Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0460/14
Data do Acordão:07/02/2014
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ANA PAULA LOBO
Descritores:CONCURSO
CONTRA-ORDENAÇÃO
CÚMULO JURÍDICO
CUMULO MATERIAL
QUESTÃO PREJUDICIAL
SUSPENSÃO
OPOSIÇÃO
Sumário:I – De 2001 e 2009 e após 2011, o artigo 25º do RGIT manda sancionar o concurso de contra-ordenações através do sistema do cúmulo material, tendo este sistema sido o do cúmulo jurídico em 2009 e 2010.
II – Formulado o pedido de apensação dos diversos processos de contra-ordenação e realização de cúmulo de coimas, perante o Chefe do Serviço de Finanças que o indeferiu e estando pendente de recurso tal decisão de indeferimento, que será inviabilizada, total ou parcialmente pelo cumprimento da decisão que aplicou a coima sem realização de cúmulo, apresenta-se a decisão do referido recurso como questão prejudicial no processo de oposição à execução, a determinar a suspensão dos seus termos até que seja ali proferida decisão, com trânsito em julgado, ao abrigo do disposto no artº 279º, nº 1 do Código de Processo Civil ex vi do artº 2º do Código de Procedimento e Processo Tributário.
Nº Convencional:JSTA000P17744
Nº do Documento:SA2201407020460
Data de Entrada:04/14/2014
Recorrente:A... SA
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Recurso Jurisdicional
Decisão recorrida – Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro
. de 21 de Janeiro de 2014


Acordam nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:


A…………….., SA, veio interpor o presente recurso da sentença supra mencionada, proferida no âmbito do processo de oposição n.º 762/10.7BEAVR à execução fiscal n.º 0132201001014536, tendo, para esse efeito formulado, a final da sua alegação, as seguintes conclusões:

1. Como resulta do documento n.º 3 junto com as alegações de fls… dos autos, a recorrente impugnou judicialmente no Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro a decisão da administração fiscal que indeferiu a sua pretensão de aplicação do regime de cúmulo jurídico das coimas que concretamente lhe foram aplicadas, coimas essas que são a causa de pedir da presente execução e cujo pagamento coercivo a administração fiscal, por via dela, pretende obter.

2. Sobre tal impugnação judicial ou recurso não recaiu, ainda, decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro.

3. Caso o Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro atenda a pretensão da recorrente nesse recurso, virá a ser aplicada à recorrente uma coima única para punição das infracções em que incorreu, em razão da aplicação do regime do cúmulo jurídico às coimas exequendas.

4. A ser assim, não pode afirmar-se, por ora e até decisão sobre a impugnação judicial aludida, que as coimas exequendas são exigíveis.

5. O recurso da decisão da administração fiscal que indeferiu a aplicação do regime do cúmulo jurídico às coimas exequendas é prejudicial em relação à presente oposição à execução, na medida em que a decisão ali proferida poderá implicar a aplicação de uma coima única de valor diverso do somatório das coimas exequendas, alterando, consequentemente, a causa de pedir da execução dos autos.

6. Nessa conformidade, impunha-se a suspensão da presente oposição à execução até prolação de decisão judicial sobre o recurso referido, nos termos que resultam do disposto no artigo 272º, n.º 1 do CPC, disposição que a Mm.ª Juíza violou ao decidir julgar improcedente a oposição à execução.

7. Por força do disposto, no artigo 3º, n.º 2 do RGCOC para que a recorrente possa beneficiar do regime do cúmulo jurídico das coimas, em concreto o mais favorável dos regimes em confronto, não pode, de todo, pagar as coimas, ou seja, não pode cumprir as sanções aplicadas, porquanto, caso tal pagamento venha a suceder, retirará efeito útil ao recurso entretanto intentado.

8. A sentença proferida, na medida em que “obriga” a recorrente a pagar as coimas, nega-lhe a possibilidade de vir a beneficiar da aplicação do regime do cúmulo jurídico das coimas.

Sem prescindir,
9. Ao recurso da decisão de indeferimento de realização do cúmulo jurídico das coimas intentado pela recorrente é aplicável o regime constante dos artigos 80º e ss. do RGIT.

