Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0894/14
Data do Acordão:05/06/2015
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ASCENSÃO LOPES
Descritores:OPOSIÇÃO DE JULGADOS
Sumário:I – A existência de alçadas não prejudica o direito ao recurso para o Supremo Tribunal Administrativo nos termos previstos no nº 5 do art. 280º do CPPT.
II – Os requisitos desse recurso traduzem-se na necessidade de as decisões em confronto perfilharem «solução oposta» estando em causa o «mesmo fundamento de direito» e ocorrendo «ausência substancial de regulamentação jurídica», o que pressupõe, naturalmente, uma identidade dos factos subjacentes (que terão de ser essencialmente os mesmos do ponto de vista do seu significado jurídico) e uma identidade do regime jurídico aplicado (ainda que em invólucros legislativos diferentes), pois que sem essa identidade não será possível vislumbrar a emissão de proposições jurídicas opostas sobre a mesma questão fundamental de direito, nem se poderá atingir o fim visado com este tipo de recurso, que é o de assegurar o valor da igualdade na aplicação do direito.
III – Por força, primeiro do Decreto-Lei nº 637/76, de 29 de Junho, e, posteriormente, da Lei nº 97/88, de 17 de Agosto (art. 2º, nº 2) o inciso “aprovação ou licença” da Junta Autónoma das Estradas, constante do no art. 10º, nº 1, alínea b), do Decreto-Lei nº 13/71, de 23 de Janeiro, foi derrogado e desgraduado na emissão de parecer.
IV – Por força dos mencionados diplomas, o licenciamento da afixação e inscrição de mensagens de publicidade passou a ser atribuído de forma universal às câmaras municipais, na área do respectivo concelho, sem prejuízo da intervenção obrigatória, através da emissão do respectivo parecer, por parte de entidades com jurisdição exclusiva para defesa de interesses públicos específicos que têm de ser tidos em conta na emissão de licença final pelo respectivo município.
V – Assim sendo, depois da entrada em vigor daqueles diplomas a Z………, S.A., deixou de ter competência para licenciar a afixação de mensagens publicitárias, carecendo, por isso, de competência para tributar esse licenciamento.
Nº Convencional:JSTA000P18981
Nº do Documento:SA2201505060894
Data de Entrada:07/15/2014
Recorrente:Z......, S.A.
Recorrido 1:BANCO X....., S.A.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em conferência, nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1 – RELATÓRIO

O Banco X……., S.A., com os demais sinais dos autos, veio deduzir impugnação judicial contra o acto de indeferimento do recurso hierárquico deduzido por si, sobre as liquidações relativas a taxa de publicidade, no montante de € 908,64.

Por sentença de 11 de abril de 2014, o TAF de Almada julgou procedente a presente impugnação judicial.

Inconformada com o assim decidido, reagiu a Z…………., S.A. interpondo o presente recurso com as seguintes conclusões das alegações:

