Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01307/16
Data do Acordão:01/11/2017
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ISABEL MARQUES DA SILVA
Descritores:NULIDADE DE SENTENÇA
OMISSÃO DE PRONÚNCIA
CONVOLAÇÃO
PEDIDO SUBSIDIÁRIO
Sumário:I - É nula, por omissão de pronúncia, a sentença que deixe de apreciar questões que deva conhecer excepto aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras (artigos 125.º, n.º 1 do Código do Procedimento e do Processo Tributário e 668.º, n.º 1, alínea d) e 660.º n.º 2 do Código de Processo Civil).
II - Sendo o acto reclamado o acto de indeferimento do pedido de levantamento/cancelamento das penhoras efectuadas pela Fazenda Pública - que não as próprias penhoras –, a apreciação do mérito da reclamação pressupõe a imputação pelo reclamante ao acto reclamado de vícios próprios deste, o que, não tendo sucedido, determina a necessária improcedência da reclamação.
Nº Convencional:JSTA000P21285
Nº do Documento:SA22017011101307
Data de Entrada:11/21/2016
Recorrente:A..., LDA
Recorrido 1:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- Relatório-
1 – A………………………., LDA, com os sinais dos autos, recorre para este Supremo Tribunal da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra de 23 de Setembro de 2016, que julgou improcedente a reclamação judicial por si deduzida contra o indeferimento do pedido de levantamento das penhoras ordenadas no âmbito do processo de execução fiscal n.º 1562201001053671, para o que apresentou as seguintes conclusões:
A. Vem a Recorrente interpor Recurso da Sentença proferida em 23 de setembro de 2016, por com a mesma não concordar.
B. Tal Sentença, passível de ser sindicada, deve ser revogada de modo a considerar-se totalmente procedente a Reclamação da Decisão do órgão da Execução Fiscal apresentado pela Recorrente.
C. A sentença de que ora se recorre é nula, já que, da mesma, não consta a pronúncia quanto aos factos alegados, imposta pelo artigo 607.º, n.º 4 do CPC e determinada pelo artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do CPC, ambos aplicáveis ex vi artigo 2.º, alínea e) do CPPT.
D. Considerou o Tribunal a quo que não se verifica erro na forma de processo, uma vez que a Recorrente pretende atacar o despacho que indeferiu o cancelamento da penhora, na sequência do requerimento dirigido ao Chefe do Serviço de Finanças de Sintra 1, e que isto significa que o pedido é adequado à forma de processo utilizada, independentemente da causa de pedir invocada, o que envolveria a apreciação do mérito da sua pretensão.
E. Contudo, não se pronuncia o Tribunal a quo quanto à pretensão da Recorrente: a ilegalidade/inadmissibilidade das penhoras efectuadas pela AT, posteriormente ao registo do contrato-promessa com eficácia real, com a consequente declaração de caducidade das mesmas.
F. Termos em que se impõe a apreciação da questão colocada à apreciação do Tribunal, explanada na p.i., na qual foi solicitada a revogação da decisão reclamada e o cancelamento das penhoras ordenadas, em consequência da sua ilegalidade/inadmissibilidade.
G. O entendimento perfilhado pelo Serviço de Finanças de Sintra 1, esvazia de conteúdo a função que tem a promessa real de aquisição registada a favor da Recorrente do registo de todos os ónus/encargos cujo cancelamento se pretendeu.
H. A ser como defendeu o referido Serviço de Finanças, a Recorrente nenhuma proteção teria, sobretudo quando se precaveu com o registo do contrato-promessa com eficácia real.
I. Nada tendo contribuído para isso, a Recorrente vê-se na contingência de ter que suportar uma pesadíssima oneração sobre o imóvel que lhe pertence por direito, algo a que o Direito não pode ser indiferente.
J. Os efeitos da compra e venda celebrada entre a Recorrente e B………………, têm que retroagir à data da promessa com eficácia real em 10 de fevereiro de 2012, tornando as identificadas penhoras juridicamente incompatíveis com o Direito registado a favor do recorrente em 10 de fevereiro de 2012, que prevalece sobre as mesmas.
