Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:037/14
Data do Acordão:06/18/2015
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:ANA PAULA PORTELA
Descritores:PROCEDIMENTO CAUTELAR
SUSPENSÃO DE EFICÁCIA
INEPTIDÃO DA PETIÇÃO INICIAL
INTERESSE EM AGIR
PERICULUM IN MORA
JUIZ DOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS E FISCAIS
CONCURSO PARA JUIZ DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO
Sumário:I - Não há incompatibilidade entre os pedidos de antecipação de decisão e de suspensão de deliberação, já que não se pode pedir a antecipação de uma deliberação de graduação num determinado sentido se a deliberação em sentido contrário se mantiver na ordem jurídica.
II - O interesse em agir não se afere pela possibilidade de os factos serem ou não suficientes para conduzir à concessão da providência mas antes pela inutilidade da providência nos interesses que se visam proteger e acautelar na esfera jurídica da requerente .
III - Estando, neste momento, requerente e contra-interessada graduada em 1ª lugar a exercer as mesmas funções a título efetivo não existe facto consumado com a não suspensão da deliberação de 10/12/2013 já que, no caso de vir a proceder o pedido de anulação da mesma, após trânsito em julgado da decisão anulatória, nos termos do art. 173º nº1 do CPTA será reconstituída a situação jurídica de acordo com a legalidade, tendo por referência a situação que existiria se o ato anulado não tivesse sido praticado.
IV - Não implicam prejuízos de difícil reparação para a esfera jurídica da requerente a espera pela prolação da decisão na ação administrativa especial instaurada por inerente indefinição quanto às candidatas colocadas em 1º e 2º lugar no concurso aqui em causa já que esta sempre se manteria até à decisão definitiva da ação administrativa especial quer se suspenda ou não a deliberação do CSTAF.
V- A inversão das posições entre a 1ª e 2ª graduadas no concurso não vai acautelar qualquer indefinição total da situação profissional das candidatas , já que a situação será sempre de indefinição até decisão final.
VI - O decretamento da suspensão ou o indeferimento da mesma não interfere com qualquer imagem e dignidade quer da interessada quer da contra-interessada quer da magistratura.
Nº Convencional:JSTA00069257
Nº do Documento:SA120150618037
Data de Entrada:01/15/2014
Recorrente:A..................
Recorrido 1:CONSELHO SUPERIOR DOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS E FISCAIS E OUTRA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:PROCEDIMENTO CAUTELAR
Objecto:DEL CSTAF 2013/12/10.
Decisão:INDEFERIDO
Área Temática 1:DIR ADM CONT - MEIO PROC ACESSÓRIO SUSPEFIC.
Legislação Nacional:CPC13 ART186.
CPTA ART4 ART47 ART120 ART173.
Jurisprudência Nacional:AC STJ PROC00A3277 DE 2001/03/08.; AC STAPLENO PROC037/14 DE 2015/03/19.
Referência a Doutrina:MANUEL ANDRADE - NOÇÕES ELEMENTARES DE PROCESSO CIVIL PAG79.
ANSELMO CASTRO - DIREITO PROCESSUAL DECLARATÓRIO VOLII PAG253.
ANTUNES VARELA - MANUAL PROCESSO CIVIL PAG172.
CASTRO MENDES - LIÇÕES VOLI PAG488.
JOSÉ CARLOS VIEIRA ANDRADE - JUSTIÇA ADMINISTRATIVA 8ED PAG307.
AROSO ALMEIDA - O NOVO REGIME DO PROCESSO NOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS 3ED PAG59 E SEGS PAG293 PAG299-300.
Aditamento:
Texto Integral: 1. RELATÓRIO

1.1. Z………………….., devidamente identificada nos autos, instaurou no Supremo Tribunal Administrativo contra o CONSELHO SUPERIOR DOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS E FISCAIS - indicando como contra-interessados, 23 particulares devidamente identificados, a fls. 274/5, que aqui se dão por expressamente reproduzidos - simultaneamente com a propositura da correspondente acção administrativa especial de impugnação de atos administrativos, a providência cautelar de suspensão de eficácia da deliberação do «CSTAF», datada de 10.12.2013, que homologou a lista de graduação do concurso aberto para o provimento de uma vaga de juiz desembargador na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul ,bem como das vagas que, entretanto, ocorram e das que, no período de validade do concurso, venham a ocorrer na Secção de Contencioso Administrativo dos Tribunais Centrais Administrativos, Norte e Sul, conforme Aviso n.º 15821/2012, publicado no DR, 2.ª Série, de 23.11.2012, assim como da deliberação do «CSTAF» da mesma data que nomeou a candidata colocada em 1.º lugar do citado concurso, como juíza desembargadora, publicadas, respectivamente, através da Deliberação (extrato) n.º 2415/2013, no DR, 2.ª série, de 30.12.2013, e da Deliberação (extracto) n.º 05/2014, no DR, 2.ª série, de 03.01.2014.

1.2. A Requerente peticionou ainda a intimação do «CSTAF» a “alterar provisoriamente a graduação no concurso”, assim como a determinar a suspensão do exercício de funções como juíza desembargadora da contra-interessada colocada em 1.º lugar, X………., bem como a aplicação da faculdade prevista no art. 121.º do CPTA.

1.3. O STA proferiu acórdão, em 15.05.2014 [cfr. fls. 512/559], com fundamento no disposto no art. 121.º do CPTA, a “antecipar o juízo sobre a causa principal”, julgou a acção procedente e, consequentemente, anulou a deliberação do CSTAF, de 10.12.2013, que havia homologado a lista de graduação ao concurso conforme Aviso nº 15821/2012.