10. A dedução de impugnação judicial tem efeito suspensivo relativamente às decisões recorridas, por força do disposto no artigo 88º, n.º 1 do RGCO e no artigo 408º, n.º 1, al. a) do CPP, aplicável ex vi artigos 3º, al. b) do RGIT e 41º, n.º 1 do RGCO.

11. Na medida em que a procedência ou improcedência do recurso da decisão de indeferimento de realização de cúmulo jurídico das coimas poderá ou não, respectivamente, afectar as decisões de aplicação das coimas à recorrente, tal efeito suspensivo deverá ser-lhe extensivo.

12. Ao decidir pela improcedência da oposição à execução sem, ao invés, declarar a suspensão das decisões de aplicação das coimas exequendas, violou a Mm.ª Juíza “a quo” o disposto no artigo 88º, n.º 1 do RGCO e no artigo 408º, n.º 1, al. a) do CPP.

Nestes termos e nos melhores de Direito, deve ser proferido acórdão que revogue a douta sentença recorrida e determine a suspensão da presente oposição à execução até prolação de decisão pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro sobre o recurso da decisão da administração fiscal que indeferiu a aplicação do regime do cúmulo jurídico às coimas exequendas, assim se fazendo JUSTIÇA!

Requereu que seja revogada a sobredita sentença e determinada a suspensão da presente oposição à execução até prolação de decisão pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro sobre o recurso da decisão da administração fiscal que indeferiu a aplicação do regime do cúmulo jurídico às coimas exequendas.

Foi emitido parecer pelo Magistrado do Ministério Público no sentido da procedência parcial do recurso.

Mostram-se provados, os seguintes factos com relevo para a decisão do presente recurso:

A. Em 11 de Maio de 2010, foi, no Serviço e Finanças de Oliveira de Azeméis, instaurado contra a Oponente o processo de execução fiscal n.º 0132201001014536, para cobrança coerciva de dívidas referentes a coimas e encargos de processos de contra-ordenação, no montante global de € 79.010,73 (cf. fl. 3, e fl. 23);

B. O processo de execução fiscal referido na letra anterior teve por base as certidões de dívida constantes de fls. 24 e segs;

C. Em 17 de Maio de 2010, a Oponente foi citada para o processo de execução fiscal (cf. fl. 23, e fls. 34 e 35);

D. Em 7 de Junho de 2010, a Oponente deduziu recurso das decisões de aplicação das coimas (cf. fl. 22, e fl. 23);

E. Em 16 de Junho de 2010, a Oponente deduziu a presente oposição à execução fiscal (cf. fls. 4);

F. Em 23 de Novembro de 2011, foi proferida sentença no recurso de contra-ordenação que correu termos neste tribunal e unidade orgânica sob o n.º 921/10.2BEAVR, com o seguinte teor essencial (cf. consulta no SITAF): “A………………., S.A., NIPC …………., com sede no Lugar …………, ……………-UL, veio em 07/06/2010, interpor recurso judicial da coima única de €10 853, 45, com custas de € 51,00, que lhe foi aplicada no uso de competência delegada do Director de Finanças de Aveiro em 12/03/2010, por entregas fora de prazo de imposto retido na fonte nos montantes de €52 481, 20 e €457, 95 e respeitantes a IRC, IRS e Imposto de Selo, de acordo com os artigos 88° nº 6 do CIRC, 98º do CIRS e 26º nº 4 e 114º nºs 2, 3 e 4 do RGIT (fls. 4 a 20 dos Autos). Do teor do Autos emerge que a decisão proferida foi notificada por carta registada efectivamente recebida pela Recorrente em 25/03/2010, constando daquela expressamente que o recurso judicial deveria ser interposto no prazo de 20 dias previsto nos artigos 79º nº 2 e 80º do Regime Geral das Infracções Tributárias. E que o mesmo decorreria após prazo de 15 dias para pagamento da coima reduzida a 75%, conforme o artigo 78º nºs 1 e 2 do Regime Geral das Infracções Tributárias (fls. 14 dos Autos). O recurso em causa foi apresentado em 07/06/2010 (fls. 31 e seguintes dos Autos). Nos termos do art. 80º nº 1 do Regime Geral das Infracções Tributárias o recurso deve ser apresentado no Serviço Tributário onde tiver sido instaurado o processo de contra-ordenação no prazo de 20 dias após a notificação da coima. Constituindo-se assim como data limite para a respectiva interposição, e de acordo com as datas de notificação e apresentação supra indicadas, o dia 24/05/2010, prazo que não foi respeitado pela Recorrente. Decorre do art. 3º al. b) do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT) que às contra-ordenações é aplicável subsidiariamente o regime geral do ilícito de mera ordenação social (Regime Geral das Contra Ordenações), diploma aprovado pelo D.L. 433/82, de 27 de Outubro. E nos termos do artigo 63º nº 1 do Regime Geral das Contra-Ordenações que «O juiz rejeitará, por meio de despacho, o recurso feito fora do prazo ou sem respeito pelas exigências de forma». Assim, nos termos das disposições supra referidas, rejeito o recurso pela sua manifesta extemporaneidade”;

