Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01284/12
Data do Acordão:02/20/2013
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ISABEL MARQUES DA SILVA
Descritores:GRADUAÇÃO DE CRÉDITOS
IMPOSTO MUNICIPAL SOBRE IMÓVEIS
PRIVILÉGIO CREDITÓRIO
Sumário:I - Nos termos dos artigos 744.º, n.º 1 do Código Civil e 122º do Código do IMI, gozam de privilégio imobiliário especial sobre os bens cujos rendimentos estão sujeitos a Imposto Municipal sobre Imóveis, os créditos de IMI inscritos para cobrança no ano corrente na data da penhora (…), e nos dois anos anteriores, bem como os respectivos juros de mora (8.º do Decreto-Lei n.º 73/99, de 16 de Março), pelo que devem ser também graduados em primeiro lugar, precedendo os créditos garantidos por hipoteca.
II - O privilégio imobiliário geral previsto nos artigos 111.º do CIRS e 116.º do CIRC beneficia somente o crédito relativo aos três anos anteriores à penhora, relevando os anos a que respeitam os rendimentos que justificaram a liquidação do imposto e não o momento em que ele foi posto a cobrança.
Nº Convencional:JSTA00068141
Nº do Documento:SA22013022001284
Data de Entrada:11/22/2012
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:BANCO A..., S.A.
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:TAF AVEIRO
Decisão:PROVIDO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT
Legislação Nacional:CIMI03 ART122
CCIV66 ART744 ART751
CIRC01 ART116
CIRS01 ART111
DL 73/99 DE 1999/03/16 ART8
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- Relatório -
1 – A Fazenda Pública recorre para este Supremo Tribunal da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, de 29 de Setembro de 2011, proferida nos autos de verificação e graduação de créditos n.º 21/10.5BEAVR, apresentando as seguintes conclusões:
1. No processo de execução fiscal n.º 0051200501033255 e apensos (designadamente, os processos executivos nºs 0051200501043102, 0051200501043960, 00512000501057871, 051200501058444, 0051200501059220, 00512005001060724, 0051200501062891, 0051200501067087, 0051200601009273, 0051200601018523, 0051200601032240, 0051200601037773, 0051200601040421, 0051200701010760, 0051200701018540, 0051200701050117, 0051200701058517, 0051200801002708, 0051200801005359, 0051200801009770, 0051200801011847, 0051200801026127 e 0051200801035320), foi penhorada a fracção em 16/06/2008 a Favor da Fazenda Nacional a fracção autónoma designada pela letra “A” do prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia da …… sob o artigo 4772, e descrito na Conservatória do Registo Predial de Aveiro com o n.º 2132/20010508 – A. Esta penhora foi registada pela Apresentação 53, de 2008/06/18.
2. Pela Fazenda Pública na sequência de notificação nos termos do artigo 243.º do CPPT foram reclamados os seguintes créditos:
- Créditos no valor de €287,43, respeitantes a IMI, referentes ao ano de 2007, acrescidos de juros de mora, em cobrança coerciva no processo de execução fiscal n.º 0051200801071726.
- Créditos no valor de €121,56, respeitante a IRC, referente ao ano de 2006, acrescidos de juros de mora, em cobrança coerciva no processo de execução fiscal n.º 0051200901004581.
