Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01711/11.0BELRS 0489/17
Data do Acordão:10/14/2020
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:NUNO BASTOS
Descritores:TAXA DE PUBLICIDADE
RENOVAÇÃO
CONSTITUCIONALIDADE
Sumário:I - A questão de saber se a renovação da taxa de publicidade cobrada por um município viola o princípio da equivalência consagrado no artigo 4.º do RGTAL não é do conhecimento oficioso e, não tendo sido invocada junto do tribunal recorrido, não pode ser conhecida em via de recurso;
II - Do facto de o regulamento de publicidade municipal prever que o licenciamento da publicidade se renova automaticamente não deriva que o tributo cobrado aquando da renovação não tenha caráter bilateral, sinalagmático ou comutativo nem resulta, por conseguinte, que o tributo respetivo tenha a natureza de um imposto;
III - Do artigo 6.º do RGTAL deriva que o elemento material da incidência das taxas de publicidade, aquando da renovação da licença respetiva, não se reconduz a uma atividade de reavaliação da verificação dos pressupostos que determinaram o seu licenciamento.
Nº Convencional:JSTA000P26501
Nº do Documento:SA22020101401711/11
Data de Entrada:04/26/2017
Recorrente:A.........– PUBLICIDADE NA COMPANHIA B........., S.A.
Recorrido 1:MUNICÍPIO DE LISBOA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

1. Relatório

1.1. A…….. – Publicidade na Companhia B………, S.A., contribuinte fiscal n.º ………, com sede na Avenida ………, edifício ……, n.º ……., ……., em Algés, recorreu da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou totalmente improcedente a impugnação judicial da liquidação das taxas cobradas pelo Município de Lisboa e relativas à renovação, para o ano de 2011, do licenciamento da publicidade instalada em espaços publicitários pertencentes à Companhia B………….., colocados em meios e transporte coletivos da cidade de Lisboa, de cuja concessão a Impugnante é titular, no valor global de € 126.995,41 (cento e vinte e seis mil, novecentos e noventa e cinco euros e quarenta e um cêntimos).

O recurso foi admitido com subida imediata nos próprios e autos e com efeito meramente devolutivo.

Notificada da sua admissão, a Recorrente apresentou alegações, que resumiu nas seguintes conclusões: «(...)

a) O presente recurso jurisdicional cinge-se à parte da Sentença recorrida que julgou não inconstitucionais os artigos 3.º e 16.º do RPML e o artigo 29.º, n.º 5, alínea a), da TTORML e que julgou improcedente a arguição de ilegalidade da taxa liquidada por violação do conceito jurídico de taxa previsto na lei;

b) O fato tributário discutido nos presentes é a renovação da licença de publicidade da Recorrente para o ano de 2011;

c) Relativamente à arguição da inconstitucionalidade orgânica dos artigos 3.º e 16.º do RPML e do artigo 259.º, n.º 5, alínea a) da TTORML, e para a dar por não verificada, o Tribunal a quo, remeteu na íntegra para o decidido no Acórdão n.º 177/2010 do Tribunal Constitucional;

d) Ora, acontece que, como se demonstrou na alínea a) da Parte III das presentes alegações (para onde se remete na íntegra), o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento ao considerar abrangida no âmbito das referidas normas a renovação automática da licença de publicidade atribuída à Recorrente;

e) Na verdade, à notificação feita à Recorrente para pagamento destas taxas surge como consequência do facto de a legislação municipal estabelecer como regra que a renovação das licenças concedidas por prazo superior a 30 (trinta) dias é sucessiva e automática (ver artigo 20.º do RPML);

f) A regulamentação camarária deixa claro que uma vez emitida a licença com duração igual ou superior a 30 dias, a sua renovação no termo do prazo é automática, ou seja, ocorre, independentemente de qualquer impulso do particular ou da própria edilidade;

g) Dada a norma regulamentar que prevê a renovação automática da licença, em cada ano a CML simplesmente realiza uma operação aritmética que consiste na multiplicação do valor unitário da taxa previsto no regulamento municipal pelo número de metros quadrados de cada anúncio previamente licenciado;

h) Ou seja, aquando da renovação das licenças – momento que releva para os autos – a CML não realiza ao sujeito passivo das taxas (i.e., à ora Recorrente) uma actividade que possa consubstanciar uma prestação individualizada e concreta que sirva de pressuposto ou facto tributário de uma taxa, à luz do disposto no artigo 4.º, n.º 2, da LGT e do artigo 3.º do RGTAL;