1.4. O CSTAF, não se conformando com tal decisão, interpôs recurso para o Pleno, a fls. 602/614, invocando, nomeadamente, os art.s 25º do ETAF e 147º nº1 a), do CPTA.

1.5. V…………., na qualidade de contra-interessada, veio, também, a fls. 646, interpor recurso para o Pleno.

1.6. X……………, contra-interessada, também interpôs recurso para o Pleno da secção, apresentando as suas alegações a fls. 663/758.

1.7. Admitidos os recursos, nos termos do despacho de fls. 793, veio o Pleno da secção do contencioso administrativo, proferir acórdão (fls. 1018/1042) em 19.3.2015, julgando:
Procedentes que se mostram os recursos jurisdicionais dirigidos à decisão no segmento relativo ao juízo de antecipação da causa principal, impõe-se, então, a sua revogação nesse âmbito, prosseguindo os autos na Secção para apreciação da pretensão cautelar requerida, ficando sem efeito o julgamento efetuado sobre o fundo da causa.
... Face ao antecedente julgado tem-se como prejudicado o conhecimento do demais objeto de recurso.
... DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes do Pleno da Secção de Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em conceder provimento parcial aos recursos jurisdicionais das contra-interessadas X…………e V……….no segmento relativo à decisão de antecipação da causa principal nos termos do art. 121.º do CPTA, e, em consequência, revogar a decisão judicial recorrida, determinando a remessa dos autos à Secção.

1.8. Em cumprimento do acórdão do Pleno, as partes foram notificadas para se pronunciar.
*
2-FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
(que resulta da análise dos análise dos autos e já constava de ambas as decisões já proferidas):

I) A Requerente, Juíza de Direito, exercia funções, destacada como auxiliar, no Tribunal Central Administrativo Sul (TCAS), [doc. n.º 13, fls. 236];

II) Através do Aviso n.º 15821/2012, publicado no DR, 2.ª Série, n.º 227, de 23.11.2012, foi aberto concurso para o provimento de uma vaga de juiz na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul, bem como das vagas que entretanto ocorram e das que, no período de validade do concurso, venham a ocorrer na Secção de Contencioso Administrativo dos Tribunais Centrais Administrativos, Norte e Sul, e cujo preenchimento seja ajuizado pelo Conselho em função das necessidades de serviço [doc. n.º 01, fls. 71];

III) O prazo para apresentação de candidaturas, era de 10 dias úteis a contar da publicação do Aviso [ponto 01 do Aviso];

IV) O prazo de validade do concurso foi fixado em um ano, prorrogável até 06 meses [ponto 01 do Aviso];

V) O ponto IV) estabeleceu que os requerimentos de admissão ao concurso devem ser acompanhados:
a) De nota curricular;
b) Dos trabalhos forenses (máximo 07) e trabalhos científicos (máximo 03), os quais devem ser numerados, não sendo considerados os trabalhos que ultrapassem os números definidos. Os trabalhos científicos e forenses deverão, de preferência, ser entregues em formato digital, gravados em CD ou DVD;
c) De documentos que os concorrentes queiram apresentar para efeitos de apreciação da graduação a efetuar, nomeadamente:
i) Documentos comprovativos das classificações de serviço, da antiguidade e da graduação obtidas em concursos noutra jurisdição;
ii) Documentos comprovativos da classificação na licenciatura em Direito e de outros eventuais graus académicos ou cursos complementares;
iii) Currículo pós-universitário, devidamente comprovado;
iv) Quaisquer outros elementos que abonem à preparação específica, idoneidade e capacidade dos candidatos para o cargo a prover.

VI) Foi consagrado no mesmo Aviso, ponto 05, que a graduação dos concorrentes seria feita segundo o mérito relativo dos concorrentes, tomando-se globalmente em conta a avaliação curricular, tendo em consideração os fatores, nos termos do artigo 69.º, n.º 2, do ETAF:
a) Anteriores classificações de serviço:
i) A ponderação das anteriores classificações de serviço será operada tendo por referência o resultado dos últimos atos e avaliação de mérito;
ii) A última avaliação de mérito será considerada na proporção de 2/3 e a penúltima avaliação de mérito na proporção de 1/3, tendo em conta as seguintes pontuações:
“Suficiente”- 60 pontos;
“Bom” - 80 pontos;
“Bom com distinção - 100 pontos; e
“Muito Bom” - 120 pontos;
b) Graduação obtida em concursos de habilitação ou cursos de ingresso em cargos judiciais, com ponderação entre 01 e 05 pontos;
c) Currículo universitário e pós-universitário, com ponderação entre 01 e 05 pontos;
d) Trabalhos científicos realizados, com ponderação entre 0 e 05 pontos, não se englobando nesta categoria os trabalhos que correspondam ao exercício específico da função;
e) Atividade exercida no âmbito forense ou no ensino jurídico, com ponderação entre 0 e 05 pontos;
f) A preparação específica, idoneidade e capacidade dos candidatos para o cargo a prover, com ponderação entre 01 e 60 pontos, designadamente:
i) O prestígio profissional e cívico corresponde ao exercício específico da função (01 a 05 pontos);
ii) A qualidade dos trabalhos forenses, tendo em conta os conhecimentos revelados com reflexo na resolução dos casos concretos designadamente no domínio da técnica jurídica, nas opções quanto à forma e ainda quanto à substância (0 a 20 pontos);
iii) A capacidade de trabalho, ponderando a quantidade e a qualidade do serviço, designadamente, a existência de serviço já prestado como auxiliar nos Tribunais Centrais Administrativos (0 a 30 pontos);
iv) O grau de empenho revelado pelo magistrado na sua formação contínua e atualizada e na adaptação às modernas tecnologias (0 a 05 pontos);
v) Eventuais sanções constantes do registo disciplinar do concorrente que toquem com a sua idoneidade serão ponderadas, de acordo com a maior ou menor gravidade, com dedução até 20 pontos.