K. Estando o contrato-promesa com eficácia real ditado de eficácia erga omnes, o direito do promitente comprador é oponível a todos os credores e titulares de quaisquer direitos com ele incompatíveis ainda que registados ulteriormente na vigência e eficácia do antecedente registo daquela promessa, conferindo ao promitente-comprador o direito de seguimento.
L. Do registo do contrato-promessa com eficácia real emerge um direito real de aquisição, revestido de eficácia absoluta.
M. Assim, todos os ónus/encargos registados sobre o Imóvel depois de 10 de fevereiro de 2012 são e eram incompatíveis com a promessa com eficácia real registada, nessa data, a favor da Recorrente.
N. Devendo deixar de subsistir porque comprometem, irremediavelmente, o direito a favor da Recorrente registado a 10 de fevereiro de 2012, coartando os direitos que à mesma assistem enquanto possuidora e legítima proprietária do Imóvel.
O. O promitente-comprador, em contrato-promessa de compra e venda dotado de eficácia real, viu registadas penhoras da Autoridade Tributária e Aduaneira depois do registo daquele contrato-promessa, só tem que exercer o direito à execução específica na execução a que respeitem aquelas penhoras, nos termos do artigo 831.º do CPC, se, aquando daquela venda, não tiver ainda interposto ação de execução específica contra o promitente vendedor, ou não tiver outorgado com ele escritura pública referente à compra e venda prometida, não sendo, pois, obrigado a esperar pela referida venda executiva.
P. No primeiro caso mencionado, a venda executiva que tenha lugar, não estando, então, definitivamente julgada a ação de execução específica contra o promitente vendedor, deverá ser suspensa quanto ao imóvel em questão, até aquela decisão definitiva, e sendo esta a de procedência, deverá ser levantada a penhora.
Q. No segundo caso, de realização da compra e venda prometida por escritura pública, como é o caso em apreço, deverão ser cancelados os registos das penhoras.
R. Só com este entendimento se pode dizer que a eficácia real do contrato-promessa se traduz na possibilidade de o contrato-promessa ser invocado contra terceiros que, posteriormente ao registo da referida promessa, venham a adquirir direitos incompatíveis com o seu cumprimento, quer estes assentem ou não num ato de vontade do titular registral.
S. Submete-se, pois, o presente recurso à douta apreciação de V/ Exas. Em ordem a alcançar-se, na verdade, aquilo que é de elementar justiça,
T. O que passa por fazer proceder o alegado na Reclamação da Decisão do órgão da Execução Fiscal deduzida.
Nestes termos e nos mais de Direito que V. Eas. Doutamente se dignarão suprir, deverá o presente Recurso merecer provimento e, em consequência, ser revogada a decisão recorrida, com as demais consequências legais.
Ao decidir-se assim, estarão V. Exas., como sempre, a fazer a tão costumada Justiça.


2 – Não foram apresentadas contra-alegações.

3 – O Exmo Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal emitiu o parecer de fls. 229/230 dos autos, no sentido de que o recurso não merece provimento, porquanto: Parece claro que a sentença recorrida não tinha que apreciar a ilegalidade da penhora, uma vez que não é o ato sindicado mas sim o ato de indeferimento do levantamento da penhora e ao qual a recorrente não imputou qualquer vício.//Não se verifica, pois, à evidência o vício formal de omissão de pronúncia.// (…)//Como bem decidiu a sentença recorrida inexiste erro na forma de processo utilizada, uma vez que o formulado (fls. 21) pedido de revogação da decisão reclamada é, absolutamente, compatível com a reclamação de ato de órgão de execução fiscal (RAOEF), regulada nos artigos 276.º a 278.º do CPPT.// Na causa de pedir a recorrente limita-se a argumentar contra a alegada ilegalidade da penhora do imóvel, que, como é claro, não é o ato reclamado nem a mesma é aflorada no Despacho do Serviço de Finanças que indefere o pedido de levantamento da penhora, sendo certo que não imputa qualquer vício ao despacho sindicado e a invocação desses vícios constituía um ónus seu, pelo que, como bem sentenciou o tribunal recorrido, a reclamação não poderia deixar de improceder.// De qualquer modo, sempre se dirá que, como se refere no sumário do acórdão do STA, de 08/06/2011 – recurso n.º 025/11, em situação idêntica à dos presentes autos, disponível no sítio da internet www.dgsi.pt, que: “I –A celebração de contrato-promessa de compra e venda com eficácia real não obsta à penhora e venda do bem no processo executivo; apenas obriga a que o direito de aquisição de que goza o promitente comprador seja atendido no momento da realização da venda executiva, em conformidade com o preceituado no artigo 903.º do Código de Processo Civil. // II - Por outro lado, a celebração do contrato prometido, em momento posterior ao registo da penhora, também não obsta à venda do bem no processo executivo, dado que os actos de disposição dos bens penhorados são inoponíveis em relação à execução.» - cfr., parecer, a fls. 230 dos autos.


