Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo | |
Processo: | 0935/17 |
Data do Acordão: | 11/16/2017 |
Tribunal: | 1 SECÇÃO |
Relator: | TERESA DE SOUSA |
Descritores: | CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES ACIDENTE DE SERVIÇO ALTA MÉDICA INDEMNIZAÇÃO PRESUNÇÃO |
Sumário: | I – Se é a própria Junta Médica da CGA, realizada em 16.12.2014, que relativamente ao acidente aqui em causa refere expressamente que: “Das lesões apresentadas resultou uma incapacidade permanente parcial de 32% de acordo com o Capítulo III nº 7 e Capítulo I nº 1.1.1 alínea b) da T.N.I.”. Apenas pode estar a referir-se àquele valor de incapacidade, que remontava à data da primeira alta clínica, visto que não existe qualquer outro fixado no que respeita à incapacidade do autor. II - Vindo a mesma CGA a atribuir agora uma incapacidade permanente parcial, com a desvalorização de 48%, conforme parecer da Junta médica da CGA, homologado por despacho da Direcção de 08.01.2015, reconheceu que houve um agravamento, nos termos e para os efeitos do art. 24º, nº 2. III - Assim, o acórdão recorrido não incorreu em erro de julgamento, nem violou os arts. 20º, nº 1, 21º, nº 1 e 24º, nº 2 do DL nº 503/99, ao situar a alta clínica para efeitos de pagamento de prestações pela CGA em 09.02.2002 IV - Face aos termos da transacção celebrada entre o autor e a Companhia de Seguros, a CGA não estava impedida de fazer funcionar a presunção estabelecida no art. 46º, nº 5 do DL nº 503/99, de 20/11, já que tal preceito visa, precisamente, que o mesmo dano não seja duplamente indemnizado, estabelecendo um direito de regresso quer a favor da CGA, quer dos serviços ou organismos que tenham pago ao trabalhador quaisquer prestações previstas naquele diploma. |
Nº Convencional: | JSTA00070415 |
Nº do Documento: | SA1201711160935 |
Data de Entrada: | 10/16/2017 |
Recorrente: | CGA, IP E A... |
Recorrido 1: | OS MESMOS |
Votação: | UNANIMIDADE |
Meio Processual: | REC REVISTA EXCEPC |
Objecto: | AC TCAN |
Decisão: | NEGA PROVIMENTO |
Área Temática 1: | DIR ADM CONT - REC REVISTA EXCEPC. |
Legislação Nacional: | DL 503/99 DE 1999/11/20 ART20 N1 ART21 N1 ART24 N2 ART46 N4 N5. CONST76 ART63 ART1 ART13 ART266. |
Jurisprudência Nacional: | AC STA PROC0244/11 DE 2011/11/04. |
Aditamento: | |
Texto Integral: | Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo 1. Relatório A) O Autor foi vítima de acidente de viação ocorrido em 08 de abril de 2002, do qual lhe resultou espasmo cervical, disestesias, parestesias e cervico-braquialgias da parte esquerda cada vez mais violentas, tendo-lhe sido diagnosticada hérnia forarminal, C6-C7 esquerda, pós traumática, com sofrimento medular e radicular, acrescido de diminuição da força muscular em C7 esquerda e no membro inferior esquerdo (cordão antero-lateral da medula), o que exigiu intervenção cirúrgica a hérnia discal pós-traumática, onde efetuou artrodese (cirurgia) C6-C7 com cage e enxerto de ilíaco, bem como, demorados tratamentos das especialidades de neurocirurgia e ortopedia.B) O Autor à data daquele acidente era, e ainda hoje é, médico especialista de radiologia, no Instituto Português de Oncologia do Porto, local para onde se dirigia aquando do sinistro, motivo pelo qual o evento foi qualificado como acidente em serviço, tendo-lhe sido atribuída uma incapacidade temporária absoluta (ITA) de 100%, tendo alta definitiva em 09 de setembro de 2002, conforme Informação Clínica prestada pelo médico da Companhia de Seguros, nos seguintes termos:-«Para os devidos efeitos declaro que A………… (Dr.) pode retomar funções laborais a partir de 02/09/09». (vide doc. de fls. 37 dos autos, doc. 7 da P1) C) O Autor em 20/08/2012, solicitou a reapreciação do processo com submissão a junta médica por agravamento da situação clínica; tendo sido submetido à junta médica da ADSE em 27/11/2012, que lhe concedeu alta do acidente em serviço e o considerou com incapacidade permanente parcial; e decidiu que deveria ser presente à junta médica da Caixa Geral de Aposentações, de acordo com o n.