Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01528/06.4BELSB
Data do Acordão:03/24/2021
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CT
Relator:NUNO BASTOS
Descritores:OPOSIÇÃO DE ACÓRDÃOS
PRESCRIÇÃO
CONTRIBUIÇÕES
Sumário:I - Sendo o recurso por oposição de acórdãos a que alude o artigo 284.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, na redacção inicial, interposto em coligação por ambos os recorrentes e as alegações apresentadas apenas por um deles, deve julgar-se deserto o recurso interposto pelo outro;

II - Não há oposição de acórdãos se, desde logo, o acórdão fundamento e o acórdão recorrido não responderam de forma oposta à questão colocada no recurso;

III - O acórdão fundamento e o acórdão recorrido não responderam de forma oposta se, estando em causa saber se o artigo 48.º, n.º 3, da Lei Geral Tributária, verificados os seus pressupostos, obsta a que a citação do responsável subsidiário produza os seus próprios efeitos interruptivos da prescrição, nenhum dos acórdãos responde afirmativamente a essa questão.

Nº Convencional:JSTA000P27427
Nº do Documento:SAP2021032401528/06
Data de Entrada:10/12/2020
Recorrente:A………. E OUTROS
Recorrido 1:AT – AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

1. Relatório

1.1. B…………. contribuinte fiscal n.º ………., com domicílio indicado na Rua ……., …, …….., 4450-…… Porto, e

A…………, contribuinte fiscal n.º ……….., com domicílio indicado em Rua ……., … ……., 4150-…Porto,

Interpuseram, em requerimento conjunto, recurso do acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul (que negou provimento ao recurso da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa que julgou improcedente a oposição à execução fiscal n.º 3328199501005774), ao abrigo do disposto no artigo 284.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, invocando contradição com cinco acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo e um do Tribunal Central Administrativo Sul.

Por despacho da Relatora, foram os Recorrentes notificados para indicarem o acórdão fundamento pelo qual optavam.

O primeiro Recorrente veio indicar como acórdão fundamento o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 21 de Abril de 2010, tirado no processo n.º 023/10.

O segundo Recorrente, em requerimento autónomo, indicou como acórdão fundamento «quanto à questão da ineficácia dos atos suspensivos ou interruptivos» o mesmo que já tinha indicado o primeiro Recorrente. E quanto à questão da «falta de citação da executada e nulidade de todo o processado subsequente», indicou o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 30 de Novembro de 2011, tirado no processo n.º 915/14.

O recurso foi admitido por despacho que consta de fls. 557 do processo físico.

Notificado da sua admissão, o primeiro Recorrente apresentou alegações de primeiro grau, tendentes a demonstrar a existência de oposição com o acórdão fundamento, tendo concluído do seguinte modo:

«(…)

A) Entre o acórdão recorrido e o acórdão fundamento existe identidade da questão de direito e das situações de facto, na medida em que ambos os arestos se pronunciaram sobre a prescrição de dívidas de contribuições e cotizações para a Segurança Social (dos períodos de 1992 e 1993 primeiro e 1994 a 1998, o segundo), cobradas coercivamente no âmbito de processos de reversão, em situações em que estava em causa a alteração legislativa do prazo de prescrição e a aplicação da Lei nova, ou seja, da lei n.º 17/2000, de 8 de agosto, bem como a aplicação do disposto no artigo 48.º, n.º 3 da LGT.

B) Não houve alteração substancial da regulamentação jurídica, perfilhando-se, nos acórdãos em análise, solução oposta que decorre de decisões expressas.

C) No acórdão recorrido o Tribunal decide pela não verificação da prescrição das dívidas, pois não considera aplicável o disposto no artigo 48.º, n.º 3, da LGT.

D) No acórdão fundamento o Tribunal considera verificada a prescrição das dívidas, porque aplica o disposto no artigo 48.º, n.º 3 da LGT.

E) Com efeito, se no acórdão recorrido se conclui que “os Oponentes foram citados da reversão da execução em 21/11/2005. Pelo que, o prazo de prescrição que terminaria em 06/02/2006, foi interrompido com a citação em 21/11/2005” (Sublinhado nosso).