3. Não se conforma a Fazenda Pública com a douta sentença por um lado porque não graduou os créditos exequendos relativos a IMI dos anos de 2005, 2006 e 2007 (correspondentes ao prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia da …… sob o artigo 4772 – fracção “A”), no lugar que lhe competia, ou seja, em primeiro lugar, juntamente com os créditos reclamados relativos a IMI do ano de 2007, garantidos por privilégio creditório imobiliário, previsto nas disposições combinadas nos artigos 122.º do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI) e 744.º do Código Civil (C.C.).
Por outro lado, porque não graduou o crédito exequendo referente a IRC do ano de 2004, que goza apenas da preferência resultante da penhora registada pela Ap. 53, de 2008/06/18.
E, por último, porque graduou os créditos exequendos relativos a IMI do ano de 2004, em terceiro lugar, juntamente, com os créditos garantidos pelo privilégio imobiliário geral nos termos dos artigos 108.º e 111.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (CIRC) e do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIRS), respectivamente.
4. Com efeito, tendo em conta que a penhora da fracção autónoma a que respeitam os créditos exequendos relativos a IMI dos anos de 2005, 2006 e 2007, foi registada a favor da Fazenda Nacional, em 16/06/2008, e que os mesmos foram inscritos para cobrança no ano corrente na data da penhora e nos dois anos anteriores, tais créditos gozam do privilégio creditório imobiliário previsto nas disposições combinadas dos artigos 122.º do CIMI e 744.º, n.º 1 do C.C., deveriam ter sido graduados, em primeiro lugar, a par dos créditos reclamados de IMI do ano de 2007.
5. Por seu turno, os créditos exequendos relativos a IMI e a IRC do ano de 2004 que beneficiam, apenas da garantia decorrente da penhora registada pela Ap. 53, de 2008/06/18, deveriam ter sido graduados, em quarto lugar, a par dos créditos exequendos relativos a IVA de 2005 e 2006, coimas e encargos de 2004, 2005, 2006, 2007 e 2008.
6. Não o tendo feito, a douta sentença recorrida fez uma errada interpretação das normas aplicáveis, tendo, violado, nomeadamente, o disposto nos artigos 240.º n.º 1, do CPPT, nos artigos 751.º, 744, n.º 1, e 747, n.º 1, al. a) e 822.º do C.C. e nos artigos 108.º do CIRC, 111.º CIRS e 122.º do CIMI.
Nos termos vindos a expor e nos que Vªs. Exªs., sempre mui doutamente, poderão suprir, deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, revogar-se a douta sentença recorrida, substituindo-a por outra que reconheça e gradue os créditos relativos a IMI dos anos de 2005, 2006 e 2007 e respectivos juros de mora, referentes ao imóvel penhorado, em cobrança coerciva nos processos executivos nºs. 0051200601018523, 0051200601040421, 0051200701018540, 0051200701050117 e 0051200801035320, em primeiro lugar, juntamente com os créditos reclamados de IMI do ano de 2007, e reconheça e gradue os créditos exequendos relativos a IMI e a IRC do ano de 2004 e respectivos juros de mora, em cobrança coerciva nos processos executivos n.ºs 0051200501033255, 0051200501059220 e 0051200501057871, no lugar que lhes pertence, ou seja, em quarto lugar, a par dos créditos exequendos relativos a IVA de 2005 e 2006, coimas e encargos de 2004, 2005, 2006, 2007 e 2008, conforme se apresenta mais consentâneo com o Direito e a Justiça.