VII) As classificações de serviço consideradas foram definidas no ponto VI), como aquelas que fossem homologadas pelo «CSTAF» até ao termo do prazo de apresentação das candidaturas;

VIII) Para a avaliação dos concorrentes, foi aberto um processo individual de candidatura, no qual se integram os elementos relevantes, designadamente os extraídos do respetivo processo individual [v.g., percurso profissional, classificações de serviço, relatórios das três últimas inspeções e registo disciplinar], os trabalhos apresentados, a nota curricular elaborada pelo concorrente e o respetivo requerimento de candidatura. Se necessário, solicitar-se-ão ainda os elementos respeitantes ao serviço realizado noutras jurisdições ou serviços a que os concorrentes tenham estado ligados [ponto 07 do Aviso];

IX) O aviso de abertura previu, no ponto VIII), a defesa dos currículos perante um júri constituído, nos termos do art. 69.º, n.º 3, do ETAF;

X) O ponto 15 dispôs que atenta a qualidade das diversas classes concorrentes, a natureza curricular do concurso e a respetiva tramitação, designadamente a defesa pública do currículo, considera-se dispensada a audiência dos interessados, nos termos da alínea a), do n.º 2 do art. 103.º do Código do Procedimento Administrativo;

XI) Apresentados os requerimentos de candidatura, entre eles o da A. [cfr. fls. 13-14], foram organizados apensos, constituindo o apenso referente à A. o apenso B.

XII) Sendo o apenso D o referente à contra-interessada B…………, indicada pela A., constando o respetivo requerimento de candidatura a fls. 16 do processo de concurso.

XIII) Em 12 de março de 2013, o Júri reuniu para distribuir as tarefas de apreciação e valoração dos trabalhos de cada candidato [cfr. ata n.º 01, a fls. 71-73 do processo de concurso];

XIV) Em 17 de abril, o Júri reuniu para se debruçar, em concreto, sobre os elementos curriculares dos candidatos [cfr. ata n.º 02, a fls. 78 do processo de concurso].

XV) Nos dias 22, 23 e 29 de abril, o Júri realizou as entrevistas aos candidatos [cfr. ata n.º 03, a fls. 79 a 81 do processo].

XVI) Nos dias 08 e 23 de maio, o Júri voltou a reunir para apreciar, em concreto, os elementos curriculares dos candidatos [cfr. atas n.ºs 04 e 05, a fls. 83 e 84 do processo].

XVII) Em 4 de julho, o Júri aprovou, por unanimidade, o parecer [P1227/PARECER] sobre a prestação de cada um dos candidatos, elaborando uma lista de graduação, nos termos e para os efeitos do artigo 69.º, n.º 4, do ETAF [cfr. ata n.º 06, a fls. 85-175 do processo de concurso].

XVIII) Por deliberação de 10.12.2013 [doc. n.º 05, fls. 126 e segs.] publicada no DR, 2.ª série, n.º 252, de 30.12.2013 [Deliberação (extrato) n.º 2415/2013], o «CSTAF», concordou, aderindo, na íntegra, ao seu teor, homologando a referida lista de graduação;

XIX) Esta deliberação teve dois votos de vencido, anexos à mesma [sendo uma declaração por adesão], uma abstenção, de acordo com a declaração de voto também ali anexa e um «esclarecimento», documentos juntos com o «P.A.» e que se dão por reproduzidos;

XX) Na mesma deliberação do «CSTAF», de 10.12.2013, foi nomeada Juíza Desembargadora da Secção do Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul, B…………, publicada no DR, 2.ª série, n.º 02, de 03.01.2014 [deliberação (extrato) n.º 05/2014];

XXI) B………… foi graduada em 01.º lugar [184,83 pontos], na lista de graduação referida no ponto III);

XXII) A………… foi graduada em 02.º lugar [184,33 pontos], na mesma lista de graduação;

XXIII) A classificada em 01.º lugar, por deliberação do «CSTAF» de 10.12.2013, [Deliberação (extrato) n.º 05/2014, publicada no DR, 2.ª série, n.º 02, de 03 de janeiro de 2014] foi nomeada Juíza Desembargadora para a vaga a preencher e tomou posse, exercendo as funções de juíza desembargadora do «TCA/S»;

XXIV) Em 15.01.2014 A………… requereu, neste STA, contra o «CSTAF», cumulativamente com a propositura da correspondente ação administrativa especial de impugnação de atos administrativos, a adoção de providência de suspensão de eficácia da deliberação do «CSTAF», de 10.12.2013, que homologou a lista de graduação dos candidatos, bem como da deliberação que nomeou a candidata posicionada em 01.º lugar;

XXV) Cumulou esse pedido com o de intimação do «CSTAF» para que adote uma conduta que altere provisoriamente a graduação no concurso, passando a colocar a requerente em 01.º lugar e a classificada em 01.º lugar para o 02.º lugar e solicita ainda a aplicação do art. 121.º do CPTA;

XXVI) O «CSTAF» proferiu a “Resolução Fundamentada”, constante de fls. 404 a 408, nos termos que aqui se dão por reproduzidos, nos termos e para efeitos do art. 128.º, n.º 1, do CPTA [fls. 404 a 408];