F) Já no acórdão fundamento, apesar de também se defender a aplicação da Lei nova, o Tribunal não olvida o facto de a citação ter ocorrido mais de 5 anos após a liquidação das contribuições/cotizações, dando-lhe aliás relevância e concluindo pela prescrição das dívidas, por considerar que a interrupção da prescrição quanto à devedora originária não produz efeitos quanto ao revertido.

G) Posto isto, é por demais evidente que entre o acórdão ora recorrido e o acórdão fundamento existe a oposição exigida pelo artigo 284.º do CPPT e em consequência deverá o presente recurso prosseguir os seus trâmites até final.».

O segundo Recorrente nada disse.

A Ex.ma Sr.ª Juíza Desembargadora Relatora concluiu pela verificação da oposição de acórdãos e ordenou a notificação de Recorrentes e Recorrida para alegarem nos termos do disposto nos artigos 282.º, n.º 3 e 284.º, n.º 5, ambos do Código de Procedimento e de Processo Tributário.

O primeiro Recorrente apresentou alegações de segundo grau e concluiu do seguinte modo:

A) A decisão proferida pelo TCA SUL nos presentes autos está em manifesta contradição com a jurisprudência do STA, firmada no acórdão de 21/04/2010, proferido no âmbito do processo n.º 023/10, pelo que importa dirimir esse conflito, apresentando as razões pelas quais se considera que o entendimento e a interpretação que foi feita pelo STA deve prevalecer, nas situações em que seja invocada a prescrição de dívidas à Segurança Social e em que esteja em causa a alteração legislativa do prazo de prescrição e a aplicação da Lei nova;

B) Na base do entendimento vertido no acórdão do STA e do próprio entendimento que o Recorrente tem nesta matéria estão as seguintes premissas: i) à data da citação para a reversão (que, no caso, aconteceu em 21/11/2005 – cf. alínea E do probatório) haviam decorrido mais de 10 anos sobre a instauração da execução (no caso, em 16/05/1995 – cf. alínea A do probatório);

C) Para além disso, também já haviam decorrido cinco anos após a liquidação das dívidas em causa, para efeitos da aplicação do disposto no artigo 48.º n.º 3 da LGT;

D) Tais factos são suficientes para declarar, à luz das normas aplicáveis, a prescrição da dívida;

E) Seguindo de perto o acórdão-fundamento, apesar da Lei n.º 17/2000 não prever expressamente essa possibilidade, o “vazio normativo” criado por essa omissão faz com tenha necessariamente que se aplicar a LGT e, em especial, o disposto no n.º 3 do artigo 48.º que prevê que “A interrupção da prescrição relativamente ao devedor principal não produz efeitos quanto ao responsável subsidiário se a citação deste, em processo de execução fiscal, for efetuada após o 5.º ano posterior ao da liquidação”.

F) A ser seguido o entendimento do TCA SUL, a prescrição das dívidas à Segurança Social estender-se-ia indefinidamente no tempo, passando por cima do prazo decorrido desde a citação da devedora originária e/ou a instauração da execução, possibilitando que a entidade Exequente utilize o expediente da citação dos responsáveis subsidiários para eternizar a prescrição, interrompendo-a sem fundamento legal;

G) Para o STA, e também para o Recorrente, é claro que a alteração ao prazo de prescrição das dívidas relativas a contribuições e quotizações para a Segurança Social, promovida pela Lei n.º 17/2000, não produziu qualquer alteração na aplicação, à contagem desse prazo prescricional, da regra vertida no artigo 48.º, n.º 3, da LGT;

H) E especificamente quanto à questão da natureza do procedimento de apuramento ou de cobrança das dívidas à Segurança Social, acompanhamos em toda a linha o entendimento sufragado pelo STA, no acórdão-fundamento, no sentido de que se tratam de um ato de liquidação, para efeitos da aplicação do disposto no n.º 3 do artigo 48.º da LGT;

I) No momento em que a Segurança Social extrai a certidão das dívidas de contribuições ou quotizações, mais não está do que a exigir ao seu devedor um montante que é líquido e exigível. Se assim não for, então a liquidação destas dívidas ocorre em momento ainda anterior a esse, designadamente quando se verifica a obrigação do seu pagamento, nos termos legais;

J) Não havendo, quer na Lei n.º 17/2000, quer em qualquer outro diploma legal, norma que preveja uma situação similar à que se encontra prevista no artigo 48.º, n.º 3, da LGT, nada impede que esse aparente “vazio normativo” seja preenchido através da aplicação subsidiária das regras gerais previstas na LGT, entre as quais se encontra tal norma;