Com dispensa dos vistos, dada a natureza urgente do processo, cumpre decidir.
- Fundamentação –
4 – Questão a decidir
É a de saber se a sentença recorrida enferma de nulidade por omissão de pronúncia, porquanto, tendo julgado que não se verificava erro na forma do processo, não se pronunciou o tribunal a quo quanto à pretensão da Recorrente: a ilegalidade/inadmissibilidade das penhoras efectuadas pela AT, posteriormente ao registo do contrato-promessa com eficácia real, com a consequente declaração de caducidade das mesmas, o que alegadamente se impunha.

5 – Matéria de facto:
É do seguinte teor o probatório fixado na sentença recorrida:
a) Corre termos, no Serviço de Finanças de Sintra-1, o processo de execução fiscal (PEF) n.º 1562201001009281, contra “C………………, Lda”, para cobrança de dívida de IRC do exercício de 2007 – Cfr. PEF, apenso;
b) Em 23 de Fevereiro de 2011 foi proferido despacho pelo Chefe do Serviço de Finanças de Sintra 1 determinando a reversão do processo de execução identificado na alínea antecedente contra B……………… – Cfr. documento a fls 47 e 48 do PEF, apenso;
c) Em 3 de Janeiro de 2012, no Cartório Notarial de ……………., entre B…………….. e a Reclamante “A………………, Lda”, foi outorgado “Contrato-Promessa com Eficácia Real” – Cfr. documento 9 junto com a p.i., o qual se dá, aqui, por integralmente reproduzido;
d) Em 27 de Novembro de 2012, a favor da Fazenda Nacional, foi efectuada a penhora da fracção autónoma designada pelas letras “……..”, correspondente ao …………, destinada a habitação, com duas arrecadações e terraço, do prédio urbano localizado na Av. ………….., nº ….., …., ….., …, e ….. e Avenida …….., nº …, …, … e …, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o n.º 3524 da freguesia de ………., concelho de Lisboa e inscrito na matriz predial da actual freguesia de ………., com origem no registo urbano 513 da freguesia de . …………. (extinta), concelho de Lisboa – Cfr. documentos 6 e 7 juntos com a p.i., os quais se dão, aqui, por integralmente reproduzidos;
e) A penhora mencionada na alínea anterior foi registada em 27 de Novembro de 2012, pela apresentação n.º 4141 – Cfr. documento 6 junto com a p.i., o qual se dá, aqui, por integralmente reproduzido;
e) (sic) Sobre o prédio referido em c), incidem os seguintes ónus ou encargos: 28 000,00;

· Ap. 50 de 2002.03.12 – Hipoteca Voluntária – Capital € 700 000,00 – Montante Máximo Assegurado: € 907 760,00 – Sujeito Ativo Banco Comercial Português, SA (…) – Fundamento: garantia de empréstimo; juro anual de 4,65%; cláusula penal 4% - despesas: € 28 000,00;
· Ap. 35 de 2007.07.27 - Hipoteca Voluntária – Capital € 700 000,00 – Montante Máximo Assegurado: € 909 440,00 – Sujeito Ativo Banco Comercial Português, SA (…) – Fundamento: garantia de empréstimo; juro anual de 4,56%; acrescido da sobretaxa de 4% em caso de mora a título de cláusula penal - despesas: € 28 000,00;
· Ap. 1712 de 10/02/2012 – Promessa de Alienação – Sujeito Ativo: A………………, Lda. (…) – Prazo para realização da escritura: 15 dias após o pagamento da última prestação prevista na cláusula segunda, nº 1, al. b) do contrato ou liquidação integral antecipada do preço, nos termos da cláusula quinta do contrato;