XXVII) O «CSTAF», em 27.03.2014, veio requerer a apensação aos autos da deliberação aprovada em 25.03.2014 [fls. 483 e segs.], que nomeou 05 Juízes Desembargadores como Juízes Conselheiros do Contencioso Administrativo do STA, o que deu lugar à abertura de 02 vagas no TCA/S e 03 no TCA/N;

XXVIII) Por ocorrerem tais vagas no período de validade do concurso sub judice, o «CSTAF» nomeou, na mesma sessão, as candidatas posicionadas em 02.º [ora requerente] e 03.º lugares da lista de graduação constante do ponto XVIII.
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3.O DIREITO
3.1.QUESTÕES DE QUE CUMPRE CONHECER
Decidido em Pleno que não estamos perante a situação a que alude o art. 121º do CPTA há que conhecer do pedido cautelar nas seguintes vertentes:
_ Aferir das questões prévias suscitadas pelas requeridas X……….e V……….. que ainda não foram conhecidas. (atendendo a que já foi conhecida pelo Pleno a questão da inutilidade superveniente da lide).
_Verificar se ocorrem os pressupostos para a suspensão de eficácia da deliberação do «CSTAF», datada de 10.12.2013, que homologou a lista de graduação do concurso aberto pelo Aviso n.º 15821/2012, publicado no DR, 2.ª Série, de 23.11.2012, assim como da deliberação do «CSTAF» que nomeou a candidata colocada em 1.º lugar do citado concurso, como juíza desembargadora.
_ caso seja de suspender as referidas deliberações verificar se deve ser proferida providência antecipatória de intimação do «CSTAF» a “alterar provisoriamente a graduação no concurso”, e já que , neste momento a questão da suspensão do exercício de funções como juíza desembargadora da contra-interessada colocada em 1.º lugar, X………….deixa de se colocar porque, independentemente de ficar colocada em 1ª ou 2º lugar sempre se manteria, neste momento, face às vagas entretanto abertas, como juíza desembargadora.

3.2 QUESTÕES PRÉVIAS
3.2.1.CONTRADIÇÃO DE PEDIDOS
Alega a requerida V……….. que os pedidos formulados pela requerente são substancialmente incompatíveis entre si já que, se se pretende a paralisação do concurso em causa não pode, ao mesmo tempo, requerer-se a alteração provisória da graduação, pelo que a petição é inepta.
Nos termos do art. 186º do Novo CPC:
“- É nulo todo o processo quando for inepta a
2 - Diz-se inepta a petição:
a) Quando falte ou seja ininteligível a indicação do pedido ou da causa de pedir;
b) Quando o pedido esteja em contradição com a causa de pedir;
c) Quando se cumulem causas de pedir ou pedidos substancialmente incompatíveis.
3 - Se o réu contestar, apesar de arguir a ineptidão com fundamento na alínea a) do número anterior, a arguição não é julgada procedente quando, ouvido o autor, se verificar que o réu interpretou convenientemente a petição inicial.
4 - No caso da alínea c) do n.º 2, a nulidade subsiste, ainda que um dos pedidos fique sem efeito por incompetência do tribunal ou por erro na forma do processo.”
Vejamos então se ocorre cumulação de pedidos incompatíveis.
Dispõe o art. 4º do CPTA:
“Cumulação de pedidos
1 - É permitida a cumulação de pedidos sempre que:
a) A causa de pedir seja a mesma e única ou os pedidos estejam entre si numa relação de prejudicialidade ou de dependência, nomeadamente por se inscreverem no âmbito da mesma relação jurídica material;
b) Sendo diferente a causa de pedir, a procedência dos pedidos principais dependa essencialmente da apreciação dos mesmos factos ou da interpretação e aplicação dos mesmos princípios ou regras de direito.
2 - É, designadamente, possível cumular:...”
E, o 47º do CPTA:
“1 - Com qualquer dos pedidos principais enunciados no n.º 2 do artigo anterior podem ser cumulados outros que com aqueles apresentem uma relação material de conexão, segundo o disposto no artigo 4.º e, designadamente, o pedido de condenação da Administração à reparação dos danos resultantes da actuação ou omissão administrativa ilegal.
2 - ... 3 -... 4 - ...5 - ...6 - No caso de absolvição da instância por ilegal cumulação de impugnações, podem ser apresentadas novas petições...”
Resulta destes preceitos o princípio da livre cumulação de pedidos que permite uma efetividade da tutela jurisdicional e da celeridade e economia processuais mas, também, que a mesma não se basta com uma compatibilidade entre pedidos, sendo necessária entre eles uma relação de prejudicialidade, dependência ou coincidência.
E que, os requisitos positivos da cumulação são:
1- a causa de pedir ser a mesma e única;
2- não sendo, que o julgamento dos pedidos dependa da apreciação dos mesmos factos ou da interpretação e aplicação das mesmas regras ou princípios de direito;
3_ou que os pedidos estejam em relação de prejudicialidade ou dependência.
O nº2 do art. 4º CPTA exemplifica estes requisitos positivos.
No caso sub judice vem requerido como primeiro pedido a suspensão de eficácia da deliberação do «CSTAF», datada de 10.12.2013, que homologou a lista de graduação do concurso aberto.
O que não significa a paralisação do concurso, significa que aquela deliberação não é executada.
Seguidamente, pede que, face à suspensão dessa deliberação, a entidade requerida, o CSTAF, seja intimado a “alterar provisoriamente a graduação no concurso”, assim como a determinar a suspensão do exercício de funções como juíza desembargadora da contra-interessada colocada em 1.º lugar.
Ou seja, requer que se antecipe a decisão que a requerente entende que deve ser a que há-de resultar da procedência do processo principal.
Portanto, não há incompatibilidade entre os pedidos, não obstante o pedido de antecipação requerido esteja dependente da procedência do primeiro, ou seja, do deferimento do pedido de suspensão da deliberação de 10/12/2013.
É que, não se podia pedir a antecipação de uma deliberação de graduação num determinado sentido se a deliberação em sentido contrário se mantivesse na ordem jurídica.
Não é, pois, inepta a petição cautelar.