K) Veja-se o entendimento do Conselheiro Lopes de Sousa [In “Sobre a prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas”, fls. 118.] que, relativamente ao regime de prescrição de obrigações para a Segurança Social, refere o seguinte “No que não está especialmente regulado serão de aplicar as regras dos artigos 48.º e 49.º da LGT, atenta a vocação desta Lei para regular a generalidade das relações jurídicas-tributárias, afirmada no seu n.º 1. Com efeito, não há qualquer suporte normativo para afirmar que se está perante conceitos diferentes de prescrição ou que os efeitos das causas interruptivas são diferentes dos previstos para a generalidade das obrigações tributárias”;

L) Em suma, o entendimento que o Recorrente considera que deverá ser validado no presente caso, por se afigurar o que melhor reflete o espírito e a interpretação agregada das normas em matéria de prescrição de créditos da Segurança Social, é o de que a Lei n.º 17/2000 veio regular determinados aspetos, como o prazo de prescrição, o início e a forma da sua contagem ou, ainda, os factos interruptivos, mas, no que não foi especialmente regulado por esse diploma legal, nomeadamente quanto aos efeitos da interrupção da prescrição na esfera dos responsáveis subsidiários, será de aplicar subsidiariamente o que determina a LGT, em concreto o n.º 3 do artigo 48.º;

M) Aplicando tal entendimento ao caso vertente, terá necessariamente que se concluir pela prescrição das dívidas em causa, pelo facto de os responsáveis subsidiários, entre os quais se encontra o ora Recorrente, terem sido citados após os 5 anos posteriores à liquidação dessas dívidas;

N) Por fim, refira-se que o entendimento do Recorrente foi acompanhado pelo Digno Magistrado do Ministério Público, nos presentes autos, bem como, por recente jurisprudência, como disso são exemplo os acórdãos do TCA Norte, de 16/02/2017, proferido no processo n.º 00758/06.3BEPNF; de 16/03/2017, proferido no processo n.º 01403/14.9BEBRG ou de 07/02/2019, proferido no processo n.º 03055/16.2BEPRT;

O) Por todos estes motivos, deve ser confirmado o entendimento do Acórdão- Fundamento e anulado o Acórdão-Recorrido, declarando-se prescritas as dívidas em crise.».

O segundo Recorrente nada disse.

Não foram apresentadas contra-alegações

1.2. Recebidos os autos neste tribunal, foi ordenada a abertura de vista ao Ministério Público.

A Ex.ma Senhora Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto parecer «no sentido da procedência do recurso, revogando-se a sentença recorrida, por [lhe] parecer serem corretos os fundamentos vertidos no acórdão fundamento.».

Com dispensa dos vistos legais, cumpre decidir, em conferência, no Pleno da Secção.


◇◇◇

2. Da deserção do recurso do segundo Recorrente

Resulta dos autos (fls. 382 do processo físico) que ambos os Recorrentes, em requerimento conjunto, interpuseram recurso por oposição de acórdãos para o Supremo Tribunal Administrativo, ao abrigo do artigo 284.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário.

E ambos os Recorrentes (fls. 517 do processo físico), ainda em requerimento conjunto, insistiram pela apreciação desse requerimento junto do Tribunal recorrido.

No entanto, quando foram convidados a indicar o acórdão fundamento, o primeiro Recorrente, em requerimento autónomo, indicou o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo n.º 023/10 (fls. 536).

E o segundo Recorrente, pretendendo também recorrer quanto «à falta de citação da executada e nulidade de todo o processado subsequente», indicou também e nesta parte, o Acórdão tirado no processo n.º 915/14 (fls. 548).

A Ex.ma Senhora Desembargadora Relatora disse admitir «o recurso interposto através do requerimento de fls. 382 e sgs. (processo físico)» e ordenou que ambos os Recorrentes fossem notificados para apresentarem alegações no prazo de oito dias, sob pena de o recurso ser julgado deserto (fls. 557).

Todavia, o segundo Recorrente nunca chegou a apresentar alegações.

