Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01143/18.0BELSB
Data do Acordão:02/11/2019
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:SÃO PEDRO
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
ASILO
PROTECÇÃO
Sumário:Deve admitir-se revista relativamente à questão de saber se o art. 17º da Lei do Asilo é aplicável às situações em que, face às declarações do interessado, se conclui que a retensão é infundada.
Nº Convencional:JSTA000P24204
Nº do Documento:SA12019021101143/18
Data de Entrada:02/01/2019
Recorrente:A.... E OUTROS
Recorrido 1:MINISTÉRIO DA ADMINISTRAÇÃO INTERNA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Formação de Apreciação Preliminar – art. 150º, 1, do CPTA.

Acordam no Supremo Tribunal Administrativo (art. 150º, 1 do CPTA)

1. Relatório

1.1. A………………….., B……………….. e C……………….., identificados nos autos, recorreram para este Supremo Tribunal Administrativo, nos termos do art. 150º, 1, do CPTA, do acórdão do TCA Sul, proferido em 22 de Novembro de 2018, que revogou a sentença proferida pelo TAC de Lisboa e, consequentemente, julgou improcedente a ACÇÃO ADMINISTRATIVA através da qual os autores impugnaram a deliberação do DIRECTOR NACIONAL DO SERVIÇO DE ESTRANGEIROS E FRONTEIRAS, que considerou infundado o pedido de protecção internacional.

1.2. Fundamenta a admissibilidade da revista por estar em causa a apreciação das formalidades essenciais do procedimento administrativo, mais concretamente o direito de audiência dos interessados.

1.3. A entidade recorrida – Ministério da Administração Interna – afirma não vê no caso concreto fundamento para admissão da revista.

2. Matéria de facto

Os factos dados como provados são os constantes do acórdão recorrido para onde se remete.

3. Matéria de Direito

3.1. O artigo 150.º, n.º 1, do CPTA prevê que das decisões proferidas em 2ª instância pelo Tribunal Central Administrativo possa haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo «quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental» ou «quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito». Como decorre do próprio texto legal e a jurisprudência deste STA, tem repetidamente sublinhado trata-se de um recurso excepcional, como de resto o legislador cuidou de sublinhar na Exposição de Motivos das Propostas de Lei nºs 92/VIII e 93/VIII, considerando-o como uma «válvula de segurança do sistema», que só deve ter lugar, naqueles precisos termos.

3.2. A primeira instância anulou a deliberação impugnada por violação do art. 17º da Lei 27/2008, de 30 de Junho, com a seguinte argumentação.

“(…)

Resulta pois do facto supra, que ao autor não lhe foi dada a possibilidade de se pronunciar sobre o relatório previsto no n.º1 do artigo 17.º da Lei do Asilo. Efetivamente, a este apenas lhe foi dada a possibilidade de se pronunciar sobre as declarações que o mesmo havia prestado e não sobre a apreciação que o SEF viria a fazer sobre as mesmas. Conforme resulta do facto dado como provado em I) do probatório, o SEF em 14/05/2018 elaborou a informação n.º 745/GAR/2018, da qual constava já proposta de decisão que viria a ser seguida na decisão final proferida pelo Diretor Nacional do SEF na mesma data (Cfr. al. J) do probatório).

Foi já da decisão final que o autor viria a ser notificado através de carta registada em 23/05/2018 (Cfr. al. K) dos factos provados). Deste modo, resulta pois da factualidade provada, que ao autor não foi dada a possibilidade de o mesmo exercer o direito de audiência prévia relativamente à informação/relatório que viria a conduzir à decisão final objeto de impugnação nos autos, nomeadamente, do enquadramento da factualidade pelo mesmo relatada na previsão do artigo 19.º, n.º1, al. e) da Lei do Asilo e inerente tramitação acelerada.

(…)”.

3.3. O TCA Sul revogou a decisão da primeira instância, por entender, em suma, que no presente caso não era necessário cumprir o art. 17º, 1, da Lei do Asilo, porquanto “não tendo (o procedimento) passado para a fase de instrução em virtude de ser infundado, de acordo com os requisitos do art. 19º, da Lei 26/2014, de 5 de Maio”.

3.4. Os recorrentes, cidadãos Angolanos, impugnaram a decisão que indeferiu a sua pretensão (proteção internacional – asilo ou autorização de residência por razões humanitárias) com fundamento do caso não ser elegível para protecção subsidiária uma vez que nas declarações prestadas “não indicou qualquer ato persecutório ou ameaças que configurem terem existido sistemáticas violações dos direitos humanos ou de se encontrar em risco de sofrer ofensa grave”. Deste modo e com fundamento no disposto na al. e) do n.º 1 do art. 19º da Lei 27/2008, de 30/6, o pedido foi considerado infundado.

3.5. A questão que se coloca é a de saber se, neste caso e outros similares, deve ou não ser dado cumprimento ao disposto no art.17º da referida Lei do Asilo. A nosso ver a questão merece ser reapreciada neste STA. Na verdade, para além de não haver convergência nas decisões judiciais, está em causa uma questão suscetível de vir a colocar-se no futuro, ou seja, em todos os casos em que, face às declarações do interessado, a entidade competente entenda que a pretensão é infundada.

Deste modo e com vista a uma interpretação e aplicação uniforme do direito deve ser admitida a revista.

4. Decisão

Face ao exposto admite-se a revista.

Porto, 11 de Fevereiro de 2019. – São Pedro (relator) – Costa Reis – Madeira dos Santos.