3.2.2.FALTA DE INTERESSE EM AGIR
Invocam ambas as requeridas a falta de interesse em agir da requerente na suspensão da deliberação do CSTAF homologatória da decisão do concurso já que, desempenhando a requerente as funções de juíza auxiliar do TCAS ( agora já efetiva) não há qualquer interesse a acautelar que vise assegurar a utilidade da tutela efetiva já que o decretamento da providência e a requerida inversão de classificação final entre requerente e contra-interessada não é adequada a garantir a utilidade da ação administrativa especial tal como configurada pela autora por não existir qualquer obstáculo à reconstituição da situação da requerente.
Então vejamos.
Diferentemente da legitimidade o interesse em agir consiste no facto de o direito do demandante estar carecido de tutela judicial (Manuel Andrade, in Noções Elementares de Processo Civil, pág. 79), distinguindo-se do interesse direto em demandar, determinante da legitimidade do autor e ou requerente
Pode dar-se o caso de o autor, sendo embora parte legítima, não ter necessidade de recorrer à tutela do tribunal para satisfação do seu direito, quer porque não foi violado, quer porque não se encontra sequer ameaçado.
A doutrina dominante (designadamente, Manuel Andrade, obra citada, pag. 81, Anselmo de Castro, Direito Processual Civil Declaratório, Vol. II, pág. 253; e Antunes Varela, Manual de Processo Civil, pág. 172) sustenta que o interesse em agir constitui um pressuposto processual.
Castro Mendes, Lições, Vol. I, pag. 488, tem opinião contrária, argumentando que a nossa lei contempla mesmo casos de ação inútil, nos arts. 449.º n.º 2 c) e 66.º n.º 2 e n.º 3 do Código de Processo Civil.
Na jurisprudência, a opinião dominante é também no sentido de que o interesse em agir constitui um pressuposto processual (vide entre outros, o ac. do STJ de 08/03/2001, proc. n.º 00A3277).
A este propósito José Carlos Vieira de Andrade in Justiça Administrativa 8ª edição pag. 307 refere :
“. (…) Normalmente designada por “ interesse processual “ ou “ interesse em agir” este pressuposto exige a verificação objectiva de um interesse real e actual, isto é, da utilidade na procedência do pedido e constitui um pressuposto comum, directamente decorrente da ideia de economia processual (…).“
E, Aroso de Almeida in “ O Novo Regime do processo nos Tribunais Administrativos “ 3ª edição pag. 59 e seguintes salienta :
“Como fazem notar os processualistas, o pressuposto da legitimidade não se confunde com o do interesse processual ou interesse em agir. Com efeito, pode não haver qualquer dúvida quanto à questão de saber se quem está em juízo é parte na relação material, tal como o autor a configura _…_ e no entanto poder questionar-se a existência de uma necessidade efectiva de tutela judiciária e, portanto, de factos objectivos que tornem necessário o recurso à via judiciária (…)
A exemplo do que, por exemplo, sucede com o CPC alemão, o CPTA não consagra, em termos gerais, o interesse em agir como um pressuposto processual, mas contém uma referência expressa a este requisito, no artigo 39º, a propósito das situações em que o problema reconhecidamente se coloca com maior acuidade … Por outro lado, e tal como já foi referido, também no artigo 55º nº1 alínea a), embora misturada com a questão da legitimidade, surge uma manifestação do mesmo requisito na exigência de um carácter “ directo” ao interesse individual para impugnar actos administrativos. Com efeito, quando se exige que o interesse do impugnante seja directo, no sentido, tradicionalmente construído neste domínio, em que ele deve ser actual, está a fazer-se apelo à ideia de que o impugnante deve estar constituído numa situação e efectiva necessidade de tutela judiciária. (…)
A questão que, a partir de aí, se há-de colocar é, pois, a de apurar, em cada caso concreto, se quem se propõe impugnar esse acto se apresenta como parte legítima e, por outro lado, como estando colocado em situação que, do ponto de vista do interesse em agir, fundamente a necessidade de recorrer à via judicial.”
Em suma, devemos entender que o interesse em agir continua no novo CPTA a ser um pressuposto da ação quer a nível principal quer a nível cautelar.
Atenhamo-nos ao caso sub judice.
É certo que o interesse que a requerente vem invocar é a defesa da imagem e dignidade dos tribunais e magistratura e evitar situações de indefinição total da requerente e da contra-interessada.
E, nesse sentido, formula os seguintes pedidos nestes autos de processo cautelar:
“ [a) suspensão de eficácia da deliberação do «CSTAF», datada de 10.12.2013, que homologou a lista de graduação do concurso aberto para o provimento de uma vaga de juiz desembargador na Secção de Contencioso Administrativo do TCA/S, bem como das vagas que, entretanto, ocorram e das que, no período de validade do concurso, venham a ocorrer na Secção de Contencioso Administrativo dos TCA’s, Norte e Sul, assim como da deliberação do «CSTAF» que nomeou a candidata colocada em 01.º lugar do citado concurso como juíza desembargadora, com vista a assegurar utilidade à ação principal de impugnação da legalidade daquelas deliberações;
b) intimação do «CSTAF» a “alterar provisoriamente a graduação no concurso”;
c) suspensão do exercício de funções como juíza desembargadora da contra-interessada colocada em 01.º lugar, B…………;
d) antecipação do juízo principal no quadro do regime previsto no art. 121.º do CPTA]...”
Não nos parece que só pelo facto de a requerente exercer as mesmas funções que resultariam da suspensão da deliberação aqui em causa tal signifique que carece de interesse em agir.
Na verdade, não podemos dizer que, atendendo aos pedidos formulados e causa de pedir, independentemente de os factos por si alegados serem ou não suficientes para conduzir à concessão da providência, o deferimento do pedido de suspensão da deliberação e demais pedidos formulados seja inútil para os interesses que se visam proteger de acautelar.
É que, estar a exercer as funções a um título e estar graduada de uma forma ou de outra, pode sempre ser relevante em abstrato para, eventuais concursos que surjam e comissões de serviço, entre outros.
Aliás, o que se referiu no acórdão do Pleno deste STA de 03/19/2015 nestes autos a propósito da improcedência da questão prévia da inutilidade superveniente da lide vale, em parte, para esta questão do interesse em agir.
Como se extrai deste:
“Daí que não é pelo simples facto de um candidato haver sido nomeado, entretanto, para lugar abrangido pelo concurso que a sua pretensão de discussão da legalidade da deliberação de graduação dos candidatos ao concurso e a sua suspensão, com pedido de alteração da ordem de graduação e, bem assim, de antecipação do juízo nos termos do art. 121.º do CPTA, se torne inútil supervenientemente.
V. Independentemente dum juízo de procedência ou não quanto ao objeto pretensivo formulado pela requerente cautelar temos, pois, que os factos que nos autos, entretanto, “vieram a lume” não geram ou comportam quaisquer implicações em termos do desaparecimento do objeto do processo ou da perda de interesse por parte daquela no prosseguimento da lide cautelar e mesmo na lide principal que permanecem incólumes, inclusive até pela relevância que, face ao disposto no art. 61.º, n.º 2, al. c), do ETAF, as anteriores graduações em concursos assumem em futuro concurso, motivação pela qual importaria concluir, como se fez na decisão recorrida, pela improcedência da questão prévia em epígrafe dado não assistir razão às recorrentes na questão que deduziram.”
Pelo que, não se pode concluir pela inexistência de interesse em agir nesta parte.
Improcede, pois, a questão prévia suscitada.