Ora, entendemos que a Ex.ma Senhora Desembargadora Relatora devia ter extraído as consequências legais da falta de apresentação de alegações por este Recorrente e, em consequência, deveria ter julgado deserto o seu recurso.

De todo o modo, a decisão que, em vez de julgar deserto o recurso respectivo, determina a notificação deste segundo Recorrente para apresentar alegações de segundo grau não vincula o tribunal superior. É a solução que se retira do preceituado no artigo 641.º, n.º 5, do Código de Processo Civil, por identidade de razão.

Assim sendo, atento o disposto no artigo 284.º,n.º 4, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (na redacção anterior à que lhe foi introduzida pela Lei n.º 118/2019, de 17 de Setembro), irá a final ser julgada a deserção deste recurso.


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3. Dos fundamentos de facto


3.1. O acórdão recorrido relevou a seguinte matéria de facto: «(...)

A) Foi autuado em 16/05/1995, o processo de execução fiscal nº 332819950100577.4, a correr no Serviço de Finanças de Lisboa 9, contra C………………, LDA, NIF ………., tendo por base certidões por dívidas ao Centro Regional de Segurança Social e Vale do Tejo, relativas aos anos de 1992 e 1993, no montante de 50 121 436$00 – cfr. fls. 1 a 4 do processo de execução fiscal apenso;

B) Em 29/04/1996, foi citada a devedora originária C……………., LDA, de que contra ela corre o processo de execução fiscal referido em A – cfr. fls. 6 e 7 do processo de execução fiscal apenso;

C) A C………… LDA, foi declarada em estado de falência por sentença de 27/06/1996, no processo que correu termos no Tribunal Judicial do Porto, 4º Juízo, 2ª Secção, sob o nº 56/96 e que foi arquivado com visto em correição, com data de 09/04/2003 – cfr. informação de fls. 286 dos autos e teor dos ofícios de fls. 13 e 18 do processo de execução fiscal apenso;

D) Em 14/11/2005, foi proferido despacho a reverter a execução referida em A, contra os ora Oponentes – cfr. fls. 110 e 111 do processo de execução fiscal apenso;

E) Em 21/11/2005, os Oponentes foram citados de que são executados por reversão da execução referida em A, na qualidade de responsáveis subsidiários, para pagar a quantia exequenda de € 170 896,36 (sendo € 120 188,79 de contribuições para a segurança social e € 50 707,58 de juros de mora) – cfr. fls. 112 a 113 verso do processo de execução fiscal apenso.».

(…)

«Ao abrigo do preceituado no artigo 662.º do Código de Processo Civil, por se mostrar documentalmente comprovado com relevância para a decisão da causa, aditam-se ao probatório os seguintes factos:

F) O processo de execução fiscal nº 332819950100577.4, melhor identificado na alínea A), não foi avocado aos autos de falência nº 56/96 (a que se faz referência na alínea c), que correu termos no Tribunal Judicial do Porto, 4º Juízo, 2ª Secção, conforme informação do Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa 9, constante de fls. 286 dos autos;

G) O processo de execução fiscal supra referido esteve parado entre 20/10/1997 e 26/04/2004, cfr. fls. 12 e 13 do PEF apenso.».

3.2. O acórdão fundamento reproduziu a seguinte matéria de facto, dada como assente na sentença recorrida: «(...)

1. Em 24/02/1995, foi instaurada execução fiscal n.º 2003.95/100006.3 contra a sociedade D…………., Lda., por dívidas emergentes de contribuições ao Centro Distrital de Segurança Social de Santarém, relativa ao ano 1994, no montante global de Esc.: 9.871.584$00 (cfr. certidão de dívidas de fls. 2 e 3 da execução);

2. Em 15/03/2004 foram apensadas ao processo identificado em 1 as execuções fiscais nºs 2003-95/1000446, 2003-96/100003.9, 2003-100031.4 e 2003-98/100099.3, prosseguindo a execução pelo valor global de € 203.315,83 (fls. 7 da execução);

3. A sociedade executada foi citada para os termos da execução em 18/03/2004 (fls. 8, 9 e 10 da execução);

4. Por despacho de 12/04/2006 do Sr. Chefe de Finanças de Constância, foi determinado que se procede -se à notificação do oponente para efeitos do exercício do direito de audição prévia para efeitos de reversão da execução (fls. 75 -A da execução);