· Ap. 1002 de 2012.05.24 – Hipoteca Legal – Capital: €1 019 369,75 – Sujeito Ativo: Fazenda Pública; (…) PEF em que é executada D……………, Lda.: Proc. n.º 1503200601124412 (…); Proc. n.º 1503200601127110 (…); Proc. 1503200601142100 (…); Proc. nº 1503200601154443 (…); Proc n.º 1503200601208578 (…); Proc. n.º 1503200701217690 (…); Proc nº 1503200801025490 (…); Proc nº 1503200901010050 (…); Proc nº 1503200901020358 (…); Proc nº 1503200901024604 (…); Proc nº 15032006010660722 (…); Proc nº 1503200701042939 (…); Proc nº 1503200801069730 (…); Proc nº 1503200801125281 (…);
· Ap. 2190 de 2012.10.17 – Penhora – Data da penhora: 2012.10.17 – Quantia Exequenda: €13 487,72 – sujeito Ativo: E……………. (…) Processo executivo nº 12174/12.3YYLSB – Seção Geral de Execução de Lisboa – 1º Juízo, 3ª Seção;
· Ap. 1599 de 2012.11.07 – Penhora – Data da penhora: 2012.11.07 – Quantia Exequenda: €19 669 528,77 – Sujeito Ativo: Fazenda Pública (…) – PEF nº 1503201101286803;
· Ap. 4141 de 2012.11.27 – Penhora – Data da penhora: 2012.11.27 – Quantia Exequenda: €107 136,50 – Sujeito Ativo: Fazenda Pública (…) – PEF nº 1503201001009281;
f) Ap. 4152 de 2012.11.07 - Penhora – Data da penhora: 2012.11.07 – Quantia Exequenda: €97 420,36 – Sujeito Ativo: Fazenda Pública (…) – PEF nº 1503201001053671 – Cfr. idem;
g) Em 17 de Março de 2014, no Cartório Notarial de ……………, em Lisboa, foi outorgada escritura de Compra e Venda, da qual se destaca: - “(…) B………. e pelo preço de setecentos e cinquenta e quatro euros, já recebido, à sociedade A………………, Lda (…) vende a fracção autónoma designada pela letra FF, correspondente ao décimo primeiro andar, destinado a habitação, com duas arrecadações e terraço, do prédio urbano, localizado na Av. …………, números …., …, …, …, … e … e Avenida ……, nº …, …, … e …, freguesia de ……………, concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número três mil quinhentos e vinte e quatro, daquela freguesia, afecto ao regime de propriedade horizontal, conforme inscrição, relativa a apresentação um de doze de Outubro de mil novecentos e sessenta e um, registada a favor do vendedor, conforme inscrição, relativa à apresentação número quarenta e nove, doze de Março de dois mil e dois, inscrito na respectiva matriz da referida freguesia sob o número 46, da freguesia de ……………, com o valor patrimonial de €564 150,00. (…) – Cfr. documento 8 junto com a p.i., o qual se dá, aqui, por integralmente reproduzido;
h) Em 4 de Setembro de 2015, no Serviço de Finanças de Sintra – 1, deu entrada requerimento da Reclamante “A……………, Lda”, dirigido ao Chefe do serviço de Finanças de Sintra 1, no âmbito do PEF nº 1562201001009281, na qualidade de possuidora e legítima proprietária da fracção autónoma identificada na alínea c), do qual se extrai o seguinte: “desde 10.02.2012 (data do registo da promessa de alienação a favor do requerente) até 18.03.2014 (data do registo de aquisição a favor da requerente) vieram a recair sobre o imóvel diversos ónus/encargos (…) Nomeadamente duas penhoras (Ap 4141 de 27.11.2012 e Ap. 4152 de 27.11.2012) registadas no âmbito dos processos à margem referenciados, em que é sujeito passivo o anterior proprietário do imóvel, B………………. (…). Os efeitos da compra e venda celebrada entre a requerente e B…….. retroagem