrigações condicionais ou subordinadas a condição suspensiva para efeitos deste normativo.
O que significa, basicamente, que para efeitos do C.I.R.E, todas as dívidas tributárias constituídas à data da declaração de insolvência se consideram vencidas nessa data independentemente de ter ou não sido efectuado o seu apuramento pelo sujeito passivo ou pela Administração Tributária;
y) A razão de ser de tal regime radica fundamentalmente no facto de o processo de insolvência ser orientado pelos princípios universalidade, da igualdade e da proporcionalidade. Do primeiro, decorre que, em princípio, todos os créditos e todos os credores são admitidos à insolvência. Do segundo decorre que, em princípio, todos os credores concorrem ao produto da venda da massa insolvente em posição de paridade, isto é, sem prevalência de uns sobre os outros. Do terceiro decorre que, em princípio, todos os créditos são pagos pelo produto da venda dos bens do insolvente de acordo com a regra par condicio creditorum, isto é, rateadamente;
z) À luz destes critérios, não faria sentido que o credor Estado não fosse admitido à insolvência só porque o crédito tributário, integralmente formado em data anterior à declaração de insolvência, ainda não tinha sido liquidado. Sobretudo se a obrigação de liquidação recaía sobre o próprio devedor, como é o caso.
aa) Mas é possível apelar a outra razão, esta de carácter histórico: é que o sistema falencial português tem evoluído de um processo meramente destinado à execução da responsabilidade pessoal do devedor (finalidade líquidatória) para um processo destinado ao saneamento das empresas inviáveis e recuperação das empresas viáveis (finalidade saneatória). O seu principal objectivo não é já (ou apenas) o de tutelar os interesses dos credores, mas o de salvaguardar o interesse público que se encontra associado à saúde económico - financeira do tecido empresarial no seu todo. Finalidade que só é verdadeiramente atingível se no processo de insolvência forem mesmo considerados todos os créditos imputáveis à acção gestionária que antecedeu a declaração respectiva.
Porque, de outro modo, todas as deliberações quanto à viabilidade da empresa seriam provisórias e condicionais. E, para serem rigorosas, todas as avaliações de risco que porventura as tivessem suportado, nomeadamente as de outros incumprimentos, deveriam considerar uma margem de erro, factores aleatórios introduzidos pela hipótese de débitos desconhecidos, que muito dificultariam a opção pela recuperação;
bb) Finalmente, a possibilidade de reclamar depois da extinção do processo de insolvência créditos vencidos antes de esta ser declarada, não poderia deixar de afectar o efectivo empenhamento dos credores — incluindo o credor Estado — da definição do destino da empresa e, assim, comprometer a finalidade estrutural deste processo, que é a de separar com eficácia as empresas que são viáveis das que não o são, de salvar umas e liquidar as outras;
cc) Por todo o exposto, entendemos que «créditos (tributários) vencidos após a declaração de falência» para os efeitos do artigo 180.°, n.º 6, do C.P.P.T. serão apenas aqueles que forem relativos a factos tributários cuja formação transponha a data de declaração de insolvência;
dd) O que, de resto, está de acordo com a distinção basilar entre dívidas da insolvência e dívidas da massa insolvente que emana do artigo 233°, n.º 1, citado na decisão recorrida;
ee) As dívidas da insolvência são as dívidas a que alude o seu artigo 47.º do CIRE (cfr. em particular o seu n.º 2), isto é, são as dívidas que têm a sua génese (o seu fundamento) em factos anteriores à declaração de insolvência (ainda que tenham sido confirmadas no decorrer do processo — cfr. o n.º 3 daquele artigo 47°);
ff) As dívidas da massa insolvente são as dívidas a que alude o seu artigo 51.º (cfr. em particular o seu n.º 2), isto é, são as que se formam no âmbito do próprio processo de insolvência;
gg) À luz desta distinção, não restam qualquer dúvida que a dívida exequenda é uma dívida da insolvência, para os efeitos do C.I.R.E., visto que tem a sua génese em factos anteriores à data da declaração de insolvência;
hh) Pelo que o crédito respectivo também não é um crédito vencido após a declaração de falência para os efeitos do artigo 180°, n.º 6, do C.P.P.T., não lhe sendo aplicável este dispositivo legal” — cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 12.10.2011, processo n.º 01096/11.SBEBRG, relator: Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos, disponível em www.dgsi.pt
ii) O que significa que, relativamente aos créditos formados em data anterior à declaração de insolvência mas que só venham a ser apurados depois desta, como é o caso dos presentes autos, deve a Administração Tributária promover a instauração da execução fiscal, não com vista ao seu prosseguimento nos termos do artigo 180°, n.º 6, do CPPT, mas com vista à sua sustação logo após a sua instauração e remessa ao processo de insolvência, nos termos do n.º 1 do mencionado artigo 180.°
jj) Face ao exposto, não se tratando de um crédito vencido após a declaração de insolvência, devem os presentes autos ser sustados, nos termos do disposto no artigo 88°, n.º 1 do CIRE e 180°, n.º 1 do CPPT, ao contrário do decidido pelo acórdão ora recorrido;
kk) A ora Recorrente encontra-se isenta de custas nos termos do disposto no artigo 4°, al. u) do RCP, uma vez que se encontra em processo de recuperação, face à aprovação do plano de insolvência.
Termos em que
a) Deve ser dado inteiro provimento ao presente recurso e, em consequência,
b) Deve ser declarada que a nulidade da notificação da penhora de fls. dos autos pode ser arguida em reclamação nos termos do disposto no artigo 2769 e ss do CPPT;
c) Deve o crédito exequendo ser declarado como crédito vencido antes da declaração de insolvência
e;
d) Consequentemente, ser ordenada a suspensão dos presentes autos de execução fiscal.»

2 – A Fazenda Pública vem apresentar as suas contra alegações no sentido que deve improceder o recurso.