«1) Concretamente, Importa saber se a Z……… depois da entrada em vigor da Lei nº 97/88, tem competência para a liquidação de taxas de publicidade, nos termos da alínea j), do n.º 1, do artigo 15º, do Decreto Lei nº 13/71, de 23 de Janeiro, atualizado pelo Decreto-Lei nº 25/2004, de 24 de Janeiro.
2) À Z………, S.A., foi cometida a administração das infraestruturas rodoviárias nacionais que integram o domínio público rodoviário do Estado e que estejam em regime de afetação ao trânsito público e atribuídos poderes, prerrogativas e obrigações conferidos ao Estado, com o decorre das disposições conjugadas dos artigos 8º e 10º, do Decreto-Lei n.º 374/2007, de 7 de Novembro.
3) No que concerne à legalidade da taxa, face ao disposto nos artigos 1º e 2º, da Lei nº 97/88, de 17 de agosto — bem como ao disposto nos artigos 11º e 15º, do Decreto Lei n.º 13/71 — a afixação de publicidade depende de licenciamento prévio das autoridades competentes, a qual deve ser antecedida de parecer das autoridades com jurisdição nos locais onde a publicidade for aplicada.
4) A Z…….., S.A., quando autoriza a instalação de painéis publicitários propicia a instalação de um bem do domínio público para a colocação de painéis publicitários, prestando um serviço que tem a ver com a verificação da compatibilidade entre a instalação dos painéis e a segurança rodoviária.
5) Por cada autorização emitida prevê a lei a cobrança de uma taxa de publicidade - artigo 15º, al. j), do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de janeiro, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 25/2004, de 24 de janeiro.
6) A competência da Z………. não pode, assim, ser confundida com a de outras entidades que têm atribuições distintas.
7) No acórdão de 26/08/2013 conclui-se que “... depois da entrada em vigor da Lei n.º 97/88, a recorrente deixou de ter competência para liquidar taxas pelo licenciamento de afixação de mensagens publicitária, uma vez que a sua intervenção se limita à emissão de parecer, no âmbito do procedimento de licenciamento, da autoria das câmaras municipais, nos termos do disposto no art. 20, nº 2, da Lei nº 97/88.”
8) Enquanto nos acórdãos nºs. 0243/99, 0244/99 e 0140/11, de 08/06/2011, conclui-se que “Ora, a entidade exequente, IEP-Instituto de Estradas de Portugal, tem competência atribuída por lei, nos sobreditos termos, para conceder autorização ou licença e cobrar através de execução fiscal as taxas devidas «pela implantação de tabuletas ou objectos de publicidade».
Tanto basta para concluir — e ao contrário do que defende a ora recorrente — que é legal «a cobrança da taxa referida».”
9) De acordo com a interpretação vertida nestes dois acórdãos o legislador, não pretendeu, com a publicação do Decreto-Lei n.º 637/76, de 29 de Julho e posteriormente a Lei nº 97/88, de 17 de agasto, revogar as disposições do Decreto-Lei n.º 13/71, que atribuem à Z…….. a competência para o licenciamento da publicidade à margem das estradas sob sua jurisdição.
10) Da legislação de proteção às estradas nacionais referente à afixação de publicidade à margem das estradas nacionais, o Decreto-Lei nº 13/11, de 23 de janeiro, tem natureza especial, não tendo sido revogado pela Lei 97/88, de 17 de agosto.
11) A zona de proteção às estradas não foi afetada por aquela legislação, sendo, por isso, permitido à Recorrente aplicar e fazer aplicar o Decreto-Lei nº 13/71 quanto à afixação de publicidade (artigo 3.º, alínea b), artigo 10.º, nº 1, alínea b), ambos do Decreto-Lei nº 13/71),
12) A aposição de tabuletas ou objetos de publicidade estão dependentes de aprovação ou licença da EP (ex-JAE), de acordo com o disposto no artigo 10.º, do DL nº 13/71, de 23/01, estando de igual moda fixadas no artigo 15 do citado diploma legal as taxas a pagar par cada autorização ou licença e bem, assim, as obras dela isentas.
13) O conceito de parecer a emitir por parte da JAE, a quem sucedeu a Recorrente, terá de ser interpretado de modo ajustado ao restante sistema jurídico vigente, passando a corresponder à “aprovação ou licença” prevista no artigo 10.º nº 1, alínea b), do Decreto-Lei nº 13/71 ou à “autorização ou licença”, na designação constante do artigo 15.º, nº 1, alínea j), do mesmo diploma.
14) Permissão esta, que supõe a verificação de que a estrada ou a perfeita visibilidade do trânsito não são afetadas ou de que não é necessário impor quaisquer outras condições que, por circunstâncias especiais, se torne necessário estabelecer (artigo 12.º, nºs 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 13/71).
15) Quando a Lei n.º 97/88 (e bem assim o anterior Decreto-lei n.º 637/76) faz depender o licenciamento municipal do parecer prévio da Z……., quer com isso dizer que a Câmara Municipal não poderá licenciar a publicidade sem que para o efeito exista por parte da EP a permissão para o efeito (quando a estrada se encontra sob jurisdição desta), mas já o contrário pode suceder, isto é, a Z…….. pode licenciar a afixação da publicidade, nos termos do Decreto-Lei nº 13/71, sem qualquer pronúncia por parte da CM.
16) Assim, e em matéria de publicidade, coexistem duas jurisdições nas estradas sob jurisdição da Z………: a da JAE, por força do DL 13/71, e a das autarquias em virtude da Lei nº 97/88 de 17 de agosto, sendo que na hipótese da publicidade afixada para além da zona de proteção às estradas (cfr: artigo 3.º, alínea b) e artigo 10.º, n.º 1, alínea b), ambos do DL 13111) e sob jurisdição camarária será ainda devido a emissão de parecer da JAE, caso aquela seja percetível da primeira
17) Esta é, em traços genéricos, a posição defendida pela Recorrente e sufragada nos acórdãos nº 243/09 e 244/09.
18) É manifesta, pois, a oposição de julgados, cuja apreciação e decisão, para melhor aplicação do direito, se impõe.
19) Verificando-se, assim, os fundamentos do recurso de oposição de julgados, ou seja, identidade substancial das situações tácticas em confronto e a divergência de soluções quanto à mesma questão de direito, o presente recurso deve prosseguir os seus trâmites.
20) Da legislação de proteção às estradas nacionais referente à afixação de publicidade à margem das estradas nacionais, o Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de janeiro, tem natureza especial,
21) não tendo sido revogado pela Lei nº 97/88, de 17 de agosto, não se pronunciando o acórdão recorrido quanto à questão da revogabilidade, ou não, do DL 13/71.
22) O Decreto-Lei n.º 13/71, de 23/01, encontra-se, ainda, em vigor, pese embora tenha sido objeto de alterações sucessivas, operadas pelos Decreto-Lei nº 667/76, de 05/08, 235/82, de 19/06 e 25/2044, de 24/01.
23) A zona de proteção às estradas não foi afetada por aquela legislação, sendo, por isso, permitido à Recorrente aplicar e fazer aplicar o Decreto-Lei n. 13/71 quanto à afixação de publicidade (artigo 34 alínea b, artigo 10.º, n.º 1, alínea b) ambos do Decreto-Lei n.º 13/71),
24) O conceito de parecer a emitir por parte da JAE, a quem sucedeu a Recorrente, terá de ser interpretado de modo ajustado ao restante sistema jurídico vigente, passando a corresponder à “aprovação ou licença” prevista no aflige 10.º, n.º 1, alínea b), do Decreto-Lei n.º 13/71 ou à “autorização ou licença’ na designação constante do artigo 15.º, nº 1, alínea j), do mesmo diploma
25) Permissão esta, que supõe a verificação de que a estrada ou a perfeita visibilidade do trânsito não são afetadas ou de que não é necessário impor quaisquer outras condições que, por circunstâncias especiais, se torne necessário estabelecer (artigo 12º, nºs 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 13/71).
26) Acresce que, o facto do Decreto-Lei nº 25/2004, de 24 de Janeiro, ter atualizado expressamente as taxas a pagar pelas autorizações e licenças concedidas pela Z………, traduz a inequívoca intenção do legislador em manter a mencionada habilitação legal concedida pelo Decreto-Lei n.º 13/71,
27) Assim, o artigo 2.º, nº 1, da Lei nº 97/88, de 17/08, não revogou o artigo 10º, n.º 1, alínea b), do DL n.º 13/71, de 23/01, ou seja, a norma que atribuía ao IEP enquanto sucessor da JAE competência para a aprovação ou licença relativa à implantação de tabuletas ou objetos de publicidade, comercial ou não, numa faixa de 100 m para além da zona “non aedificandi” respetiva, continua a atribuir à Recorrente Z………, S.A,”, enquanto sucessora do IEP, a competência para o licenciamento de aposição de tabuletas ou objetos de publicidade, e a cobrança das respetivas taxas, na denominada proteção à estrada, nos termos designadamente dos artigos 1º, 2º 3º, 10º e 15º, nº 1, al. j), do DL n.º 13111, de 23/01.
28) Devendo o intérprete presumir que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados, não pode deixar se ser considerado o facto de que, 16 anos após a alegada derrogação da competência da Z…….., defendida no acórdão recorrido, o legislador procedeu à atualização, expressa e inequívoca, da taxa devida pela autorização ou licença da publicidade concedida pela Z……….
29) Existem dois regimes de licenciamento da publicidade que se complementam, atendendo, aliás, às competências e responsabilidades próprias de cada uma das entidades envolvidas.
30) Concluindo-se que, do douto Acórdão n.º 232/13, de 26/06/2013, foi interposto recurso com base em oposição de julgados, que se encontra em análise.
Nestes termos e nos mais de direito que V. Exas. mui doutamente suprirão, deverá:
a) O presente recurso prosseguir os seus termos, julgando-se verificada a invocada oposições de acórdãos, com as legais consequências;
b) Ser declarada nula a sentença por violação do disposto alínea d), do n.º 1, do artigo 615º do CPC, ou, caso assim não se entenda;
c) Ser revogada por errada interpretação e aplicação do disposto no artigo 3º, alínea b); artigo 10º,nº 1, alínea b), ambos do Decreto-Lei nº 13/71, artigo 2.º, n.º 2, da Lei nº 97/88 e artigo 9º do CC.
Assim se fazendo inteira e sã JUSTIÇA.»