º 5 do artigo 20.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro. (doc. de pág. 152 do processo administrativo e doc. de fls. 52 dos autos — doc. 14 da PI; idem a pág. 123 do PA)D) O Autor foi submetido à junta médica da Caixa Geral de Aposentações em 15/07/2014 e posteriormente em 16/12/2014, tendo esta última atribuído uma incapacidade permanente parcial (1PP), com a desvalorização de 48%; e consequentemente foi-lhe fixada uma pensão anual vitalícia de € 9871,76, correspondente a uma pensão mensal de € 705,13.E) O Autor intentou ação cível contra o condutor do veículo que causou o referido acidente de viação e contra a respetiva Companhia de Seguros, na qual realizou os seguintes pedidos:Deve a presente acção ser julgada procedente por provada e por via dela serem os demandados serem condenados a pagar ao Autor o montante global de Euros 1.383.310,92 acrescidos de Juros de mora vencidos, bem como dos vincendos, assim discriminados - A quantia de Euros 1.268 951,07 a título de incapacidade Permanente Parcial A quantia de Euros 74.359,85 a título de perdas salariais - A quantia de Euros 40.000,00 a título de danos morais, tudo acrescidos de juros desde a citação até integral e efectivo pagamento. F) No âmbito da referida ação cível, foi efetuada uma transação, nos seguintes termos:«Aberta a audiência, pelos Exm.ºs mandatários das partes foi pedida a palavra e, sendo-lhes concedida, no uso dela disseram que Autor e 1.º Ré acordaram em pôr termo ao litígio constante destes autos por transacção, nos termos das cláusulas seguintes: I O Autor reduz o pedido à quantia de €375.000,00 (trezentos e setenta e cinco mil euros) com o qual se considera ressarcido de todos os danos patrimoniais e não patrimoniais advenientes do acidente em causa nos autos.II A Ré B…………., SA. compromete-se a pagar a referida quantia no prazo de 15 (quinze) dias contra recibo e mediante cheque a enviar para o escritório da ilustre mandatária do Autor. 1III O Autor desiste do pedido formulado contra o 2.º Réu, C………...IV As custas em divida a juízo serão suportadas em partes iguais por Autor e . Ré, B…………, S.A., prescindindo estes das custas de parte e procuradoria na parte disponível.»G) A Ré, notificou o Autor da suspensão do pagamento da pensão, nos seguintes termos:«Assunto: PENSÃO POR ACIDENTE EM SERVIÇO - ALTERAÇÃO DL 503/1999 de 20/11, LEI 98/2009 de 4/9 Utente n.º: ………. Categoria: MÉDICO Motivo da alteração: Alteração do valor da indemnização recebida Comunico a V. Exa, que, por decisão de 2016-01-15, da Direcção da Caixa Geral de Aposentações (Delegação de poderes publicada no DR II Série, n.° 192 de 2013-10-04), lhe foi alterada a pensão anual vitalícia para € 9 871,76, a que corresponde uma pensão mensal de € 705,13 (€ 9 871,76/14), em consequência do acidente em serviço de que foi vitima. Do referido acidente em serviço resultou uma incapacidade permanente parcial, com a desvalorização de 48%, conforme parecer da Junta Médica desta Caixa, homologado por despacho da Direcção da Caixa Geral de Aposentações de 2015-01-08. A pensão mensal, foi calculada nos seguintes termos: Retribuição anual €29 380,25 Pensão Mensal (€9 871,76/14) €705,13 Subsidio Férias (€9871,76/14) €705.13 Subsídio Natal (€9871,76/14) €705,13 Data de Efeito 2012-11-27 No acidente de que foi vítima o(a) subscritor(a), houve responsabilidade de terceiro, tendo sido fixada uma indemnização paga numa única prestação, no valor de € 375 000,00, onde o montante de € 250 000,00 é deduzido na pensão, pelo que este valor não será abonado até se esgotar a importância de €250 000,00. EVOLUÇÃO DE PENSÃO Início Pensão Início. Pensão (€) 2012-11-27 705,13 2012-12-01 705,13 DIVISÃO DE ENCARGOS Regime Entidade Valor Tipo de Valor Pensão DL 503/99 INST PORTUGUÊS ONCOLOGIA P F GENTIL, EPE 705,13 P VITALÍCIA-ACDEN.SERV.