G. A sentença referida na letra anterior foi notificada à Oponente em 4 de Janeiro de 2012 (cf. consulta no SITAF);

H. Em 20 de Fevereiro de 2012, a Oponente requereu ao Chefe do Serviço de Finanças de Oliveira de Azeméis “que seja organizado um único processo que agrupe todos os processos de contra-ordenação supra identificados e seja efectuado o cúmulo jurídico das sanções aplicadas à arguida”, considerando, entre o mais, que “(o) facto de as decisões tomadas nos processos de contra-ordenação em causa se terem tornado definitivas, porque não tempestivamente atacadas, como considerou o Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, não impede que se faça presentemente o cúmulo jurídico das sanções” (cf. fls. 76 e segs).

Questões objecto de recurso

1- questão prejudicial que determina a suspensão da instância executiva – cúmulo das coimas-.

Tentando reordenar a matéria de facto provada em termos cronológicos temos a considerar o seguinte:
1- Em 12/03/2010 foi proferida decisão administrativa que condenou a recorrente na coima única de €10 853, 45.
2- Tal decisão foi notificada por carta registada efectivamente recebida pela Recorrente em 25/03/2010.
3- Constava daquela notificação (2), expressamente, que o recurso judicial deveria ser interposto no prazo de 20 dias previsto nos artigos 79º nº 2 e 80º do Regime Geral das Infracções Tributárias.
4- O recurso judicial de impugnação daquela decisão administrativa foi apresentado em 07/06/2010 (fls. 31 e seguintes dos Autos) no Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro e correu seus termos sob o n.º 921/10.2BEAVR.
5- Tal recurso foi rejeitado pela sua manifesta extemporaneidade em 23 de Novembro de 2011.
6- A sentença referida no número anterior foi notificada à Oponente em 4 de Janeiro de 2012 (cf. consulta no SITAF);
7- Em 20 de Fevereiro de 2012, a Oponente requereu ao Chefe do Serviço de Finanças de Oliveira de Azeméis “que seja organizado um único processo que agrupe todos os processos de contra-ordenação supra identificados e seja efectuado o cúmulo jurídico das sanções aplicadas à arguida”. Tal pedido foi indeferido. Desta decisão de indeferimento foi interposto recurso judicial ainda não decidido.

8- Em 11 de Maio de 2010, foi, no Serviço e Finanças de Oliveira de Azeméis, instaurado contra a Oponente o processo de execução fiscal n.º 0132201001014536, para cobrança coerciva de dívidas referentes a coimas e encargos de processos de contra-ordenação, no montante global de € 79.010,73 (cf. fl. 3, e fl. 23);

9- Em 17 de Maio de 2010, a Oponente foi citada para o processo de execução fiscal (cf. fl. 23, e fls. 34 e 35);

10 - Em 16 de Junho de 2010, a Oponente deduziu a presente oposição à execução fiscal.