A recorrida, Banco X……….., SA apresentou contra alegações com o seguinte quadro conclusivo:
«1. A Lei nº 97/88, de 17 de Agosto, universalizou a licença municipal de afixação ou instalação de publicidade, conferindo esta competência, expressamente e em exclusivo, às câmaras municipais da respectiva área.
2. A Lei nº 97/88, de 17 de Agosto, é taxativa ao prescrever no nº 2 do seu art. 12 que “sem prejuízo de intervenção necessária de outras entidades, compete às Câmaras Municipais (...) a definição dos critérios de licenciamento aplicáveis na área do respectivo concelho”.
3. Nos termos da lei supra indicada, a entidade licenciadora é sempre a Câmara Municipal da área onde se pretende implantar a publicidade.
4. Ainda que o parecer referido no nº 2 do art. 2 da supra mencionada lei fosse vinculativo, que não é, tal circunstância não determinaria que a ora Recorrente pudesse cobrar duplamente uma taxa já cobrada pela Câmara Municipal respectiva.
5. Aliás, atente-se, neste sentido à Recomendação do Provedor de Justiça Nº 5/A/2012, dirigida à Z……… S.A..
6. O ora Recorrido encontra-se a liquidar, anualmente, às Câmaras Municipais de Alcobaça, de Porto de Mós e do Montijo as taxas pela mesma determinadas para afixação dos elementos publicitários em questão nos presentes processos.
7. Os artigos 10º, 12º e 15º do Decreto-Lei 13/71, de 23 de Janeiro, foram tacitamente revogados pela Lei nº 97/88 de 17 de Agosto, uma vez que referem-se expressamente a “Aprovação, autorização ou licença”, licença essa cuja competência foi, exclusivamente, atribuída às câmaras Municipais pela Lei nº 97/88.
8. A Lei nº 97/88 veio conferir à Câmara Municipal da respectiva área competência para o licenciamento para afixação ou inscrição de mensagens publicitárias de natureza comercial, devendo o mesmo licenciamento ser precedido de PARECER de entidades como a ora Recorrente.
9. Decorre da Lei nº 97/88 e, também, da Lei nº 13/71 que a taxa devida resulta da licença ou autorização.
10. Não existe na lei qualquer referência permitindo a aplicação de uma taxa para emissão de um parecer.
11. O nº 1 do art.º 15º do Decreto-lei nº 13/71, de 23 de Janeiro, na sua redacção actual, apenas prevê a incidência da taxa nos casos sujeitos a autorização ou licença, nada referindo, quanto à emissão de simples pareceres.
12. A circunstância de duas entidades públicas poderem cobrar taxas pelo mesmo serviço feriria os mais elementares valores do nosso ordenamento jurídico.
13. Os licenciamentos em questão nos presentes autos e as taxas que lhe estão associadas, de duração anual, e consistindo num pagamento de uma determinada quantia por área ocupada pela publicidade, acaba por traduzir-se numa espécie de pagamento de uma renda por ocupação de um espaço do domínio publico.
14. No caso sub judice, a publicidade está afixada em propriedade privada do Banco A., pelo que, não faz qualquer sentido o pagamento de uma taxa sem qualquer contrapartida, pois a contrapartida que justifica a taxa é a ocupação de espaço de domínio público.
15. O art.º 31 do Decreto-lei nº 48/2011 vem aditar um nº 3 ao art.º 1 da Lei nº 97/88, de 17 de Agosto, isentando de qualquer tributação o licenciamento/autorização de publicidade.
16. A tributação aqui em causa não tem por escopo assegurar a remuneração de qualquer serviço prestado pela Z………., S.A., relacionado com a emissão de um parecer, partindo, apenas, de um pressuposto básico errado, qual seja o que tudo se passaria como se o espaço onde está instalada a publicidade fosse da titularidade da Z………. e por ele o particular pagasse uma renda anual.»

