Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01206/16
Data do Acordão:02/09/2017
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:ANA PAULA PORTELA
Descritores:INTIMAÇÃO PARA CONSULTA DE DOCUMENTOS
Sumário:I - O pedido de “(iii) consulta da documentação de suporte dos referidos custos” ainda que a expressão usada seja de “os referidos custos” e estes sejam documentos contendo a informação qualitativa e quantitativa (i) dos custos incorridos pelo ICP- ANACOM com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal universal e não universal nos anos de 2010 a 2013” não deixa de incluir a consulta de quaisquer documentos que se refiram aos referidos custos, sejam eles quais forem e da forma como existam na entidade requerida.
II - Pelo que ocorre coincidência entre o pedido formulado à entidade requerida e o presente pedido de intimação relativo à consulta de documentos já que em ambos se pretende a consulta da documentação de suporte dos custos com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal universal nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013 e (ii) dos custos incorridos pelo ICP-ANACOM com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal não universal nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013, não tendo sido violados os artigos 104º e 105º do CPTA.
III - Não estando em causa a reprodução de qualquer documento fica, desde logo, excluída a questão da prévia adaptação documental a exigir, eventualmente, esforço desproporcionado justificativo da denegação do direito de acesso, e por isso de violação do nº 5 do art. 11º da LADA.
IV - Não ocorre violação do art. 14º nº3 da LADA pelo facto de estar em causa a consulta de milhares de documentos e registos contabilísticos que não interfere com o acesso à consulta de documentos apenas podendo tornar mais penosa a consulta.
V - Não ocorre violação dos n.ºs 5 e 6 da LADA a aqui recorrente não concretizou atempadamente em que medida os documentos objecto de consulta continham segredos de empresa ou interferiam com a reserva da intimidade da vida privada e a proteção da confidencialidade no quadro do exercício do direito de acesso aos documentos administrativos por conterem dados pessoais segredos comerciais, industriais ou sobre a vida interna de uma empresa, e não o poder fazer neste momento.
Nº Convencional:JSTA000P21448
Nº do Documento:SA12017020901206
Data de Entrada:12/05/2016
Recorrente:ICP - AUTORIDADE NACIONAL DE COMUNICAÇÕES
Recorrido 1:A... LDA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo
RELATÓRIO

1. A ICP – ANACOM vem interpor recurso de revista para este STA do Acórdão do TCA que concedeu provimento ao recurso jurisdicional da sentença do TAC de Lisboa (que deferindo pedido de intimação deduzido por A……… intimou a “… entidade requerida a prestar à Requerente, no prazo de 15 dias, o montante global dos custos da prestação do serviço universal e não universal, apresentados por cada operadora, relativos aos anos 2010, 2011, 2012 e 2013, bem como os rendimentos auferidos nos mencionados anos que serviram de base à determinação dos custos de regulação e consequentemente, à fixação da taxa anual que serviram de base à determinação dos custos de regulação e consequentemente, à fixação da taxa anual de prestação de serviços postais referentes aos mesmos), declarou nula a sentença recorrida e, em substituição intimou a “... entidade requerida a disponibilizar à requerente, no prazo de 15 dias, a consulta da documentação de suporte dos custos incorridos pelo ICP-ANACOM com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal universal e do serviço postal não universal, nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013.”

Para tanto alega, em conclusão:

“Objeto do recurso e pressupostos da respetiva admissibilidade

1.ª O presente recurso tem por objeto o acórdão de fls., na parte em que intimou a Recorrente ANACOM a prestar à Recorrida A………., «no prazo de 15 dias, a consulta da documentação de suporte dos custos incorridos pelo ICP-ANACOM com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal universal e do serviços postal não universal [sic], nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013»;

2.ª A revisão do acórdão recorrido é «claramente necessária para uma melhor aplicação do direito» (artigo 150.º n. 1, in fine do CPTA);

3.ª Já porque foram violados os artigos 104.º, n.º 1 e 105.º do CPTA, na medida em que o Tribunal a quo condenou a ANACOM a facultar o acesso à informação não procedimental em termos diversos dos inicialmente requeridos pela A……….. e que fundamentaram a alegada falta de satisfação do pedido, quando, sendo o requerimento inicial formulado em termos diferentes, aquela decisão poderia ter sido outra (primeiro fundamento do recurso — violação de lei processual), ocorrendo in casu um erro manifesto na aplicação do direito que redunda em violação do princípio constitucional da separação de poderes, o que justifica e fundamenta a revista;

4.ª Já porque também foram violados os artigos 6.º, nºs 5 e 6, 11. n.º 5 e 14.º n.º 3 da LADA, na medida em que o Tribunal a quo acaba por permitir o acesso indiscriminado e indiferenciado a toda documentação de suporte dos custos incorridos com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal, universal e não universal, nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013, sem atender, quer ao princípio da proporcionalidade, que deflui dos artigos 11.º, n. 5 e 14.º n.º 3 da LADA, quer ao princípio da reserva da intimidade da vida privada ou confidencialidade, que deflui do artigo 6.º, nºs e 6 do mesmo diploma (segundo fundamento do recurso — violação de lei substantiva);

5.ª Trata-se, em ambos os casos, de questões que têm a virtualidade de repetição em termos análogos noutras situações, pelo que, com suporte no acórdão desse Supremo Tribunal de 11 de novembro de 2015, proferido no proc. n. 01370/15, não poderá deixar de ser admitido o presente recurso, com fundamento no disposto no artigo 150.º, n.º 1, in fine do CPTA;

Com efeito,

Primeiro fundamento do recurso: violação de lei processual

6.ª Os termos em que foi formulado pela A………..., em 2 de setembro de 2014, o requerimento de acesso à informação administrativa não procedimental condicionaram de forma decisiva a resposta da ANACOM, precisamente porque lhe foi solicitado o acesso a informação desagregada quanto aos (i) custos incorridos pela ANACOM com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal universal nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013 e quanto aos (ii) custos incorridos pela ANACOM com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal não universal nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013, quando essa informação não existe, nesses termos, nas contas desta entidade reguladora, como decorre da resposta dada à A……….. em 8 de setembro de 2014 (alínea B) do probatório), pelo que seria impossível satisfazer o pedido de informação da A………..

7.ª Mesmo que a ANACOM franqueasse o acesso da A………. a todo o seu sistema de contabilidade, esta empresa nunca conseguiria obter a informação que pretende, na forma que pretende, pois, a informação não está organizada desse modo;

8.ª Quando o Tribunal a quo conclui que «a entidade requerida admite que possui os documentos pretendidos pela requerente» (fls. 26) não poderia deixar igualmente de concluir que a entidade requerida apenas possui esses documentos de forma agregada isto é, sem distinguir qualitativa e quantitativamente (i) os custos incorridos com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal universal nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013 e (ii) os custos incorridos com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal não universal nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013, como lhe havia sido requerido pela A………. em 2 de setembro de 2014;

9.ª A………… pediu uma coisa em 2 de setembro de 2014 e, face à resposta da ANACOM de 8 de setembro de 2014, foi ajustando progressivamente o pedido: primeiro nos artigos 19.º 20.º e 22.º e 25º do requerimento inicial; depois nos n.ºs 18, 19, 20, 22 e 25 da resposta às exceções; depois nos § 36, 40, 44, 57 e 58 das alegações de recurso e, finalmente, nos § 37, 38, 44 e 46 a 48 das contra-alegações de recurso, chegando a afirmar que «sempre solicitou a consulta de toda a documentação de suporte dos custos de regulação, supervisão e fiscalização dos serviços postais relevantes para o cálculo da “taxa anual de prestação de serviços postais”, independentemente de os mesmos respeitarem ao serviço universal ou aos demais serviços postais» (§ 37 das contra-alegações de recurso);