-DL 503/99 OBSERVAÇÕES Remunerações consideradas conforme informação prestada pelo serviço. Por ofício de 2015-12-12, vem o IPO do Porto informar que no acidente de que foi vítima V. Exa. houve responsabilidade de terceiro tendo sido fixada pela companhia de seguros Lyberty uma indemnização relativa a todos os danos patrimoniais e não patrimoniais, no valor de 375 000,00 Euros. Assim, aplicando o disposto n.º 5 do art.º 46° do D.L 503/99, presume-se que dois terços da indemnização que foi fixada foram atribuídos para o ressarcir por danos patrimoniais futuros, o que corresponde a um montante de 250.000 Euros. Assim, a pensão fixada por despacho desta Caixa de 2015-04-09 fica agora suspensa, e só irá ser abonada depois de esgotada a indemnização recebida, 250000 euros.»” 3. O Direito 3.1 Recurso da Caixa Geral de Aposentações, IP A Caixa Geral de Aposentações, IP (doravante CGA), interpôs na Secção do Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal, recurso de revista do acórdão do TCA Norte que revogou parcialmente a sentença absolutória do TAF do Porto. Alega, em síntese, que não existem elementos formais que permitam à CGA afirmar que a data da alta é diferente daquela em que foi realizada a junta médica da ADSE, E que ao decidir de modo diferente, violou o Acórdão Recorrido, o disposto nos artigos 20º, nº 1, 21º, nº 1, e 24º, nº 2, do DL nº 503/99, de 20/11 A questão a decidir no presente recurso interposto pela CGA é a de determinar qual a data da alta: se esta deve reportar-se a 09.09.2002, conforme informação clínica prestada pelo médico da Companhia de Seguros, nos termos constantes da alínea B) dos factos provados; se a data de submissão do Autor à junta médica da ADSE – 27.11.2012 – nos termos indicados na alínea C) do probatório. Sobre esta questão o acórdão recorrido refere, nomeadamente, o seguinte: “Na verdade, …, a solução adoptada na decisão peca por ser desnecessariamente formalista, ao considerar que nas deliberações das Juntas Médicas e na lei pode encontrar-se suporte para uma decisão conforme à realidade presumível dos factos, de resto estribada em documentos clínicos donde decorre que a incapacidade permanente parcial do Autor, então “fixável em 32%”, remonta à “data da cura/consolidação médico-legal das lesões” que é “fixável em 7-9-2002”, como referiu o IML (doc. fls. 40-42). (…) Ora, a Junta Médica da CGA de 16-12-2014 (doc. fls. 53) refere que é “relativa ao acidente ocorrido em 03 de abril de 2002” e que “Das lesões apresentadas resultou uma incapacidade permanente parcial de 32%...”, sem quaisquer reservas que sensatamente, se esperaria fossem expressamente declaradas se tal incapacidade não remontasse à data da primeira alta clínica ocorrida”. Afigura-se-nos que o acórdão recorrido ajuizou correctamente face ao quadro legal aplicável – os artigos 20º, nº 1, 21º, nº 1 e 24º, nº 2 do DL nº 503/99, de 20/11 a que o Recorrente faz apelo e a que doravante se referiram todos os preceitos sem menção de qualquer outro. Com efeito, o art. 20º, nº 1, sob a epígrafe “Alta”, prescreve o seguinte: “Quando o trabalhador for considerado clinicamente curado ou as lesões ou a doença se apresentarem insusceptíveis de modificação com terapêutica adequada, o médico assistente ou a junta médica prevista no artigo 21.º, conforme os casos, dar-lhe-á alta, formalizada no boletim de acompanhamento médico, devendo o trabalhador apresentar-se ao serviço no 1.