O EMMP pronunciou-se emitindo o seguinte parecer:
«Recorre a Z………, S.A. da sentença do TAF de Almada de 11.04.2014 que julgou procedente a impugnação deduzida pelo Banco X………, S.A..
Como decorre da lei, são as Conclusões da Alegação de Recurso que definem o objecto e delimitam o âmbito do recurso, ou seja, o espaço de intervenção do tribunal ad quem, salvo quando se trate de matérias de conhecimento oficioso que possam ser decididas com base nos elementos que constem dos autos e que não se mostrem cobertas pelo caso julgado – cfr. os arts. 635.º e 639º, ambos do CPC (correspondentes aos arts. 684.º e 685.º B do CPC revogado), ex vi do art. 2.º do CPPT.
Das decisões dos tribunais de 1ª instância cabe recurso para o Tribunal Central Administrativo, salvo quando a matéria for exclusivamente de direito (art. 280.º do CPPT).
A admissibilidade dos recursos por efeito das alçadas é regulada pela lei em vigor ao tempo em que seja instaurada a acção (art. 6º, n.º 6 do ETAF).
Não cabe recurso das decisões dos tribunais tributários de 1.ª instância quando o valor da causa não ultrapassar um quarto das alçadas fixadas para os tribunais judiciais de 1ª instância (art.6º, n.º 2 do ETAF e art. 280º, n.º 4 do CPPT).
No caso vertente, o valor da causa é inferior a um quarto da alçada dos tribunais judiciais de 1ª instância.
Em situações como esta a lei só permite o recurso para este Supremo Tribunal quando as decisões em causa perfilhem solução oposta relativamente ao mesmo fundamento de direito e na ausência substancial de regulamentação jurídica, com mais de três sentenças do mesmo ou de outro tribunal de igual grau ou como uma decisão de tribunal de hierarquia superior (art. 105.º da LGT e 280º, n.º 5 do CPPT).
Tais recursos observarão, segundo Jorge Lopes de Sousa, os requisitos globais dos recursos com fundamento em oposição de julgados (anot. ao art. 280º, in CPPT anotado 2000, p1085 Cfr. no sentido indicado, o douto Ac. deste Supremo tribunal de 14.12.2006 – Rec. nº 0870/05) e, salvo melhor entendimento, o seu objecto estará circunscrito à apreciação das questões de direito sobre as quais alegadamente existem decisões contraditórias.
Daí que se nos suscitem muitas dúvidas quanto à possibilidade de apreciar a questão da nulidade que a recorrente ancora no disposto no art. 615º, n.º 1, al. d) do CPC e cujos contornos não se mostram adequadamente informados na Alegação de Recurso e respectivas Conclusões.
Admitindo que a arguida nulidade possa ser apreciada no presente recurso e que mesma se refira à questão da alegada não pronúncia sobre a “revogabilidade, ou não, do DL 13/71” [Conclusão 21), sempre se dirá que tal nulidade não se verifica pois a sentença recorrida não deixa de se pronunciar sobre aquela questão ao referir na sua parte final que “(…) em face de tudo quanto vai exposto, é patente que a resposta à questão que vem posta não exige que se tome posição sobre o problema de saber até que ponto o Decreto-lei n.º 13/71 se encontra ou não revogado,..”. Se essa pronúncia não é acertada a questão será de erro de julgamento e não de nulidade sentença.
Quanto ao mais.
As questões suscitadas no recurso são as que respeitam à competência da Z………., SA para, no quadro da Lei n.º 97/88, de 17 de Agosto, liquidar taxas de publicidade.
Como é jurisprudência corrente deste Supremo Tribunal, aplicável in casu, para haver oposição operante entre julgados é necessário que se verifique contradição entre a decisão recorrida e a decisão fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito e que não ocorra a situação de a decisão impugnada estar em sintonia com a jurisprudência mais recentemente consolidada do STA. E que se verifica o 1.º requisito enunciado se as decisões em confronto assentam em situações de facto idênticas nos seus contornos essenciais e está em causa o mesmo fundamento de direito, não tendo havido alteração substancial da regulamentação jurídica pertinente e tendo sido perfilhada solução oposta, por decisões expressas e antagónicas” (cfr., por todos, o douto Ac. de 12-12-2012, proferido no processo nº 0932/12).
Para julgar procedente a impugnação considerou a sentença recorrida, na esteira do douto Acórdão deste Supremo Tribunal de 26.06.2013 — Rec. n.º 0232/13, que “depois da entrada em vigor da Lei n.º 97/88, a impugnante (escreveu-se recorrente) deixou de ter competência para liquidar taxas pelo licenciamento de afixação de mensagens publicitárias, uma vez que a sua intervenção se limita à emissão de parecer, no âmbito do procedimento de licenciamento, da autoria das câmaras municipais, nos termos do disposto no art. 2. n.º 2, da Lei n.º 97/88’
Ora, no douto Acórdão deste Supremo Tribunal de 25.06.2009 — Rec. n.º 0243/09 considerou-se, no que aqui importa, ser “excessiva e errónea a conclusão (...) de que «Com a entrada em vigor da Lei 97/88, de 17 de Agosto, passou a ser das câmaras municipais a competência para “licenciar’, “autorizar”, ou “aprovar a afixação de publicidade, em locais sob jurisdição de outras entidades, como a EP, Estradas de Portugal, EPE. (outrora Junta Autónoma das Estradas”. Considerou-se, concretamente, que o “IEP — Instituto das Estradas de Portugal, tem competência atribuída por 1 e 4 (...), para conceder autorização ou licença e cobrar através de execução fiscal as taxas devidas «pela implantação de tabuletas ou objectos de publicidade».
No mesmo sentido se pronunciou o também indicado Acórdão deste Supremo Tribunal de 25-06- 2009— Rec. n.º 0244/09.
O antagonismo decisório parece evidente, salvo melhor entendimento.
Constatada a oposição, entende-se que a solução do presente recurso deverá pender para a doutrina do douto Acórdão deste Supremo Tribunal de 26.06.2013 — Rec. n.º 0232/13, em que se louva a sentença recorrida, por ser aquela que, a meu ver, considerando a factualidade provada, melhor se harmoniza com o quadro legal aplicável e para a qual o texto da norma, ponto de partida da actividade interpretativa, mais fortemente aponta.
Com efeito, no que concerne à competência para o licenciamento deve considerar-se revogada a norma do art.º 10º, nº 1, alínea b) do DL nº 13/71, de 23 de Jan. pela Lei n.º 97/88, de 17 de Agosto, diploma que, regulando genericamente a matéria relativa à afixação e inscrição de mensagens publicitárias de natureza comercial, expressamente prevê, no seu art. 2º, n.º 2, al. b), o licenciamento camarário dessa afixação, a ser precedido de parecer da Z………., SA, ora recorrente.
Assim, a competência que o art. 10º, n.º 1, al. b) do DL n.º 13/71, de 23 de Jan. cometia à JAE para a aprovação ou licenciamento de tabuletas ou objectos de publicidade comercial, numa faixa de 100 m para além da zona non aedificandi respectiva, mostra-se deslocada, ao menos parcialmente, no quadro da Lei n.º 97/88, de 17 de Agosto (Na linha do que já determinava DL 637/76, de 29 de Julho), para o perímetro de competências das câmaras municipais, nelas se incluindo a definição dos critérios de licenciamento aplicáveis na área do respectivo concelho (arts. 1.º e 2.º do diploma). As deliberações das câmaras municipais devem, no entanto, ser precedidas de parecer das entidades com jurisdição sobre os locais onde a publicidade for afixada, no caso, da Z………., SA., o que bem se compreende pois a colocação de elementos publicitários é susceptível de afectar, por exemplo, a segurança na circulação rodoviária (art. 4º, n.º 1, al. d) e 3 da Lei n.º 97/88) que lhe incumbe acautelar.
Como se refere no apontado douto Acórdão deste Supremo Tribunal de 26.06.2013, segmento que com a devida vénia se transcreve “(c)onfrontando o teor deste preceito com o expressamente cansa grada no art. 10º, nº 1, alínea b), do Decreto-Lei nº 13/71, facilmente se conclui que os preceitos estão em contradição na parte em que este último comete à recorrente, na área de jurisdição correspondente a 100 metros para além da zona non aedificadi, a competência para a aprovação ou licença, enquanto que o nº 2 do art. 2º da Lei nº 97/88 degrada essa intervenção na mesma matéria à mera emissão de parecer obrigatório.
Poderá dizer-se que constituindo a Lei nº 97/88 lei geral, em face do Decreto-Lei nº 13/71 que, pelo seu turno, consubstancia um regime especial, estaria afastada a possibilidade de este ser revogado por aquela lei. Acontece que no caso de contradição entre normas da mesma hierarquia, a regra vai no sentido de que lex specialis derrogat legi generalí ainda que esta seja posterior, excepto, neste caso, “se outra for a intenção inequívoca do legislador’ (Cfr. Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, 78 reimpressão, Almedina, Coimbra, 1994, p. 170.).
Ora, afigura-se que a Lei no 97/88 pretende de forma inequívoca regular a afixação e inscrição de mensagens de publicidade e propaganda atribuindo o licenciamento de forma universal às câmaras municipais, na área do respectivo concelho, sem prejuízo da intervenção obrigatória, através da emissão do respectiva parecer, por parte de entidades com jurisdição exclusiva para defesa de interesse públicos específicos que têm de ser tidos em conta na emissão de licença final pelo respectivo município”.
Aderindo, pois, à doutrina deste douto Acórdão, emito parecer no sentido da improcedência do presente recurso e da consequente manutenção do julgado.»

2 – FUNDAMENTAÇÃO

O Tribunal “ a quo” deu como provada a seguinte factualidade:
1. Por ofícios de 11/01/2012 da Z…….., S.A. foi a impugnante notificada para proceder ao pagamento das taxas de publicidade EN242 Km 023-800 Lado direito e EN243 KM 019+650 Lado direito, no montante global de € 681,48 no prazo de 10 dias (cfr. doc. junto a fls. 16 a 19 dos autos);
2. Por ofício de 13/10/2011 da Z………., S.A. foi a impugnante notificada para proceder ao pagamento da taxa de publicidade EN 10 Km 72-600 Lado esquerdo, no montante de € 227,16 no prazo de 10 dias (cfr. doc. junto a fls. 20 e 21 dos autos);
3. A impugnante deduziu recurso hierárquico das decisões identificadas nos dois pontos anteriores (cfr. docs. juntos a fls. 22 a 31 dos autos);
4. Por ofício de 29/02/2013 foi a Impugnante notificada do indeferimento dos recursos hierárquicos identificados no ponto anterior (cfr. doc. junto a fls. 32 dos autos).