10.ª A alegada recusa da ANACOM em fornecer as informações solicitadas pela A………. baseou-se num pedido da respetiva consulta em termos desagregados solicitando esta o acesso diferenciado, qualitativa e quantitativamente, à documentação de suporte dos (i) custos incorridos pela ANACOM com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal universal nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013 e (ii) dos custos incorridos pela ANACOM com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal não universal nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013;

11.ª Como bem salientou a Magistrada do Ministério Público junto do Tribunal Central Administrativo Sul no seu parecer, embora tendo como referencial a sentença proferida em 1.ª instância pela 2.ª Unidade Orgânica do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, «o pedido de intimação destina-se a tornar efectivo um direito à informação ou à obtenção de documentos, constitucionalmente garantidos — cf. também, art° 104° do CPTA; mas, para que possa ser utilizado o meio processual judicial de “Intimação”, é necessário que, previamente e nas circunstâncias de tempo legalmente determinadas — cf art° 105° do CPTA - o interessado dirija tal pedido à entidade que detém a informação ou o documento pretendido e que essa mesma entidade lhe negue a informação ou o acesso ao documento solicitado, sendo deles detentora. Não sendo satisfeito o pedido pela autoridade a quem foi solicitado, pode o interessado requerer ao tribunal a sua intimação - cf art° 104° do CPTA

- tendo em vista a sua satisfação, mas não pode alterar ou extravasar o pedido que dirigiu à autoridade administrativa, cuja recusa é a causa de pedir da “Intimação”. É que a intimação judicial só é possível nos casos em que a administração não satisfaz o pedido que lhe é dirigido. Veja-se a este propósito o Ac. do TCASuI proferido no proc n° 00433/05 em que se considerou que “pedida e recusada certidão nos termos ditos em I. não deve intimar-se a autoridade requerida a passar a certidão ao abrigo do art. 24.º do CPPT pois a recusa dela não foi nesses termos.”» (sublinhado acrescentado);

12.ª Realmente, sendo o pressuposto do meio processual regulado nos artigos 104.º a 108.º do CPTA a não satisfação, o indeferimento ou a satisfação parcial de um determinado pedido de acesso à informação administrativa procedimental ou não procedimental ocorre violação de lei processual, in casu, dos artigos 104.º, n.º 1 e 105.º do CPTA, quando o Tribunal a quo condene a entidade requerida a facultar o acesso à informação não procedimental em termos diversos dos inicialmente requeridos;

13.ª Com efeito, sendo a causa de pedir da “Intimação” a não satisfação, o indeferimento ou a satisfação parcial de um determinado pedido de acesso à informação administrativa procedimental ou não procedimental, o tribunal a quo não pode determinar a intimação da entidade requerida a facultar o acesso a arquivos e registos administrativos em termos diferentes dos inicialmente requeridos, pois quanto a esses novos termos não ocorreu qualquer recusa, não satisfação ou satisfação parcial do pedido por parte da Administração;

14.ª Por outras palavras, não poderá o acesso ser requerido em termos desagregados como sucedeu in casu, e a entidade requerida, que alegadamente recusou o acesso nesses termos, vir depois a ser condenada à satisfação da pretensão da requerente em termos agregados disponibilizando «a consulta da documentação de suporte dos custos incorridos pelo ICP-ANACOM com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal universal e do serviços postal não universal, nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013», sob pena de violação do princípio constitucional da separação de poderes, substituindo-se o Tribunal à Administração no exercício da função administrativa;

15.ª Para se encontrarem preenchidos os requisitos do processo de intimação para prestação de informações, consulta de documentos e passagem de certidões, previsto no n.º 1 do artigo 104.º do CPTA, nomeadamente, a recusa da Administração (in casu, a ANACOM) em facultar a consulta de documentos, prestar informações ou passar certidões (cf. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 29/05/2008, proc. 01130/07.3BECBR, disponível em www.dgsi.pt), seria necessário que a ANACOM tivesse sido confrontada pela A………, ora Recorrida, com um pedido de acesso aos documentos na versão modificada que veio apenas a apresentar em juízo;

16.ª Termos em que ocorre in casu um erro manifesto na aplicação do direito por violação do disposto nos artigos 104.º, n.º 1 e 105.º do CPTA (violação de lei processual) que redunda em violação do princípio constitucional da separação de poderes, o que justifica e fundamenta a revista;

17.ª Trata-se, ademais, de uma questão que tem a virtualidade de repetição em termos análogos noutras situações pelo que, com suporte no acórdão desse Supremo Tribunal de 11 de novembro de 2015, proferido no proc.º n.º 01370/15, não poderá deixar de ser admitido o presente recurso, com fundamento no disposto no artigo 150.º n.º 1, in fine do CPTA;

Segundo fundamento do recurso: violação de lei substantiva

Violação dos artigos 11.º 2, n.º 5 e 14.º, n.º 3 da LADA - o princípio da proporcionalidade e a proibição do exercício abusivo do direito de acesso aos documentos administrativos

18.ª Em segundo lugar, ao permitir o acesso indiscriminado a todos os documentos contabilísticos de suporte aos 11 centros de custos identificados na resposta da ANACOM ao requerimento inicial de intimação, no valor de €2.713.726 em 2013, €2.537.545 em 2012, €2.252.318 em 2011 e €2.507.495 em 2010, totalizando nos 4 anos em causa um valor superior a dez milhões de euros, o Tribunal a quo vem permitir à A………. um exercício sem quaisquer limites do direito de acesso à informação não procedimental, pondo em causa o princípio da proporcionalidade e a proibição do exercício abusivo do direito de acesso aos documentos administrativos, que deflui dos artigos 11.º, n.º 5 e 14.º n. 3 da LADA;

19.ª Estando em causa, no plano contabilístico, blocos unitários de custos cuja repartição é feita de acordo com a metodologia Activity Based Costing (ABC), a respetiva documentação de suporte, relativa ao período de 4 anos, é imensa, sendo composta por milhares de documentos e registos contabilísticos (a grande maioria dos quais apenas em suporte digital/eletrónico e apenas acessíveis através dos sistemas de informação da ANACOM);

20.ª Ora, tanto o exercício do direito à informação administrativa não procedimental como o correlativo princípio geral da administração aberta ou do arquivo aberto não podem deixar de ser entendidos no quadro geral dos princípios da proporcionalidade, da boa-fé e da colaboração da Administração com os particulares;

21.ª Nesta conformidade, se o dever de prestação de informação não legitima posturas evasivas por parte da Administração, também o direito de acesso à informação não se afigura compatível com posições abusivas ou excessivas por parte dos interessados, como ocorre in casu, com o sancionamento do Tribunal a quo;

22.ª O direito à informação administrativa não procedimental não pode ser interpretado e aplicado, como ocorre no caso sub judice, como um direito de acesso geral e indiscriminado aos registos contabilísticos da ANACOM (ou de qualquer outra entidade administrativa) e a todos os documentos que suportam os custos incorridos com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal universal e dos demais serviços postais nos anos de 2010 a 2013, inclusive;

23.ª É aplicável neste caso, tanto o n.º 5 do artigo 11.º da LADA como o n.º 3 do artigo 14.º do mesmo diploma onde, em homenagem ao princípio da proporcionalidade e ao princípio geral da proibição do exercício abusivo de posições jurídicas, se estabelece que «A entidade requerida não tem o dever de criar ou adaptar documentos para satisfazer o pedido, nem a obrigação de fornecer extractos de documentos, caso isso envolva um esforço desproporcionado que ultrapasse a simples manipulação dos mesmos» (artigo 11.º, n.º 5 da LADA, itálico acrescentado) e que «A Administração não está obrigada a satisfazer pedidos que, face ao seu carácter repetitivo e sistemático ou ao número de documentos requeridos, sejam manifestamente abusivos» (artigo 14.º n.º 3 da LADA, itálico acrescentado);