4.DA PROVIDÊNCIA CAUTELAR DE SUSPENSÃO DE EFICÁCIA
Na sequência da decisão do Pleno desta Secção que concedeu provimento ao recurso da decisão da secção que antecipara a decisão da causa principal após ter conhecido da questão da inutilidade superveniente da lide suscitada pela recorrida, cumpre aferir dos pressupostos da suspensão de eficácia da deliberação do «CSTAF», datada de 10.12.2013, que homologou a lista de graduação do concurso aberto por aviso nº 15821/2012, publicado no DR 2ª série, de 23/11/201, para o provimento de uma vaga de juiz desembargador na Secção de Contencioso Administrativo do TCA/S, bem como das vagas que, entretanto, ocorram e das que, no período de validade do concurso, venham a ocorrer na Secção de Contencioso Administrativo dos TCA’s, Norte e Sul, assim como da deliberação do «CSTAF» que nomeou a candidata colocada em 01.º lugar do citado concurso como juíza desembargadora, com vista a assegurar utilidade à ação principal de impugnação da legalidade daquelas deliberações.
E, ainda da intimação do «CSTAF» a “alterar provisoriamente a graduação no concurso”.
Comecemos, então, por aferir se procede a questão da suspensão de eficácia da referida deliberação de 10/12/013.