No acórdão fundamento, nº 0243/09 de 25/06/2009, encontra-se fixada a seguinte matéria de facto:
1. Em 17-08-2007, foi instaurado o processo de execução nº 1058200701056026, contra a empresa “A…, Ldª, por dívida ao IEP-Instituto de Estradas de Portugal, devidos pelo não pagamento de taxas correspondentes à instalação de oito painéis publicitários junto à EN 125, aos Km 31,200 e 31,300, na quantia de € 10.906,68 (informação oficial de fls. 22);

2. A empresa “A…, Ldª, com o nº de contribuinte (…) tem como objecto social “Actividade Publicitária e de Espectáculos” (fls. 13 dos autos);

3. Em 28-08-2007 a executada foi citada (informação oficial de fls. 22);

4. Em 01-10-2007 deu entrada a petição inicial (carimbo aposto no rosto de fls. 5).

3 – DO DIREITO
A decisão recorrida considerou o seguinte (destacam-se apenas os trechos mais relevantes da decisão com maior relevo para o presente recurso)
“- RELATÓRIO
Banco X………., S.A., com demais sinais nos autos, vem intentar a presente Impugnação Judicial do acto de indeferimento do recurso hierárquico deduzido por si das liquidações referentes a taxas de publicidade cobradas pela Z……….., no montante de € 908,64.
Para tanto alega, em síntese, que:
• Inexistência de autorização e competência para liquidação e cobrança da taxa;
• Duplicação de colecta uma vez que o Banco em causa liquida anualmente às Câmaras Municipais respectivas as taxas pelas mesmas determinadas para afixação dos elementos publicitários em questão nos presentes processos.
Termina pedindo a anulação dos actos de liquidação.
Junta documentos e arrola testemunhas.
Regularmente citada para contestar a Z………, SA fê-lo por articulado de fls. 65 e segs. pugnado pela improcedência da presente impugnação e suscitando a questão da incompetência territorial deste Tribunal.
A impugnante pronunciou-se sobre a questão da incompetência territorial por articulado de fls. 85 e segs..
Foi dispensada a audiência de inquirição das testemunhas arroladas. Aos autos foi junto o processo instrutor.
O Digno Magistrado do Ministério Público emitiu parecer de fls. 150 e segs. dos autos pugnando pela procedência da presente impugnação.
Cumpre decidir.
QUESTÃO PRÉVIA
Vem a impugnada suscitar a questão da incompetência territorial deste Tribunal.
Não lhe assiste razão.
(…).
II. DOS PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
(…)
III - FUNDAMENTAÇÃO
(…)
C) QUESTÕES JURÍDICAS A SOLUCIONAR
A questão que se coloca é a de saber se as taxas referidas são ou não devidas.
D) DO DIREITO
Alega a Impugnante que há falta de autorização para liquidação e Cobrança da taxa em referência pela Impugnada uma vez que não tem competência para cobrar as taxas.
Vejamos.
Nesta matéria seguiremos o mais recente Acórdão do STA de 26/06/2013, no recurso nº 232/13, com o qual concordamos pelo que passamos a transcrever:
(…)
Passando ao caso dos autos retira-se do probatório supra que em causa está a liquidação e execução de taxas de publicidade devidas pela instalação de anúncios junto a estradas que são da competência das Câmaras Municipais e não da Z………, S.A. pelo que a presente impugnação será julgada procedente.
IV. Decisão
Em face do anteriormente exposto, o Tribunal julga procedente a presente oposição.
Custas pela Z………, S.A..
Registe e notifique.
Almada, 11 de Abril de 2014.

DECIDINDO NESTE STA e seguindo de perto o Ac. do STA de 18/06/2014 tirado no rec. 01435/13 no qual o ora Relator interveio como primeiro adjunto:
Previamente se dirá que embora se suscite a nulidade da sentença recorrida no final das conclusões das alegações “b) Ser declarada nula a sentença por violação do disposto alínea d), do n.º 1, do artigo 615º do CPC” a verdade é que não se descortinam as razões de tal pedido nem com recurso à leitura global das alegações que precedem as conclusões. Mas manifesta-se concordância com o expresso pelo Mº Pº no seu parecer sobre esta matéria para o qual se remete.
Quanto ao mais:
Em primeiro lugar, cumpre realçar que o presente recurso foi interposto ao abrigo do regime previsto no artigo 280º nº 5 do CPPT, segundo o qual, «a existência de alçadas não prejudica o direito ao recurso para o Supremo Tribunal Administrativo de decisões que perfilhem solução oposta relativamente ao mesmo fundamento de direito e na ausência substancial de regulamentação jurídica, com mais de três sentenças do mesmo ou outro tribunal de igual grau ou com uma decisão de tribunal de hierarquia superior.».

Trata-se de um recurso previsto para aqueles casos em que a decisão recorrida perfilha solução oposta – relativamente ao mesmo fundamento de direito e na ausência substancial de regulamentação jurídica – à adoptada em mais de três sentenças do mesmo ou outro tribunal de igual grau, ou com uma decisão de tribunal de hierarquia superior. Nessa situação, ainda que o valor da causa não ultrapasse um quarto da alçada fixada para os tribunais judiciais de primeira instância, o que impediria, em princípio, o recurso da decisão face ao disposto no nº 4 do artigo 280º do CPPT (Segundo o qual «não cabe recurso das decisões dos tribunais tributários de 1ª instância proferidas em processo de impugnação judicial ou de execução fiscal quando o valor da causa não ultrapassar um quarto das alçadas fixadas para os tribunais judiciais de primeira instância».), ele torna-se admissível à luz do nº 5 deste preceito legal.

Daí que, embora o valor da presente causa seja de € 908,64, mais 227,16 euros (conforme resulta dos pontos 1) e 2) do probatório, isto é, não ultrapasse um quarto das alçadas fixadas para os tribunais judiciais de primeira instância, tal recurso poderá ser admissível à luz do mencionado regime legal, já que ele possibilita o recurso para a Secção de Contencioso Tributário do STA com vista à uniformização das decisões sobre idêntica questão de direito, em conformidade, aliás, com o disposto no artigo 105º da LGT.

Os requisitos destes recursos traduzem-se na necessidade de as decisões em confronto perfilharem «solução oposta» estando em causa o «mesmo fundamento de direito» e ocorrendo «ausência substancial de regulamentação jurídica», conforme decorre à evidência do nº 5 do art.º 280º do CPPT.

O que pressupõe, naturalmente, uma identidade dos factos subjacentes (que terão de ser essencialmente os mesmos do ponto de vista do seu significado jurídico) e uma identidade do regime jurídico aplicado (ainda que em invólucros legislativos diferentes), pois sem essa identidade não será possível vislumbrar a emissão de proposições jurídicas opostas sobre a mesma questão fundamental de direito, nem se poderá atingir o fim visado com este tipo de recurso, que é o de assegurar o valor da igualdade na aplicação do direito.