5. Em 12/04/2006 foi expedida notificação para audição prévia (reversão) registada ao oponente (fls. 75 -B e 76 da execução);

6. Por despacho de 05/09/2006 do Sr. Chefe de Finanças de Constância, foi ordenada a reversão contra o oponente, na qualidade de responsável subsidiário da sociedade “D………, Lda.” (fls. 78 da execução apensa);

7. O executado/oponente foi citado na qualidade de responsável subsidiário, em 11/05/2006 (cfr. fls. 79 e 80 da execução);

8. O oponente deduziu a presente oposição em 08/06/2006 (fls. 1 dos presentes autos).».


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4. Dos fundamentos de Direito

4.1. O presente recurso tem por fundamento a oposição entre o acórdão recorrido e o acórdão proferido pela Secção Tributária do Supremo Tribunal Administrativo de 21 de Abril de 2010, tirado no processo n.º 023/10.

O processo judicial em que foi proferido o acórdão recorrido foi instaurado em 2007, e o acórdão recorrido foi proferido em 2014, pelo que lhe é aplicável o regime do recurso por oposição de acórdãos que deriva dos artigos 27.º, n.º 1, alínea b), do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais de 2002 e 284.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, este na redacção anterior à que lhe foi introduzida pela Lei n.º 118/2019, de 17 de Setembro.

Assim, a admissibilidade deste recurso depende da verificação cumulativa dos seguintes requisitos legais:

a) Identidade substancial de situações jurídicas;

b) Decisões opostas sobre a mesma questão fundamental de direito;

c) Que a decisão recorrida não esteja em sintonia com a jurisprudência mais recente, consolidada, do tribunal ad quem.

Por outro lado, para haver identidade substancial de situações jurídicas é necessário que ocorra:

a) A identidade substancial de situações fácticas (que os factos sejam subsumíveis às mesmas normas jurídicas);

b) A identidade substancial da regulamentação jurídica (que as eventuais modificações legislativas não possam servir de base a diferentes argumentos que possam ser valorados para a determinação de diferentes soluções jurídicas).

Finalmente, para haver decisões opostas sobre a mesma questão fundamental de direito, é necessário:

a) Que a oposição resulte das próprias decisões (não bastando a oposição entre argumentos ou entre os argumentos de um e a decisão do outro);

b) Que as decisões opostas sejam expressas (não podendo ser invocada a partir de decisões implícitas)

Vejamos, então, se estes requisitos estão reunidos no caso dos autos.

4.2. O Recorrente entende que o acórdão recorrido e o acórdão fundamento responderam de forma diametralmente oposta à mesma questão de direito, que é a de saber se é aplicável ao regime da prescrição das contribuições e cotizações devidas à Segurança Social introduzido pela Lei n.º 17/2000, o disposto no artigo 48.º, n.º 3 da Lei Geral Tributária, na redacção então em vigor.

E o Recorrente entende que os acórdãos responderam de forma oposta a essa questão, porque o acórdão recorrido atribuiu efeito interruptivo à citação dos responsáveis subsidiários [ver a conclusão “E)” das suas alegações de primeiro grau].

Enquanto o acórdão fundamento não olvidou o facto de a citação destes ter ocorrido mais de cinco anos após a liquidação das contribuições (ou ato que, para o efeito, lhe deva equivaler) [ver a conclusão “F)” das mesmas alegações].

É manifesto que o Recorrente pretende que o acórdão fundamento, ao contrário do acórdão recorrido, não atribuiu efeito interruptivo à citação do revertido, por força daquele número 3 do artigo 48.º da Lei Geral Tributária.

Mas o Recorrente interpreta erradamente o acórdão fundamento. O facto a que este acórdão não atribuiu efeitos interruptivos não foi a citação do revertido. Foi a citação do «devedor originário» (da sociedade ali executada).

O que ali tinha relevo porque a citação do «devedor originário», no caso do acórdão fundamento, tinha ocorrido já na vigência da lei nova (em 18 de março de 2004). Isto é, numa altura em que a lei já atribuía à citação efeito interruptivo da prescrição.

O que não sucedia no caso dos autos porque, aqui, a citação do «devedor originário» ocorreu na vigência da lei antiga (isto é, da Lei n.º 28/84, de 14 de agosto e do Código do Processo Tributário, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 154/91, de 23 de abril).