4.1.Invoca a requerente que deve ser concedida a providência nos termos do art. 120º nº1 al. a) do CPTA por ser evidente a procedência da pretensão face à manifesta ilegalidade das deliberações recorridas, nomeadamente face à manifesta ilegalidade na avaliação do factor i) “ o prestígio profissional e cívico corresponde ao exercício específico da função”, à falta de fundamentação por motivação deficiente e à manifesta ilegalidade por dispensa de audiência prévia.
Dispõe o art. 120º al. a) do CPTA que as providências cautelares são adoptadas “Quando seja evidente a procedência da pretensão formulada ou a formular no processo principal, designadamente por estar em causa a impugnação de ato manifestamente ilegal, de ato de aplicação de norma já anteriormente anulada ou de ato idêntico a outro já anteriormente anulado ou declarado nulo ou inexistente.
O que significa que nesta situação o fumus boni iuris adquire a máxima intensidade.
A providência é, assim, concedida independentemente de quaisquer outros pressupostos como sejam a ocorrência do periculum in mora ou a ponderação de interesses públicos e privados.
Estão aqui em causa “atos manifestamente ilegais”, após sumária demonstração de evidência da procedência da ação principal, impondo-se, por isso, repor rapidamente a legalidade.
Estamos perante uma situação excecional que se acentua quando estejam imputados ao ato vícios formais já que neste caso o vício pode tornar-se irrelevante e ser possível o aproveitamento do ato.
Independentemente de não estarem aqui em causa vícios graves, qualificando-se como tais, aqueles que se concretizam na lesão insuportável dos valores protegidos pelo direito administrativo e que por isso implicam a nulidade do ato, e de ser questionável se só relativamente a estes se reporta a manifesta procedência da ação a que alude esta alínea a) do art. 120º do CPTA, não podemos esquecer que não faz parte do âmbito deste processo o conhecimento dos vícios da ação principal, sob pena de esta perder o objecto e de se estar a transformar um processo cautelar urgente num processo principal sem as garantias que só este pode assegurar.
Reporta-se, antes, este preceito àquelas situações em que ao juiz, e sem necessidade de grandes estudos ou averiguações e numa imediatez evidente, se afigure ao primeiro olhar, incontroverso, patente e evidente, ser a ação manifestamente procedente.
O que não é, manifestamente, o caso, bastando atentar nas posições jurídicas manifestadas pelas intervenientes na petição e contestação.
Neste mesmo sentido se disse no Ac. do Pleno 037/14 de 03/19/2015 a propósito da falta de pressupostos para antecipação da causa, neste mesmo processo:
“ ..Ora a causa ainda não se mostrava, naquele momento, suficientemente “madura” para efeitos da sua decisão final, impondo-se que o juízo da causa principal venha a ter lugar não no âmbito do processo cautelar mas no da ação administrativa especial já instaurada para esse efeito, enquanto sede própria e regra para a emissão daquele juízo de mérito.”
Em suma, as questões a conhecer no âmbito da ação principal não são tão líquidas e evidentes como imputa a requerente, antes exigindo uma análise que não é só por si de uma evidência indiscutível compatível com a simplicidade de um processo urgente, ficando prejudicada a possibilidade de percepção do ato como "manifestamente ilegal" ou de "evidente" a eventual procedência da ação principal.

Efetivamente da argumentação de ambas as partes é perceptível que a questão não é líquida e que se impõe um estudo que não é compatível com a análise perfunctória que um cautelar exige.

É que, em sede de apreciação do critério de decisão constante da alínea a) do n.º 1 do artigo 120.º do CPTA, a análise dos vícios apontados ao ato administrativo praticado traduz-se numa apreciação sumária ou perfunctória, que se prende com a necessidade de evitar a antecipação sobre o juízo final da causa, que deve ser decidido em sede própria e não no âmbito cautelar, sob pena de inutilidade do processo principal, que passaria a ser reduzido à condição de confirmação ou não do juízo de legalidade ou ilegalidade proferido no processo cautelar.

Assim, no caso dos autos, e tal como se decidiu no Pleno quando revogou a decisão que antecipou o conhecimento da causa principal ainda é prematuro o conhecimento das ilegalidades suscitadas, antes se impondo que o processo principal prossiga os seus normais trâmites.
Impondo-se a necessidade da indagação dos vícios imputados por não estarmos perante uma situação de absoluta liquidez quanto à procedência de algum dos vícios invocados, tal como resulta, desde logo, das posições veiculadas por ambas as partes, não pode retirar-se a conclusão do critério de evidência consagrado na alínea a) do nº1 do artº 120º do CPTA, enquanto critério de decisão cautelar. Não ocorrem, pois, os pressupostos exigidos pela al.a) do art. 120º do CPTA para concessão da providência.

