Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0220/15
Data do Acordão:07/09/2015
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:TERESA DE SOUSA
Descritores:CONTRATO DE LOCAÇÃO OU AQUISIÇÃO DE BENS E SERVIÇOS
REDUÇÃO REMUNERATÓRIA
PRINCÍPIO DA IGUALDADE
Sumário:I - Resulta do próprio teor literal do arts. 19º e 22º da Lei nº 55-A/2010 de 31/12, que os mesmos se aplicam a órgão, serviço ou entidade previstos nos nºs 1 a 4 do art. 3º da Lei nº 12-A/2008, de 27/2, que regula o respectivo âmbito de aplicação objectivo, estando contemplado no nº 1, alínea a) daquele art. 22º que a “redução remuneratória” é aplicável aos serviços da administração directa e indirecta do Estado, bem como aos contratos de aquisição de serviços que venham a celebrar-se ou renovar-se por aqueles órgãos, serviços ou entidades, em 2011, com idêntico objecto e a mesma contraparte.
II - Este art. 22º, nº, 1, alínea a) da Lei nº 55-A/2010, apenas estabelece quais os órgãos, serviços e entidades do Estado (bem como institutos de regime especial e pessoas colectivas de direito público) que ficam sujeitos à sua previsão na celebração e/ou renovação de contratos de aquisição de serviços independentemente de quem seja a contraparte. Podendo esta ser (e sendo provavelmente) uma pessoa singular ou pessoa colectiva privada.
III - Estando em causa nos autos contratos de aquisição de serviços celebrados em 2011, por ajuste directo, a PSP encontrava-se vinculada, em cumprimento da lei, a aplicar o regime de redução remuneratória previsto nos arts. 19º e 22º da Lei nº 55-A/2010, conjugado com o disposto no nº 1, do art. 3º da Lei nº 12-A/2008.
IV - A aplicação da redução remuneratória contida nos arts. 19º e 22º da Lei nº 55-A/2010 à situação da Recorrente não representa por si só uma violação do princípio da igualdade, previsto no art. 13º, nº 1 da CRP, já que não vem alegado, nem se demonstra que qualquer cidadão ou empresa colocados na mesma situação da Recorrente tenham obtido da Administração um tratamento desigual sem fundamento legal ou justificação razoável.
Nº Convencional:JSTA00069290
Nº do Documento:SA1201507090220
Data de Entrada:04/30/2015
Recorrente:A..., LDA
Recorrido 1:ESTADO
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC REVISTA EXCEPC
Objecto:AC TCAN
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR ADM ECON - APROVISIONAMENTO BENS SERVIÇOS ADM.
Legislação Nacional:L 55A/2010 DE 31/12 ART19 ART22.
L12A/2008 DE 27/02 ART3.
L 53/2007 DE 31/08 ART1 ART2 ART3.
DL 29A/2011 DE 01/03 ART69.
CCP ART112 ART130 ART77.
L 64B/2011 DE 30/12 ART26.
CONST05 ART13.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC044777 DE 2000/05/11.; AC STA PROC046378 DE 2000/04/16.; AC STA PROC0275/10 DE 2010/07/08.; AC TCAN PROC1380/072BEVIS DE 2011/11/11.; AC TCAS PROC1101/05 DE 2008/09/18.; AC TC 396/11 DE 2011/09/21.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo

1. Relatório
A………………, Lda, vem interpor recurso de revista do acórdão do TCAN que, no âmbito da acção administrativa comum, sob a forma de processo ordinário, que intentou contra o Estado Português, negou provimento ao recurso jurisdicional que interpôs da sentença do TAF de Aveiro que julgou a acção improcedente e absolveu o Réu do pedido de pagamento da quantia de € 110.092,96 acrescida de juros de mora vencidos e vincendos.
Nas alegações da presente revista formula as seguintes conclusões:
A. A sentença e o acórdão recorridos padecem de algumas nulidades e de diversos erros de julgamento;
B. Com efeito, o Tribunal apreciou,
i. As normas constantes dos arts. 19º e 22º da Lei nº 55-A/2010 de 31 de Dezembro, vulgo Orçamento de Estado para 2012, não se aplica aos entes privados;
ii. O predito normativo, tal como este especificamente indica, só tem aplicação prática no que respeita às remunerações dos funcionários da administração pública, atento o art. 19º da Lei nº 55-A/2010 de 31 de Dezembro;
iii. O disposto no art. 22º da Lei nº 55-A/2010 de 31 de Dezembro, ao pretender alargar a redução remuneratória a todas as entidades que se relacionem com a administração pública, ainda que na modesta opinião da Autora, seja, manifestamente injusta e porque não dizer ilegal, só tem aplicação a todos os contratos que tenham início no ano de 2012 ou nas suas renovações;
iv. Ora, o contrato que a Autora celebrou com a administração pública - Polícia de Segurança Pública - foi celebrado no ano de 2007, tendo sido posteriormente sujeito a ajuste directo, porquanto, o ente público não logrou lançar um outro procedimento concursal;
v. Face à predita prática que a administração pública lançou mão, não pode a ora Autora vir a ser penalizada;
vi. Atente-se que, o procedimento concursal levado a cabo em 2007, teve por imposição da alínea b) do nº 1 do Art. 74º do Código dos Contratos Públicos aprovado pela Lei nº 18/2008, de 29 de Janeiro como factor determinante de adjudicação o “preço mais baixo”, logo, qualquer alteração unilateral como a que se pretendeu com a aplicação da “redução remuneratória” constante da Lei nº 55-A/2010 de 31 de Dezembro, viola os princípios da “boa-fé”;
vii. Mais, no entender da Autora, a aplicação dos arts. 19º e 22º da Lei nº 55-A/2010 de 31 de Dezembro, viola claramente o nº 1 do art. 13º da Constituição da República Portuguesa, pelo que a aplicação da mesma deve ser considerada inconstitucional.

Em contra-alegações o Recorrido Estado Português formula as seguintes conclusões:
1 – Não se verificam os pressupostos da admissibilidade do recurso de revista, exigidos pelo art. 150, nº 1 do CPTA, pelo que o mesmo não deverá ser admitido.
2 – Se assim não for entendido, deverá ser negado provimento ao recurso, mantendo-se integralmente o Acórdão recorrido.

A formação a que se refere o art. 150º, nº 5 do CPTA admitiu a revista, por acórdão de 08.04.2015, por haver entendido: «(…) estar em causa uma questão jurídica de importância fundamental, qual seja a de saber se a redução de 10% prevista nos artigos 19º e 22º da Lei 55-A/2010, de 31 de Dezembro é aplicável ao preço das prestações de serviço por entidades privadas, ao abrigo de contratos onde o preço fora previamente fixado. E determinante da vontade de contratar. Trata-se de uma questão sobre a concreta dimensão de uma importante medida restritiva, que pode efectivamente colocar-se em situações semelhantes e, portanto, justificativa da intervenção da última instância da jurisdição administrativa.».

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

2. Os Factos
A)
Na sequência de concurso público internacional nº 05/RCAP/2007, foi adjudicado à A. a prestação de serviços de limpeza nas instalações da P.S.P. em diversos comandos do continente - cfr. doc. 1 junto com a p.i..
B)
Após o decurso do prazo previsto no referido concurso, a A. continuou a prestar serviços à Polícia de Segurança Pública, por mais algum tempo, por ajuste directo - facto admitido por acordo.
C)
No âmbito da execução dos serviços prestados a A. emitiu as facturas descriminadas no item 15º) da p.i. - cfr. docs. 17 a 160 da p.i. que se dão por reproduzidas.
D)
A P.S.P. não procedeu ao pagamento da quantia de 110.092.96 € relativa a 10% do valor total das facturas referidas em C) - facto admitido por acordo.
E)
A P.S.P., através de ofº com a refª DL/4029/2011 comunicou à A. a adjudicação dos serviços de limpeza nos Comandos Distritais de Aveiro, Castelo Branco, Coimbra, Guarda, Leiria e Santarém para o primeiro trimestre de 2011, referindo que o valor aceite pelo Ministério das Finanças corresponde ao valor facturado no ano de 2010, reduzido em 10% - cfr. doc. 1 junto com a contestação.
F)
A P.S.P., através de of° com a refª DL/5281/2011, comunicou à A. a adjudicação dos serviços de limpeza para os referidos comandos para o segundo trimestre de 2011, referindo que o valor aceite pelo Ministério das Finanças corresponde ao valor facturado no ano de 2010, reduzido em 10% - cfr. doc. 2 junto com a p.i..
G)
A P.S.P. através de of com a refª DL/6311/2011, comunicou à A. a adjudicação dos serviços de limpeza para aqueles Comandos para o terceiro trimestre de 2011, referindo que o valor aceite pelo Ministério das Finanças corresponde ao valor facturado no ano de 2010, reduzido em 10% - cfr. doc. 3 junto com a p.i..
H)
A P.S.P. através de ofºs com as refª DL/3880/2011, de 02 de Agosto de 2012, DL 5287/2011, de 3 de Novembro de 2012 e DL 6305/2011, de 29 de Dezembro de 2011 comunicou à A. a adjudicação dos serviços de limpeza relativamente aos primeiro, segundo e terceiro trimestre de 2011 para o Instituto Superior de Ciências Policiais e de Segurança Interna referindo que o valor aceite pelo Ministério das Finanças corresponde ao valor facturado no ano de 2010, reduzido em 10% - cfr. docs. 4. 5 e 6 juntos com a p.i..
I)
A P.S.P. através de ofº com a refª DL/3552/2011, de 12 de Julho de 2011 comunicou à A. a adjudicação dos serviços de limpeza relativamente ao primeiro trimestre de 2011 para o Comando Distrital de Bragança referindo que o valor aceite pelo Ministério das Finanças corresponde ao valor facturado no ano de 2010, reduzido em 10% - cfr. doc. 7 junto com a p.i..