24.ª O acórdão recorrido violou os artigos 11.º n.º 5 e 14.º, n.º 3 da LADA, bem como o princípio da proporcionalidade e a proibição do exercício abusivo do direito de acesso aos documentos administrativos, o que justifica e fundamenta a revista;

25.ª Trata-se, ademais, de uma questão que tem a virtualidade de repetição em termos análogos noutras situações pelo que, com suporte no acórdão desse Supremo Tribunal de 11 de novembro de 2015, proferido no proc. n.º 01370/15, não poderá deixar de ser admitido o presente recurso, com fundamento no disposto no artigo 150.º, n.º 1, in fine do CPTA;

Violação do artigo 6.º, nºs 5 e 6 da LADA — a reserva da intimidade da vida privada e a proteção da confidencialidade no quadro do exercício do direito de acesso aos documentos administrativos

Informações contendo dados pessoais e nominativos e acesso a documentos administrativos contendo segredos comerciais, industriais ou sobre a vida interna de uma empresa

26.ª Em terceiro lugar o acesso indiscriminado da A………. a todos os documentos contabilísticos que suportam os lançamentos respeitantes aos diversos blocos de custos anteriormente identificados, franqueado pelo acórdão recorrido, suscita especiais problemas de confidencialidade e de acesso a dados pessoais e nominativos não só no bloco de custos respeitante aos “gastos com o pessoal associados ao setor postal” (conta 63 do SNC), uma vez que esses custos são obtidos a partir da afetação direta das horas de trabalho aos processos/serviços e objetos de custeio da ANACOM, de acordo com o reporte feito por todos os colaboradores numa aplicação informática “Reporte de Horas de Trabalho (RHT)”, e no bloco de custos respeitante no “Gastos associados diretamente com o setor postal” (conta 62 SNC), onde consta informação relativa à participação em reuniões no país e no estrangeiro, bem como informações decorrentes de outros processos de trabalho, em particular os relacionados com ações de fiscalização, mas também nos “gastos com comunicações (telefone, fax, e transmissão de dados — conta 62 do SNC) e com serviços postais (conta 62 do SNC), na medida em que permitirá à A……….. aceder a informações contendo dados pessoais e nominativos;

27.ª Mais ainda: sendo-lhe facultado o acesso aos sistemas de informação de suporte aos sistemas de contabilidades da ANACOM (SNC e ABC), a A………… teria acesso também ao detalhe/discriminação dos dados faturados aos concorrentes, aos valores faturados aos operadores de telecomunicações, aos valores faturados por todos os fornecedores e prestadores de serviços à ANACOM, etc., o que implica o acesso a documentos administrativos contendo segredos comerciais, industriais ou sobre a vida interna de uma empresa…

28.ª ... o que implica a violação dos n.ºs 5 e 6 do artigo 6.º, onde se determina que «5 - Um terceiro só tem direito de acesso a documentos nominativos se estiver munido de autorização escrita da pessoa a quem os dados digam respeito ou demonstrar interesse directo, pessoal e legítimo suficientemente relevante segundo o princípio da proporcionalidade» e que «6 - Um terceiro só tem direito de acesso a documentos administrativos que contenham segredos comerciais, industriais ou sobre a vida interna de uma empresa se estiver munido de autorização escrita desta ou demonstrar interesse directo, pessoal e legítimo suficientemente relevante segundo o princípio da proporcionalidade» (ênfase aditada);

Informações sobre a vida interna da ANACOM

29.ª Por outro lado, o acesso indiscriminado da A……….. a todos os documentos contabilísticos que suportam os lançamentos respeitantes aos diversos blocos de custos anteriormente identificados permitirá à A………… aceder a informações sobre a vida interna da ANACOM que também suscitam especiais problemas de confidencialidade, podendo pôr em causa o cumprimento da sua missão enquanto regulador do setor postal;

30.ª Ao permitir o acesso indiscriminado da A……….. a todos os documentos contabilísticos que suportam os lançamentos respeitantes aos diversos blocos de custos incorridos pela ANACOM com a regulação do setor postal, o acórdão recorrido permitiu uma verdadeira devassa da vida interna da ANACOM, transformando o direito de acesso à informação administrativa não procedimental numa espécie de auditoria ao regulador pelos regulados, sem quaisquer limites, e em termos que põem em causa o cumprimento por parte da ANACOM da sua missão enquanto regulador do setor postal;

31.ª Na prática, o que resultaria do cumprimento pela ANACOM ao acórdão recorrido, não seria uma mera consulta aos documentos de suporte aos custos incorridos pela ANACOM com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal universal e do serviço postal não universal, nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2103 — porque tal consulta não é viável dessa forma e nesses termos — mas sim uma intrusão geral da A……….. em todo o sistema contabilístico e financeiro da ANACOM, abrangendo a contabilidade geral e analítica e as aplicações informáticas que as suportam, com as inerentes consequências a nível da confidencialidade de dados financeiros do mercado (empresas do setor postal e de comunicações eletrónicas) e acesso a dados pessoais dos trabalhadores da ANACOM;

32.ª Nestes termos, o acórdão recorrido violou o artigo 6.º n.ºs 5 e 6 da LADA e os princípios da reserva da intimidade da vida privada e da proteção da confidencialidade subjacentes àquelas disposições normativas, o que justifica e fundamenta a revista;

33.ª Trata-se, ademais, de uma questão que tem a virtualidade de repetição em termos análogos noutras situações pelo que, com suporte no acórdão desse Supremo Tribunal de 11 de novembro de 2015, proferido no proc.º n.º 01370/15, não poderá deixar de ser admitido o presente recurso, com fundamento no disposto no artigo 150.º, n. 1, in fine do CPTA.

Termos em que se encontram reunidos os pressupostos de admissibilidade do presente recurso, na medida em que o conhecimento dos respetivos fundamentos é claramente necessário à melhor aplicação do direito, quer no caso em apreço, quer em casos similares em que se coloquem as mesmas questões processuais e substantivas.

Assim sendo e na procedência do presente recurso, deverá ser revogado o acórdão recorrido, na parte em que intimou a Recorrente a prestar à Recorrida «no prazo de 15 dias, a consulta da documentação de suporte dos custos incorridos pelo ICP-ANACOM com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal universal e do serviços postal não universal [sic] nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013», o qual deverá ser substituído por outro que, aplicando melhor o direito aos factos, indefira a pretensão da Recorrida, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!”

2. A…………… contra-alegou, concluindo:

A) A Recorrida discorda da posição adoptada pela Recorrente no âmbito do presente recurso, entendendo ... não se encontrarem preenchidos os requisitos, previstos no artigo 150º do CPTA, que permitiriam a interposição daquele recurso

B) A Recorrente não demonstrou se e em que medida os vícios imputados ao Acórdão proferido pelo Tribunal a quo constituem fundamento para a admissão do recurso excepcional de revista, tão-só procurando demonstrar a existência de erros de julgamento nesse Acórdão;

C) O Tribunal a quo afirmou expressamente não ter ficado demonstrada qualquer divergência entre o pedido deduzido pela Recorrida em sede administrativa e o pedido deduzido posteriormente nos presentes autos de intimação;

D) A Recorrente pretende que o Tribunal ad quem reaprecie a identidade dos pedidos formulados pela Recorrida em sede administrativa e judicial o que não constitui fundamento para a admissão do recurso excepcional de revista, não podendo esse Douto Tribunal ad quem conhecer esse pedido sob pena de violação do regime ínsito no artigo 150º do CPTA;

E) A invocada violação de lei processual não constitui fundamento para a admissão do recurso excepcional de revista nos termos do artigo 150º do CPTA uma vez que não implica a apreciação de uma questão que pela sua relevância jurídica ou social se revista de importância fundamental ou cuja resolução seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito;