º dia útil seguinte, excepto se lhe tiver sido reconhecida uma incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual ou para todo e qualquer trabalho, caso em que se consideram justificadas as faltas dadas até a realização da junta médica da Caixa Geral de Aposentações”. E o nº 5 do mesmo preceito: “Após a alta, se for reconhecida ao acidentado uma incapacidade permanente ou se a incapacidade temporária tiver durado mais de 36 meses, seguidos ou interpolados, a entidade empregadora deve comunicar o facto à Caixa Geral de Aposentações, que o submeterá a exame da respectiva junta médica para efeitos de confirmação ou da verificação da eventual incapacidade permanente resultante do acidente e de avaliação do respectivo grau de desvalorização”. Por sua vez, o art. 21º, nº 1 prescreve que: “A verificação e confirmação da incapacidade temporária, a atribuição da alta ou a sua revisão, previstas nos artigos 19.º e 20.º, e a emissão do parecer referido no artigo 23.º competem a uma junta médica composta por dois médicos da ADSE, um dos quais preside, e um médico da escolha do sinistrado.” Prevendo o art. 24º, nº 2 que: “O reconhecimento da recidiva, agravamento ou recaída pela junta médica determina a reabertura do processo, que seguirá, com as necessárias adaptações, os trâmites previstos para o acidente e confere ao trabalhador o direito à reparação prevista no artigo 4.º”. Resulta do disposto no art. 20º, nº 1 que a alta tanto pode ser concedida pelo médico assistente, como pela junta médica. No caso em apreço a alta definitiva foi concedida pelo médico da companhia de seguros. Aliás, a deliberação da junta médica da ADSE, de 27.11.2012, o que diz é o seguinte: “Tem alta do presente acidente em serviço”, não estabelecendo qualquer data para essa alta (reiterando o que havia dito:”Tem alta”, em 17.12.2002 – cfr. fls. 280 verso). Por sua vez, o termo “confirmação” da incapacidade temporária pressupõe uma realidade já existente, compatível com o reconhecimento pela junta médica de que tal incapacidade remonta ao tempo da alta clínica inicial, tendo por base, no caso, o parecer do IML – Serviço de Clínica Médico-Legal de fls. 40 a 42, que considerou a incapacidade permanente geral fixável em 32%, remontando “à data da cura/consolidação médico-legal das lesões” e “fixável em 7-9-2002”, e a que o acórdão recorrido faz referência. E, o processo do Autor é reapreciado por agravamento da situação clínica (o que pressupõe que já antes havia sido apreciado pela junta médica da ADSE, conforme se vê de fls. 280 verso e do P.A.), a seu pedido, com aquela (nova) submissão à Junta Médica da ADSE, naquela data de 27.11.2012 (cfr. al. C) dos FP). Ora, é a própria Junta Médica da CGA, realizada em 16.12.2014, que relativamente ao acidente aqui em causa refere expressamente que: “Das lesões apresentadas resultou uma incapacidade permanente parcial de 32% de acordo com o Capítulo III nº 7 e Capítulo I nº 1.1.1 alínea b) da T.N.I.”. No que apenas pode estar a referir-se àquele valor de incapacidade, que remontava à data da primeira alta clínica, visto que não existe qualquer outro fixado no que respeita à incapacidade do autor. Vindo a mesma CGA a atribuir agora uma incapacidade permanente parcial, com a desvalorização de 48%, conforme parecer da Junta médica da CGA, homologado por despacho da Direcção de 08.01.2015. Ou seja, a CGA reconheceu que houve um agravamento, nos termos e para os efeitos do art. 24º, nº 2. Assim, o acórdão recorrido não incorreu em erro de julgamento, nem violou os arts. 20º, nº 1, 21º, nº 1 e 24º, nº 2 do DL nº 503/99, ao situar a alta clínica para efeitos de pagamento de prestações pela CGA em 09.02.2002, sendo de confirmar. 3.2 Recurso subordinado do Autor Defende o Recorrente que da interpretação conjugada dos n.ºs. 4 e 5, do art. 46º do DL nº 503/99, resulta que: para se poder presumir o valor dos danos patrimoniais futuros a que se refere o nº 4 do sobredito comando legal, estes terão, pelo menos, de fazer parte integrante do montante global da indemnização recebida pelo beneficiário. E que os danos a que aludem os n.