3 – O Exmº Procurador Geral Adjunto neste Supremo Tribunal Administrativo emitiu douto parecer, com a fundamentação que, na parte mais relevante, se transcreve:
(…..) «Estão em causa duas questões:
1ª-primeira tem a ver com a admissibilidade da arguição da nulidade/citação perante o tribunal, no âmbito da reclamação do artigo 276.º do CPPT, sem anterior invocação de tal nulidade perante o órgão de execução fiscal.
2ª-A segunda tem a ver com o momento do vencimento do crédito para efeitos do estatuído no artigo 180.°/6 do CPPT.
1 ª QUESTÃO.
Afigura-se-nos que quanto a esta questão não se verifica identidade de situações fácticas.
Na verdade, no acórdão de 2013.09.13 do TCAN-P.02508/12 (acórdão fundamento) estava em causa a falta de citação da reclamante, nos termos do disposto no artigo 188.º/1 do CPC, mais precisamente notificações ao fiel depositário que foram devolvidas e que não chegaram ao conhecimento deste (artigo 188.°/ e) do CPC).
A tese do acórdão fundamento tem como pressuposto a ocorrência de uma falta de citação, nulidade insanável, invocável a todo o tempo, nos termos do estatuído no artigo 165.º/l/ a)/4 do CPPT.
Ora, no caso dos autos não está em causa qualquer falta de citação, pois que a recorrente na sua P1 alega que a notificação que lhe foi dirigida não lhe permitia compreender a natureza e origem da dívida e o valor que lhe era indicado, pelo que se mostrariam violados os normativos dos artigos 37.º/l do CPPT e 68.º/l/ a)/2 do CPA, que obrigam à comunicação da fundamentação do acto ao notificando.
Trata-se, assim, de uma situação reconduzível a mera nulidade, nos termos do disposto no artigo 191.º do CPC.
Por outro lado, no acórdão fundamento a reclamante invocou a falta de citação para questionar a legalidade do despacho que determinou a entrega do imóvel.
No acórdão recorrido, a recorrente não invocou a nulidade da citação/notificação com vício invalidante da penhora, pois que a sua arguição prende-se com a própria notificação e com a necessidade do seu aperfeiçoamento e substituição.
Nunca a recorrente pediu a anulação do processado posterior à alega notificação irregular, sendo certo que o invocado fundamento de nulidade da penhora reside na declaração de insolvência e suas consequências na execução fiscal.
No que concerne a esta concreta questão inexiste, pois, identidade de situações fácticas e, consequentemente, oposição de acórdãos.
2. QUESTÃO.
Quanto a esta questão existe efectivamente oposição de acórdãos.
De facto, o acórdão recorrido, em que está em causa IVA de 2010, apoiando-se na decisão do STA, de 2012.02.29-P.0885/11 e na doutrina de Saldanha Sanches, sustenta a tese de que a mera ocorrência do facto tributário, em 2010, gera o direito do Estado ao imposto, sendo, todavia, certo que tal direito tem de ser exercido por via da liquidação, que deve ser notificada ao contribuinte para proceder ao pagamento do tributo no prazo legal e só decorrido o prazo do pagamento voluntário a obrigação se considera vencida.
Por sua vez o acórdão fundamento (acórdão do TCAN, de 2011.10.12- P.01096/11), em que estava em causa IVA de 2007, entende que, nos impostos que devam ser autoliquidados, como é o caso do IVA, o decurso do prazo previsto na lei para a formação do facto tributário importa o vencimento da obrigação de apresentar a declaração periódica, bem como a obrigação de liquidar o montante devido e enviar o respectivo meio de pagamento, sem qualquer necessidade de interpelação.
Quanto ao mérito da causa parece-nos ser de perfilhar a posição da decisão recorrida, na senda, aliás da jurisprudência da 2ª secção do STA (Acórdão de 29 de Fevereiro de 2012, proferido no recurso nº 0885/11, disponível no sitio da Internet www.dgsi.pt).
Na verdade, com ensina Saldanha Sanches (Manual de Direito Fiscal, pagina 113) há que distinguir entre “...a existência de uma obrigação na forma de uma pretensão fiscal e uma obrigação que atingiu a fase da exigibilidade: o que só acontece depois de ter sido verificado o momento do vencimento dessa obrigação.
Enquanto a obrigação se não encontra vencida aquilo que existe para o sujeito passivo da obrigação tributária é uma mera pretensão fiscal na altura ainda destituída de exigibilidade: o facto legalmente previsto para o nascimento desta pretensão já se verificou mas não decorreu ainda o prazo legalmente previsto ou o facto exigido por lei para que se dê o vencimento desta obrigação”.
Portanto, no caso em análise o vencimento da obrigação apenas se verificou após o decurso do prazo de pagamento voluntário, que terminou em 2012.12.31, data a partir da qual a AT pode exigir o seu pagamento, sendo certo que a sentença que decretou a insolvência é de 2011.11.28 e transitou em julgado em 2012.01.20.
As normas do artigo 180.º/1/6 do CPPT, enquanto normas especiais não foram revogadas pelo CIRE, atento o estatuído no artigo 7.º/3 do CC (neste sentido citado Jorge Lopes de Sousa, III, volume, páginas 321/322).
A norma do artigo 91.º/1 do CIRE tem correspondência, pelo menos parcial, com o conceito civil de crédito vencido constante do artigo 780.º/1 do CC e não é aplicável aos créditos fiscais.
Com efeito, como bem refere a entidade recorrida, a lei fiscal estabelece prazos rígidos quanto às obrigações declarativas e de pagamento, sendo certo que o vencimento dos créditos fiscais por via da declaração de falência permitiria que a Administração Tributária exigisse impostos já liquidados em períodos de tempo inferiores a esses prazos legais, surpreendendo o contribuinte com exigências de que não estava à espera e tomaria quase impossível que aquela AT reclamasse em tempo útil os créditos não liquidados em sede de insolvência, situações que não podem, obviamente, corresponder à intenção do legislador.
Termos em que deve dar-se por não verificada a oposição de acórdãos, e julgar-se findo o recurso quanto à questão da arguição da nulidade da notificação/citação e julgar-se verificada a oposição de acórdãos quanto à questão do momento do vencimento do crédito fiscal, negando-se provimento ao recurso e mantendo-se na ordem jurídica o acórdão recorrido.»

4 – Colhidos os vistos dos Excelentíssimos Juízes Conselheiros Adjuntos, cumpre apreciar em conferência do pleno da secção.