3. O Direito
As questões que cumpre apreciar e decidir na presente revista são as de saber se ocorrem as nulidades invocadas; se aos contratos de prestação de serviço indicados no probatório, e em causa nos autos, se aplicam as reduções remuneratórias previstas nos artigos 19º e 22º da Lei nº 55-A/2010, de 31 de Dezembro - Lei do Orçamento de Estado (LOE) para 2011; e se ocorre violação dos princípios da boa-fé e da igualdade (previsto no art. 13º, nº 1 da CRP).

Na conclusão A das suas alegações a Recorrente imputa ao acórdão recorrido “diversas nulidades”.
No entanto, nem nas conclusões, nem no corpo alegatório, se refere a qualquer nulidade da decisão recorrida (cfr. art. 615º, nº 1 do CPC) ou a quaisquer nulidades processuais que possam ter ocorrido, pelo que não estando minimamente identificadas quaisquer nulidades, é de julgar improcedente tal conclusão.

Alega a Recorrente que as normas constantes dos arts. 19º e 22º da Lei nº 55-A/2010, de 31/12, não se aplicam aos entes privados só tendo aplicação no que respeita às remunerações dos funcionários da Administração Pública, atento o disposto naquele art. 19º da Lei nº 55-A/2010. O disposto no art. 22º da Lei nº 55-A/2010, ao pretender alargar a redução remuneratória a todas as entidades que se relacionem com a administração só tem aplicação a todos os contratos que tenham início no ano de 2012 ou nas suas renovações.
Resulta do probatório que na sequência de concurso público internacional nº 05/RCAP/2007, foi adjudicado à A. a prestação de serviços de limpeza nas instalações da P.S.P. em diversos comandos do continente.
Após o decurso do prazo previsto no referido concurso, a A. continuou a prestar serviços à Polícia de Segurança Pública, por mais algum tempo, por ajuste directo.
Assim, a PSP através de sucessivos ofícios comunicou à aqui Recorrente a adjudicação de serviços de limpeza para os Comandos Distritais de Aveiro, Castelo Branco, Coimbra, Guarda, Leiria e Santarém para os três primeiros trimestres de 2011, referindo que o valor aceite pelo Ministério das Finanças corresponde ao valor facturado no ano de 2010, reduzido em 10% (cfr. als. A), B) e E) a G) do probatório).
Comunicou, igualmente, a adjudicação dos serviços de limpeza relativamente ao 1º trimestre de 2011 para o Comando Distrital de Bragança, com idêntica menção da redução do valor facturado em 10% (cfr. al. I) do probatório).
E, ainda, comunicou a adjudicação dos serviços de limpeza relativamente aos 1º, 2º e 3º trimestres do ano de 2011 para o Instituto Superior de Ciências Policiais e de Segurança Interna, referindo sempre que o valor aceite pelo Ministério das Finanças corresponde ao valor facturado no ano de 2010, reduzido em 10% (cfr. als. I) e H) do probatório).
No âmbito da execução destes serviços prestados a A. emitiu as facturas descriminadas no art. 15º da petição inicial, conforme dado como provado na al. C) dos factos, sendo tais facturas todas respeitantes ao ano de 2011.

