Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0672/12.3BECBR
Data do Acordão:05/21/2020
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:CARLOS CARVALHO
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
APRECIAÇÃO PRELIMINAR
DEMOLIÇÃO
ALTERAÇÃO
PLANO DIRECTOR MUNICIPAL
NÃO ADMISSÃO DO RECURSO
Sumário:Não é de admitir o recurso excecional de revista de acórdão do TCA que, relativamente a um pedido de licenciamento de obras ilegais, segue o entendimento doutrinal e jurisprudencialmente uniforme.
Nº Convencional:JSTA000P25960
Nº do Documento:SA1202005210672/12
Data de Entrada:03/17/2020
Recorrente:A....................
Recorrido 1:MUNICÍPIO DE MIRANDA DO CORVO
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em apreciação preliminar, na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:

1. A…………, invocando o disposto no art. 150.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos [CPTA], peticiona a admissão do recurso de revista por si interposto do acórdão de 13.12.2019 do Tribunal Central Administrativo Norte [doravante TCA/N] [cfr. fls. 615/634 - paginação «SITAF» tal como as ulteriores referências à mesma, salvo expressa indicação em contrário], que negou provimento ao recurso de apelação pelo mesmo deduzido e que manteve a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra [doravante TAF/C] [cfr. fls. 474/492], que havia julgado improcedente a ação administrativa por si instaurada contra o Município de Miranda do Corvo e na qual peticionava a anulação da deliberação camarária de 02.08.2012, que ordenou a demolição, no prazo de 90 dias, de um anexo da sua casa de habitação que o mesmo destina a garagem e arrumo de alfaias agrícolas e de um o trator que usa na exploração agrícola.

2. Motiva a admissão do recurso de revista [cfr. fls. 646/663] na necessidade de uma melhor aplicação do direito fundada na ocorrência de erro de julgamento que acomete ao acórdão recorrido, já que proferido com errada interpretação e aplicação do disposto nos arts. 05.º do CPA/91 [atual art. 07.º do CPA vigente], 106.º do RJUE, e 18.º da CRP e dos princípios da proporcionalidade e do tempus regit actum.

3. O R. produziu contra-alegações em sede de recurso de revista [cfr. fls. 680/688] nas quais pugna, desde logo, pela não admissão da presente revista.
Apreciando:

4. Dispõe-se no n.º 1 do art. 150.º do CPTA que «[d]as decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excecionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito».

5. Do referido preceito extrai-se, assim, que as decisões proferidas pelos TCA’s no uso dos poderes conferidos pelo art. 149.º do CPTA, conhecendo em segundo grau de jurisdição, não são, em regra, suscetíveis de recurso ordinário, dado a sua admissibilidade apenas poder ter lugar quando: i) esteja em causa apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, revista de importância fundamental; ou, ii) o recurso revelar ser claramente necessário para uma melhor aplicação do direito.

6. O TAF/C julgou improcedente a pretensão deduzida na ação administrativa sub specie pelo A., aqui recorrente, por entender que o ato impugnado não enfermava das ilegalidades que aquele lhe havia assacado, explicitando-se na motivação da mesma, no que ora importa nesta sede e para efeitos de análise do juízo de improcedência nela proferido quanto à ilegalidade relativa à desproporção da ordem de demolição impugnada face à alegada existência in casu de uma possibilidade de legalização do edificado, que «as diligências tendentes à viabilidade atual da legalização do anexo, que os autos documentam e que na matéria de facto provada se recolheu em atenção ao ponto de vista do Autor, destinavam-se à obtenção dos pressupostos de uma eventual inutilidade superveniente da lide em consequência de uma revogação administrativa da dita ordem, aberto que estivesse o caminho a uma legalização do edificado: não a uma sindicância da bondade dos pressupostos do ato impugnado» já que presente o princípio tempus regit actum e atento «o “bloco de legalidade” vigente no momento de decidir e a atitude do dono da obra, a mesma é insuscetível de ser legalizada» pelo que de nada valia ao A. «obter pareceres favoráveis e de outras entidades, também necessários ao licenciamento, se um dos cumulativamente exigidos para a aprovação do “projeto” de arquitetura - implantação incluída – estava à partida prejudicado» [cfr. 474/492].