5 – No acórdão recorrido (de fls. 223 e segs.) encontram-se fixados os seguintes factos:
A) Em 19/1/2013 o Serviço de Finanças de Valongo-1 instaurou contra a reclamante o PEF n.º 1899201301003666, por dívidas de coimas e custas do processo de contra - ordenação, constantes da certidão de dívida de fls. 31 e verso, cujo teor aqui se dá por reproduzido, no montante total de €601,50, cuja data limite de pagamento voluntário terminou em 7/1/2013 (fls. 30 a 32 e 57 a 61).
B) Em 22/1/2013 o Serviço de Finanças de Valongo-1 instaurou contra a reclamante o PEF n.º 1899201301003798, por dívidas de IVA do 3.° trimestre de 2010 e juros, constantes das certidões de dívida de fls. 34 a 35 verso, cujo teor aqui se dá por reproduzido, no montante total de €11.6061,80, cuja data limite de pagamento voluntário terminou em 31/12/2012 (fls. 33 a 35 verso e 57 a 61).
C) O PEF referido em B) está apensado ao PEF identificado em A) desde 9/3/2013 (fls. 57 a 61, 107 e 108).
D) No decurso do prosseguimento do PEF 1899201301003666 e apenso, em 26/6/2013 foi solicitada a penhora do veículo com a matrícula ………….. (fls. 56 a 61).
E) Em 4/7/2013 foi registada a penhora do veículo (fls. 56 a 61).
F) A oponente foi citada pessoalmente para o PEF e notificada do registo da penhora em 6/9/2013 (fls. 23, 56 a 61 e petição inicial a fls. 5).
G) A citação / notificação recebida pesa reclamante consta de fls. 23, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
H) A reclamante apresentou a presente reclamação em 16/09/2013 (fls. 29 e 57 a 61).
I) Em 03/10/2013 O órgão de execução fiscal proferiu o despacho previsto no art. 277.º, n.º 2, do CPPT, que consta de fls. 57 a 60, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
J) A reclamante foi julgada insolvente por sentença de 28/11/2011, transitada em julgado em 20/1/2012, proferida no processo n.º 555/11.4 TYVNG, instaurado em 15/6/2011 (fls. 115 a 123).
K) Em assembleia de credores realizada em 1/10/2012 foi aprovado, com o voto contra da Fazenda Nacional, o plano de insolvência da reclamante, que foi homologado por sentença de 29/4/2013 (fls. 47 a 55).
L) No processo de insolvência foi proferido o despacho junto a estes autos a fls. 555, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
M) O veículo com a matrícula ………… não foi apreendido no processo de insolvência (fls. 115 e 128).

5.1 No acórdão fundamento do Tribunal Central Administrativo Norte, processo nº 02508/12 (fls. 402 e segs.) foram dados como provados os seguintes factos:
1. Em 29.12.2009, no Serviço de Finanças (SF) de Gondomar foi instaurado o Processo Executivo n.º 3468200901104608, contra a ora Reclamante M... e R…, com o NIF 1… (fls. 1 e ss.);
2. Referente a dívidas de IRS, do ano de 2005, no montante de 41.263,60 (fls. 1 e ss.);
3. A reclamante foi citada em 29.06.2010 (fls. 24);
4. No âmbito do referido PEF, em 05.03.2010, foi registada na Conservatória do Registo Predial de Gondomar, a penhora do prédio urbano sito na Rua…, inscrito na matriz com o n.º 8… a favor da Fazenda Pública (fls. 8 e ss);
5. Em 22.09.2010, o Chefe do Serviço de Finanças de Gondomar emitiu o seguinte despacho: Nos termos do art. 239.º, do CPPT cite-se os credores com garantia real, os credores conhecidos e desconhecidos e os sucessores dos credores preferentes. Para venda judicial dos bens penhorados, a realizar neste Serviço de Finanças, designo do dia 10 de Dezembro de 2010 pelas 11H00. A venda será feita por meio de propostas em carta fechada, as quais deverão ser apresentadas até àquele dia e hora, altura em que se procederá à sua abertura. Nos termos do art. 250º n.º1 a) do CPPT, fixo o valor base para venda dos bens em €101 440,00, valor resultante da avaliação, devendo o valor a anunciar para venda ser o correspondente a 70% daquele valor. ( ...) (fls., 33);
6. Em 23.09.2010, foi publicitado o respectivo edital (fls. 34);
7. Em 30.06.2010 a Reclamante foi notificada da data da venda do imóvel (fls. 39);
8. Por despacho do OEF de 10.12.2010 foi adiada a data da venda do imóvel (fls. 70);
9. Por despacho do OEF de 09.03.2011 foi novamente adiada a data da venda do imóvel (fls. 77);
10. Em 06.06.2011, foi elaborado o auto de abertura e aceitação de propostas, do qual consta que a proposta de maior valor, no montante de €95.000,00 foi apresentada por A… (fls. 168);
11. Em 21.06.2011 foi emitido o título de adjudicação do imóvel ao adquirente A… (fls. 232);
12. A FP enviou duas notificações ao fiel depositário do imóvel para proceder à entrega das chaves, tendo ambas sido devolvidas (fls. 240 e ss.);
13. Em 04.08.2011, o adquirente A…, apresentou no Serviço de Finanças de Gondomar um requerimento, solicitando a entrega do imóvel (fls. 249);
14. Em 09.08.2011 o Chefe do Serviço de Finanças de Gondomar, proferiu despacho, com o seguinte teor (fls. 252):
Face ao informado, e atenta a alteração verificada com a Lei n.º 55-A/2010, de 31/12, designa-se o dia 8 de Setembro de 2011 pelas 10h30 para proceder à entrega da fracção inscrita na matriz predial urbana n.º 8… da freguesia de …………. (…………), descrito na CRP de Gondomar (…), sita na R…, em ………., nos termos do art. 256.º n.º 2 do CPPT.
Notifique-se o executado/ fiel depositário e a executada da data da diligência, bem como a Requerente para comparecer ou fazer-se representar, no local para entrega do imóvel.
Solicitar ao abrigo do disposto no artigo 256º n.º3 do CPPT, a comparência das autoridades policiais no local e data designada, de molde a ser assegurada a calma e tranquilidade públicas.
15. A reclamante foi notificada do referido despacho em 12.08.2011 (fls. 256 e ss.);
16. A reclamante requereu ao OEF, em 07.09.2011, a revogação daquele despacho (fls. 267 e ss.);
17. Bem como apresentou acção para suspensão da eficácia do acto de venda do imóvel (fls. 274);
18. Em 08.09.2011 a reclamante deduziu RAOEF do despacho de entrega do imóvel (fls. 315 e ss.) 19. O OEF suspendeu a entrega do imóvel (fls. 311)
20. A acção cautelar 1888/11 terminou pela absolvição da FP da instância (fls. 141);
21. A RAOEF com o n.º 2707/11, foi julgada improcedente;
22. Em 11.05.2012 o adquirente requereu ao OEF a entrega do imóvel (fls. 494);
23. Em 24.07.2012 o Chefe do Serviço de Finanças de Gondomar, proferiu despacho, com o teor seguinte (fls. 575):

Face ao informado, e atenta a alteração verificada com a Lei n.º 55-A/2010, de 31/12, designa-se o dia 19/09/2012 pelas 10h30 para proceder à entrega da fracção inscrita na matriz predial urbana n.º 8… da freguesia de …….. (…………), descrito na CRP de Gondomar (…), sita na R…, em …………., nos termos do art. 256.º n.º 2 do CPPT.
Notifique-se o executado/fiel depositário e a executada da data da diligência, bem como a Requerente para comparecer ou fazer-se representar, no local para entrega do imóvel.
Solicitar ao abrigo do disposto no artigo 256° n.º 3 do CPPT, a comparência das autoridades policiais no local e data designada, de molde a ser assegurada a calma e tranquilidade públicas.
24. Deste despacho a reclamante deduziu a presente reclamação (fls. 613).