ºs 4 e 5, do art. 46º, são os danos patrimoniais futuros e não quaisquer danos. Mais alega que são manifestamente inconstitucionais, os nºs 4 e 5, do art. 46º do DL n° 503/99, quando interpretados no sentido de que os mesmos abarcam quaisquer danos e que a lei não distingue entre os danos que foram ou não solicitados em acção anterior ou objecto de negociação amigável; Que o art. 46º do DL n° 503/99, nos seus n.ºs 4 e 5, é ainda inconstitucional por violar o direito à segurança social consagrado no art. 63º da CRP, violando, também, os Princípios da proporcionalidade, da igualdade, da protecção da confiança e da justiça, pelo que ao decidir pela aplicação da mencionada presunção, a decisão recorrida violou os arts. 1º, 13º e 266º da CRP. Vejamos. O art. 46º, sob a epígrafe “Responsabilidade de terceiros”, prevê o direito de regresso dos serviços e organismos que tenham pago aos trabalhadores quaisquer prestações previstas no DL nº 503/99, contra terceiros civilmente responsáveis pelo acidente ou doença profissional (nºs 1 e 2). Os nºs 3, 4 e 5 do referido preceito prevêem o seguinte: “3 - Uma vez proferida decisão definitiva sobre o direito às prestações da sua responsabilidade, a Caixa Geral de Aposentações tem direito de regresso contra terceiro responsável, incluindo seguradoras, por forma a dele obter o valor do respectivo capital, sendo o correspondente às pensões determinado por cálculo actuarial. 4 – Nos casos em que os beneficiários das prestações tenham já sido indemnizados pelo terceiro responsável, não há lugar ao seu pagamento até que nelas se esgote o valor da indemnização correspondente aos danos patrimoniais futuros, sem prejuízo do direito de regresso referido no número anterior, relativamente à eventual responsabilidade não abrangida no acordo celebrado com terceiro responsável. 5 – Quando na indemnização referida no número anterior não seja discriminado o valor referente aos danos patrimoniais futuros, presume-se que o mesmo corresponde a dois terços do valor da indemnização atribuída.” Conforme resulta dos factos provados o Autor e a seguradora fizeram uma transacção judicial pela qual esta pagou ao autor uma indemnização relativa a todos os danos patrimoniais e não patrimoniais, no valor de 375 000,00 Euros. Nesta transacção não ficou discriminado qual o valor imputável a cada um dos danos que o Autor havia peticionado, e que havia discriminado na petição inicial da acção, conforme indicado na alínea E) dos factos provados. Ora, na sua petição inicial o autor havia pedido directamente uma indemnização a título de incapacidade permanente parcial (a quantia de €1.268.951,07), sendo precisamente esta incapacidade que determinou que a CGA tenha atribuído ao autor uma pensão. No acórdão deste Supremo Tribunal de 04.11.2011, P. nº 0244/11, em caso em tudo semelhante ao dos presentes autos, expendeu-se o seguinte: «Apesar de na petição inicial o ora recorrido não pedir qualquer indemnização quanto a danos patrimoniais futuros, nada impede que este tipo de danos não possam ser englobados na transacção efectuada. Tal é permitido pelo nº 2 do supra referido artº 1248º que permite constituir, modificar ou extinguir direitos diversos do direito controvertido, apenas tendo de se respeitar os limites impostos no artº 1249º do CC. Assim, quando o lesado, ora recorrido, na transacção se declara ressarcido de todos os danos patrimoniais e não patrimoniais emergentes do acidente mediante a quantia proposta e entregue pela Companhia seguradora, tem de entender-se que estão englobados no montante indemnizatório todos os danos, seja qual for a sua natureza ou actualidade, sem exclusão de nenhum. Ora tendo, uma vez que o recorrido já recebeu a indemnização acordada por todos danos sofridos no acidente, então tem pleno cabimento a aplicação do estatuído no nº 4 do artº 46º do DL nº 503/99, ou seja, uma vez que o sinistrado já foi indemnizado pela Companhia de Seguros não há pagamento das prestações da responsabilidade da CGA até que não se esgote o valor da indemnização correspondente aos danos