Deste modo, este tipo de recurso pressupõe, forçosamente, que no domínio do mesmo quadro normativo e perante idêntica realidade factual, tenham sido adoptadas soluções jurídicas opostas quanto à mesma questão fundamental de direito. Ou seja, que as decisões em confronto tenham arrancado de situações de facto idênticas e aplicado os mesmos preceitos legais, e que por força de uma diferente interpretação jurídica tenham chegado a conclusões antagónicas.

E porque assim é, a primeira questão a resolver no presente recurso consiste em saber se ocorre ou não a invocada oposição de acórdãos, pois, como resulta expressamente do art. 641º, nº 5 do CPC, a decisão de admissão do recurso proferida pelo tribunal recorrido não faz caso julgado e não impede o tribunal de recurso de reapreciar a questão.

Como se sabe, este tipo de recurso segue a tramitação dos recursos jurisdicionais previstos no art. 280º do CPPT, com a disciplina constante dos arts 281º e 282º desse diploma legal, e não a tramitação prevista no art. 284º do CPPT, pelo que nele não há, após o despacho de admissão do recurso, a fase processual de alegações (e conclusões) tendentes a demonstrar a existência da apontada oposição de julgados (prevista no nº 3 do art. 284º). Nele não há, sequer, uma fase processual idêntica à prevista no nº 5 do art. 284º, pelo que não pode ser julgado findo pelo relator por falta de verificação da invocada oposição.

Ao recorrente basta invocar e evidenciar a oposição de julgados no requerimento de interposição do recurso, com vista a vê-lo admitido ao abrigo do nº 5 do art. 280º do CPPT, pelo que, uma vez admitido o recurso, não está obrigada a levar essa matéria às conclusões da alegação sobre o mérito do recurso que subsequentemente tem de apresentar nos termos previstos no nº 3 do art. 282º do CPPT. O que, desde logo, afasta a argumentação do Exmº Magistrado do Ministério Público junto deste Supremo Tribunal.

Todavia, dado que a decisão de admissão do recurso não vincula o tribunal superior, importa aferir, como se disse, se efectivamente existe a invocada oposição de julgados.

Tal como decorre da leitura da sentença recorrida, a questão em debate na presente impugnação judicial é a de saber se as Z……, S.A., tem competência para licenciar e taxar a afixação de publicidade pela instalação de anúncios junto a estradas que são da competência das Câmaras Municipais e não da Z………

Na sentença recorrida usando-se fundamentação remissiva para o acórdão do STA de 26/06/2013 no rec. 232/13 considerou-se que a publicidade não estava afixada em plena zona de estrada nacional, onde a sociedade anónima Z………., S.A. (doravante, Z…..) tem pleno domínio, mas sim afixada em zona de protecção à estrada nacional, onde a Z……. não tem esse poder de domínio, mas tão só de jurisdição com vista à preservação da faixa de protecção. Nesse enquadramento, julgou-se que a Z…….. não tinha competência para a liquidação das taxas em causa.

Para assim se decidir, argumentou-se, em suma, que as normas do Dec. Lei nº 13/71, de 23 de Janeiro, foram revogadas pela Lei nº 97/88, de 17 de Agosto.

«O artigo 10º do DL nº 13/71 de 28/1 conferia ao tempo dos actos impugnados, à EP - E.P.E, como sucessora legal da JAE, competência para autorizar a implantação de tabuletas ou objectos de Publicidade numa faixa de 100 m para cada lado da zona non aedificand, da estrada nacional Em plena concordância com esta conferência, o artigo 15º do mesmo diploma legal fixava e fixa o valor das taxas a cobrar por cada autorização quejanda
Todavia, o DL nº 97/88, de 17 de Agosto (artigos 1º e 2º), cometeu às câmaras municipais “sem prejuízo da intervenção necessária de outras entidades”, a competência para licenciar a afixação de publicidade na área do respectivo concelho, estipulando, porém, que “a deliberação (...) deve ser precedida de parecer das entidades com jurisdição sobre os locais onde a publicidade for afixada, nomeadamente (...) a Junta Autónoma de Estradas”.
Daqui resulta que a JAE, tal como os seus legais sucessores, a não ser no espaço da Zona da Estrada, em que tem pleno domínio, deixou de ter competência para autorizar a afixação de publicidade na Zona de protecção das estradas nacionais Na parte do seu dispositivo incompatível com os artigos 10 e 2º do DL nº 97/88, o artigo 100 do DL nº 13/71 está, afinal, tacitamente revogado.
À Impugnante no que à faixa de protecção concerne, compete agora emitir parecer obrigatório, parecer que, ao que decorre do nº 2 do DL nº 97/88, deve ser solicitado pela Câmara Municipal.».

Ora, também no acórdão fundamento, proferido em processo de oposição a execução fiscal, foi apreciada e decidida a questão da habilitação legal do Instituto de Estradas de Portugal (actual Z………, S.A.) para a liquidação e cobrança de taxa de publicidade, no pressuposto de que a questão constituía fundamento de oposição à luz da alínea a) do art. 204º do CPPT.
E nele julgou-se que, ao contrário do que era defendido pelo oponente/recorrente, as normas do Dec. Lei nº 13/71, de 23 de Janeiro, não haviam sido revogadas pela Lei nº 97/88. Como nele se deixou afirmado, «…temos por excessiva e errónea a conclusão da ora recorrente, de que «Com a entrada em vigor da Lei 97/88, de 17 de Agosto, passou a ser das câmaras municipais a competência para “licenciar”, ou “autorizar”, ou “aprovar” a afixação de publicidade, em locais sob jurisdição de outras entidades, como a EP, Estradas de Portugal, E.P.E. (outrora Junta Autónoma de Estradas)».
«Ora, a entidade exequente, IEP-Instituto de Estradas de Portugal, tem competência atribuída por lei, nos sobreditos termos, para conceder autorização ou licença e cobrar através de execução fiscal as taxas devidas «pela implantação de tabuletas ou objectos de publicidade».

Julgou-se, portanto, que o IEP-Instituto de Estradas de Portugal gozava de habilitação legal ou competência para a cobrança por meio de execução fiscal de taxas de licença para a implantação de tabuletas ou objectos de publicidade na denominada zona de protecção à estrada.

Sendo assim, não há dúvida que as decisões em confronto convocaram realidades factuais semelhantes e apelaram às mesmas normas jurídicas, decidindo de modo oposto a mesma questão fundamental de direito.

Tanto basta para se concluir que se verificam os requisitos previstos no n.º 5 do art. 280.º do CPPT, razão pela qual passaremos de imediato ao conhecimento do mérito do recurso, avaliando se a decisão recorrida decidiu, ou não, com acerto.

A questão a decidir neste recurso é, como vimos, a de saber quem é a entidade competente para licenciar e, consequentemente, tributar a afixação de tabuletas de publicidade na zona de protecção das estradas nacionais.

