Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01037/12
Data do Acordão:01/30/2013
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ISABEL MARQUES DA SILVA
Descritores:OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL
ERRO NA FORMA DE PROCESSO
DUPLICAÇÃO DE COLECTA
Sumário:I - Se os oponentes invocaram como fundamento da oposição à execução a existência de “duplicação de colecta”, a par de ilegalidades várias das liquidações sindicadas, não há erro na forma do processo que obste ao conhecimento do mérito desse fundamento de oposição (artigos 204.º n.º 1, alínea g) e 205.º do CPPT).
II - O facto de se ter invocado como fundamento de impugnação deduzida pelos mesmos sujeitos a “dupla tributação” não obsta, em razão da excepção de “caso julgado”, a que na oposição possa ser conhecido o fundamento de “duplicação de colecta”, pois que se trata de conceitos diferentes e os sujeitos actuam numa e outra acção em diversa qualidade jurídica.
Nº Convencional:JSTA00068070
Nº do Documento:SA22013013001037
Data de Entrada:10/04/2012
Recorrente:A... E B.....
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENTE TAF BRAGA
Decisão:PROVIDO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - / EXEC FISCAL / OPOSIÇÃO
Legislação Nacional:CPPT99 ART204 N1 G ART205
Jurisprudência Nacional:AC STA0472/12 DE 2012/09/19
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- Relatório -
1 – A……. e B……., com os sinais dos autos, recorrem para este Supremo Tribunal da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, de 23 de Maio de 2012, que, na oposição por eles deduzida contra as execuções fiscais n.º 0361201101012037 e n.º 0361201101012029, instauradas pelo Serviço de Finanças de Braga- 1 para cobrança coerciva de Imposto do Selo, por erro na forma do processo insusceptível de convolação em impugnação por esta ter sido também deduzida e já julgada, com trânsito em julgado da decisão, anulou todo o processo, absolvendo a Fazenda Pública da instância.
Os recorrentes terminam as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:
I – A sentença recorrida decide anular todo o processo e, em consequência, absolver a Fazenda Pública da instância;
II – A sentença recorrida não se pronúncia sobre o mérito do fundamento alegado na Oposição pelos “Recorrentes” de “duplicação de colecta”;
III – Na verdade, a “duplicação de colecta” está expressamente prevista como fundamento de Oposição à execução no artigo 204.º n.º 1 alínea h) do Código de Procedimento e de Processo Tributário;
IV – Deveria a Meritissíma Juíza do Tribunal a quo ter-se decidido do mérito daquele fundamento, ao não fazê-lo, fere de vício a sentença recorrida.
Nestes termos e nos demais de direito que V. Ex.as doutamente suprirão, deve o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se a douta sentença recorrida e substituindo-se por outra que decida sobre o mérito do fundamento de oposição à Execução de “duplicação de colecta” alegado pelos Recorrentes na Oposição.

2 – Não foram apresentadas contra-alegações.

3 – O Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal emitiu o parecer de fls. 173 dos autos, no qual conclui que parece que bem se decidiu, sendo de julgar o recurso como não provido.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
- Fundamentação -
4 – Questão a decidir
É a de saber se bem andou a decisão recorrida ao abster-se de conhecer do mérito da oposição quanto à alegada “duplicação de colecta”