A recorrente juntou a fls. 21 e 22, certidão com data do dia 28 de Junho de 2010, onde é certificado que: “Sujeito Passivo A……………….., SA, NIPC …………, é arguida nos Processos de Contra-Ordenação 0132200906040810, no qual foi fixada a coima no valor de € 5.763,18, 0132200906040870, no qual foi fixada a coima no valor de € 10.853,45, 0132200906041116, no qual foi fixada a coima no valor de € 6.938,60, 0132200906041132, no qual foi fixada a coima no valor de € 7.176,62, 0132200906041191, no qual foi fixada a coima no valor de € 7.621,07, 0132200906041272, no qual foi fixada a coima no valor de € 7.002,67, 0132200906041337, no qual foi fixada a coima no valor de € 6.811,44, 0132200906041469, no qual foi fixada a coima no valor de € 7.500,58, 0132200906041540, no qual foi fixada a coima no valor de € 6.376,42, 0132200906041558, no qual coima no valor de € 12.202,09, 0132200906041680, no qual foi fixada a coima no valor de € 6.652,26 e 0132200906041698, no qual foi fixada a coima no valor de € 12.802,37, os quais se encontram extintos por Extracção de certidão de dívida. Mais CERTIFICO que o Sujeito Passivo em causa apresentou neste Serviço de Finanças em 07/06/2010 Recurso das Decisões de Aplicação das Coimas”.

A recorrente nas alegações escritas de fls. 70 e segs., invoca, a título de “questão prévia – factos supervenientes”, em síntese, o seguinte: “(e)m 20.02.2012, a oponente apresentou requerimento à administração tributária pelo qual pediu que fosse organizado um único processo que agrupe todos os processos de contra-ordenação referidos em 3 e 5 da petição inicial de oposição à execução de fls. e que fosse efectuado o cúmulo jurídico das coimas que lhe foram aplicadas”; “(s)obre tal requerimento recaiu decisão do Sr. Director de Finanças de Aveiro que indeferiu a pretensão da arguida”;
“(d)e tal decisão recorreu a oponente para esse Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, apresentando no órgão de execução fiscal e, simultaneamente, entidade administrativa decisora dos processos contra-ordenacionais”; “(s)obre tal impugnação judicial ainda não recaiu qualquer decisão”; “(n)o recurso judicial em causa, a oponente sustenta que a decisão da administração tributária referida em 2. supra deve ser substituída por outra decisão judicial que proceda ao cúmulo jurídico das infracções pelas quais a oponente foi condenada (as constantes de 5 da p.i. de oposição à execução), aplicando-se-lhe coima única no montante de € 12.802,37, correspondente ao valor mínimo previsto nos artigos 114°, n.º 2, 25°, n.º 2 e 26º, nº 1 al. b) do RGIT, ou, quando assim se não entenda, deve aquela decisão ser substituída por outra que imponha à administração tributária a realização do cúmulo jurídico das coimas aplicadas à oponente de acordo com os preceitos legais citados”; “(a) ser procedente a pretensão da oponente no aludido recurso Judicial, as coimas exequendas não serão devidas” (cf. artigos 1.º a 6.º das alegações), dando “por reproduzidas as considerações acima tecidas a propósito da exequibilidade (ou falta dela) das decisões de aplicação de coimas à oponente” (cf. artigo 19.º das alegações), pugnando, a final, “que deve ser julgada procedente a oposição à execução e, consequentemente, declarada extinta a presente execução” (cf. artigo 21.º das alegações).

Por força do disposto no art.º 148.º, n.º 1 do CPPT, o processo de execução fiscal abrange, nomeadamente, a cobrança coerciva das seguintes dívidas:
a) Tributos, incluindo impostos aduaneiros, especiais e extra fiscais, taxas e demais contribuições financeiras a favor do Estado, adicionais cumulativamente cobrados, juros e outros encargos legais;
b) Coimas e outras sanções pecuniárias fixadas em decisões, sentenças ou acórdãos relativos a contra-ordenações tributárias, salvo quando aplicadas pelos tribunais comuns”.