5.2 Por sua vez no acórdão fundamento do TCA Norte, processo nº 1096/11 de 12.10.2011, (fls. 390 e segs) foram provados os seguintes factos:

a) Por notificação datada de 07/12/2010, foi a reclamante notificada para efectuar o pagamento da quantia 84.060,68€, correspondente à liquidação adicional de I.V.A. e juros compensatórios, H referente ao ano de exercício de 2007 (76.905,32€ de tributo acrescido de 7155,36€ de juros compensatórios);
b) O prazo de pagamento voluntário findou a 15/12/2010;
c) A liquidação exequenda ocorreu em 05/11/2011;
d) Face ao não pagamento, em 21-02-11, foi instaurado o processo executivo n°476201101007777, de que este autos são incidente;
e) Por decisão de 27/03/2009, transitada em julgado em 29/04/2010, proferida pelo 1° Juízo Cível do Tribunal Judicial de Guimarães, no processo n.º 1276/09.3TBBRG, foi declarado o estado de insolvência da ora reclamante;
f) Em 23/04/2010, por decisão proferida no mesmo processo foi homologado, nos termos do disposto no artigo 214.º do C.I.RE., o plano de insolvência aprovado (não havendo noticia que já tenha transitada, pois foi interposto recurso com efeito devolutivo);
g) Em 10/05/2010, foi declarado findo o citado processo de insolvência;
h) A executada em momento posterior à pendência, viu a Administração Tributária reter reembolsos de IVA, num valor total de 200.431,97€;
i) Com data de 19.05.2011, a reclamante requereu, no respectivo Serviço de Finanças, a sustação e apensação ao processo de insolvência dos presentes autos executivos e da requerida suspensão da execução mediante o oferecimento de garantia;
j) Foi proferida decisão, datada de 2 de Junho de 2011 indeferindo tal pretensão;
k) A reclamante é proprietária do prédio urbano, composto de edifício de r/c, andar e logradouro, situado no lugar de … freguesia de …, concelho de Guimarães, descrito na 2ª Conservatória do Registo Predial de Guimarães sob o n.º … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ….
l) Este bem encontra-se onerado com outros ónus e encargos com prioridade de registo - cfr. caderneta predial junta aos autos e que aqui se dá por integralmente reproduzida;

6. Da admissibilidade do recurso de oposição de acórdãos.

O presente recurso vem interposto do acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Norte a 15 de Maio de 2014, exarado a fls. 299/236, por alegada oposição entre aquele aresto e dois acórdãos fundamento, um proferido pelo Tribunal Central Administrativo Norte, datado de 13 de Setembro de 2013, no processo nº 02508/12, quanto à questão da admissibilidade da arguição da nulidade/citação perante o tribunal, no âmbito da reclamação do artigo 276.º do CPPT, sem anterior invocação de tal nulidade perante o órgão de execução fiscal e o outro, também do Tribunal Central Administrativo Norte de 12 de Outubro de 2012, proferido no recurso nº 0196/11, quanto à questão de saber qual o momento do vencimento do crédito para efeitos do estatuído no artigo 180.°/6 do CPPT.

Pese embora em relação à referida primeira questão a recorrente tenha indicado no requerimento de interposição de recurso dois acórdãos fundamento - o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, datado de 13 de Setembro de 2013, no processo nº 02508/12, e o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 02.04.2014, recurso 217/04 - entende-se que se deverá considerar apenas como fundamento do recurso, nesta parte, o Acórdão indicado em primeiro lugar (Neste sentido vide Acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário de 07.03.1990, processo nº 4295, in AP-DR de 30.06.1992, pag. 2548.) (do Tribunal Central Administrativo Norte, datado de 13 de Setembro de 2013, no processo nº 02508/12) quer porque só a ele a recorrente se refere nas alegações sobre a questão de fundo, quer ainda porque, notificada para juntar nota de trânsito em julgado dos acórdãos fundamento, a recorrente apenas juntou certidão do referido Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte.
Por despacho de fls. 307 dos autos, o Exmº Relator veio admitir o recurso, em sede de apreciação preliminar de oposição de julgados, ordenando a notificação das partes para apresentarem alegações, nos termos e no prazo referido no nº 5, do artigo 284º do CPPT.
Não obstante tal despacho, importa reapreciar se a mesma se verifica, pois tal decisão não faz caso julgado e não impede ou desobriga o Tribunal de recurso de proceder à reapreciação da necessária verificação dos pressupostos processuais de admissibilidade, prosseguimento e decisão do recurso, em conformidade com o disposto no actual artigo 641º, n.º 5, do Código de Processo Civil (anterior artº 685º-C, nº 5 do mesmo diploma), podendo, se for caso disso, ser julgado findo o recurso (cf., neste sentido, entre muitos outros, os acórdãos do Pleno desta secção de 07.05.2003, recurso 1149/02, de 18.01.2012, recurso 1030/10, e de 12.12.2012, recurso 932/12.

Por isso, e perante o circunstancialismo fáctico-jurídico supra descrito cumpre apreciar, antes de mais, se se verificam os requisitos do recurso por oposição de acórdãos.

7. Como vem afirmando a jurisprudência deste Supremo Tribunal Administrativo, tendo os autos dado entrada posteriormente a 1 de Janeiro de 2004 é aplicável o regime previsto nos artigos 27.º, alínea b) do ETAF, 284.º do CPPT e 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), pelo que são os seguintes os requisitos de admissibilidade dos recursos por oposição de acórdãos:
- existir contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão invocado como fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito;
- a decisão impugnada não estar em sintonia com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.
No que concerne à caracterização da questão fundamental sobre a qual deve existir contradição de julgados constitui também jurisprudência pacífica do pleno desta secção que se devem adoptar os critérios já assentes no domínio do ETAF de 1984 e da LPTA, para detectar a existência de uma contradição, ou seja:
- identidade da questão de direito sobre que recaíram os acórdãos em confronto, que supõe estar-se perante uma situação de facto substancialmente idêntica; – que não tenha havido alteração substancial na regulamentação jurídica; – que se tenha perfilhado, nos dois arestos, solução oposta; o que pressupõe identidade substancial das situações fácticas, entendida esta não como uma total identidade dos factos mas apenas como a sua subsunção às mesmas normas legais.
- a oposição deverá decorrer de expressa resolução da questão de direito suscitada, não sendo atendível a oposição implícita dos julgados – ver acórdãos do Pleno da Secção de Contencioso Tributário de 18.02.1998, recurso 28637, de 12.03.2003, recurso 35205, de 26.09.2007, recurso 452/07, de 21.05.2008, recurso 460/07, de 06.06.2009, recurso 617/08, e de 13.11.2013, recurso 594/12.