Trata-se de questão que actualmente tem obtido resposta idêntica tanto na Secção de Contencioso Tributário (na vertente da tributação do licenciamento) como na Secção de Contencioso Administrativo (na vertente do licenciamento em si), como se pode ver pelos acórdãos proferidos por esta Secção de 26/06/2013, no rec. nº 0232/13, e de 4/06/2014, no rec. nº 01730/13, e pela Secção de Contencioso Administrativo de 20/02/2014, nos recs. nºs 01854/13; 01597/13; 01786/13; 01814/13; 01340/13; 01415/13; 01813/13; 01500/13; 0604/13; 01417/13; 0983/13; de 20/03/2014, no rec. nº 01500/13; de 20/03/2014, no rec. nº 01814/13; de 3/04/2014, nos recs. nº 01815/13; 01896/13; 01600/13; 01741/13; 01792/13; 01499/13; 01556/13; 024/14; de 15/05/2014, nos recs. nº 0133/14; 0135/14; 0140/14; 01516/13; de 29/04/2014, no rec. nº 073/14, e de 26/06/2014, no rec. nº 0232/13, traduzindo uma jurisprudência que actualmente se pode considerar consolidada.

Esta resposta foi inicialmente dada pelo referido acórdão desta Secção no recurso nº 0232/13, cuja fundamentação sufragamos na íntegra, e que posteriormente foi acolhida pela Secção de Contencioso Administrativo.

Nesse acórdão deixou-se explicitado o seguinte:

«3.1. O art. 1º do Decreto-Lei nº 13/71, de 23 de Janeiro, que veio regulamentar a jurisdição da Junta Autónoma das Estradas em relação às estradas nacionais, estabeleceu que tal área de jurisdição abrangia, para além da “zona da estrada” (englobando a faixa de rodagem, as bermas, as valetas, os passeios, as banquetas ou taludes, pontes e viadutos), a denominada “zona de protecção à estrada” (constituída pelas faixas com servidão non aedificandi e pelas faixas de respeito) - arts. 1º a 3º.
Diz expressamente o art. 3º do Decreto-Lei nº 13/71 que a zona de protecção à estrada nacional é constituída pelos terrenos limítrofes em relação aos quais se verificam:
a) Proibições (faixa designadamente com servidão non aedificandi;
b) Ou permissões condicionadas à aprovação, autorização ou licença da Junta Autónoma de Estradas (faixas de respeito)”.
O art. 8º, sob a epígrafe, “Proibições em terrenos limítrofes da estrada”, dispõe que é proibida a construção, estabelecimento, implantação ou produção de “Tabuletas, anúncios ou quaisquer objectos de publicidade, com ou sem carácter comercial, a menos de 50 m do limite da plataforma da estrada ou dentro da zona de visibilidade, salvo no que se refere a objectos de publicidade colocados em construções existentes no interior de aglomerados populacionais e, bem assim, quando os mesmos se destinem a identificar instalações públicas ou particulares.”
Por sua vez, segundo o disposto no art. 10º, nº 1, alínea b), depende da aprovação ou licença da Junta Autónoma da Estrada, a “Implantação de tabuletas ou objectos de publicidade, comercial ou não, numa faixa de 100 m para além da zona non aedificandi respectiva”.
Em face do quadro legal exposto, a questão essencial a decidir é a de saber se a recorrente mantém competência para liquidar taxas de publicidade, em especial nas situações referenciadas no art. 10º, nº 1, alínea b), do Decreto-Lei nº 13/71, de 23 de Janeiro, sobretudo depois da entrada em vigor da Lei nº 97/88, de 17 de Agosto.
Este diploma, que sucedeu ao Decreto-Lei nº 637/76, de 29 de Junho, veio definir o enquadramento geral da publicidade exterior, sujeitando-a a licenciamento municipal prévio e remetendo para as câmaras municipais a tarefa de definir, à luz de certos objectivos fixados na lei, os critérios que devem nortear os licenciamentos a conceder na área respectiva.
Embora o diploma não revogue expressamente o Decreto-Lei nº 13/71 nem sequer algumas das suas normas, a verdade é que aquela lei veio universalizar a licença municipal de afixação ou instalação de publicidade no espaço exterior, dizendo expressamente que esta depende do licenciamento prévio das autoridades competentes (nº 1 do art. 1º da Lei nº 97/88).
Por seu turno, diz o nº 2 que “Sem prejuízo de intervenção necessária de outras entidades, compete às câmaras municipais, para salvaguarda do equilíbrio urbano e ambiental, a definição dos critérios de licenciamento aplicáveis na área do respectivo concelho”.
No preceito seguinte (art. 2º), sob a epígrafe “Regime de licenciamento”, refere no seu nº 1 que o pedido de licenciamento é dirigido ao presidente da Câmara Municipal da respectiva área, devendo, nos termos do estatuído no nº 2, “A deliberação da câmara municipal deve ser precedida de parecer das entidades com jurisdição sobre os locais onde a publicidade for afixada, nomeadamente do Instituto Português do Património Cultural, da Junta Autónoma das Estradas, da Direcção-Geral de Transportes Terrestres, da Direcção de Turismo e do Serviço Nacional de parques, Reservas e Conservação da Natureza.”
Confrontando o teor deste preceito com o expressamente consagrado no art. 10º, nº 1, alínea b), do Decreto-Lei nº 13/71, facilmente se conclui que os preceitos estão em contradição na parte em que este último comete à recorrente, na área de jurisdição correspondente a 100 metros para além da zona non aedificadi, a competência para a aprovação ou licença, enquanto que o nº 2 do art. 2º da Lei nº 97/88 degrada essa intervenção na mesma matéria à mera emissão de parecer obrigatório.
Poderá dizer-se que constituindo a Lei nº 97/88 lei geral, em face do Decreto-Lei nº 13/71 que, pelo seu turno, consubstancia um regime especial, estaria afastada a possibilidade de este ser revogado por aquela lei.
Acontece que no caso de contradição entre normas da mesma hierarquia, a regra vai no sentido de que lex specialis derrogat legi generali ainda que esta seja posterior, excepto, neste caso, “se outra for a intenção inequívoca do legislador” (Cfr. Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, 7ª reimpressão, Almedina, Coimbra, 1994, p. 170.).
Ora, afigura-se que a Lei nº 97/88 pretende de forma inequívoca regular a afixação e inscrição de mensagens de publicidade e propaganda atribuindo o licenciamento de forma universal às câmaras municipais, na área do respectivo concelho, sem prejuízo da intervenção obrigatória, através da emissão do respectivo parecer, por parte de entidades com jurisdição exclusiva para defesa de interesse públicos específicos que têm de ser tidos em conta na emissão de licença final pelo respectivo município.
Realce-se que esta é, aliás, a tese da recorrente.
Com efeito, nas suas conclusões a recorrente não refere em parte alguma qual a norma que lhe confere competência para a emissão do licenciamento em causa.
Pelo contrário, em vários pontos das Conclusões, designadamente, nos pontos 12, 15, 22, 23, 26 e 27, a recorrente fala sim na sua competência para a emissão de parecer.