F) O Tribunal a quo não intimou a Recorrente a criar ou adaptar documentos para posterior disponibilização à Recorrida nem tão pouco considerou, perante as circunstâncias do caso concreto, que face ao número de documentos cuja consulta foi requerida pela Recorrida, o exercicio do direito à informação fosse abusivo;

G) A Recorrente pretende que o Tribunal ad quem admita o presente recurso para reapreciar a ponderação que o Tribunal a quo fez dos factos em crise em particular do impacto que teria, no caso concreto, a disponibilização da documentação contabilística de suporte dos custos de regulação, supervisão e fiscalização dos serviços postais universais e não universais entre 2010 e 2013 — o que não se coaduna com os pressupostos do recurso de revista consagrados no art. 150º do CPTA;

H) A Recorrente apenas invocou o regime consagrado no artigo 6º nº 6, da LADA, e apenas em reacção a um manifesto lapso de julgamento do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, entretanto rectificado pelo Tribunal a quo, que condenara a Recorrente a disponibilizar à Recorrida os documentos contendo os custos da prestação dos serviços postais incorridos pelas empresas que exercem essa actividade;

I) Nunca foi suscitado nas instâncias ou em sede administrativa o carácter reservado dos documentos cuja consulta foi solicitada pela Recorrida;

J) A questão suscitada sobre a alegada violação dos regimes ínsitos nos artigos 6.º nºs 5 e 6, 11.º n 5 e 14.º nº 3, da LADA, não encerra um grau de complexidade superior ao comum, nem tão a sua solução exige operações exegéticas ou um enquadramento normativo especialmente complexo;

K) O sentido decisório perfilhado pelo Tribunal a quo não é ostensivamente errado ou juridicamente insustentável, existindo diversa Jurisprudência e pareceres da CADA que reconhecem o direito de acesso a documentos contabilísticos de entidades administrativas em casos análogos ao dos presentes autos;

L) Não se encontram preenchidos os requisitos previstos no artigo 150º do CPTA porquanto a análise das alegadas violações de lei substantiva não encerram a apreciação de questões que pela sua relevância jurídica ou social se revistam de importância fundamental nem tão pouco será necessária para melhor aplicação do direito, pelo que no momento da apreciação sumária de tais pressupostos nos termos do artigo 150º nº 5, do CPTA, esse Douto Tribunal ad quem deverá pugnar pela não admissão do presente recurso;

M) Caso esse Douto Tribunal ad quem considere preenchidos os requisitos previstos no artigo 150º nº 1, do CPTA, não poderá deixar de considerar que a solução adoptada pelo Douto Tribunal a quo é a que melhor se adequa à situação dos autos por se revelar totalmente conforme à lei, intimando a Recorrente a disponibilizar à Recorrida, no prazo de 15 dias, a consulta da documentação de suporte dos custos incorridos com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal universal e não universal, nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013.

Nestes termos e nos demais de Direito que V Ex.as doutamente suprirão, requer ao Douto Tribunal ad quem que não admita o recurso interposto pela ANACOM, com fundamento na falta de preenchimento dos pressupostos previstos no artigo 150º nº 1, do CPTA.

Em caso de improcedência do pedido anterior, requer ao Douto Tribunal ad quem que julgue improcedente o presente recurso, pugnando pela manutenção do sentido decisório perfilhado pelo Douto Tribunal a quo no âmbito do seu Acórdão de 19 de Agosto de 2016.

Na medida da improcedência do presente recurso, requer-se ao Douto Tribunal ad quem que condene a ANACOM no pagamento das custas judiciais, tudo com as demais consequências legais.

3. Por Acórdão da Formação, proferido neste STA, em 10.11.2016, foi o recurso de revista admitido, extraindo-se do mesmo:

“...2.3. A questão dos autos emerge de pedido da ora recorrida em aceder a documentação de suporte (i) dos custos incorridos com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal universal nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013 e (ii) dos custos incorridos pelo ICP - ANACOM com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal não universal nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013.

Na resposta a esse pedido a entidade ora recorrente informara, entre o mais, que não existia na sua posse qualquer documento fazendo a decomposição do valor dos custos incorridos em função de ser ou não serviço postal universal.

O requerente formulou, então, o pedido de intimação. E se bem que o mesmo não corresponda totalmente ao que havia solicitado à entidade demandada, a verdade é que quanto à documentação daqueles custos há correspondência.

A primeira instância entendeu que a requerente pretendia saber os custos da regulação a partir da distinção entre prestação de serviço postal universal e não universal.

Ora, considerou que a entidade requerida não estava obrigada a coligir os elementos pretendidos. Porém, poderia e deveria fornecer-lhe outros elementos.

Essa decisão foi julgada nula pelo Tribunal Central, pois julgou que ela tinha condenado em objecto diverso do pedido.

Depois, o TCA conheceu em substituição e condenou nos termos que transcrevemos (supra 1.3.).

Agora, a recorrente, embora sob outra perspectiva, coloca problema que radica na mesma questão de identidade de matéria. Já não por se tratar de condenação em objecto diverso do pedido formulado ao tribunal (que levou à declaração de nulidade da sentença) mas por se tratar de condenação que não tem em atenção o pedido que lhe fora efectivamente dirigido pela interessada.

É a questão que aparece como primeiro fundamento do recurso:

«Pode o tribunal determinar a intimação da entidade requerida a facultar o acesso a arquivos e registos administrativos em termos diferentes dos inicialmente requeridos que fundamentaram a alegada recusada ANACOM, quando, sendo o requerimento formulado em termos diferentes, aquela recusa poderia não ocorrer?

20. Expliquemo-nos melhor: pressupondo o meio processual regulado nos artigos 104 a 108 do CPTA a não satisfação, o indeferimento ou a satisfação parcial de um determinado pedido de acesso a informação administrativa procedimental ou não procedimental, não ocorrerá violação de lei processual, in casu, dos artigos 104.º, n.º 1 e 105.º do CPTA, quando o tribunal a quo condene a entidade administrativa a facultar o acesso à informação não procedimental em termos diversos dos inicialmente requeridos?

21. Por outras palavras ainda: poderá o acesso ser requerido em termos desagregados, como sucedeu in casu, sendo requerido o acesso diferenciado, qualitativa e quantitativamente, à documentação de suporte dos (i) custos incorridos pela ANACOM com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal universal nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013 e (ii) dos custos incorridos pela ANACOM com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal não universal nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013, e a entidade requerida, que alegadamente recusou o acesso nesses termos, vir depois a ser condenada à satisfação da pretensão da requerente em termos agregados».

Note-se que não parece estar em discussão haver uma condenação em menos do que fora requerido. Nessas situações, que são correntes, o tribunal condena em menos, mas no estrito quadro do que havia sido pedido e não satisfeito.

No caso presente tratar-se-á, defende a recorrente, de modificação face ao que lhe fora solicitado e a que respondera.

Esta questão é, na verdade, relevante e pode colocar-se em situações futuras. Ela respeita à exacta determinação do que foi solicitado e depois recusado pela entidade administrativa, e se tem de ser nesse quadro estrito que o pedido de intimação pode ser formulado e a decisão se tem de conter.

E não deixará de observar-se que, no caso em apreço, precisamente a impossibilidade de satisfação do pedido nos termos desagregados que haviam sido solicitados, fora razão da resposta da entidade administrativa.

Ora, se, a final, o tribunal vem a condenar à satisfação de algo diverso do que fase pré contenciosa fora solicitado pelo requerente à requerida justifica-se a pergunta inicial da recorrente: «Pode o tribunal determinar a intimação da entidade requerida […] em termos diferentes dos inicialmente requeridos que fundamentaram a alegada recusada […] quando, sendo o requerimento formulado em termos diferentes, aquela recusa poderia não ocorrer».