8. No caso vertente a recorrente suscita a oposição de julgados relativamente a duas questões tratadas no acórdão recorrido:
- a primeira refere-se à admissibilidade da arguição da nulidade/citação perante o tribunal, no âmbito da reclamação do artigo 276.º do CPPT, sem anterior invocação de tal nulidade perante o órgão de execução fiscal alegando que, neste segmento, o acórdão recorrido terá julgado tal questão em oposição ao decidido no acórdão fundamento do Tribunal Central Administrativo Norte, processo nº 02508/12 (fls. 402 e segs.)

- a segunda tem a ver com o momento do vencimento do crédito para efeitos do estatuído no artigo 180.°/6 do CPPT e que teria sido julgada em oposição à decisão proferida no acórdão fundamento do TCAN, processo nº 1096/11 de 12.10.2011, (fls. 390 e segs).

Em relação à primeira questão as recorrentes alegam consistir a oposição de julgados no facto de o acórdão recorrido ter sustentado o que a reclamante não pode invocar directamente no tribunal e na reclamação das decisões do órgão da execução fiscal o julgamento da alegada nulidade processual (ilegalidade da notificação da penhora), sem que a tenha requerido anteriormente ao órgão de execução fiscal enquanto que, na tese do acórdão fundamento (Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, processo n.º 02508/12.6BEPRT, de 13.09.2013) “a nulidade de falta de citação pode ser conhecida pelo Tribunal sem que o órgão de execução fiscal sobre ela se tenha pronunciado, se invocada na reclamação prevista no artigo 276.° do CPPT"

No que concerne à segunda questão a recorrente alicerça a oposição de julgados no facto de Acórdão recorrido ter considerado que constituindo-se a relação jurídica com o facto tributário (cfr. art. 36.°, n.° 1, da LGT), a correspondente obrigação tributária só se torna certa com a liquidação e exigível com o conhecimento da mesma, sendo que a liquidação só produz efeitos relativamente ao contribuinte após lhe ter sido validamente notificada, e, com base nesse pressuposto, ter concluído que o crédito exequendo referente a Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) e a dívida de coimas e custas se venceu em momento ulterior ao da declaração de insolvência, pelo que, nada obsta à instauração e prossecução de execução fiscal para cobrança do mesmo.
E alega que este julgamento está em oposição com o decidido no acórdão fundamento (do TCAN, processo nº 1096/11 de 12.10.2011, fls. 390 e segs), no qual se entendeu que estando em causa dívidas relativas a Imposto sobre o Valor Acrescentado o seu vencimento não depende de interpelação e resulta directamente da lei, devendo ser sustada, logo após a instauração, a execução fiscal que for instaurada para cobrança de créditos tributários gerados em data anterior à declaração de insolvência mas que só foram posteriormente liquidados ou reclamados.

Vejamos pois.

9. Da admissibilidade da arguição da nulidade da citação perante o tribunal, no âmbito da reclamação do artigo 276.º do CPPT, sem anterior invocação de tal nulidade perante o órgão de execução fiscal.

O acórdão recorrido confirmou a decisão proferida pelo TAF de Penafiel, que julgou improcedente a reclamação das decisões do órgão da execução fiscal deduzida contra o despacho do Serviço de Finanças de Valongo 1, que ordenou a penhora do veículo com a matrícula …………….
A reclamante, ora recorrente, alegara na sua petição inicial que a notificação que lhe foi dirigida não lhe permitia compreender a natureza e origem da dívida e o valor que lhe era indicado, pelo que se mostrariam violados os normativos dos artigos 37.º/1 do CPPT e 68.º/1/ a)/2 do CPA, que obrigam à comunicação da fundamentação do acto ao notificando.
Sobre tal questão o acórdão recorrido ponderou que, consubstanciando a referida citação/notificação a prática dum ato processual, a sua eventual irregularidade teria de ser invocada perante o órgão de execução fiscal, isto é, a reclamante teria de invocar a nulidade do ato ao órgão de execução fiscal (art. 191º. n.º2, e 195.º n.° 1, do CPC e 2º, alínea e), do CPPT) e dessa decisão caberia então a respectiva reclamação de decisão do órgão da execução fiscal , nos termos dos arts. 276.º e seguintes do CPPT.
Consignou-se também no acórdão recorrido que o tribunal não podia apreciar e julgar uma nulidade processual, sem que ela tivesse sido invocada e decidida, em momento anterior, pelo órgão de execução fiscal. E que só da decisão que indeferisse a invocada nulidade é que o interessado podia reclamar.
No prosseguimento de tal discurso argumentativo o Acórdão ponderou também que, no caso em apreço, a reclamante não invocara perante o órgão de execução fiscal a alegada nulidade processual da citação/notificação, pelo que não podia invocar directamente no tribunal e naquela reclamação o julgamento dessa alegada nulidade processual, sem que o tivesse requerido anteriormente ao órgão de execução fiscal.
Para concluir, confirmando o julgado recorrido, no sentido de que a irregularidade/nulidade da notificação da penhora, consubstanciando a prática de um acto processual reconduzido à sua nulidade, aduzida directamente perante o Tribunal Tributário de 1ª instância não é compatível com o meio processual utilizado, porquanto, atenta a natureza judicial do processo de execução fiscal e o carácter incidental das nulidades que ali ocorram, se impõe que as nulidades de que o mesmo enferme sejam nele invocadas e apreciadas, cumprindo ao requerente submeter o requerimento de arguição de nulidades em análise ao OEF em causa e só na eventualidade de indeferimento deste sendo, então, possível o recurso à via judicial para apreciação da legalidade desse preciso acto de indeferimento.

Já no acórdão fundamento, também do Tribunal Central Administrativo Norte (processo 02508/12) estava em causa, entre outras, a questão da falta de citação da reclamante, nos termos do disposto no artigo 188.º/1 do CPC, mais precisamente notificações ao fiel depositário que foram devolvidas e que não chegaram ao conhecimento deste (artigo 188.°/ e) do CPC).