4.2. Vejamos, agora, os restantes pressupostos do art. 120º nº1 al. b) do CPTA.
O requisito do fumus boni iuris a que alude a al. b) do art. 120º do CPTA tem a ver com a aparência do direito da aqui requerente.
Assim, para que o tribunal possa dar como verificado este requisito, torna-se necessário que inexistam circunstâncias que impeçam o conhecimento de mérito do pedido formulado ou a formular no processo principal, e que exista aparência do direito quanto ao mérito da pretensão.
No caso verifica-se o pressuposto do fumus boni iure pelo que cumpre aferir se estão preenchidos os restantes pressupostos para o deferimento da providência cautelar.
Como refere o legislador o “periculum in mora” traduz-se no “fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar [ou ver reconhecidos] no processo principal”.
O Prof. Mário Aroso de Almeida diz “(...) se não falharem os demais pressupostos de que, nos termos do artigo 120º, depende a concessão da providência, ela deve ser concedida desde que os factos concretos alegados pelo requerente inspirem o fundado receio de que, se a providência for recusada, se tornará depois impossível, no caso de o processo principal vir a ser julgado procedente, proceder à reintegração, no plano dos factos, da situação conforme à legalidade. É este o único sentido a atribuir à expressão “facto consumado.”
Nestas situações, em que a providência é necessária para evitar o risco de infrutuosidade da sentença a proferir no processo principal, o critério deixa, pois, de ser o da susceptibilidade ou insusceptibilidade da avaliação pecuniária dos danos, para passar a ser o da viabilidade do restabelecimento da situação que deveria existir se a conduta ilegal não tivesse tido lugar.
Do ponto de vista do periculum in mora, a providência também deve ser, entretanto, concedida quando, mesmo que não seja de prever que a reintegração, no plano dos factos, da situação conforme à legalidade se tornará impossível pela mora do processo, os factos concretos alegados pelo requerente inspirem o fundado receio da produção de “prejuízos de difícil reparação” no caso de a providência ser recusada, seja porque a reintegração no plano dos factos se perspectiva difícil, seja porque pode haver prejuízos que, em qualquer caso, se produzirão ao longo do tempo e que a reintegração da legalidade não é capaz de reparar ou, pelo menos, de reparar integralmente....” (in: “O Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos”, 3ª edição revista e atualizada, págs. 293 e segs., em especial, págs., págs. 299 e 300).
A questão da existência de periculum in mora terá, assim, que ver com a maior ou menor dificuldade no restabelecimento da situação que deveria existir se a conduta ilegal não tivesse tido lugar, devendo o juiz ponderar as circunstâncias concretas do caso em função da utilidade da sentença e não decidir com base em critérios abstractos.
No caso sub judice, invoca a requerente uma situação de facto consumado e prejuízo sério na imagem e dignidade que se exige ao tribunal quer ao nível da imagem da candidata quer em termos de organização interna.
E que, a manutenção do status acarreta indefinição total no processo principal, que pode ser longo, na situação das candidatas colocadas em 1º e 2º lugar.
Na aferição deste requisito têm que se considerar todos os prejuízos relevantes para os interesses do requerente, quer o perigo respeite a interesses públicos, comunitários ou colectivos, quer estejam em causa apenas interesses individuais.
E, constitui-se uma situação de facto consumado quando seja impossível a reintegração específica da esfera jurídica do lesado, tendo por referência a situação jurídica e de facto existente para este no momento da respectiva lesão competindo à requerente o ónus de alegar a matéria de facto integradora dos requisitos legais de que depende a concessão da providência requerida (art. 342.º do CC), não podendo o tribunal substituir-se ao mesmo.
Ora, quanto à questão do facto consumado não nos parece que a mesma ocorra já que, na altura da interposição da providência cautelar, a requerente já estava a exercer as funções de desembargadora, como auxiliar, como resulta de XXVIII da matéria de facto, mas foi entretanto nomeada juíza desembargadora do TCAS, por ter ocorrido vaga no período de validade do concurso.
O que significa que estão, neste momento, ambas (requerente e contra-interessada graduada em 1º lugar) a exercer as mesmas funções a título efetivo.
Assim, no caso de vir a proceder o pedido de anulação da deliberação de 10/12/2013 do CSTAF, este, após trânsito em julgado da decisão anulatória, ver-se-á obrigado a reconstituir a situação jurídica de acordo com a legalidade, tendo por referência a situação que existiria se o ato anulado não tivesse sido praticado, nos termos do art. 173º, 1 do CPTA.
Neste caso será suprimida da ordem a ordem jurídica a referida deliberação impondo-se a correção da graduação que resultar depois de supridas as ilegalidades existentes, sendo, se for o caso disso, reposta a requerente como 1ª graduada do concurso com as inerentes consequências daí decorrentes, como a de que tudo se passará como se tivesse sido graduada em 1º lugar no referido concurso.
Por outro lado, não se vê de que forma esperar pela prolação da decisão na ação administrativa especial instaurada, e com isso a existência de uma situação de indefinição quanto às candidatas colocadas em 1º e 2º lugar no concurso aberto para o provimento de uma vaga de juiz desembargador na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul, implicará prejuízo de difícil reparação.
Desde logo ambas as interessadas exercem o mesmo tipo de funções (como efetivas apesar de aquando da interposição da petição a aqui requerente a título de auxiliar), e a decisão que decidir a título definitivo a questão aqui em causa reporá a legalidade tal como se o ato ilegal não tivesse sido praticado.
Por outro lado a alegada indefinição da situação sempre se manteria até à decisão definitiva da ação administrativa especial quer se suspenda ou não a deliberação do CSTAF.
A indefinição é inerente à controvérsia judicial e as decisões dor órgãos máximos como é o caso do CSTAF não foge à regra sem que por isso ocorra qualquer imagem prejudicial ao funcionamento das instituições, bem pelo contrário.
Pelo que, não se percebe que prejuízos irreparáveis possam advir para a requerente caso o ato não seja suspenso (prejuízos que nem sequer estão invocados) e não seja intimada a entidade requerida a inverter a “alterar provisoriamente a graduação no concurso”, assim como a determinar a suspensão do exercício de funções como juíza desembargadora da contra-interessada colocada em 1.º lugar.
Nem se vê de que forma a inversão das posições entre a 1ª e 2ª graduadas no concurso aqui em causa, ou seja contra-interessada X…………. e requerente Z………….., vai acautelar qualquer indefinição total da situação profissional das candidatas, já que a situação será sempre de indefinição até decisão final, mantenha-se ou suspenda-se o ato.
E, nem o decretamento da suspensão ou o indeferimento da mesma interfere com qualquer imagem e dignidade quer da interessada quer da contra-interessada quer da magistratura.
Pelo que, nenhum dos prejuízos invocados são suscetíveis de se reconduzirem à situação de prejuízo de difícil reparação tendo em conta a argumentação da requerente.
Em suma, não está preenchido o requisito do “periculum in mora”, por não estar em causa uma situação de risco fundado da constituição de uma situação de facto consumado por ser impossível a reintegração no plano dos factos da situação conforme à legalidade uma vez decidido o processo principal com decisão favorável à pretensão da requerente e, por outro, da provável existência de risco de ocorrência de prejuízos de difícil reparação por não haver prejuízos para os interesses da requerente ou de outros, já produzidos ou a produzir ao longo do tempo, e cuja reintegração da legalidade não é possível reparar ou reparar integralmente.
Não ocorrendo, desde logo, o requisito do prejuízo de difícil reparação, fica prejudicado o conhecimento do requisito de ponderação de interesses e dos pedidos formulados em consequência.
*
Em face de todo o exposto acordam os juízes deste STA em julgar improcedentes os pedidos formulados neste processo cautelar.
Custas pela requerente.
R. e N.
Lisboa, 18 de Junho de 2015. – Ana Paula Soares Leite Martins Portela (relatora) – António Bento São Pedro – Alberto Acácio de Sá Costa Reis.