A resposta tem mesmo implicações ao nível de determinar quem se deve considerar vencedor e vencido na ação, com consequentes repercussões nas suas custas.

Sendo suficiente para a admissão o fundamento acabado de apreciar, é desnecessária a análise do demais alegado para esse efeito.

3. Pelo exposto, admite-se a revista.

4. Notificado o EMMP, ao abrigo do art. 146º, nº1 E 147º, Nº2 do CPTA, foi emitido o seguinte Parecer:

“... No recurso interposto para este Tribunal pretende-se saber se, no caso concreto, um pedido de acesso a informação de documento em termos desagregados relativa a acesso diferenciado, qualitativo e quantitativamente; à documentação de suportes dos “(i) custos incorridos pela ANACOM com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal universal nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013 e (ii) dos custos incorridos pela ANACOM com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal não universal nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013”, pode a entidade requerida, que alegadamente recusou o acesso nesses termos, vir depois a ser condenada à satisfação da pretensão da requerente em termos agregados. (vide ponto 21 do corpo das alegações da ANACOM).

Importa, por isso, apurar, entre o mais, nos termos das alegações da Recorrente, se existe violação dos art°s 104° e 105° do C.P.A “na medida em que o Tribunal a quo condenou a ANACOM a facultar o acesso à informação não procedimental em termos diversos dos inicialmente requeridos pela A………. e que fundamentaram a alegada falta de satisfação do pedido, quando, sendo o requerimento inicial formulado em termos diferentes, aquela decisão poderia ter sido outra...” (vide conclusão n° 3).

Vejamos:

O direito à informação está consagrado na Constituição no art. 268° nº 1 e 2 e regulado na Lei de Acesso a Documentos Administrativos através da Lei n° 46/07, de 24/08 (LADA).

Nos termos do Ac. 0896/07, de 17/01/08 deste Tribunal refere-se: “O direito de acesso aos arquivos e registos administrativos vem sendo considerado como um direito fundamental cujo sacrifício só se justifica quando confrontado com direitos e valores constitucionais de igual ou mais valia, como os relativos à segurança interna e externa, à investigação criminal e à reserva da intimidade das pessoas (sic)”.

Porém, na questão suscitada nesta revista, não se põe em causa esse direito à informação, mas tão somente saber se no decurso do pedido de intimação poderá haver condenação que não tenha em atenção o pedido apresentado inicialmente junto da entidade administrativa.

O CPTA no art. 104° e ss. consagra os pressupostos do processo de intimação para prestação de informações, consulta de processo ou passagens de certidões, não prevendo a existência de alterações no pedido formulado, uma vez que a intimação só é possível na medida em que a entidade administrativa não satisfez o pedido que lhe foi solicitado.


*

Ora, a Requerente apresentou, em 02/09/14 um requerimento solicitando que lhe fossem disponibilizados: “através de reprodução por fotocópia ou por qualquer outro meio técnico, designadamente electrónico, os documentos contendo a informação qualitativa e quantitativa (i) dos custos incorridos pelo ICP-ANACOM com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013 e (ii) dos custos incorridos pelo ICP-ANACOM com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal não universal nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013 e, bem assim, que seja disponibilizada à requerente (iii) a consulta da documentação de suporte dos referidos custos”.

No dia 26/09/2004 apresentou novo pedido de informação solicitando:

Intime o ICP-ANACOM a autorizar e disponibilizar à Requerente a consulta da documentação de suporte (1) dos custos por incorridos com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal universal nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013 e (ii) dos custos incorridos pelo ICP-ANACOM com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal não universal nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013, nos termos do disposto nos artigos 5°, 11°, n.° 1, alínea b), 13° da Lei n.° 46/2007, de 24 de Agosto, 104.° e 105.° do CPTA;”

Constata-se, assim, que os pedidos apresentados, em 02/09/2000 e em, 26/09/2004 não são coincidentes.

Nos termos do art. 609 nº 1 do C.P.C o juiz não pode condenar em objeto diverso do apresentado no pedido. Sobre esta matéria veja-se o Ac. do STJ, de 21/12/76 in B.M.J n° 262 a fls. 139 onde se refere: “A decisão que ultrapassa o pedido formulado, sem modificação objectiva da instância, passando a abranger matéria distinta, está eivada da nulidade prevista no artigo 668.°, n° 1, alínea e), do Código de Processo Civil”.

Este princípio é aplicável subsidiariamente ao processo nos Tribunais Administrativos, nos termos do art. 1 do C.P.T.A.


*

Deste modo, entendemos que foram violados os art°s 104° e 105° do C.P.T.A e ainda o disposto no art. 615º n° 1 — alínea e) do C.P.C devendo, por isso, julgar-se procedente a Revista.”

10. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

*

FACTOS CONSIDERADOS PROVADOS PELA DECISÃO RECORRIDA:

A) No dia 2/09/2014 a A………….., Lda requereu ao Presidente do ICP - Autoridade Nacional de Comunicações, que lhe ... disponibilizados, “através de reprodução por fotocópia ou por qualquer outro meio técnico, designadamente electrónico, os documentos contendo a informação qualitativa e quantitativa (i) dos custos incorridos pelo ICP- ANACOM com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal universal nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013 e (ii) dos custos incorridos pelo ICP-ANACOM com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal não universal nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013 e, bem assim, que seja disponibilizada à requerente (iii) a consulta da documentação de suporte dos referidos custos” (cfr. doc. 3 junto com o requerimento inicial).

B) O ICP-ANACOM respondeu ao pedido referido em A) por ofício com a referência ANACOM-S060201/2014, de 8/09/2014, nos seguintes termos (cfr. doc. 4 junto com o requerimento inicial):

“(…) Em resposta, cumpre-nos informar o seguinte:

4. Conforme mencionado no número 5 do requerimento sob resposta, na desagregação dos custos (gastos) totais do ICP-ANACOM por tipo de actividade, aprovada por deliberação do Conselho de Administração do ICP-ANACOM de 14 de Novembro de 2013 (…) e por deliberação do Conselho de Administração do ICP-ANACOM de 24 de Julho de 2014 (…) não é feita qualquer distinção entre custos incorridos com a regulação, supervisão e fiscalização da actividade do prestador do serviço postal universal e custos incorridos com a regulação, supervisão e fiscalização da actividade dos demais prestadores de serviços postais, porque tal distinção não tem expressão nas contas do ICP-ANACOM.

5. Na verdade, resulta dos documentos n.ºs 1 e 2 juntos com o requerimento sob resposta, que a metodologia de apuramento dos custos de regulação não assenta nos procedimentos administrativos de autorização e registo dos operadores (artigos 24º, n.ºs 1 a 3, 27º a 33º e 34º e 35º da Lei n.º 17/2012).

6. Com efeito, nos termos do anexo A (“metodologia de apuramento dos custos de regulação”) às deliberações citadas e juntas como documentos n.ºs 1 e 2 com o requerimento sob resposta, “o sistema de custeio do ICP-ANACOM foi desenvolvido com base na metodologia ABC e tem como objectivo identificar os custos associados ao desenvolvimento das actividades inerentes às atribuições estatutárias que lhe estão cometidas, bem como dar resposta ao estipulado no n.º 4 do artigo 105º da Lei n.º 5/2004, bem como ao estabelecido nos n.ºs 1 e 2 do artigo 44º da Lei n.º 17/2012, de 26 de Abril”;(…)

10. Não existe, por isso, na posse do ICP-ANACOM, qualquer “documento administrativo” susceptível de reprodução, que contenha a informação solicitada, uma vez que, como já se disse e é reconhecido no n.º 5 do requerimento sob resposta, não existe nas contas do ICP-ANACOM qualquer decomposição do valor dos custos incorridos com a regulação, supervisão e fiscalização da actividade dos prestadores dos serviços postais nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013, em função da sua actividade, isto é, consoante estes prestem, ou não o serviço postal universal.