5 – Apreciando.
5.1 Do mérito do recurso
A decisão recorrida, a fls. 126 a 130 dos autos, absteve-se de conhecer do mérito da causa e absolveu a Fazenda Pública da instância, anulando todo o até agora processado, nos termos do artigo 98.º, n.º 4, do Código de Procedimento e de Processo Tributário e dos artigos 199.º n.º 1, 288.º, n.º 1, alínea b), 493.º, n.º 2, e 494.º, alínea b) do Código de Processo Civil, aplicáveis subsidiariamente por força da alínea e) do artigo 2.º do primeiramente referido, considerando ainda prejudicado o conhecimento das demais questões prévias e excepções dilatórias suscitadas nos autos (cfr. sentença, a fls. 129), por ter julgado verificado erro na forma do processo insusceptível de convolação, por já ter sido deduzida (e julgada definitivamente) impugnação judicial deduzida com os mesmos fundamentos.
Para assim julgar, considerou a decisão recorrida que como resulta evidente dos fundamentos de facto e de direito que modelam a causa de pedir dos oponentes, e do próprio pedido tal como por eles vem expressamente formulado, a pretensão em apreciação nos presentes autos vem apenas dirigida contra a legalidade, em concreto, das liquidações do imposto do selo que incidiu sobre a aquisição, por usucapião, do prédio objecto da escritura de justificação celebrada em 9 de Dezembro de 2004, mas que a ilegalidade no caso concreto da dívida exequenda, como a que é trazida a juízo pelos oponentes, não pode ser conhecida em sede de oposição à execução fiscal, salvo se a lei não assegurar meio judicial de impugnação ou recurso contra os actos de liquidação em causa (…), o que não é manifestamente o caso, uma vez que os referidos meios de reacção contenciosa se encontram previstos na lei e foram, aliás, postos oportunamente à disposição dos oponentes que, servindo-se deles, deduziram oposição judicial contra as liquidações do imposto em execução, e com os mesmos fundamentos de que agora se socorrem (cfr. decisão recorrida, a fls. 127 e 128 dos autos).
No que ao alegado vício de “duplicação de colecta” respeita, considerou a decisão recorrida que não pode, outrossim, haver lugar à apreciação, nestes autos de oposição, do vício que os oponentes qualificam como de “duplicação de colecta”, desde logo porque o conhecimento do mérito do mesmo se encontra precludido pela excepção de caso julgado decorrente da decisão acima referida, que sobre ele se pronunciou, mas, acrescentou, que sempre se dirá, de todo o modo, que este vício tal como invocado, dados os contornos em que vem fundado, não encontra subsunção na previsão da alínea g) do n.º 1 do artigo 204.º, conjugada com a do artigo 205.º n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário, porquanto como se pode extrair do teor do articulado dos oponentes, estes não vêm invocar a existência de uma cobrança ilegal de um mesmo tributo (ou de tributo de igual natureza), referente ao mesmo facto tributário e ao mesmo período de tempo; antes se insurgem contra a tributação da aquisição da titulada pela escritura de justificação que outorgaram, sustentando para tanto que a “transmissão” em causa teria sido já tributada, em sede de imposto sobre sucessões e doações, por virtude da doação que anteriormente teve lugar e, nesta conformidade, o vício suscitado, tal como vem configurado pelos oponentes, seria susceptível de afectar a própria legalidade da liquidação do imposto do selo, mas não a existência actual da dívida exequenda e ou a sua exigibilidade, pelo que não pode esta causa de pedir, à qualificação da qual o tribunal está vinculado (artigo 664.º do Código de processo Civil), servir também ela de fundamento à oposição ora em apreciação (cfr. decisão recorrida, a fls. 128 dos autos).
Discordam do decidido os recorrentes, embora apenas quanto ao vício de duplicação de colecta (cfr. as conclusões das alegações, supra transcritas), alegando que a sentença recorrida não se pronúncia sobre o mérito do fundamento alegado na Oposição pelos “Recorrentes” de “duplicação de colecta”, que está expressamente prevista como fundamento de Oposição à execução no artigo 204.º n.º 1 alínea h) (sic) do Código de Procedimento e de Processo Tributário e que deveria a Meritissíma Juíza do Tribunal a quo ter-se decidido do mérito daquele fundamento, ao não fazê-lo, fere de vício a sentença recorrida.
Vejamos.
Resulta claramente justificado na decisão recorrida as razões pelas quais não se conheceu do mérito do fundamento alegado na Oposição pelos “Recorrentes” de “duplicação de colecta”, a saber, o facto de a impugnação deduzida pelos mesmos sujeitos, e transitada em julgado, já se ter sobre ela pronunciado e a circunstância de que o alegado vício qualificado pelos oponentes como de “duplicação de colecta” não corresponder à sua definição legal para efeitos de oposição à execução fiscal.
E embora nenhum dos fundamentos da decisão de não conhecimento do mérito da alegada “duplicação de colecta” tenha sido concretamente atacado pelos ora recorrentes – pois que nas suas alegações não refutam nem a existência de excepção de caso julgado quanto ao fundamento de “duplicação de colecta”, nem procuram justificar a razão pela qual deve entender-se que a situação dos autos é susceptível de configurar o fundamento de “duplicação de colecta” para efeitos de oposição à execução fiscal -, certo é que alegam com acerto que a duplicação de colecta constitui fundamento de oposição expressamente previsto na lei (cfr. a alínea g) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT), não havendo, pois, quanto a este fundamento, erro na forma do processo, devendo haver pronúncia de mérito sobre a verificação ou inverificação de tal fundamento.
Não há excepção caso julgado que obste à apreciação da verificação ou inverificação de “duplicação de colecta”, pois que não decorre da petição de impugnação e sentença proferida nesses autos (a fls. 105 a 121 dos autos) que tal fundamento tenha sido invocado e apreciado na impugnação (o que invocaram na impugnação foi a existência de “dupla tributação” – cfr. o artigo 32.º da petição de impugnação, a fls. 110 dos autos, que, como é sabido, se não confunde com a “duplicação de colecta”), para além de que na impugnação e na oposição os sujeitos actuam em qualidades jurídicas diversas, não havendo, pois, a requerida identidade de sujeitos, pressuposto da excepção de caso julgado (o Acórdão deste Supremo Tribunal de 19 de Setembro último, proferido no recurso n.º 472/12).
Claro está que se o Tribunal “ a quo” concluir que a situação dos autos não cabe na definição legal de duplicação de colecta para efeitos de oposição à execução, constante do artigo 205.º do CPPT, terá de julgar a oposição improcedente. Não pode é abster-se de conhecer tal fundamento, pois que, ao contrário do julgado, não é manifesto que nessa fase processual pudesse conhecer do mérito. E não pode este Supremo Tribunal conhecer do mérito deste em substituição do tribunal “a quo”, pois que não se encontra fixado o necessário probatório, e sem que este se encontre fixado não deve concluir-se no sentido de que é manifesta a improcedência do fundamento invocado.
Têm, pois, os oponentes o direito de ver apreciado em concreto o mérito do fundamento invocado de “duplicação de colecta”, havendo, em consequência, que dar provimento ao recurso, revogar a decisão recorrida no segmento impugnado, baixando os autos ao tribunal recorrido para conhecimento do mérito da oposição quanto à alegada duplicação de colecta, se a tal nada mais obstar.

O recurso merece provimento.
- Decisão -
6 - Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, em conceder provimento ao recurso, revogando a decisão recorrida no segmento impugnado, baixando os autos ao tribunal “ a quo” para que prossigam, se a tal nada mais obstar.

Sem custas, pois a Fazenda Pública não contra-alegou.
Lisboa, 30 de Janeiro de 2013. - Isabel Marques da Silva (relatora) - Lino Ribeiro - Dulce Neto.