O quadro legal relevante subjacente aos factos assentes dispõe o seguinte:
A LOE/2011 no seu art. 19º, sob a epígrafe Redução remuneratória prevê que:
1 - A 1 de Janeiro de 2011 são reduzidas as remunerações totais ilíquidas mensais das pessoas a que se refere o n.º 9, de valor superior a € 1500, quer estejam em exercício de funções naquela data, quer iniciem tal exercício, a qualquer título, depois dela, nos seguintes termos:
a) 3,5 % sobre o valor total das remunetações superiores a € 1000 e inferiores € 2000:
b) 3,5 % sobre o valor de € 2000 acrescido de 16 % sobre o valor da remuneração total que exceda os € 2000, perfazendo uma taxa global que varia entre 3.5 % e 10 %, no caso das remunerações iguais ou superiores a € 2000 até € 4165;
c) 10 % sobre o valor total das remunerações superiores a € 4165.
(…)”.
Prescrevendo o art. 22º da mesma Lei:
Artigo 22º
Contratos de aquisição de serviços
1 - O disposto no artigo 19º é aplicável aos valores pagos por contratos de aquisição de serviços que venham a celebrar-se ou renovar-se em 2011, com idêntico objecto e a mesma contraparte celebrados por:
a) Órgãos, serviços e entidades previstos nos nº 1 a 4º do artigo 3º, da Lei nº 12-A/2008, de 27 de Fevereiro, alterada pelas Leis nºs 64-A/2008, de 31 de Dezembro, e 3-B/2010, de 28 de Abril, incluindo institutos de regime especial e pessoas colectivas de direito público, ainda que dotadas de autonomia ou de independência, decorrente da sua integração nas áreas de regulação, supervisão ou controlo;
(…)”.
Por sua vez prevê o art. 69º do DL nº 29-A/2011, de 1/3, diploma que estabelece as disposições necessárias à execução do Orçamento de Estado para 2011, sob a epígrafe Contratos de aquisição de serviços, que:
1- Para efeitos do disposto no n.º 1 do artigo 22.º da Lei n.º 55 -A/2010, de 31 de Dezembro, é considerado o valor total a pagar pelo contrato de aquisição de serviços, excepto no caso das avenças, previstas no n.º 7 do artigo 35.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro, alterada pelas Leis n.ºs 64-A/2008, de 31 de Dezembro, 3-B/2010, de 24 de Abril. 34/2010, de 2 de Setembro, e 55-A/2010, de 31 de Dezembro, em que a redução incide sobre o valor a pagar mensalmente.
2 - Não estão sujeitas ao disposto nos n.ºs 1 e 2 do artigo 22.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro:
a) A celebração ou a renovação de contratos de aquisição de serviços essenciais previstos no n.º 2 do artigo 1.º da Lei n.º 23/96, de 26 de Julho, alterada pelas Leis n.ºs 12/2008, de 26 de Fevereiro, e 24/2008, de 2 de Junho, ou de contratos mistos cujo tipo contratual preponderante não seja o da aquisição de serviços ou em que o serviço assuma um carácter acessório da disponibilização de um bem;
b) A celebração ou a renovação de contratos de aquisição de serviços por órgãos ou serviços adjudicantes ao abrigo de acordo quadro;
c) A celebração ou a renovação de contratos de aquisição de serviços por órgãos ou serviços abrangidos pelo âmbito de aplicação da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro, alterada pelas Leis n.ºs 64-A/2008, de 31 de Dezembro, 3-B/20010, de 24 de Abril, 34/2010, de 2 de Setembro, e 55-A/2010, de 31 de Dezembro, com entidades públicas empresariais;
d) As renovações de contratos de aquisição de serviços, nos casos em que tal seja permitido, quando os contratos tenham sido celebrados ao abrigo de concurso público em que o critério de adjudicação tenha sido o mais baixo preço.
3 - Compete ao membro do Governo responsável pela área da segurança social a emissão do parecer previsto no n.º 2 do artigo 22.º da Lei n.º 55 -A/2010, de 31 de Dezembro, nos casos em que aquele membro do governo concede a autorização prévia a que se refere o n.º 3 do artigo 35.º do presente decreto-lei.”.

