Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo | |
Processo: | 01222/17 |
Data do Acordão: | 11/16/2017 |
Tribunal: | 1 SECÇÃO |
Relator: | MADEIRA DOS SANTOS |
Descritores: | APRECIAÇÃO PRELIMINAR CONTRATO DE AVENÇA RELAÇÃO DE SUBORDINAÇÃO |
Sumário: | I - Não colhe a crítica que o recorrente dirige à qualificação de um contrato como de avença – censura baseada na presença real de uma relação de trabalho subordinado – se as cláusulas contratuais explicitamente recusavam uma tal subordinação. II - Se o acto impugnado correspondeu, afinal, ao exercício de um direito potestativo – aliás, contratualmente previsto – de extinção do negócio, não podia esse acto enfermar do vício resultante da preterição da audiência prévia. III - Não é de receber a revista se o aresto recorrido aparentemente não padece dos erros que o recorrente lhe imputa e se as «quaestiones juris» colocadas no recurso, pela sua singularidade, são de improvável repetição. |
Nº Convencional: | JSTA000P22558 |
Nº do Documento: | SA12017111601222 |
Data de Entrada: | 11/07/2017 |
Recorrente: | A... |
Recorrido 1: | MAI E MF |
Votação: | UNANIMIDADE |
Aditamento: | |
Texto Integral: | Acordam, em apreciação preliminar, no Supremo Tribunal Administrativo: A…………….., identificado nos autos, interpôs a presente revista do aresto do TCA-Sul confirmativo da decisão do TAC de Lisboa que julgou improcedente a acção instaurada pelo ora recorrente contra os Ministérios das Finanças e da Administração Pública e onde o autor impugnou o acto terminante de um «contrato de avença», por si celebrado com a PSP, e pediu a condenação dos réus a reconhecerem que ele já estava definitivamente nomeado ou, pelo menos, a adoptarem diversos comportamentos conformes à ideia de que tal contrato valia por tempo indeterminado. O recorrente pugna pela admissão da revista para correcção dos erros do acórdão «sub specie», para se garantir uma tutela jurisdicional efectiva e para se explicitar o tipo de controvérsia presente nos autos. O MAI considera a revista inadmissível. Cumpre decidir. Em princípio, as decisões proferidas em 2.ª instância pelos TCA’s não são susceptíveis de recurso para o STA. Mas, excepcionalmente, tais decisões podem ser objecto de recurso de revista em duas hipóteses: quando estiver em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, assuma uma importância fundamental; ou quando a admissão da revista for claramente necessária para uma melhor aplicação do direito («vide» o art. 150º, n.º 1, do CPTA). «In casu», e fundamentalmente, o autor veio a juízo impugnar o acto de 2009 que fez cessar um contrato – cujo «nomen» era «prestação de serviço em regime de avença» – que ele celebrou com a PSP em 2002 e referente a actividades de psicologia clínica. E o autor baseou tal impugnação em dois pontos: o acto traduziria um despedimento ilegal porque o sobredito contrato fora, deveras, de trabalho subordinado; e o acto seria ainda formalmente ilegal por inobservância da audiência prévia. As instâncias unanimemente entenderam que o contrato fora «de avença», o que excluía a ideia de um despedimento e tornava desnecessária a audiência prévia. E, nesta revista, o recorrente acomete o acórdão «sub specie» de múltiplos modos, em que todavia avulta o alegado desprezo do TCA quanto aos factos caracterizadores da índole subordinada da relação de emprego. Nem sempre o aresto recorrido se explicou idealmente. Contudo, e nesta «summaria cognitio», afigura-se-nos que a decisão nele adoptada está certa – o que logo afasta a necessidade de se receber o recurso para a melhorar. Com efeito, aquele «contrato de prestação de serviço em regime de avença» é o título jurídico fundante da acção; e o desfecho desta depende do modo como se qualifique o negócio. É óbvio que tal trabalho de qualificação deve ir além do mero «nomen juris» do contrato; mas não pode, por outro lado, exceder as cláusulas contratuais, pois estas, enquanto agregadoras da «lex contractus», é que irão determinar a sua verdadeira natureza. Donde se segue uma evidência: o modo como após o contrato se intentou executá-lo, se acaso brigar com o que negocialmente se dispusera, há-de ser irrelevante para a sua qualificação – sob pena dos contratos absurdamente se qualificarem a partir de comportamentos que lhes sejam estranhos ou que até os violem. Ora, como o contrato em questão excluía à partida «qualquer subordinação hierárquica», era efectivamente irrelevante – como as instâncias «impliciter» assumiram – tudo o que o autor alegou em prol dessa subordinação de facto; pois, mesmo que as coisas assim se tivessem passado, isso não traria a desnaturação do contrato – e apenas significaria o seu desrespeito. Assim, e quanto ao ponto acima tratado, as instâncias decidiram aparentemente bem. E o mesmo deve dizer-se do aludido vício formal. O TAC não notou que o acto impugnado não era, em rigor, um acto administrativo, já que correspondia ao exercício de um direito potestativo (de resolução ou de denúncia), aliás negocialmente previsto. Não reparando nisso, o TAC não extraiu daí quaisquer consequências no plano adjectivo – pelo que está agora assente a regularidade do processo. Todavia, essa inquestionável regularidade fica-se pela relação jurídico-processual, não sendo extensível à genuína natureza do acto impugnado «in judicio». E, na medida em que tudo aponta para que ele deveras traduza o exercício de um direito potestativo, nenhuma razão há para que se anule o acto por preterição da audiência prévia. Pelo que também este segmento se nos afigura bem decidido, não necessitando de reapreciação. O recorrente também não persuade quando alude a nulidades nas decisões do TAC e do TCA. A omissão de pronúncia que ele invoca parece partir de uma confusão entre indicações «de nomine» e «de re»; até porque não se vê que as instâncias hajam incorrido na «petitio principii» referida, aliás implicitamente, na revista – a de se partir de um contrato já encarado como «de avença» para, depois, o qualificar como tal. E não há qualquer excesso de pronúncia por se aludir às várias possibilidades de se fazer cessar o contrato, visto que o acto «sub censura» tratara exactamente disso. Ademais, a alusão do recorrente à tutela jurisdicional efectiva não impressiona, pois essa ideia somente acarreta que os tribunais devem enfrentar e resolver os litígios – e não que devam fazê-lo a favor dos autores. Por último, são vãs as críticas do recorrente quanto à possibilidade do TCA emitir uma decisão sumária, tendo em conta que a 2.ª instância acabou por julgar a apelação através de um acórdão – o que trouxe a superação do problema. Assim, o aresto recorrido não evidencia os lapsos que justificariam a subversão da regra da excepcionalidade das revistas. Por outro lado, o caso vertente encontra-se singularizado pelo contrato respectivo, o que torna improvável a repetição da controvérsia e exclui a necessidade de uma definição por parte do STA. Nestes termos, acordam em não admitir a revista. Custas pelo recorrente. Lisboa, 16 de Novembro de 2017. – Madeira dos Santos (relator) – Costa Reis – São Pedro. |