Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01647/13
Data do Acordão:11/05/2014
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FONSECA CARVALHO
Descritores:RESPONSABILIDADE POR CUSTAS
Sumário:I – A figura da reversão é uma das formas da efectivação da responsabilidade subsidiária em sede de execução fiscal “ex vi” do disposto no n.º 1 do artigo 23 da LGT.
A responsabilidade subsidiária garante o pagamento da dívida tributária de outrem pelo que para a sua efectivação é necessário que se realize o pressuposto de facto determinante da obrigação do sujeito passivo – o chamado devedor originário – bem como o pressuposto de facto gerador da obrigação do responsável.
II – Daí que se tivermos em conta o instituto da responsabilidade subsidiária em direito fiscal, as circunstâncias da sua efectivação e o facto de a oposição em sede de execução fiscal dever ser entendida como uma verdadeira contestação à pretensão do exequente e ainda que a condenação em custas assenta no pressuposto de que as custas devem ser suportadas por quem a elas deu causa, não podemos deixar de considerar tendo a inutilidade da lide derivado do pagamento do devedor originário que é este e não o revertido o responsável pelo seu pagamento.
III – E isto porque sendo o devedor originário - o executado - e sendo ele que extingue a execução voluntariamente - estar obrigada também ao pagamento das custas deste processo de oposição “ex vi” do disposto no artigo 264 do CPPT.
Nº Convencional:JSTA000P18191
Nº do Documento:SA22014110501647
Data de Entrada:10/24/2013
Recorrente:A...
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

RELATÓRIO:

Inconformado com a sentença do TAF de Loulé que julgando extinta a instância por impossibilidade superveniente da lide condenou o oponente nas custas veio a oponente dela interpor recurso para o STA formulando as seguintes conclusões:
1 – A sentença recorrida na parte das custas enferma de ilegalidade por violação do disposto no artigo 450/3 e 4 “a contrario” do CPC.
2 – No dia 11 04 2012 foi instaurado o processo de execução fiscal nº 1139201012053 que correu termos no Serviço de Finanças de Tavira contra a devedora originária B……………… Ldª
3 – Em 06 de Julho de 2012 o processo referido em 2 reverteu contra o oponente ora recorrente.
4 – Subsequentemente o recorrente apresenta um requerimento de oposição à execução em face da reversão o qual deu origem aos presentes autos.
5 – Nesse requerimento a recorrente alegou e ofereceu prova documental e testemunhal relativa ao facto de a sociedade devedora originária ser proprietária de bens móveis e imóveis cujo valor venal era mais do que suficiente para pagar todas as dívidas fiscais.
6 – Efectivamente ao contrário do que vem explanado na informação do Serviço de Finanças de Tavira sobre os quatro imóveis aí identificados, património da devedora originária e que foram penhorados pela Fazenda Nacional os registos de aquisição a favor de terceiros eram provisórios e nunca chegaram a ser convertidos em definitivo.
7 – Tais registos não se tornaram definitivos em consequência das diligências da devedora originária junto dos promitentes-compradores aquando da constatação das penhoras sobre os ditos imóveis por parte da Fazenda Nacional.
8 – Sendo certo que então os mesmos se encontravam livres de ónus ou encargos para além das penhoras registadas a favor da Fazenda Nacional.
9 – O valor patrimonial global de tais imóveis ascende a cerca de € 315.060,00.
10 – Valor mais do que suficiente para garantir as dívidas fiscais da devedora originária,
11 – Em 22 de Maio de 2013 a devedora originária chegou a um acordo com a Fazenda Nacional para liquidar a quantia exequenda em sede de execução fiscal cfr despacho de 12 – Por ofício n.º 1139 /2973/2013 de 02 07 2013 o Serviço de Finanças de Tavira remeteu ao Tribunal a informação de que o processo de execução fiscal nº 1139201201012053 instaurado contra a devedora originária havia sido extinto por pagamento voluntário efectuado em 19 06 2013.
13 – No dia 19 de Junho de 2013 foi extinto o processo de execução fiscal que está na origem da presente oposição.
14 – Não fora o facto de a Fazenda Nacional ter indeferido todos os requerimentos apresentados pela devedora originária no sentido de voluntariamente pagar a dívida exequenda e as dívidas dos apensos e a execução nunca teria revertido contra o ora recorrente nem nunca teria ocorrido qualquer processo de oposição.
15 – A oposição teve por fundamento a suficiência patrimonial da devedora originária e o benefício de excussão prévia que assistia à oponente o que se verificou.
16 – A extinção dos presentes autos por inutilidade superveniente da lide foi determinada pelo tribunal “a quo” na sequência do acordo celebrado entre a Fazenda e a devedora originária em que a oponente não foi parte e a que foi estranha.
17 – A inutilidade superveniente não é facto imputável à oponente pelo que não terá de responder pelas correspondentes custas.
18 – A inutilidade da lide que se afigura nos presentes autos não pode ser imputada à oponente por não só não haver fundamento para a reversão mas por tal facto apenas ser imputável a quem gerou o facto que criou essa mesma impossibilidade
19 – O facto que gerou essa inutilidade foi o acordo celebrado entre a devedora originária e a Fazenda Nacional
20 – Não é assim de aplicar o nº 3 do artigo 450 do CPC porquanto foi a Fazenda que provocou a inutilidade por ter recorrido infundadamente à reversão e pelo acordo que celebrou com a devedora originária
21 – Sendo assim essa responsabilidade da FP tal responsabilidade pelas custas não pode ser imputável à recorrente
22 – A decisão viola o artigo 450 /3 do CPC

Deve dar-se provimento ao recurso revogar a sentença recorrida e condenar a F nas custas em crise.