Face a este quadro legal, que é o aqui em causa, vejamos então:
Como já se disse, alega a Recorrente que as normas constantes dos acima transcritos arts. 19º e 22º da Lei nº 55-A/2010, de 31/12, não se aplicam aos entes privados só tendo aplicação no que respeita às remunerações dos funcionários da Administração Pública, atento o disposto naquele art. 19º da Lei nº 55-A/2010.
Resulta claramente do próprio teor literal do arts. 19º e 22º da Lei nº 55-A/2010 de 31/12, que os mesmos se aplicam a órgão, serviço ou entidade previstos nos nºs 1 a 4 do art. 3º da Lei nº 12-A/2008, de 27/2, que regula o respectivo âmbito de aplicação objectivo, estando contemplado no nº 1, alínea a) daquele art. 19º que a “redução remuneratória” é aplicável aos serviços da administração directa e indirecta do Estado, bem como aos contratos de aquisição de serviços que venham a celebrar-se ou renovar-se por aqueles órgãos, serviços ou entidades, em 2011, com idêntico objecto e a mesma contraparte.
A Polícia de Segurança Pública (PSP) é “uma força de segurança, uniformizada e armada, com natureza de serviço público e dotada de autonomia administrativa”, de acordo com a previsão do art. 1, nº 1 da Lei nº 53/2007, de 31/8, dependendo do membro do Governo responsável pela administração interna (art. 2º da Lei nº 53/2007), pelo que estamos perante órgão, serviço ou entidade previstos no nº 1 do art. 3º da Lei nº 12-A/2008. Ou seja, a PSP é um serviço que faz parte da administração directa do Estado.
Assim, é de concluir ser o art. 19º da Lei nº 55-A/2010, aplicável, por força do art. 22º da Lei nº 55-A/2010, aos contratos de prestação de serviço em apreço, adjudicados por intermédio de ajuste directo em 2011.
De facto, este preceito apenas estabelece quais os órgãos, serviços e entidades do Estado (bem como institutos de regime especial e pessoas colectivas de direito público) que ficam sujeitos à sua previsão na celebração e/ou renovação de contratos de aquisição de serviços independentemente de quem seja a contraparte. Podendo esta ser (e sendo provavelmente) uma pessoa singular ou pessoa colectiva privada.
Só assim não seria se estivessemos perante a situação elencada na alínea d) do nº 2 do art. 69º do DL nº 29-A/2011 – renovação de contratos públicos tendo como critério de adjudicação o mais baixo preço -, caso em que não haveria lugar à redução de 10%.
Ora, o que resulta provado é que estamos perante ajustes directos (cfr. art. 112º do CCP), correspondendo estes a novos contratos, que não foram sujeitos às regras do concurso público (cfr. art. 130º e segts. do CCP), cuja adjudicação foi comunicada nos termos do art. 77º, nº 1 do CCP, e assim abrangidos pelo disposto no art. 22º da Lei nº 55-A/2010.
Assim, estando em causa nos autos contratos de aquisição de serviços celebrados em 2011, por ajuste directo, a PSP encontrava-se vinculada, em cumprimento da lei, a aplicar o regime de redução remuneratória previsto nos arts. 19º e 22º da Lei nº 55-A/2010, conjugado com o disposto no nº 1, do art. 3º da Lei nº 12-A/2008.
Aliás, este regime foi mantido pelo art. 26º da Lei nº 64-B/2011, de 30/12, pelo que mesmo que os ajustes directos em causa nos autos respeitassem ao ano de 2012, e não respeitam, como vimos, sempre operaria a redução estabelecida nos citados arts. 19º e 22º da Lei nº 55-A/2010, para os contratos celebrados ou renovados no ano de 2011.
Deste modo, não se verifica o erro de julgamento por errada interpretação da lei imputado ao acórdão recorrido.
Alega também a Recorrente que a “alteração unilateral como a que se pretende com a aplicação da “redução remuneratória” constante da Lei nº 55-A/2010 de 31 de Dezembro, viola os princípios da boa-fé”, já que o procedimento concursal de 2007 teve como factor determinante de aplicação o “preço mais baixo”.
Como já acima se disse o que aqui está em causa não é o procedimento concursal de 2007, mas sim os novos contratos de aquisição de serviços efectuados por ajuste directo no ano de 2011, e daí estarem esses contratos abrangidos pela redução remuneratória referida, ao não lhes ser aplicável a excepção contemplada no art. 69º, nº 2, alínea d) do DL nº 29-A/2011, de 1/3.