No entanto, a recorrente acaba por concluir, invocando jurisprudência deste Supremo Tribunal que “o licenciamento da publicidade é emitido pela Câmara Municipal que tem de ser precedido de um parecer da EP, E.P.E., quando a publicidade se situa na proximidade de uma estrada nacional, o que significa que aquela entidade não vem licenciar a publicidade, mas sim autorizar a sua afixação junto das estradas nacionais, que são campos de aplicação completamente diferentes.”
Concluindo-se que “(…) a aprovação ou licença concedida pela EP, E.P.E., para afixação de publicidade constante da alínea b) do n.º 1 do artigo 10º do DL 13/71, de 23/01, corresponde ao parecer mencionado no nº 2 do art.º 2º do DL 97/88, de 17/08, sendo de carácter vinculativo e obrigatório” (Acórdão proferido no processo 0243/09, de 25/6/2009)”.
Afigura-se, porém, que esta tese, além de não ter apoio legal, conduziria a resultados absurdos.
Vejamos.
3.2. Em primeiro lugar, o parecer a que se refere o nº 2 do art. 2º da Lei nº 97/88 não é vinculativo, mas tão só obrigatório. Nas palavras de VIEIRA DE ANDRADE (Lições de Direito Administrativo, 2ª ed., Imprensa da Universidade de Coimbra, Coimbra, 2011, p. 146.), os pareceres “enquanto avaliações jurídicas ou técnicas”, são obrigatórios ou facultativos, conforme tenham ou não de ser solicitados pelo órgão instrutor, e são vinculantes ou não vinculantes, conforme tenham, ou não, de ser seguidos pelo órgão decisor. E o autor termina dizendo que “os pareceres previstos em normas jurídicas são, salvo disposição expressa em contrário, obrigatórios e não vinculantes”.
Aplicando a doutrina mencionada ao caso dos autos, temos de concluir que os pareceres a que se refere o nº 2 do art. 2º da Lei nº 97/88 são obrigatórios mas não vinculativos.
Em segundo lugar, tratando-se de um parecer, ainda que obrigatório, o mesmo não se confunde com a figura da autorização nem da licença. Ao contrário dos pareceres que integram a categoria dos actos jurídicos instrumentais, mais propriamente instrutórios, na medida em que visam a assegurar a constituição de actos administrativos, as autorizações são, tal como as licenças, verdadeiros actos administrativos em sentido estrito (Cfr. VIEIRA DE ANDRADE, ob. cit., p. 142 e p.145.), embora com conteúdos diferentes.
As autorizações em sentido amplo são, segundo VIEIRA DE ANDRADE (Cfr. ob. cit., p. 145.), actos administrativos favoráveis porque conferem ou ampliam direitos ou poderes “administrativos” ou extinguem obrigações, distinguindo-se as autorizações propriamente ditas das licenças. As primeiras, também conhecidas por autorizações permissivas, caracterizam-se por permitirem “o exercício pelos particulares da actividade correspondente a um direito subjectivo pré-existente, apenas condicionado pela lei a uma intervenção administrativa”, destinada a remover um obstáculo por ela imposto. As segundas, também denominadas autorizações constitutivas, destinam-se a constituir “direitos subjectivos em favor dos particulares em áreas de actuação sujeitas a proibição relativa (preventiva) pela lei, uma vez acautelada no caso concreto a não lesão do interesse que justificou a proibição legal”.
Em face do exposto, a tese da recorrente conduziria ao absurdo de sobre a mesma situação recair simultaneamente uma autorização e uma licença que, embora da autoria de entidades diferentes, visaria o mesmo resultado: permitir (ou conferir o direito) à afixação ou inscrição de mensagens de publicidade comercial. O que conduziria a que duas entidades públicas tivessem competência para liquidar taxas sobre a mesma realidade fáctica, situação muito próxima da duplicação de colecta, proibida no art. 205º do CPPT.
Ora, o que a Lei nº 97/88 veio dizer, e é aceite pela recorrente, é que a afixação ou inscrição de mensagens publicitárias de natureza comercial depende do licenciamento prévio dos municípios, precedido de parecer das entidades com jurisdição sobre os locais onde a publicidade for afixada. O que significa que o legislador quis sujeitar a afixação de publicidade a um acto de licenciamento dos municípios e não a mera autorização, acto que tem de ser instruído com o parecer das autoridades com jurisdição nos locais de afixação da publicidade. Por esta via, o legislador consegue harmonizar os interesses visados pelos municípios, consistentes na salvaguarda do equilíbrio urbano e ambiental e, ao mesmo tempo, a segurança do trânsito das estradas nacionais. Todavia, segundo este modo de ver as coisas, existe apenas uma única entidade competente para o licenciamento e não duas como pretende a recorrente.
Em suma, em face de tudo o quanto vai exposto, é patente que a resposta à questão que vem posta não exige que se tome posição sobre o problema de saber até que ponto o Decreto-Lei nº 13/71 se encontra ou não revogado, nem tão pouco sobre se as áreas de jurisdição da recorrente consagradas no mencionado diploma ainda se mantêm ou não.
No caso em apreço, a questão sub judice traduz-se apenas em aferir da legalidade da liquidação de taxas de publicidade aplicadas às recorridas, nos termos da alínea j) do nº 1 do art. 15º do Decreto-Lei nº 13/71, de 23 de Janeiro, e actualizadas pelo Decreto-Lei nº 25/2004, de 24 de Janeiro. E o que se conclui é que, depois da entrada em vigor da Lei nº 97/88, a recorrente deixou de ter competência para liquidar taxas pelo licenciamento de afixação de mensagens publicitária, uma vez que a sua intervenção se limita à emissão de parecer, no âmbito do procedimento de licenciamento, da autoria das câmaras municipais, nos termos dos disposto no art. 2º, nº 2, da Lei nº 97/88.».

Por conseguinte, de acordo com o enquadramento legal explicitado, mesmo admitindo que o Decreto-Lei nº 13/71, de 23 de Janeiro, se mantém em vigor, a verdade é que não oferece dúvidas que por força, primeiro do Decreto-Lei nº 637/76 e, posteriormente, da Lei nº 97/88, o inciso “aprovação ou licença” constante do art. 10º, nº 1, alínea b), do Decreto-Lei nº 13/71, foi derrogado e desgraduado na emissão de “parecer” das entidades com jurisdição sobre os locais onde a publicidade for afixada. Deve, assim, o procedimento ser iniciado junto das câmaras municipais que procederão à consulta das entidades competentes para a emissão do respectivo parecer.

E limitando-se a competência da recorrente (Z......) à emissão de parecer, no âmbito do procedimento de licenciamento, da autoria das câmaras municipais, nos termos do disposto no art. 2º, nº 2, da Lei nº 97/88, não lhe pode competir a iniciativa de liquidar as taxas por tal licenciamento.

4-DECISÃO:
A sentença não merece, pois, qualquer censura, pelo que se confirma.

Custas pela recorrente.
Lisboa, 6 de Maio de 2015. - Ascensão Lopes (relator) - Ana Paula Lobo - Dulce Neto.