Constitui fundamento de oposição a integrar na alínea i) do art. 204.º do Código de Procedimento e Processo Tributário a inexigibilidade da dívida exequenda, definitiva ou temporária, desde que não envolva apreciação da legalidade da dívida ou interferência em matéria da exclusiva competência da entidade que houver extraído o título, podendo conduzir à extinção ou suspensão da execução fiscal.
Nos termos do disposto no art. 162.º, al. b) do CPPT constitui título executivo, podendo servir de base à instauração de execução fiscal a certidão de decisão proferida em processo de aplicação de coimas desde que essa decisão de aplicação da coima seja exequível, atributo que dispõem apenas as decisões proferidas pelos tribunais tributários ou pelas autoridades administrativas que se tornem definitivas, quer pelo trânsito em julgado, no que àquelas diz respeito, quer pela não interposição de recurso judicial, quanto a estas.
Verifica-se que a decisão administrativa foi objecto de recurso, daí a sua ausência de definitividade. Tendo o recurso dela interposto sido rejeitado, por extemporaneidade, formou-se, então, com esta decisão, na data do seu trânsito título exequível.
O processo de execução fiscal foi instaurado com base na decisão administrativa em 11 de Maio de 2010.
A decisão que julgou extemporâneo o recurso data de 23 de Novembro de 2011, havendo dela sido notificada a oponente, aqui recorrente em 4 de Janeiro de 2012.
Manifesto é que à data de instauração da execução fiscal não havia título executivo bastante para a instaurar.
De 2001 e 2009 e após 2011, o artigo 25º do RGIT manda sancionar o concurso de contra-ordenações através do sistema do cúmulo material, tendo este sistema sido o do cúmulo jurídico em 2009 e 2010.
O sistema do cúmulo jurídico, quando o concurso de infracções não é detectado antes da sentença, pressupõe a determinação das coimas relativas a cada uma das infracções, através de decisão ou decisões transitadas em julgado (artigo 78º, nº 2, do Código Penal, subsidiariamente aplicável, nos termos dos artigos 3.º, alínea b), do RGIT e 41º, nº 1, do Regime Geral das Contra-ordenações).
A oponente/recorrente requereu que fosse proferida decisão de aplicação de uma única coima, pretensão que foi indeferida pela administração tributária encontrando-se a aguardar decisão o recurso que sobre foi interposto.