2 - Não foram apresentadas contra-alegações.

3 - O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal emitiu parecer nos seguintes termos:
(…)
Quer parecer que a razão está com a recorrente.
No primeiro caso, parece ser de entender que a data de “inscrição para cobrança” é a correspondente à data da liquidação, a qual no caso dos dito crédito de IMI, sendo de 2005, ocorreu em 2006 – assim, Acórdãos do STJ, de 7.11.2000, na CJ/STJ, ano VIII, tomo III, pág. 101 e de 29.13.2001, na CJ – XXVI, tomo 2, pág. 91.
Assim, o referido crédito de IMI de 2005 parece encontrar-se ainda dentro do limite temporal previsto nas disposições legais, a propósito, acima referidas.
E se dúvidas houver quanto ao mesmo ser referente ao imóvel penhorado nos autos, sempre deverá mandar diligenciar-se no sentido de apurar se assim é, de acordo com o previsto no art. 13.º, n.º 1 do CPPT.
Por outro lado, o crédito de IRC de 2006, apesar de reconhecido com o privilégio imobiliário geral de que beneficia, não foi incluído na graduação efectuada no lugar que lhe compete logo após o crédito hipotecário.
De notar que os juros relativos ao crédito hipotecário que foi reclamado, são apenas os relativos aos últimos 3 anos, de acordo com o previsto no art. 693 n.º 2 do C. Civil.
Finalmente, é de reconhecer que os créditos exequendos, entre os quais se inclui o referidos IMI e IRC de 2004, que não gozam de privilégio por se encontrarem já fora do limite temporal previsto nos arts. 122.º do CIMI e 108.º (ora 116.º) do CIRC, são de graduar, por gozarem de “garantia real” resultante de penhora, no mesmo plano dos demais impostos que gozam apenas de semelhante garantia – assim, ac. do STA proferido no proc. 0400/11, de 28-9-11.
Concluindo:
Parece que o recurso é de proceder, sendo de proceder à graduação nos seguintes termos:
1.º Créditos de IMI de 2005, 2006 e 2007, respeitantes ao imóvel penhorado, e respectivos juros dos últimos 3 anos;
2.º Crédito reclamado pelo Banco A……, SA, com a limitação legal dos respectivos juros;
3.º Crédito de IRC de 2005 e 2006, e IRS de 2005, e respectivos juros dos últimos três anos;
4.º Restantes créditos exequendos, e respectivos juros, e demais juros referentes a créditos exequendos abrangidos em antecedente graduação.
Subsistindo dúvidas, sobre se o IMI de 2005 é referente ao imóvel penhorado nos autos, sempre seria de anular a graduação efectuada, mandando diligenciar-se no sentido de apurar se assim é, de acordo com o previsto no art. 13.º n.º 1 do CPPT.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
- Fundamentação -
4 – Questão a decidir
É a de saber a sentença recorrida enferma de erro de julgamento da graduação de créditos a que procedeu, concretamente ao não graduar os créditos exequendos relativos a IMI dos anos de 2005, 2006 e 2007 em primeiro lugar, juntamente com os créditos reclamados relativos a IMI do ano de 2007, ao não graduar também o crédito exequendo referente a IRC do ano de 2004, e ao graduar os créditos exequendos relativos a IMI do ano de 2004, em terceiro lugar, juntamente, com os créditos garantidos pelo privilégio imobiliário.

5 - Apreciando.
5.1 Da graduação de créditos efectuada
A sentença recorrida, a fls. 115 a 124 dos autos, julgou verificados os créditos reclamados e exequendos e procedeu à sua graduação pelo produto da venda do bem penhorado (fracção autónoma designada pela letra “A” do prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia da …… sob o artigo 4772, e descrito na Conservatória do Registo Predial de Aveiro com o n.º 2132/20010508 – penhorado em 16/06/2008 e cuja penhora foi registada pela Apresentação 53, de 2008/06/1 (cfr. sentença recorrida, a fls. 120) da seguinte forma:
1 - Os créditos reclamados relativos a IMI de 2006 e 2007 e respectivos juros de mora;
2 – O crédito reclamado pelo Banco A…… S.A.;
3 – Os créditos de IRC e IMI de 2003, 2004 e 2005 e IRS de 2005 e respectivos juros;
4 – O crédito exequendo de IVA de 2005, 2006 e 2007 e Coimas Fiscais e respectivos juros (cfr. sentença recorrida, a fls. 123).