à data da promessa com eficácia real registada em 10.02.2012, tornando as referidas penhoras juridicamente incompatíveis com o direito registado a favor da requerente em 10.02.2012, que prevalece sobre elas; o cumprimento da promessa mediante a celebração do contrato prometido determina a incompatibilidade do registo das referidas penhoras (registadas ulteriormente ao registo da promessa e anteriormente ao registo do cumprimento da mesma) com a transmissão da propriedade, as quais têm, por isso, de se considerar caducadas ou, em qualquer caso, canceladas por força do disposto no citado artigo 6º, nº 1, do CRP, o que se requer seja ordenado por V. Exª. (…)”
i) Em 28 de Dezembro de 2015, no Serviço de Finanças de Sintra 1, foi elaborada informação, no âmbito do PEF nº 1562201001009281, na sequência do requerimento referido na alínea antecedente, da qual se destaca o seguinte: Alega a Requerente ter celebrado contrato promessa com eficácia real, registado a 2012.02.10; Em cumprimento desse acto, celebrou contrato definitivo de compra e venda a 2015.03.17; Pelo que alega ser possuidora e legítima proprietária daquele desde a data do contrato prometido; Dispõe o artigo 342º, nº 1 do CPC que “se a penhora ou qualquer ato judicialmente ordenado, de apreensão ou entrega de bens, ofender a posse ou qualquer direito incompatível com a realização ou o âmbito da diligência, de que seja titular quem não é parte na causa, pode o lesado fazê-lo valer (…) deduzindo embargos de terceiro (…) nos 30 dias subsequentes àquele em que a diligência foi efectuada ou em que o embargante teve conhecimento da ofensa (…); Dispõe ainda o artigo 237.º CPPT: quando o arresto, a penhora ou qualquer outro ato judicialmente ordenado de apreensão ou entrega de bens ofender a posse ou qualquer outro direito incompatível com a realização ou o âmbito da diligência, de que seja titular um terceiro, pode fazê-lo valer por meio de embargos de terceiro; Considerados como um incidente da instância na execução fiscal, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 166º e 167º CPPT, os embargos de terceiro são, pois, um meio específico de reacção contra a penhora por parte de quem não é parte na execução, baseando-se na impenhorabilidade subjectiva dos bens. Acrescenta o n.º 2 do artigo 237º do CPPT que o prazo para a dedução de embargos é de 30 dias contados desde o dia em que foi praticado o ato ofensivo da posse ou direito ou aquele em que o embargante teve conhecimento da ofensa (…); Alega ter tomado conhecimento dos actos incompatíveis com o seu direito aquando da celebração do contrato definitivo a 17/03/2015; O prazo para a dedução dos embargos de terceiro é (…) um prazo de caducidade; Assim, para além de ser o meio impróprio, sempre seria extemporâneo. À consideração superior. (…)” – Cfr. documento 1 junto com a p.i., o qual se dá, aqui, por integralmente reproduzido;
j) Em 28 de Dezembro de 2015 foi proferido despacho, pelo Chefe do Serviço de Finanças de Sintra 1, em substituição, aposto na informação a que se refere a alínea anterior, com o seguinte teor: “Concordo. Em face do informado e com os fundamentos aduzidos, indefiro o pedido de levantamento da penhora .” – Cfr. documento a fls. 21.