E sobre tal questão, ponderou o acórdão fundamento que a falta de citação é uma nulidade insanável quando possa prejudicar a defesa do executado – artigo 165.º, n.º 1, alínea a) do CPPT, e é do conhecimento oficioso, podendo ser arguida até ao trânsito em julgado da decisão final.
Mais se consignou no acórdão fundamento que a sentença recorrida havia confundido a falta de citação com a nulidade da citação, figuras distintas, com prazos de arguição diferentes. E que a primeira pode ser arguida até ao trânsito em julgado da sentença, e que a segunda dentro do prazo de oposição. E para além disso, que a primeira é do conhecimento oficioso, enquanto que a segunda só é conhecida pelo Tribunal caso seja arguida pelo interessado.
Para concluir que a nulidade de falta de citação pode ser conhecida pelo Tribunal sem que o órgão de execução fiscal sobre ela se tenha pronunciado, se invocada na reclamação prevista no artigo 276.º do CPPT do acto que determinou a entrega do imóvel vendido no processo de execução.

Em suma a tese do acórdão fundamento tem como pressuposto a ocorrência de uma falta de citação, nulidade insanável, invocável a todo o tempo, nos termos do estatuído no artigo 165.º/1/ a)/4 do CPPT.

Constata-se assim que o acórdão recorrido e o acórdão fundamento se fundaram em pressupostos factuais bem distintos, sendo também diversas as questões jurídicas de fundo objecto dos acórdãos em confronto.
Com efeito, no caso vertente, não estava em causa, nem fora alegada qualquer falta de citação. A reclamante alegara na sua petição inicial que a notificação que lhe fora dirigida não lhe permitia compreender a natureza e origem da dívida e o valor que lhe era indicado, pelo que se mostrariam violados os normativos dos artigos 37.º/l do CPPT e 68.º/l/ a)/2 do CPA, que obrigam à comunicação da fundamentação do acto ao notificando. E pedia que tal notificação fosse substituída por outra em que se identificasse convenientemente, a origem dos valores em dívida.
Trata-se, assim, de uma situação reconduzível a mera nulidade, nos termos do disposto no artigo 191.º do CPC.
Ora no acórdão fundamento a reclamante invocou a falta de citação para questionar a legalidade do despacho que determinou a entrega do imóvel.
Esta factualidade foi determinante para que no acórdão fundamento se chegasse à conclusão de que, sendo a falta de citação do conhecimento oficioso, deve ser conhecida independentemente de arguição e pode ser conhecida pelo Tribunal sem que o órgão de execução fiscal sobre ela se tenha pronunciado, se invocada na reclamação prevista no artigo 276.º do CPPT.

Do exposto se pode concluir que, no que concerne à questão da admissibilidade da arguição da nulidade da citação perante o tribunal, no âmbito da reclamação do artigo 276.º do CPPT, sem anterior invocação de tal nulidade perante o órgão de execução fiscal) não se verifica uma verdadeira oposição de decisões expressas, já que a questão jurídica decidida no acórdão fundamento e a respectiva ratio decidendi não têm qualquer identidade com o problema considerado nos presentes autos, sendo que a divergente solução jurídica a que chegaram os arestos em confronto assenta nessa falta de identidade.
Concluiu-se assim que não se verificam os requisitos do recurso com fundamento em oposição de acórdãos, pelo que o presente recurso deve, nesta parte, ser julgado findo nos termos do artº 284º, nº 5 do Código de Procedimento e Processo Tributário.



10. Do momento do vencimento do crédito tributário para efeitos do estatuído no artigo 180.°/6 do CPPT.
Vejamos agora se, em relação a esta questão, se verifica também o primeiro dos pressupostos do recurso com fundamento em oposição de acórdãos: contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito.

De harmonia com o disposto no n.º 1 do art. 180.° do CPPT, «proferido o despacho judicial de prosseguimento da acção de recuperação da empresa ou declarada falência, serão sustados os processos de execução fiscal que se encontrem pendentes e todos os que de novo vierem a ser instaurados contra a mesma empresa, logo após a sua instauração».
Esta disposição não se aplica, porém, «aos créditos vencidos após a declaração de falência ou despacho de prosseguimento da acção de recuperação da empresa» que, nos termos do disposto no n.º 6 do mesmo art. 180.°, «seguirão os termos normais até à extinção da execução».
No caso em apreço, perante a questão de saber qual o momento em que se devem ter por vencidas as dívidas exequendas, relevante para determinação da aplicação daquele nº 6 do artº 180º, o acórdão recorrido, sufragando a jurisprudência deste Supremo Tribunal Administrativo (ac. 885/11 de 29.02.2012) concluiu que, pese embora a relação jurídica tributária se constitua com o facto tributário (cfr. art. 36.°, n.º 1, da LGT), a correspondente obrigação tributária só se torna certa com a liquidação e exigível com o conhecimento da mesma, sendo que a liquidação só produz efeitos relativamente ao contribuinte após lhe ter sido validamente notificada (cfr. art. 77.°, n.º 6, da LGT e art. 36.°, n.º 1, do CPPT).
Com base neste pressuposto, e ponderando que resulta do probatório que em 19.01.2013 foi instaurado o PEF (processo de execução fiscal) n° 1899201301003666 para cobrança coerciva de coimas e custas de processo de contra ordenação, cuja data limite de pagamento voluntário ocorreu em 07.01.2013, na quantia de € 601,50 e que em 22.01.2013 foi instaurado o PEF (processo de execução fiscal) n° 1899201301003798 para cobrança coerciva de dívidas de IVA do 3º trimestre de 2010 e juros, cuja data limite de pagamento voluntário ocorreu em 31.12.2012, na quantia de € 11.606,80, apensos e dos quais foi citada a reclamante em 06.09.2013, o acórdão recorrido considerou que o vencimento da obrigação de cumprir, de efectuar a prestação pecuniária correspondente ao montante do imposto só se deu após a liquidação do imposto e depois do sujeito passivo ser notificado desse acto e bem assim após a aplicação da coima, ou seja, em 31.12.2012 e 07.01.2013, respectivamente.
E, no prosseguimento deste discurso argumentativo concluiu que os créditos exequendos se venceram em momento ulterior ao da declaração de insolvência, pelo que, nada obstava à instauração e prossecução de execução fiscal para cobrança do mesmo.


