Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01249/12.9BELSB
Data do Acordão:11/27/2018
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:MADEIRA DOS SANTOS
Descritores:APRECIAÇÃO PRELIMINAR
OBRAS
RESPONSABILIDADE
Sumário:I - É de admitir a revista onde se discute se a responsabilidade por obras coercivas realizadas pelas câmaras municipais pertence só ao «infractor» referido no art. 108°, n.º 1, do DL n.º 555/99, de 16/12 (e a quem lhe sucedesse por via hereditária), ou se, correspondendo a uma obrigação «ob rem» ou «propter rem», impende sobre o «dominus» actual.
II - A necessidade dessa admissão também decorre do facto das instâncias haverem julgado a acção improcedente sem atentarem num erro nos pressupostos - cuja eventual irrelevância depende da «interpretatio» do acto - arguido «ab initio Iitis» e aparentemente acontecido.
Nº Convencional:JSTA000P23877
Nº do Documento:SA12018112701249/12
Data de Entrada:11/13/2018
Recorrente:A.....
Recorrido 1:CM DE LISBOA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em apreciação preliminar, no Supremo Tribunal Administrativo:
A………, identificado nos autos, interpôs esta revista do acórdão do TCA Sul confirmativo da sentença do TAC de Lisboa que julgou improcedente a acção por ele interposta contra o Município de Lisboa e onde viera impugnar o acto camarário que lhe impusera o pagamento de € 90.637,72, correspondente ao custo de uma obra coercivamente executada pela câmara municipal.

O recorrente pugna pelo recebimento da revista para melhor aplicação do direito.

O recorrido, ao invés, considera a revista inadmissível.

Cumpre decidir.

Em princípio, as decisões proferidas em 2.ª instância pelos TCA's não são susceptíveis de recurso para o STA. Mas, excepcionalmente, tais decisões podem ser objecto de recurso de revista em duas hipóteses: quando estiver em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, assuma uma importância fundamental; ou quando a admissão da revista for claramente necessária para uma melhor aplicação do direito («vide» o art. 150º, n.º 1, do CPTA).

O autor e ora recorrente foi notificado, «na qualidade de herdeiro» de um anterior proprietário de determinado imóvel, objecto de obras coercivas promovidas pela CM Lisboa, para pagar o custo de tais trabalhos.

O autor impugnou o acto porque nunca foi herdeiro desse pretérito «dominus» - embora seja o actual dono do prédio - e porque o crédito estaria prescrito. No entanto, as instâncias julgaram a acção improcedente e, nesta revista, só aquele primeiro problema vem recolocado.

É óbvio que o acto errou ao atribuir ao autor uma «qualidade de herdeiro» que nunca deteve. Mas essa atribuição da «qualidade» pode ter dois sentidos: ou significava uma mera referência à causa legitimadora da actual, e aliás indiscutível, dominialidade do autor - e, nessa hipótese, o dito erro seria irrelevante; ou significava o reconhecimento de que só o «infractor» («vide» o art. 108º, n.º 1, do DL n.º 555/99, de 16/12), ou quem hereditariamente lhe sucedesse, haveria de suportar o custo das obras coercivas - e, então, o aludido erro nos pressupostos relevaria de imediato. Ora, as instâncias nada disseram sobre isto, pois aparentemente decidiram como se nenhum erro houvesse.

E, no fundo, o antecedente problema está ligado a uma «quaestio juris» anterior: a de saber se a responsabilidade pela «execução coerciva» prevista no art. 107º do DL n.º 555/99 incumbe apenas ao «infractor» (e a quem lhe suceda «per viam hereditariam») ou se, traduzindo uma obrigação «ob rem» ou «propter rem», impende sobre o «dominus» actual.

O referido assunto pode facilmente recolocar-se e merece um acréscimo de esclarecimento. Convém, por isso, que o STA enuncie directrizes na matéria.

Nestes termos, acordam em admitir a revista.

Sem custas.

Porto, 27 de Novembro de 2018. – Madeira dos Santos (relator) – Costa Reis – São Pedro.