6 – Apreciando
6.1 Da alegada nulidade por omissão de pronúncia da sentença recorrida
A sentença recorrida, a fls. 157 a 174 dos autos, julgou improcedente a reclamação judicial deduzida pela ora recorrente, no entendimento de que, embora o meio processual por esta utilizado fosse o meio processual próprio para sindicar o despacho reclamado – de indeferimento do pedido de levantamento/cancelamento das penhoras, na sequência de requerimento anómalo que dirigiu ao Chefe do Serviço de Finanças de Sintra 1 -, da leitura da p.i. não resulta que a Reclamante assaque ao acto reclamado qualquer vício, limitando-se a argumentar quanto à legalidade da penhora – que não é, de todo, o acto aqui reclamado – face ao contrato-promessa que tinha celebrado e posterior escritura de compra e venda outorgada relativamente ao imóvel alvo de penhora, concluindo que não vindo assacados quaisquer vícios ao acto reclamado, nem sequer implicitamente, inexiste matéria que possa ser objecto de apreciação por este tribunal, no âmbito da presente reclamação, não restando senão considerar improcedente a (…) reclamação – cfr. sentença recorrida, a fls. 169 a 173 dos autos.
Alega a recorrente, em síntese, que a sentença é nula por omissão de pronúncia, porquanto, tendo julgado que não se verificava erro na forma do processo, não se pronunciou o tribunal a quo quanto à pretensão da Recorrente: a ilegalidade/inadmissibilidade das penhoras efectuadas pela AT, posteriormente ao registo do contrato-promessa com eficácia real, com a consequente declaração de caducidade das mesmas, o que alegadamente se impunha.
Mas sem razão.
O Tribunal “a quo” deixou bem explicitado, na apreciação da excepção invocada pela Fazenda Pública de impropriedade do meio processual (cfr. sentença recorrida, a fls. 169 a 171 dos autos), que a inexistência do alegado erro na forma de processo deriva do facto de o acto reclamado ser, não os actos de penhora realizados pela Fazenda Pública em 2012 (e alegadamente conhecidos aquando da celebração do contrato definitivo de compra e venda em 17 de Março de 2015), mas o acto de indeferimento do pedido de levantamento das penhoras proferido pelo Chefe do Serviço de Finanças de Sintra 1 em 28 de Dezembro de 2015, daí que não tivesse que apreciar a legalidade daquelas penhoras mas tão só a legalidade do acto reclamado, se para tal invocada tivesse sido alguma ilegalidade praticada, o que não sucedeu sequer implicitamente, razão pela qual entendeu julgar improcedente a reclamação.
Nos termos do n.º 1 do artigo 125.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) constitui causa de nulidade da sentença, entre outras, a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar, considerando-se como tais, nos termos do n.º 2 do artigo 660.º do Código de Processo Civil (CPC), aplicável ex vi da alínea e) do artigo 2.º do CPPT, todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.
No caso dos autos, sendo o acto reclamado o acto de indeferimento do pedido de levantamento/cancelamento das penhoras efectuadas pela Fazenda Pública - que não as próprias penhoras –, a apreciação do mérito da reclamação pressupunha a imputação pelo reclamante ao acto reclamado de vícios próprios deste, o que, não tendo sucedido, determina a necessária improcedência da reclamação, como bem decidido.
É que, tendo o Tribunal a quo entendido - e bem -, que o acto reclamado é a decisão de indeferimento do pedido de levantamento/cancelamento das penhoras e que a este acto – que não às penhoras –, não imputou a ora recorrente qualquer vício próprio que se impusesse conhecer, manifesto é não ser a sentença nula por omissão de pronúncia, pois que a questão da legalidade ou ilegalidade das penhoras não podia ser conhecida através do meio processual deduzido pela ora recorrente.
Se a recorrente quisesse obter pronúncia sobre o mérito das penhoras efectuadas pela Fazenda Pública teria de o ter feito em tempo e através do meio que para tal dispunha, não podendo pretender que através do meio processual que utilizou se possa reabrir a discussão sobre actos já consolidados na ordem jurídica mercê da sua não oportuna reclamação.

O recurso não merece provimento.

- Decisão -
7 - Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso.


Custas pela recorrente.

Lisboa, 11 de Janeiro de 2017. - Isabel Marques da Silva (relatora) – Pedro Delgado – Dulce Neto.