Por sua vez no acórdão fundamento do TCAN (01096/11), estando em causa dívidas de IVA do exercício de 2007, resultantes de liquidação adicional notificada em 07.12.2010, e perante a mesma questão de saber se os créditos em execução se venceram em data posterior à declaração de insolvência, não lhes sendo, por isso, aplicáveis os nºs 1 a 5 do artigo 180.º do C.P.P.T., mas sim o seu n.º 6, entendeu-se que nos impostos que devam ser autoliquidados, como é o caso do IVA, o decurso do prazo previsto na lei para a formação do facto tributário importa o vencimento da obrigação de apresentar a declaração periódica, bem como a obrigação de liquidar o montante devido e enviar o respectivo meio de pagamento, sem qualquer necessidade de interpelação.

Em síntese perante a questão de saber qual o momento em que se devem ter por vencidas as dívidas exequendas, para efeito de aplicação do nº 6 do artº 180º, do CPPT, e estando em causa dívidas tributárias de idêntica natureza, ambos os acórdãos interpretam de forma diferente o conceito de vencimento da obrigação tributária em causa, pelo que se verifica, quanto a esta questão, o apontado conflito de jurisprudência.

11. E verifica-se também, em relação à questão suscitada, o segundo requisito do recurso por oposição de acórdãos pois, em rigor, não se pode afirmar que o acórdão recorrido está em sintonia com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.
Com efeito, este Supremo Tribunal tem entendido – cfr., entre outros, os acórdãos do Pleno da Secção de Contencioso Tributário, de 19/9/2012, proferido no rec. nº 1075/11, de 15.10.2014, recurso 1463/13 e de 25.02.2015, recurso 965/14, todos in www.dgsi.pt – que a existência de uma jurisprudência consolidada deve transparecer ou do facto de a pronúncia respectiva constar de acórdão do Pleno assumido pela generalidade dos Conselheiros em exercício na Secção (consoante prevê o nº 2 do art. 17º do actual ETAF) ou do facto de existir uma sequência ininterrupta de várias decisões no mesmo sentido, obtidas por unanimidade em todas as formações da Secção.
Ora, pese embora o acórdão recorrido, tenha adoptado, quanto à aludida questão de saber qual o momento do vencimento do crédito tributário para efeitos do estatuído no artigo 180.°/6 do CPPT, a posição já acolhida pela jurisprudência deste Secção de Contencioso Tributário, não se pode concluir que se trata de jurisprudência consolidada uma vez que sobre a questão ainda não se pronunciaram todas as formações da secção, nem foi proferido qualquer acórdão do Pleno assumido pela generalidade dos Conselheiros actualmente em exercício.
Estão, assim reunidos todos os requisitos do recurso com fundamento em oposição de acórdãos.

12. Do mérito do recurso
Deste modo, verificada a oposição, cumpre decidir a questão objecto do recurso que, tal como a recorrente a configura nas suas alegações, é a de saber qual o momento do vencimento do crédito tributário para efeitos do estatuído no artigo 180.°/6 do CPPT, em ordem a aferir se os créditos dos presentes autos se venceram antes ou depois da declaração de insolvência.

Alega a recorrente que deverá vingar o entendimento expresso no acórdão fundamento, segundo o qual relativamente aos tributos que, como o I.V.A., devam ser autoliquidados, o decurso do prazo importa não apenas o vencimento da obrigação de apresentar a declaração periódica, como a obrigação de liquidar o montante devido e enviar o respectivo meio de pagamento, sem qualquer necessidade de interpelação.

Argumenta ainda, na senda de tal jurisprudência, que o legislador utilizou o termo «créditos vencidos» no artigo 180°, n.º 6, do C.P.P.T., não para remeter para um conceito tributário (que não existe) ou tão pouco para um conceito civil (que não se lhe acomoda), mas para remeter para a legislação das falências.
Ou seja: «créditos vencidos após a declaração de falência» para efeitos deste dispositivo legal são aqueles que, à luz da lei falimentar, só venham a vencer-se após a declaração de falência.
E assim invoca o artigo 91°, n.º 1, do C.I.R.E do qual resulta todas as obrigações da insolvente geradas em data anterior à declaração de insolvência e não subordinadas a condição suspensiva se consideram vencidas nesta data.
No prosseguimento deste discurso argumentativo conclui que «créditos (tributários) vencidos após a declaração de falência» para os efeitos do artigo 180.°, n.º 6, do C.P.P.T. serão apenas aqueles que forem relativos a factos tributários cuja formação transponha a data de declaração de insolvência e que à luz desta distinção, a dívida exequenda é uma dívida da insolvência, para os efeitos do C.I.R.E., visto que tem a sua génese em factos anteriores à data da declaração de insolvência, pelo que o crédito respectivo não é um crédito vencido após a declaração de falência para os efeitos do artigo 180°, n.º 6, do C.P.P.T.

A nosso ver carece de razão.
Com efeito entendemos, em sintonia com o que vem sendo dito pela jurisprudência desta secção, que as obrigações tributárias se vencem no termo do prazo legal para pagamento voluntário, à semelhança do que sucede com as obrigações jurídicas em geral que só podem ser objecto de acção executiva quando sejam certas e exigíveis.
Vejamos.
Este Supremo Tribunal Administrativo já se pronunciou por duas vezes sobre questão similar à ora suscitada.
E sempre em sentido contrário à tese que a recorrente vem sustentar.
Assim a propósito esclarece o Acórdão desta Secção de 29.02.2012, proferido no recurso 885/11 que a dívida tributária se vence «no momento em que o credor adquire o direito de exigir o seu pagamento ao devedor e esse momento, no caso sub judice, não é outro senão aquele a que se refere o termo final do prazo para o pagamento voluntário, prazo que, na ausência de lei em contrário, se inicia com a notificação ao contribuinte para pagamento (cf. art. 85.º, n.ºs 1 e 2, do CPPT). Na verdade, sendo certo que a relação jurídica tributária se constitui com o facto tributário (cfr. art. 36.º, n.º 1, da LGT), a correspondente obrigação tributária só se torna certa com a liquidação e exigível com o conhecimento da mesma, sendo que a liquidação só produz efeitos relativamente ao contribuinte após lhe ter sido validamente notificada (cfr. art. 77.º, n.º 6, da LGT e art. 36.º, n.º 1, do CPPT).» -
Também no Acórdão 903/14 de 04.03.2015, retomando tal jurisprudência se sublinhou que as obrigações tributárias se vencem no termo do prazo legal para pagamento voluntário, à semelhança do que sucede com as obrigações jurídicas em geral que só podem ser objecto de acção executiva quando sejam certas e exigíveis.
Não se vê razão para alterar tal jurisprudência, que merece a nossa concordância, cuja fundamentação jurídica subscrevemos e consideramos que tem plena aplicação no caso vertente.
Como se exarou no já referido Acórdão de 29.02.2012 (885/11), a propósito da questão de saber em que data se vence uma dívida tributária, e recordando o ensinamento de SALDANHA SANCHES (Manual de Direito Fiscal, 3.ª edição, Coimbra Editora, pág. 255, "importa distinguir «entre a existência de uma obrigação na forma de uma mera pretensão fiscal e uma obrigação que atingiu a fase da exigibilidade», sendo que esta só ocorre «depois de se ter verificado o momento de vencimento dessa mesma obrigação»; ou seja, «[e]nquanto a obrigação se não encontra vencida, aquilo que existe para o sujeito activo da obrigação tributária é uma mera pretensão fiscal – na altura, ainda destituída de exigibilidade. O facto legalmente previsto para o nascimento dessa pretensão já se verificou, mas não decorreu ainda o prazo legalmente previsto ou o facto exigido por lei para que se dê o vencimento desta obrigação".