Sendo que o artigo 34.º, n.º 3 deste último diploma, atribuía efeito interruptivo, não à citação do «devedor principal», mas à própria instauração da execução fiscal.

Do exposto deriva que, por um lado, a situação tratada nos dois acórdãos não era a mesma.

Porque, num, a citação do devedor principal ocorreu da vigência da lei nova; e no outro, ocorreu na vigência da lei antiga.

No acórdão recorrido, a lei em vigor ao tempo da citação (do devedor principal), não atribuía a esse facto efeito interruptivo da prescrição; no acórdão fundamento, a lei em vigor ao tempo da citação (do devedor principal), já atribuía efeito interruptivo à sua citação.

No acórdão fundamento, colocava-se a questão de saber se a citação do devedor principal produzia efeitos interruptivos em relação ao responsável subsidiário; no acórdão recorrido, essa questão não se colocava, porque a citação do devedor principal, ao tempo em que ocorreu, nem sequer produzia efeito interruptivo da prescrição. Nem em relação ao responsável principal, nem em relação ao responsável subsidiário.

Por outro lado, resulta também do sobredito que não há oposição entre as decisões.

Desde logo porque, nem no acórdão recorrido nem no acórdão fundamento, foi dado relevo à citação do devedor principal. No primeiro, porque a lei então em vigor não lhe atribuía efeitos interruptivos; no segundo, porque a lei então em vigor não lhe atribuía efeitos interruptivos em relação ao responsável subsidiário (desde que a citação deste fosse efetuada após o quinto ano posterior à liquidação).

Resta acrescentar que a interpretação segundo a qual o artigo 48.º, n.º 3, da Lei Geral Tributária, verificados os seus pressupostos, obsta a que a citação do responsável subsidiário produza os seus próprios efeitos interruptivos não é, sequer, seguida no acórdão fundamento.

Que não deixou de ressalvar, em abstracto, a «virtualidade interruptiva» da citação do responsável subsidiário (mesmo que a citação do devedor principal tivesse sido efetuada após o quinto ano posterior ao da liquidação). E de sublinhar, em concreto, que a citação desse responsável tinha sido efetuada depois de se ter concluído o prazo da prescrição. Sendo que, como é óbvio, nenhum facto com efeito interruptivo da prescrição pode interromper a prescrição já consumada.

De todo o exposto deriva que não estão reunidos os requisitos substantivos da admissibilidade do presente recurso por oposição de acórdãos.

E, assim sendo, deve julgar-se findo o recurso.


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5. Conclusões

5.1. Sendo o recurso por oposição de acórdãos a que alude o artigo 284.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, na redacção inicial, interposto em coligação por ambos os recorrentes e as alegações apresentadas apenas por um deles, deve julgar-se deserto o recurso interposto pelo outro;

5.2. Não há oposição de acórdãos se, desde logo, o acórdão fundamento e o acórdão recorrido não responderam de forma oposta à questão colocada no recurso;

5.3. O acórdão fundamento e o acórdão recorrido não responderam de forma oposta se, estando em causa saber se o artigo 48.º, n.º 3, da Lei Geral Tributária, verificados os seus pressupostos, obsta a que a citação do responsável subsidiário produza os seus próprios efeitos interruptivos da prescrição, nenhum dos acórdãos responde afirmativamente a essa questão.


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6. Decisão

Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam os juízes do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em:

a) Julgar findo o recurso interposto pelo primeiro Recorrente;

b) Julgar deserto o recurso interposto pelo segundo Recorrente.

Custas pelos Recorrentes.

D.n.

Assinado digitalmente pelo Relator, que consigna e atesta que, nos termos do disposto no art.15.º-A do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de Março, aditado pelo art. 3º do Decreto-Lei n.º 20/2020, de 1 de Maio, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes integrantes da formação de julgamento.

Lisboa, 24 de março de 2021

Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos (relator) – Isabel Cristina Mota Marques da Silva – Francisco António Pedrosa de Areal Rothes – Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia – José Gomes Correia – Aníbal Augusto Ruivo Ferraz – Paulo José Rodrigues Antunes – Gustavo André Simões Lopes Courinha – Paula Fernanda Cadilhe Ribeiro – Pedro Nuno Pinto Vergueiro – Anabela Ferreira Alves e Russo