Alega, porém, a recorrente Fazenda Pública, que, em primeiro lugar, deviam ter sido graduados não apenas os créditos reclamados relativos a IMI de 2007, mas também os créditos exequendos relativos a este imposto dos anos de 2005, 2006 e 2007, correspondentes ao prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia da ….. sob o artigo 4772 – fracção “A”, pois que também gozam do privilégio creditório imobiliário previsto nas disposições combinadas nos artigos 122.º do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI) e 744.º do Código Civil (CC) e que os restantes créditos exequendos relativos a IMI (de 2003, 2004 e 2005) devem ser graduados em último lugar, e não em terceiro, a par dos demais créditos exequendos, que apenas gozam da preferência conferida pela penhora registada pela Apresentação 53, de 18 de Junho de 2008, sendo igualmente este o lugar que compete na graduação ao IRC exequendo relativo a 2004.
Tem inteira razão a Fazenda Pública.
Embora a sentença recorrida não tenha fixado o probatório, extrai-se dos autos, através da relação discriminada de dívidas fiscais da executada junta pela Fazenda Pública aquando da reclamação dos seus créditos (doc. 1, de fls. 71 a 87 dos autos), que os créditos exequendos relativos a IMI dos anos de 2005, 2006 e 2007 se venceram em cada um dos anos seguintes, ou seja, foram inscritos para cobrança em 2006, 2007 e 2008, respectivamente, bem como que respeitam todos eles ao imóvel penhorado e vendido nos autos de execução (pois que, naqueles anos, no campo respeitante a “prédios”, surge apenas identificado o prédio objecto da execução – 010505-U-04772-A – cfr. fls. 75, 76, 77 e 79 dos autos), pelo que, assim sendo, gozam de privilégio creditório imobiliário nos termos das disposições conjugadas dos artigos 122.º do CIMI e 744.º do Código Civil, preferindo ao crédito garantido por hipoteca (cfr. o artigo 751.º do Código Civil), pois que a penhora teve lugar e foi registada em 2008 (pela Apresentação 53, de 18 de Junho de 2008 – cfr. sentença recorrida, a fls. 120).
No que respeita aos demais créditos exequendos relativos a IMI, não inscritos para cobrança no ano corrente na data da penhora e nos dois anos anteriores, gozam apenas da preferência que lhes é conferida pela penhora, não sendo de graduar a par dos créditos de IRC exequendo de 2005 e reclamado de 2006 e de IRS exequendo de 2005 que gozam de privilégio imobiliário geral, como fez a sentença recorrida.
Finalmente, o crédito exequendo relativo a IRC de 2004 não goza também de nenhuma outra preferência que não a que lhe é conferida pela penhora, razão pela qual não deve ser graduado a par daqueles que gozam do privilégio imobiliário previsto no artigo 111.º do Código do IRS e 116.º do Código do IRC, pois que este beneficia apenas os créditos destes impostos relativos aos três últimos anos contados da data da penhora. Assim, tendo a penhora tido lugar em 2008, beneficiam do privilégio creditório imobiliário previsto nas citadas disposições do Código do IRS e do Código do IRC os créditos por IRS/IRC dos anos de 2007 (que inexiste), 2006 e 2005, mas não já o de 2004, que deve ser graduado em último lugar.
Cumpre, ainda, atender, a que, nos termos do artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 73/99, de 16 de Março, as dívidas provenientes de juros de mora gozam dos mesmos privilégios que por lei sejam atribuídos às dívidas sobre que recaírem.

Importa, pois, refazer a graduação efectuada, dando integral provimento ao recurso da Fazenda Pública.
- Decisão -
6 - Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em conceder provimento ao recurso, revogando a sentença recorrida nos segmentos impugnados, que no demais se mantém, e, em consequência, proceder à graduação de créditos do seguinte modo:
1.º - Créditos de IMI de 2005, 2006 e 2007, inscritos para cobrança em 2006, 2007 e 2008, e respectivos juros de mora;
2.º Crédito hipotecário reclamado pelo Banco A……, S.A. e respectivos juros relativos aos últimos 3 anos (art. 693.º, n.º 2 do CC);
3.º Créditos de IRC de 2005 e 2006 e IRS de 2005, e respectivos juros de mora;
4.º Restantes créditos exequendos e respectivos juros, e demais juros referentes a créditos exequendos abrangidos na antecedente graduação.

Sem custas.

Lisboa, 20 de Fevereiro de 2013. – Isabel Marques da Silva (relatora) – Lino Ribeiro – Dulce Neto.