É certo que a recorrente, argumenta, na senda da tese acolhida no acórdão fundamento, que esta distinção já não faz sentido relativamente aos tributos que, como o I.V.A., devam ser autoliquidados. Nestes casos, acrescenta, o decurso do prazo importa não apenas o vencimento da obrigação de apresentar a declaração periódica, como a obrigação de liquidar o montante devido e enviar o respectivo meio de pagamento, sem qualquer necessidade de interpelação.

Mas nem sempre será assim, como não é, no caso subjudice.
Se o contribuinte não apresentar pontualmente a sua declaração de IVA ou nela não proceder à autoliquidação haverá, necessariamente, lugar a uma liquidação administrativa, que terá de ser notificada ao contribuinte e que define a nova data de vencimento da obrigação (Vide, neste sentido, Rui Duarte Morais, A Execução fiscal, 2ª edição, Almedina, pag. 34..)
In casu resulta do exame da factualidade provada e nomeadamente de fls. 34 a 36 v., que a liquidação da dívida de IVA referente ao terceiro trimestre de 2010, e que deu origem ao processo de execução fiscal n.º 1899201301003798, foi posterior à declaração de insolvência da sociedade recorrente, proferida em 28.11.2011, sendo que a data limite de pagamento voluntário de tal obrigação tributária ocorreu em 31.12.2012.
Por outro lado dúvidas não há de que a data limite de pagamento voluntário das dívidas de coimas e custas do processo de contra - ordenação, constantes da certidão de dívida de fls. 31 e verso que deu origem ao PEF n.º 1899201301003666, terminou em 7/1/2013 (fls. 30 a 32 e 57 a 61), ou seja, também em data posterior à declaração de insolvência da sociedade recorrente.
Neste contexto, considerando que a dívida tributária se vence no momento em que o credor adquire o direito de exigir o seu pagamento ao devedor e esse momento, no caso sub judice, se refere o termo final do prazo para o pagamento voluntário, ou seja 7.01.2013 (para a dívida de coimas) e 31.12.2012 (para a dívida de IVA), forçoso é concluir que bem andou o acórdão recorrido ao julgar que os créditos exequendos se venceram em momento ulterior ao da declaração de insolvência.


Acresce referir que não impressiona também a argumentação de que o legislador utilizou o termo «créditos vencidos» no artigo 180°, n.º 6, do C.P.P.T., para remeter para a legislação das falências.
À luz desta tese os «créditos vencidos após a declaração de falência» para efeitos deste dispositivo legal seriam aqueles que, à luz da lei falimentar, só viessem a vencer-se após a declaração de falência
Na verdade as normas dos nºs. 1 e 6 do artº 180º do CPPT constituem normas especiais que regulam os efeitos do processo de recuperação de empresa e de falência no processo de execução fiscal e que não foram revogadas pelo CIRE.
Como refere Jorge Lopes de Sousa, no seu Código de Procedimento e Processo Tributário, Áreas Edit., 6ª edição, Volume III, pag. 321, este art. 180.º foi mantido no CPPT, apesar da sua revisão operada já depois da publicação do CIRE, pelo que é de concluir que se pretendeu manter este regime processual das execuções fiscais, fazendo corresponder ao processo de insolvência as referências aos processos de recuperação de empresa e falência.
Ora constituindo o artº 180º, nº 6 do CPPT norma que estabelece um regime processual específico para as execuções fiscais, que não foi revogado pelo CIRE (Vide, neste sentido, Lopes de Sousa, ob. citada, pag. 323, e os Acórdãos desta Secção de 06.04.2011, recurso 981/10, de 14.04.2010, recurso 51/10, ambos in www.dgsi.pt.), seria certamente ilógico e contraditório que a sua interpretação e a interpretação do conceito de "créditos vencidos" fosse feita à luz do CIRE, nomeadamente do seu artº 91º, nº 1 (que estabelece que a declaração de insolvência determina o vencimento de todas as obrigações do insolvente não subordinadas a uma condição suspensiva).
Acresce por outro lado, como bem notam a entidade recorrida e Ministério Público neste Supremo Tribunal Administrativo, a lei fiscal estabelece prazos rígidos quanto às obrigações declarativas e de pagamento, sendo que o vencimento dos créditos fiscais por via da declaração de falência permitiria que a Administração Tributária exigisse impostos já liquidados em períodos de tempo inferiores a esses prazos legais, surpreendendo o contribuinte com exigências de que não estava à espera e tomaria quase impossível que aquela AT reclamasse em tempo útil os créditos não liquidados em sede de insolvência, situações que não podem, obviamente, corresponder à intenção do legislador.

Em face de tudo o exposto haveremos de concluir é de manter o entendimento sufragado no acórdão recorrido no sentido de que as obrigações tributárias se vencem no termo do prazo legal para pagamento voluntário, e que, no caso subjudice, os créditos exequendos se venceram em momento ulterior ao da declaração de insolvência.

Neste contexto, o acórdão recorrido, que assim decidiu, não merece censura e deve ser confirmado.

13. Termos em que acordam os Juízes do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em julgar não verificada a oposição de acórdãos, e consequentemente julgar findo o recurso quanto à questão da arguição da nulidade da notificação/citação e julgar verificada a oposição de acórdãos quanto à questão de determinação do momento do vencimento do crédito fiscal, negando provimento ao recurso.


Custas pela recorrente

Lisboa, 15 de Abril de 2015. - Pedro Manuel Dias Delgado (relator) – Ana Paula da Fonseca Lobo – José Maria da Fonseca Carvalho – Dulce Manuel da Conceição Neto – Joaquim Casimiro Gonçalves – Isabel Cristina Mota Marques da Silva – José da Ascensão Nunes Lopes – Francisco António Pedrosa de Areal Rothes.