Como resulta dos elementos documentais constantes dos autos relativamente a várias dessas infracções o artigo 25º do RGIT vigente à data, previa a punição em cúmulo jurídico.
À data da prática de várias dessas contra-ordenações - data limite para entrega da prestação tributária em falta, o art. 25º do RGIT dispunha o seguinte [na redacção dada pelo art. 113º da Lei nº 64-A/2008, de 31/12 (OE 2009), em vigor desde 1/1/2009]:
«1 - Quem tiver praticado várias contra-ordenações é punido com uma coima cujo limite máximo resulta da soma das coimas concretamente aplicadas às infracções em concurso.
2 - A coima aplicável não pode exceder o dobro do limite máximo mais elevado das contra-ordenações em concurso.
3 - A coima a aplicar não pode ser inferior à mais elevada das coimas concretamente aplicadas às várias contra-ordenações».
Bem certo que a Lei nº 55-A/2010, de 31/12 (OE 2011) introduziu nova redacção ao mesmo normativo «As sanções aplicadas às contra-ordenações em concurso são sempre objecto de cúmulo material», mas, haverá sempre que ter em conta o disposto nos nºs. 1 e 2 do art. 3º do DL nº 433/82, de 27/10 (RGCO) que se apresenta como regime subsidiário relativamente ao RGIT (cfr. a al. b) do art. 3º deste): «1 - A punição da contra-ordenação é determinada pela lei vigente no momento da prática do facto ou do preenchimento dos pressupostos de que depende» e «2 - Se a lei vigente ao tempo da prática do facto for posteriormente modificada, aplicar-se-á a lei mais favorável ao arguido, salvo se este já tiver sido condenado por decisão definitiva ou transitada em julgamento e já executada».
Assim, mesmo que seja discutível se deverá ser aplicado o cúmulo jurídico ou o cúmulo material a todas ou a parte das infracções indicadas pela recorrente, não há dúvida que um cúmulo de coimas haverá de ser efectuado e, tal pedido encontra-se pendente de decisão judicial.
Tendo em conta que o cúmulo jurídico só deixa de ser possível se o arguido já tiver sido condenado por decisão definitiva ou transitada em julgado e já executada, é, neste momento abstractamente possível proceder ao referido cúmulo jurídico, por a decisão não ter sido ainda executada.
Tanto quanto se pode recolher dos autos o concurso de infracções não foi detectado antes da sentença, estando nós em presença de um cúmulo jurídico superveniente que pressupõe a determinação das coimas relativas a cada uma das infracções, através de decisão ou decisões transitadas em julgado (nº 2 do art. 78º do Código Penal, subsidiariamente aplicável, nos termos dos arts. 3º, al. b), do RGIT e 32º do RGCO).
Pelo menos relativamente à contra-ordenação em causa nestes autos há já caso julgado, sendo de admitir, com elevado grau de probabilidade, atentas as datas dos processos, que o mesmo se verifica quanto às demais contra-ordenações, como indica a recorrente o que configura um cúmulo jurídico superveniente.
O art. 78º do Código Penal permite a formação do cúmulo jurídico das penas, sempre que se descubram infracções anteriores que formam uma acumulação com a já julgada, sem que a pena esteja totalmente expiada, ou quando se verifique que não fora feito o cúmulo jurídico das diversas penas por crimes que formam uma acumulação de infracções (cfr. Maia Gonçalves, Código Penal Português, Anotado e comentado, 14ª edição, Almedina, 2001, anotação 2 ao art. 78º, p. 266).
O pedido de efectivação de cúmulo jurídico que se encontra pendente de decisão judicial poderá resultar numa alteração do montante da dívida que consta de cada um desses títulos pela revogação dos actos administrativos de aplicação de cada uma das coimas parcelares com fundamento na aplicação de uma coima única por força da aplicação do regime do cúmulo jurídico às coimas parcelares subjacentes a cada um desses processos executivos, que, a ser julgado procedente levará à emissão de um novo título executivo com a nova pena (única) aplicada, com as inerentes consequências a nível dos processos de execução fiscal que se encontrem pendentes.
Não foi colocado, como entendeu o tribunal recorrido qualquer questão quanto a estarmos perante a prática continuada de uma mesma infracção, mas, diversamente, aceite a prática de uma pluralidade de infracções sancionadas, cada uma delas, com coimas distintas, e a necessidade de proceder ao cúmulo jurídico dessa pluralidade de condenações.
Segundo o Prof. Manuel de Andrade, Lições de Processo Civil, cv págs. 491 e 492, só existe verdadeira prejudicialidade e dependência quando na primeira causa se discute, em via principal, uma questão que é essencial para a decisão da segunda e que não pode resolver-se nesta em via incidental, mas (...) nada impede que se alargue a noção de prejudicialidade, de maneira a abranger outros casos, podendo considerar-se prejudicial, em relação a outro em que se discute a título incidental uma dada questão, o processo em que a mesma questão é discutida a título principal.
No mesmo sentido refere o Prof. José Alberto dos Reis in Comentário ao Código de Processo Civil, Vol. 3º, págs. 268 e 269, que “uma causa é prejudicial em relação a outra quando a decisão da primeira pode destruir ou modificar o fundamento ou a razão da segunda…” e que “sempre que numa acção se ataca um acto ou facto jurídico que é pressuposto necessário de outra acção, aquela é prejudicial em relação a esta”.
Formulado tal pedido de apensação dos diversos processos de contra-ordenação e realização de cúmulo de coimas em 20 de Fevereiro de 2012, perante o Chefe do Serviço de Finanças de Oliveira de Azeméis que o indeferiu e estando pendente de recurso tal decisão de indeferimento, que será inviabilizada, total ou parcialmente pelo cumprimento da decisão que aplicou a coima sem realização de cúmulo, apresenta-se a decisão do referido recurso como questão prejudicial neste processo, determinando a suspensão dos seus termos até que seja ali proferida decisão, com trânsito em julgado, ao abrigo do disposto no artº 279º, nº 1 do Código de Processo Civil ex vi do artº 2º do Código de Procedimento e Processo Tributário.

Deliberação

Termos em que acordam os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e determinar a suspensão do processo de execução até ser proferida decisão com trânsito em julgado no recurso apresentado contra a decisão que indeferiu o pedido de realização do cúmulo das coimas aplicadas à recorrente.

Sem custas.

Lisboa, 2 de Julho de 2014. – Ana Paula Lobo (relatora) – Dulce Neto –Ascensão Lopes.