7. O TCA/N confirmou inteiramente este juízo, negando provimento ao recurso quanto aos erros de julgamento que lhe eram assacados.

8. A alegação expendida pelo Recorrente não se mostra persuasiva, tudo apontando no sentido de que as instâncias decidiram com pleno acerto, tanto mais que se mostram assentes em fundamentação jurídica que se apresenta como plausível e razoável e consonante com a jurisprudência produzida sobre a temática, o que vale por dizer que, não lhe sendo assacado erro grosseiro ou palmar, a admissão do recurso não é necessária para uma melhor aplicação do direito.

9. Tal como vem afirmado por este Formação de Admissão Preliminar, em situações algo similares às que estão em discussão nos autos sub specie, mormente no acórdão de 31.03.2016 [Proc. n.º 0233/16], não se justifica admitir o recurso de revista excecional, nomeadamente por efeito e relevância de um novo PDM que permita a legalização da construção, quando a questão «foi apreciada pelas decisões da 1.ª e 2.ª instância de acordo com o entendimento deste STA, segundo o qual, a validade dos atos administrativos afere-se em função da lei vigente na data em que foram proferidos», não tendo razão de ser a admissão da revista quando não é «possível à luz do direito aplicável na data do ato que ordenou a demolição, a legalização da construção» e que a «alteração do quadro legal, entretanto ocorrida com a entrada em vigor do novo PDM … também não justifica a admissão da revista, uma vez que, de acordo com a jurisprudência deste STA, é à Administração que deve, em primeira linha, aferir se a realidade factual e o novo PDM permite, ou não a legalização da obra».

10. E no acórdão também desta mesma Formação de 11.11.2015 [Proc. n.º 01196/15] o recurso de revista não foi igualmente admitido, tendo-se afirmado, então, que «a questão jurídica (entrada em vigor de novo PDM que permita a legalização) apesar de poder vir a colocar-se em situações futuras - sempre que a Lei Nova venha alterar o quadro jurídico aplicável à situação subjacente à relação jurídica processual - foi decidida de acordo com a jurisprudência deste Supremo Tribunal, apreciando a validade do ato impugnado de acordo com a lei vigente na data em que foi proferido (citando vários acórdãos nesse sentido) e remetendo a aplicação da lei nova, em primeira linha, para a Administração, citando neste ponto o acórdão deste STA de 7.4.2011, proferido no processo 0601/10. Este entendimento mostra-se bem fundamentado, é juridicamente plausível e segue orientação deste Supremo Tribunal, pelo não se justifica nova intervenção, designadamente, com vista a uma melhor interpretação e aplicação do Direito» e que «nada obsta a que o recorrente formule nova pretensão de legalização da construção, tendo em conta a nova Lei, a partir do momento da sua entrada em vigor» [cfr. vide, nomeadamente, ainda os Acs. de 20.11.2014 - Proc. n.º 01166/14, e de 30.11.2017 - Proc. n.º 01309/17].

11. Daí que, pelas mesmas razões, a questão colocada neste recurso não se revista de importância jurídica ou social para justificar a admissão do recurso de revista, nem se justifique a intervenção do STA com vista a uma melhor aplicação do direito, impondo-se in casu a valia da regra da excecionalidade supra enunciada.


DECISÃO

Nestes termos e de harmonia com o disposto no art. 150.º do CPTA, acordam os juízes da formação de apreciação preliminar da Secção de Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal em não admitir a revista.

Custas a cargo do A./Recorrente. D.N..

Lisboa, 21 de maio de 2020. - Carlos Carvalho (relator) - Madeira dos Santos -Teresa de Sousa.