11. Não se trata de não possuir o documento, nomeadamente para efeitos da alínea d) do n.º 1 do artigo 14º da Lei n.º 46/2007 (LADA), mas de estar em causa um pedido de acesso a um documento inexistente.(…)

13. Finalmente refira-se que as contas do ICP-ANACOM obedecem ao SNCV, são auditadas e estão publicadas no respectivo sítio da internet, sendo de acesso público (…), pelo que se encontram à disposição de V. Ex.ªs.”

C) A requerente tomou conhecimento do ofício referido em C) no dia 9/09/2014 (cfr. doc. 4 junto com o requerimento inicial).

D) O requerimento inicial foi remetido ao TAC de Lisboa via site, no dia 26/09/2014 (cfr. fls. 1 dos autos).

*

O DIREITO

A recorrente interpõe recurso para este Tribunal do acórdão proferido pelo TCAS que entendendo que “(...) o pedido que a Requerente formulou junto do ICP — ANACON é idêntico ao que deduziu no âmbito do presente processo” declarou nula a sentença do TAC de Lisboa por ter condenado em objeto diverso do pedido, e decidiu “(...), em substituição, intimar a entidade requerida a disponibilizar à requerente, no prazo de 15 dias, a consulta da documentação de suporte dos custos incorridos pelo ICP-ANACOM com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal universal e do serviço postal não universal, nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013”.

Imputa à decisão recorrida várias violações de lei, concretamente a violação dos artigos 104.º, n.º 1 e 105.º do CPTA, dos artigos 11.º 2, n.º 5 e 14.º, n.º 3 da LADA (o princípio da proporcionalidade e a proibição do exercício abusivo do direito de acesso aos documentos administrativos) e ainda a violação do artigo 6.º n.ºs 5 e 6 da LADA e os princípios da reserva da intimidade da vida privada e da proteção da confidencialidade.

2.Comecemos então por aferir se foram violados os artigos 104º e 105º do CPTA. Alega a recorrente que, para se encontrarem preenchidos os requisitos do processo de intimação para prestação de informações, consulta de documentos e passagem de certidões, previsto no n.º 1 do artigo 104.º do CPTA, seria necessário que a ANACOM tivesse sido confrontada pela A………. com um pedido de acesso aos documentos na mesma versão que veio apenas a apresentar em juízo, o que não aconteceu, conduzindo à violação dos artigos 104.º, n.º 1 e 105.º do CPTA.

Vejamos então se os pedidos solicitados à entidade administrativa e os constantes da presente intimação são coincidentes e caso não sejam, se o tribunal poderá conhecer de um pedido de intimação diferente do que foi solicitado administrativamente à entidade intimada.

A A……………, LDA, intentou no TAC de Lisboa processo de intimação para a prestação de informação e passagem de certidão, pedindo ao Tribunal a intimação do ICP-ANACOM a (a) autorizar e disponibilizar “a consulta da documentação de suporte (i) dos custos por si incorridos com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal universal nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013 e (ii) dos custos incorridos pelo ICP - AUTORIDADE NACIONAL DE COMUNICAÇÕES (ANACOM) com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal não universal nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013, nos termos do disposto nos artigos 5º, 11º, n.º 1, alínea b), 13º da Lei n.º 46/2007, de 24 de Agosto, 104º e 105º do CPTA” e (b) “a autorizar a Requerente a reutilizar (no todo ou em parte) os documentos a consultar, passando para o efeito certidão do respectivo teor se solicitado pela Requerente.

E, no dia 2/09/2014, havia requerido ao Presidente do ICP - Autoridade Nacional de Comunicações, que lhe fossem disponibilizados, “através de reprodução por fotocópia ou por qualquer outro meio técnico, designadamente electrónico, os documentos contendo a informação qualitativa e quantitativa (i) dos custos incorridos pelo ICP-ANACOM com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal universal nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013 e (ii) dos custos incorridos pelo ICP-ANACOM com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal não universal nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013 e, bem assim, que seja disponibilizada à requerente (iii) a consulta da documentação de suporte dos referidos custos”.

A decisão recorrida entendeu, nesta parte, que:

“(...) Importa referir, em primeiro lugar, que, ao contrário do que a entidade requerida pretende, o pedido que a requerente formulou junto do ICP-ANACOM é idêntico ao que deduziu no âmbito do presente processo.

Efectivamente, a requerente apresentou junto da entidade requerida, em 2/09/2014, um requerimento solicitando que lhe sejam disponibilizados, “através de reprodução por fotocópia ou por qualquer outro meio técnico, designadamente electrónico, os documentos contendo a informação qualitativa e quantitativa (i) dos custos incorridos pelo ICP-ANACOM com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal universal nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013 e (ii) dos custos incorridos pelo ICP-ANACOM com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal não universal nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013 e, bem assim, que seja disponibilizada à requerente (iii) a consulta da documentação de suporte dos referidos custos” (cfr. alínea A) do probatório).

E pediu ao Tribunal que intime a entidade requerida a autorizar e disponibilizar “a consulta da documentação de suporte (i) dos custos incorridos com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal universal nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013 e (ii) dos custos incorridos pelo ICP - ANACOM com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal não universal nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013, nos termos do disposto nos artigos 5º, 11º, n.º 1, alínea b), 13º da Lei n.º 46/2007, de 24 de Agosto, 104º e 105º do CPTA”.

Ou seja, o que a requerente pretende, e foi isso que solicitou junto da entidade requerida e posteriormente ao TAC de Lisboa, é ter acesso à documentação em poder daquela que lhe permita saber quais os custos incorridos pelo ICA-ANACOM com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal universal e não universal nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013, tendo requerido junto da Administração “a consulta da documentação de suporte dos referidos custos”.

A entidade requerida, alegando que os documentos pretendidos não existem, pois inexiste nas contas da ANACOM qualquer decomposição, entre serviço universal e não universal, do valor dos custos incorridos com a regulação, supervisão e fiscalização dos serviços postais, nos anos de 2010 a 2013, não facultou a informação pretendida...”

Ora, desde logo, resulta dos autos que um dos pedidos formulado ao Presidente do ICP- Autoridade Nacional de Comunicações, foi a disponibilização “através de reprodução por fotocópia ou por qualquer outro meio técnico, designadamente electrónico, os documentos contendo a informação qualitativa e quantitativa (i) dos custos incorridos pelo ICP- ANACOM com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal universal nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013 e (ii) dos custos incorridos pelo ICP-ANACOM com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal não universal nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013”.

E, quer consideremos que foi abandonado no pedido de intimação formulado no TAC de Lisboa ou que corresponde à versão contida no mesmo pedido de intimação de “... reutilizar (no todo ou em parte) os documentos a consultar, passando para o efeito certidão do respectivo teor se solicitado pela Requerente” o que é certo é que a condenação proferida na decisão recorrida o ignorou, apenas condenando a aqui recorrente a “intimar a entidade requerida a disponibilizar à requerente, no prazo de 15 dias, a consulta da documentação de suporte dos custos incorridos pelo ICP-ANACOM com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal universal e dos serviços postal não universal, nos anos de 2010, 2011, 2012 e 20.”

E, como o recurso de revista para este STA não teve por objecto qualquer pedido de certidão, está o mesmo fora do âmbito de qualquer análise por este Tribunal.

Por outro lado, na presente intimação que deu entrada no TAC de Lisboa, o pedido formulado em 1º lugar é o de consulta da documentação de suporte dos custos com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal universal nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013 e (ii) dos custos incorridos pelo ICP-ANACOM com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal não universal nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013.