Não houve contra alegações
O Mº Pº neste Tribunal pronuncia-se pela procedência do recurso
Colhidos os vistos cumpre decidir

FUNDAMENTAÇÃO

De facto:

Foi a seguinte matéria de facto que o Tribunal “a quo” deu como provada e não foi questionada pelas partes:
A – Em 11 04 2012 foi instaurado contra B…………….. Ldª o processo de execução fiscal n.º 1139201201012053 por dívidas de IRC e juros compensatórios no montante de € 1477,08 cfr folhas 189 a 191 dos autos.
B – Em 06 07 2012 foi proferido despacho de reversão contra o oponente A………………. do montante global da quantia exequenda.
C – Em 02 07 2013 a Chefe do Serviço de Finanças de Tavira proferiu despacho de extinção do processo de execução fiscal nº 1139201201012053 por pagamento voluntário em 19 06 2013 o que implicou a correspondente extinção da reversão nº 1129201238 contra os responsáveis subsidiários
D – O despacho referido em “C” foi junto aos autos através do ofício nº 1139/2973/2013 de 02 07 2013 cfr folhas 313 dos autos.

De direito

O Mº juiz perante a comprovação do pagamento voluntário da dívida ora revertida por parte do devedor originário julgou extinta a instância neste processo por inutilidade superveniente da lide e condenou o revertido nas custas desta oposição nos termos do artigo 450/ 3 do CPC
O oponente ora recorrente como se verifica das conclusões do recurso não se conforma com a condenação nas custas por considera que quem deu causa à acção foi a devedora originária e a própria Fazenda Nacional por serem essas entidades as intervenientes no acordo donde resultou a extinção da execução pelo que as custas da inutilidade lhes devem ser imputáveis

Quid juris
A figura da reversão é uma das formas da efectivação da responsabilidade subsidiária em sede de execução fiscal “ex vi” do disposto no n.º 1 do artigo 23 da LGT
A responsabilidade subsidiária garante o pagamento da dívida tributária de outrem pelo que para a sua efectivação é necessário que se realize o pressuposto de facto determinante da obrigação do sujeito passivo – o chamado devedor originário – bem como o pressuposto de facto gerador da obrigação do responsável
Efectivamente o responsável é a pessoa física ou jurídica ou mesmo entidade sem personalidade jurídica que por força da lei está adstrita ao pagamento das dívidas tributárias juntamente com os devedores principais sem que essa junção determine o afastamento destes ou a sua substituição por ocupação do seu lugar. Tratando-se de responsabilidade por dívidas de outrem esta responsabilidade é por força da lei subsidiária e só pode ser efectivada em sede de execução verificado que seja determinados pressupostos que a lei prevê
O que caracteriza o responsável é que “se trata de um terceiro mas que diferentemente do substituto não retira o devedor originário da relação tributária nem ocupa o lugar dele, antes se junta-se ao devedor originário, havendo assim dois devedores do tributo mas por motivos distintos e regime jurídico diferenciado” cfr Juan Martin Queral in Curso de Derecho Financiero y Tributário pp 331
É o que decorre, aliás, dos artigos 22, 23 e 24 da LGT e 159 do CPPT
Visando o processo de oposição a extinção da execução pela procedência de alguns dos fundamentos de oposição previstos no artigo 204 do CPPT poder-se-ia afirmar em consonância com o nº 1 do artigo 450 do CPC que sendo fundada a oposição e não tendo a oposição sido julgada por circunstâncias supervenientes que a condenação nas custas se enquadrava neste preceito e não mereceria reparo.
Todavia se tivermos em conta o instituto da responsabilidade subsidiária em direito fiscal, as circunstâncias da sua efectivação e o facto de a oposição em sede de execução fiscal dever ser entendida como uma verdadeira contestação à pretensão do exequente e ainda que a condenação em custas assenta no pressuposto de que as custas devem ser suportadas por quem a elas deu causa, não podemos deixar de considerar que no caso em apreço o responsável pelo seu pagamento não pode deixar de ser a devedora originária.
E isto até pelo facto de sendo a devedora originária - o executado - e sendo ela que extingue a execução voluntariamente - estar obrigada também ao pagamento das custas deste processo de oposição “ex vi” do disposto no artigo 264 do CPPT que assim preceitua:

“A execução extinguir-se-á se o executado pagar a dívida e o acrescido.”

O acrescido não pode deixar de compreender o pagamento das custas – custas do processo de execução e demais incidentes processuais nele ocorridos a que o incumprimento da sua obrigação der igualmente causa

Sustentar posição diferente não deixaria de atentar contra o princípio constitucional da justiça como refere também Jorge Lopes de Sousa In CPPT anotado 3ª edição pp 1150 e segs.
No sentido que propugnamos decidiu já esta Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo no acórdão de 12 03 2014 in processo 1645/13.

DECISÃO:


Por todo o exposto acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário em conceder provimento ao recurso, revogar a decisão recorrida na parte em que condenou o recorrente nas custas.
Sem custas.
Lisboa, 05 de Novembro de 2014. – Fonseca Carvalho (relator) – Dulce NetoAscensão Lopes.