Acresce que, como se refere no acórdão recorrido, “os princípios gerais de direito público enquanto ordenadores da actividade administrativa e a sua hipotética ofensa só relevam no âmbito da actividade discricionária, já que em sede de poderes vinculados da Administração a haver violação, a mesma consubstancia-se, e esgota-se, na violação do normativo legal ou regulamentar invocado, ou na violação do princípio da legalidade por violação de normas legais que alegadamente vinculam a Administração assim, entre outros, Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 11/05/2000, proc. n.º 44777 e de 16/04/2000, proc. nº 46378, de 8/07/2010, proc. n.º 275/10, do Tribunal Central Administrativo Norte, de 11/11/2011, proc. 01380/07.2BEV1S, do Tribunal Central Administrativo Sul, de 18.09.2008, proc. n.º 01101/05”.
Ora, não há dúvida de que no caso em apreço, a PSP actuou em sede de poderes claramente vinculados, cumprindo os pressupostos de facto e de direito das normas aplicáveis.
Assim, não se verifica a violação do princípio invocado.
Invoca, ainda, a Recorrente a violação do nº 1 do art. 13º da CRP por entender que a actuação da PSP, ao alterar unilateralmente, em pleno curso da adjudicação da prestação de serviços, a redução remuneratória, consubstancia uma “situação de desigualdade” da lei face aos demais cidadãos.
Como já referimos, no caso presente não estamos perante o procedimento concursal de 2007, não sendo essa adjudicação que aqui está em causa (por o período de vigência desse contrato já haver cessado), mas estamos, antes, perante novos contratos de aquisição de serviços efectuados por ajuste directo no ano de 2011.
O princípio da igualdade consagrado no art. 13º da CRP pressupõe o tratamento igual em matéria de direitos e deveres de todos os particulares em relação aos poderes públicos, não podendo uns, ser privilegiados, em detrimento de outros, o que proíbe benefícios no gozo de qualquer direito e prejuízo ou detrimento na privação de qualquer direito, como refere o Recorrido.
Este princípio apenas impõe que situações iguais tenham tratamento igual, só podendo ocorrer a sua violação no exercício de poderes não vinculados.
Ora, a aplicação da redução remuneratória contida nos arts. 19º e 22º da Lei nº 55-A/2010 à situação da Recorrente não representa por si só uma violação de tal princípio, já que não vem alegado, nem se demonstra que qualquer cidadão ou empresa colocados na mesma situação da Recorrente tenham obtido da Administração um tratamento desigual sem fundamento legal ou justificação razoável.
Aliás, como é sabido, tais normas consagraram medidas destinadas à contenção do défice orçamental dentro de determinados limites pela via da redução da despesa pública, face ao excesso de dívida e de défice público que exigiu ajuda externa.
O art. 22º da Lei nº 55-A/2010, foi uma das medidas excepcionais e transitórias que incidiram sobre a generalidade dos cidadãos e empresas que tinham vínculos contratuais com o Estado ou que o viessem a ter no ano de 2011 (sendo estendida a 2012, através do referido art. 26º da Lei nº 64-B/2011, de 30/12).
O Tribunal Constitucional no acórdão nº 396/2011 veio, aliás, a pronunciar-se no sentido de não declarar a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, das normas constantes dos artigos 19º, 20º e 21º da Lei nº 55-A/2010, sendo os fundamentos, no caso, relativos ao princípio da igualdade, aplicáveis igualmente à norma contida no art. 22º da mesma Lei.
Termos em que, improcede igualmente este fundamento da alegação da recorrente.

Pelo exposto, acordam em negar provimento ao recurso, confirmando o acórdão recorrido.
Custas pela Recorrente.

Lisboa, 9 de Julho de 2015. – Teresa Maria Sena Ferreira de Sousa (relatora) – José Francisco Fonseca da Paz – Maria do Céu Dias Rosa das Neves.