Pelo que, a questão que se coloca é se este pedido tem o mesmo conteúdo do pedido de consulta de documentos deduzido perante a ANACOM (iii) a consulta da documentação de suporte dos referidos custos”.

A questão fica, assim, reduzida a aferir do conteúdo de ambos os pedidos de consulta de documentos, o deduzido perante a ANACOM e o constante do presente pedido de intimação.

A ANACOM, na resposta ao pedido de reprodução da informação perante si formulado pela aqui recorrida, alega que os documentos pretendidos não existem, pois inexiste nas suas contas qualquer decomposição, entre serviço universal e não universal, do valor dos custos incorridos com a regulação, supervisão e fiscalização dos serviços postais, nos anos de 2010 a 2013.

Mas, nada diz quanto ao pedido de consulta da documentação de suporte dos referidos custos.

Contudo, o que é certo é que para além de não ter emitido a certidão pedida também não facultou quaisquer documentos ainda que os existentes não fornecessem qualquer decomposição entre serviço universal e não universal.

Na verdade, precisamente porque não podia fornecer a certidão requerida nos termos em que foi solicitada é que se colocava de imediato a alternativa de possibilitar o acesso aos documentos existentes relativos ao valor dos custos incorridos com a regulação, supervisão e fiscalização dos serviços postais, nos anos de 2010 a 2013, de forma a que a requerente pudesse através da consulta dos mesmos fazer ela própria a referida decomposição ou não.

Ou seja, o pedido de “(iii) consulta da documentação de suporte dos referidos custos” ainda que a expressão usada seja de “os referidos custos” e estes sejam documentos contendo a informação qualitativa e quantitativa (i) dos custos incorridos pelo ICP-ANACOM com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal universal e não universal nos anos de 2010 a 2013” não deixa de incluir a consulta de quaisquer documentos que se refiram aos referidos custos, sejam eles quais forem e da forma como existam na entidade requerida.

É que, a própria natureza do que é uma consulta pressupõe uma atitude de procura de um documento concreto e definido ou de factos que resultem da conjugação de vários documentos.

Aliás, a consulta tinha, desde logo, todo o sentido precisamente pela não existência dos elementos pretendidos de forma coligida.

Porque não foi possível elaborar a certidão pela ANACOM pela inexistência dos referidos elementos desagregados colocava-se de imediato a satisfação da consulta dos elementos existentes para que a A………. procedesse ela mesmo a essa procura.

Pelo que, o pedido de consulta de documentos deduzido à ANACOM comporta o acesso aos custos incorridos pelo ICP-ANACOM com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal universal nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013 e os custos incorridos pelo ICP-ANACOM com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal não universal nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013 e que constam do presente pedido de intimação.

Assim, nesta parte, relativa à consulta de documentos, ocorre coincidência entre o pedido formulado à entidade requerida e o presente pedido de intimação à consulta de documentos.

Na verdade, em ambos os pedidos se pretende a consulta da documentação de suporte dos custos com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal universal nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013 e (ii) dos custos incorridos pelo ICP-ANACOM com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal não universal nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013.

E, não tendo este sido satisfeito pela aqui recorrente bem podia a requerente e aqui recorrida deduzir pedido de intimação nessa parte.

Fica, pois, prejudicada a questão de saber se se impunha a coincidência de pedidos perante a entidade requerida e o tribunal, já que basta que um dos pedidos seja coincidente para que, relativamente a ele, o tribunal se pronuncie sobre a bondade do seu indeferimento e já que o mesmo detém autonomia relativamente ao outro pedido também formulado.

Nada impede, pois, que o requerente aceite o indeferimento relativamente a um dos pedidos que solicitou à entidade requerida e já não o aceite relativamente a outro, desde que não haja qualquer relação de dependência entre ambos.

3. Vejamos, agora, se ocorrem os vícios invocados pela aqui recorrente de:

3.1. Violação dos artigos 11.º n.º 5 e 14.º, n.º 3 da LADA - o princípio da proporcionalidade e a proibição do exercício abusivo do direito de acesso aos documentos administrativos.

Vem a recorrente invocar a violação destes preceitos por o direito à informação administrativa não procedimental não poder ser interpretado e aplicado como um direito de acesso geral e indiscriminado aos registos contabilísticos da ANACOM (ou de qualquer outra entidade administrativa) e a todos os documentos que suportam os custos incorridos com a regulação, supervisão e fiscalização do serviço postal universal e dos demais serviços postais nos anos de 2010 a 2013, inclusive.

Pelo que, o acórdão recorrido ao intimá-la nos termos em que o fez violou os artigos 11.º nº 5 e 14º n.º 3 da LADA, bem como o princípio da proporcionalidade e a proibição do exercício abusivo do direito de acesso aos documentos administrativos.

Diz-se na decisão recorrida:

“A entidade requerida, alegando que os documentos pretendidos não existem, pois inexiste nas contas da ANACOM qualquer decomposição, entre serviço universal e não universal, do valor dos custos incorridos com a regulação, supervisão e fiscalização dos serviços postais, nos anos de 2010 a 2013, não facultou a informação pretendida.

A verdade, porém, é que acaba a entidade requerida por referir que a pretensão da requerente abrange milhares de documentos contabilísticos, sendo, por isso, abusiva. Ou seja, a entidade requerida admite que possui os documentos pretendidos pela requerente, alegando, contudo, ser abusivo e desproporcionado o pedido da requerente, na medida em que está em causa um número muito elevado de documentos contabilísticos.(...)”

É certo que a norma do art. 11° n°5 da Lei 46/07 de 24/08 estabelece com clareza que: «a entidade requerida não tem o dever de criar ou adaptar documentos para satisfazer o pedido, nem a obrigação de fornecer extractos de documentos, caso isso envolva um esforço desproporcionado que ultrapasse a simples manipulação dos mesmos».

Mas, como estamos apenas perante uma situação de consulta de documentos e não de passagem de certidão dos mesmos, não se põe em causa o fornecimento de extractos de documentos nem a adaptação de documentos para satisfação do pedido.

Ora, não se impondo à entidade administrativa criar um novo documento relativamente a dados de que não dispunha organizadamente, nem por isso, e face ao art. 11º n.º 1, als. a) a c), da LADA, deverá deixar de facultar o acesso aos documentos administrativos de onde conste a referida informação ainda que apenas através de um trabalho pessoal de consulta do processo.

Pelo que, o cumprimento do dever de consulta não implica a violação do art. 11º n.º 5 da LADA.

A este propósito refere-se no acórdão nº 0896/07 de 17.01.2008:

(…) O direito à informação materializa-se por diversos meios de que são exemplo a consulta do processo, a reprodução ou declaração autenticada de documentos, a prestação de indicações sobre a sua existência e conteúdo e a passagem de certidões. Por isso a postura da Administração perante um pedido de informação não pode ser meramente passiva.

(…) É certo que este dever de colaboração não compreende, como é lógico, a elaboração de dossiers estruturados ou sínteses da documentação existente nem a obrigação de produzir uma nova documentação administrativa com o propósito de satisfazer o pedido do Requerente porque tais atividades ultrapassam o dever legal de colaboração e de informação, mas também o é que a inexistência da obrigação de proceder a tais trabalhos não pode ser cobertura para uma interpretação minimalista do dever constitucional de prestar informações e de, na prática, constituir um boicote ao seu cumprimento”.

Na situação dos autos estamos apenas perante uma consulta de documentos, um dos meios em que se exerce o direito de acesso aos documentos administrativos “conforme opção do requerente”, nos termos do art. 11º, nº1 da LADA.

Não está aqui a reprodução de qualquer documento, o que exclui a satisfação do seu pedido através desse meio.

Assim sendo, está, igualmente, desde logo excluída, a eventualidade da necessidade de qualquer prévia adaptação documental a exigir, eventualmente, esforço desproporcionado justificativo da denegação do direito de acesso, nos termos da parte final do citado nº 5 do art. 11º.”