patrimoniais futuros. Porém, como no montante acordado e pago pela Companhia Seguradora estavam englobados todos os danos, como acima se concluiu, sem especificar parcelarmente o quantitativo de cada dano, temos que nos socorrer da presunção contida no nº 5 do mesmo artº 46º: “presume-se que o mesmo corresponde a dois terços do valor da indemnização atribuída”». Assim, e face aos termos da transacção celebrada entre o autor e a Companhia de Seguros, a CGA não estava impedida de fazer funcionar a presunção estabelecida no art. 46º, nº 5 acima transcrito, já que o referido art. 46º visa, precisamente, que o mesmo dano não seja duplamente indemnizado, estabelecendo um direito de regresso quer a favor da CGA, quer dos serviços ou organismos que tenham pago ao trabalhador quaisquer prestações previstas no DL nº 503/99. Termos em que, ao assim ter entendido, o acórdão recorrido não enferma de qualquer erro de julgamento. Alega ainda o agora Recorrente que os nºs 4 e 5 do art. 46º quando interpretados no sentido de que englobam quaisquer danos e que a lei não distingue entre os danos que foram ou não solicitados em acção anterior ou objecto de negociação amigável, seriam inconstitucionais. No entanto, nem o recorrente consubstancia em que consistiria essa inconstitucionalidade, nem nós a vislumbramos, sendo a mesma, como tal, manifestamente improcedente. Alega igualmente o recorrente que tais normativos seriam inconstitucionais por violarem o direito à segurança social consagrado no art. 63º da CRP, violando os princípios da proporcionalidade, da igualdade, da protecção da confiança e da justiça, pelo que ao decidir pela aplicação daquela presunção a decisão recorrida teria violado os arts. 1º, 13º e 266º da CRP. Mais uma vez estamos por uma alegação completamente genérica e sem qualquer fundamentação para se poder perceber em que medida considera o recorrente que tais princípios foram violados. No entanto, sempre diremos que a presente acção tem por base, precisamente, a protecção do autor numa situação de doença que lhe foi reconhecido com a atribuição de uma pensão por ser detentor de uma incapacidade parcial permanente, no que não se vislumbra qualquer violação do art. 63º da CRP. Igualmente, não se vê que a Administração Pública, no caso a CGA, não tenha na sua actuação para com o recorrente visado a prossecução do interesse público (accionando o seu direito de regresso nos termos legais), e respeitando os direitos e interesses legítimos do recorrente (atribuindo-lhe uma pensão que a lei prevê), tendo agido de acordo com as regras do Estado de Direito (arts. 1º e 266º, nº 1 da CRP). Da mesma forma não fornecem os autos quaisquer elementos que permitam considerar que foi violado o princípio da igualdade previsto no art. 13º da CRP. Este princípio, intimamente relacionado com o conceito de lei inerente ao Estado de Direito, postula o exercício de um direito igual para todos os cidadãos. No caso, a Administração estaria obrigada a proceder de modo igual em relação a dois casos iguais no plano objectivo. Ora, como é manifesto, não invocou o recorrente qualquer caso semelhante ao seu no qual a CGA não tivesse seguido o mesmo critério que aplicou ao fazer apelo à presunção prevista no art. 46º, nº 5. E, também não se vislumbra que o critério deste preceito seja desadequado e desproporcional, tendo em atenção a gestão dos dinheiros públicos e os direitos subjectivos do particular, já que este foi ressarcido pelo dano sofrido, não sendo justo nem proporcional que o fosse duplamente. Improcede, consequentemente, o recurso subordinado, sendo de confirmar o acórdão recorrido. Pelo exposto, acordam em negar provimento aos recursos e, em confirmar o acórdão recorrido. Custas pelos Recorrentes. Lisboa, 16 de Novembro de 2017. – Teresa Maria Sena Ferreira de Sousa (relatora) – José Francisco Fonseca da Paz – Maria do Céu Dias Rosa das Neves. |