Vem, também, invocada a violação do artigo 14.º nº3 da LADA que dispõe:

“3 - A Administração não está obrigada a satisfazer pedidos que, face ao seu carácter repetitivo e sistemático ou ao número de documentos requeridos, sejam manifestamente abusivos.”

Ora, quanto às limitações concretas invoca a aqui recorrente que é abusivo o acesso indiscriminado a todos os milhares de documentos e registos contabilísticos (a grande maioria dos quais apenas em suporte digital/eletrónico e apenas acessíveis através dos sistemas de informação da ANACOM) relativos aos 11 centros de custos identificados na resposta da ANACOM ao requerimento inicial de intimação, no valor de €2.713.726 em 2013, €2.537.545 em 2012, €2.252.318 em 2011 e €2.507.495 em 2010, totalizando nos 4 anos em causa um valor superior a dez milhões de euros.

E que estão em causa, no plano contabilístico, blocos unitários de custos cuja repartição é feita de acordo com a metodologia Activity Based Costing (ABC) apenas acessíveis através dos sistemas de informação da ANACOM).

Ora, desta alegação não resulta qualquer motivo legítimo de recusa do direito de acesso a documentos administrativos consubstanciado na denegação injustificada do direito à informação, em violação dos arts. 11º, nº 5 e 14º nº3 da LADA.

Desde logo, não é o facto de estar em causa a consulta de milhares de documentos e registos contabilísticos que interfere com o acesso à consulta de documentos apenas podendo tornar mais penosa a consulta.

Quanto ao facto alegado de estar em causa, no plano contabilístico, blocos unitários de custos cuja repartição é feita de acordo com a metodologia Activity Based Costing (ABC) apenas acessíveis através dos sistemas de informação da ANACOM) tal apenas foi invocado em sede de recurso de revista não o tendo sido de forma a poder constar da matéria de facto, pelo que não nos podemos ater ao mesmo.

Não resulta, pois, dos autos que o acórdão recorrido tenha violado os artigos 11.º n.º 5 e 14.º, n.º 3 da LADA, bem como o princípio da proporcionalidade e a proibição do exercício abusivo do direito de acesso aos documentos administrativos.

3.2. Violação do artigo 6.º n.ºs 5 e 6 da LADA e os princípios da reserva da intimidade da vida privada e da proteção da confidencialidade.

Alega a recorrente que o acesso indiscriminado da A……… a todos os documentos contabilísticos que suportam os lançamentos respeitantes aos diversos blocos de custos anteriormente identificados suscita especiais problemas de confidencialidade e de acesso a dados pessoais e nominativos, não só no bloco de custos respeitante aos “gastos com o pessoal associados ao setor postal” (conta 63 do SNC), uma vez que esses custos são obtidos a partir da afetação direta das horas de trabalho aos processos/serviços e objetos de custeio da ANACOM, de acordo com o reporte feito por todos os colaboradores numa aplicação informática “Reporte de Horas de Trabalho (RHT)”, e no bloco de custos respeitante no “Gastos associados diretamente com o setor postal” (conta 62 SNC), onde consta informação relativa à participação em reuniões no país e no estrangeiro, bem como informações decorrentes de outros processos de trabalho, em particular os relacionados com ações de fiscalização, mas também nos “gastos com comunicações (telefone, fax, e transmissão de dados — conta 62 do SNC) e com serviços postais (conta 62 do SNC), na medida em que permitirá à A……….. aceder a informações contendo dados pessoais e nominativos.

E, também, que ao permitir o acesso aos sistemas de informação de suporte aos sistemas de contabilidades da ANACOM (SNC e ABC), a A……… implicaria também o acesso ao detalhe/discriminação dos dados faturados aos concorrentes, aos valores faturados aos operadores de telecomunicações, aos valores faturados por todos os fornecedores e prestadores de serviços à ANACOM, etc., ou seja implicaria o acesso a documentos administrativos contendo segredos comerciais, industriais ou sobre a vida interna das empresas que se relacionam com a ANACOM.

Para além de que está, também, em causa acesso a informações sobre a vida interna da ANACOM ao ser facultado o acesso indiscriminado da A……… a todos os documentos contabilísticos que suportam os lançamentos respeitantes aos diversos blocos de custos.

Diz-se na decisão recorrida:

“Cumpre, por fim, referir que vem agora a entidade requerida, já em sede de recurso jurisdicional, invocar que os documentos pretendidos contêm informação que reflecte a estratégia comercial das empresas prestadoras de serviços postais, pelo que os mesmos são de acesso reservado, por força do disposto no n.º 6 do artigo 6.º da LADA, e confidenciais, por força do disposto no n.º 1 do artigo 64.º da LGT.

O certo é que nunca antes a entidade requerida aduziu este argumento, nem em sede de resposta ao pedido que a requerente lhe apresentou, nem mesmo na oposição que deduziu no âmbito da presente intimação judicial. Só agora o fez, sem que tenha concretizado e demonstrado, como lhe competia, em que medida é que os documentos pretendidos contêm “segredo de empresa”.

Concluímos, em face do exposto, que se mostram preenchidos todos os requisitos de que a lei faz depender o deferimento do presente pedido de intimação.”

Então vejamos.

Dispõem os n.ºs 5 e 6 do referido artigo 6º da LADA que «5 - Um terceiro só tem direito de acesso a documentos nominativos se estiver munido de autorização escrita da pessoa a quem os dados digam respeito ou demonstrar interesse directo, pessoal e legítimo suficientemente relevante segundo o princípio da proporcionalidade» e que «6 - Um terceiro só tem direito de acesso a documentos administrativos que contenham segredos comerciais, industriais ou sobre a vida interna de uma empresa se estiver munido de autorização escrita desta ou demonstrar interesse directo, pessoal e legítimo suficientemente relevante segundo o princípio da proporcionalidade» (ênfase aditada);

Contudo, a recorrente não invocou estes factos nem perante a requerente nem aquando da intimação em 1ª instância, apenas invocando em 2ª instância que se suscitam “inultrapassáveis problemas de confidencialidade e de acesso a dados pessoais e nominativos, nomeadamente no bloco de custos respeitante aos “gastos com o pessoal associados ao setor postal” (conta 63 do SNC), uma vez que esses custos são obtidos a partir da afetação direta das horas de trabalho aos processos/serviços e objetos de custeio da ANACOM, de acordo com o reporte feito por todos os colaboradores numa aplicação informática “Reporte de Horas de Trabalho (RHT)”, e no bloco de custos respeitante no “Gastos associados diretamente com o setor postal” (conta 62 SNC), onde consta informação relativa à participação em reuniões no país e no estrangeiro, bem como informações decorrentes de outros processos de trabalho, em particular os relacionados com ações de fiscalização.”

O que significa que alguns daqueles factos, porque no fundo constituem uma exceção ao direito da requerente e aqui recorrida, deveriam ter sido alvo de pronúncia em instância própria sobre se se tratam de segredos comerciais, industriais ou sobre a vida interna de uma empresa.

Pelo que, não tendo a aqui recorrente concretizado atempadamente em que medida é que os documentos continham segredos de empresa ou interferiam com a reserva da intimidade da vida privada e a proteção da confidencialidade no quadro do exercício do direito de acesso aos documentos administrativos por conterem dados pessoais segredos comerciais, industriais ou sobre a vida interna de uma empresa, não o pode vir fazer neste momento.

*

Em face de todo o exposto acordam os juízes deste STA em negar provimento ao recurso.

Custas pela recorrente.

N.

Lisboa, 9 de Fevereiro de 2017. – Ana Paula Portela (relatora) – Jorge Artur Madeira dos Santos – Teresa Maria Sena Ferreira de Sousa.