i) E no caso concreto ficou efectivamente demonstrado – como resulta do PA e é também assumido na contestação do Município – que não houve da parte da CML qualquer actividade de reavaliação dos pressupostos do licenciamento que pudesse justificar a cobrança de uma taxa pela remoção de um obstáculo jurídico;

j) Sendo certo que, à luz do decidido no Acórdão n.º 177/2010 do Tribunal Constitucional, essa actividade de reavaliação se encontra pressuposta, para que, nesse caso, se possa entender estar na presença de uma taxa e não de um imposto;

k) Como também se concluiu no Acórdão deste Alto Tribunal de 8/06/2011 (rec. N.º 300/2011), que igualmente serviu para fundar o decidido na Sentença a quo;

l) E como também já se havia decidido no Acórdão do Pelo do STA de 18/05/2005 (proc. n.º 1176/04);

m) Por tudo o que fica dito é patente o erro de julgamento do Tribunal a quo, dado que no caso concreto, o tributo liquidado, respeitante a uma renovação automática de licenciamento, só pode ser entendido como tendo natureza de um imposto e não de uma taxa;

n) Havendo assim inconstitucionalidade orgânica dos artigos 3.º e 16.º do RPML (e do artigo 29.º, n.º 5, alínea a) da TTORML), se neles se contemplar – como se entendeu na Sentença recorrida – o encargo devido por uma mera renovação automática do licenciamento de publicidade e que manifestamente tem natureza de verdadeiro imposto;

o) Ou seja, entendendo-se – como o Tribunal a quo entendeu – que a renovação de licenciamento previsto no artigo 16.º do Regulamento de Publicidade contempla também as renovações automáticas, ter-se-á de considerar a referida norma organicamente inconstitucional, na parte em que contemple essa renovação automática;

p) Não se entendendo que a referida norma regulamentar contempla a renovação automática do licenciamento, então, ao entender que a mencionada renovação implicava o pagamento de uma taxa, o Tribunal a quo fez interpretação e aplicação inconstitucionais das normas dos artigos 3.º e 16.º do RPML e do artigo 29.º, n.º 5, alínea a), da TTORML, em violação dos artigos 103.º, n.º 2 e 3, e 165.º, n.º 1, alínea i), da Constituição da República Portuguesa;

q) Também ficou demonstrado na alínea a) da Parte III das presentes alegações (para onde se remete) a manifesta inexistência de bilateralidade/sinalagmaticidade da taxa liquidada, o que implica a respetiva ilegalidade;

r) Ao não entender assim, a Sentença recorrida incorreu em novo erro de julgamento;

s) Além disso, também nesta parte se verifica uma interpretação e aplicação inconstitucionais por parte da Sentença a quo dos mencionados artigos 3.º e 16.º do RPML, bem como do artigo 4.º, n.º 2, da LGT, em violação dos artigos 103.º, n.ºs 2 e 3 e 165.º, n.º 1, alínea i), da Constituição da República Portuguesa;

t) Admitindo que o encargo cobrado tenha a natureza de uma taxa (e não de um imposto) – o que aqui se admite, sem conceder, por mera cautela de patrocínio – então, ao decidir como decidiu, a Sentença recorrida violou o princípio da equivalência, como se demonstrou na alínea c) da Parte III das presentes alegações;

u) Na verdade, o mencionado princípio (contido no artigo 4.º, n.º 1, do RGTAL), determina que a finalidade da taxa cobrada resida na compensação da prestação administrativa efectuada e, por conseguinte, que o seu quantum seja fixado de forma proporcional e adequada a esse fito compensatório (equivalência económica);

v) Ora, inexistindo no caso vertente um acto administrativo ou uma actividade pública efectiva e especificamente direccionada à Recorrente no momento da renovação da licença, que a legislação municipal classifica como automática e sucessiva, não há, por maioria de razão, qualquer custo para o ente público que tenha de ser compensado mediante o pagamento de uma taxa;

w) E mesmo que se aplicasse no caso o chamado princípio do benefício, haveria sempre dificuldade de princípio porque na renovação das licenças de publicidade não se descortina uma prestação administrativa dirigida ao sujeito passivo que constitua o pressuposto de facto da cobrança da taxa;

x) Em virtude do exposto, a taxa liquidada é ilegal na medida em que o seu quantum não tem em vista compensar custos efetivamente provocados pelo sujeito passivo, nem remunerar o valor de uma prestação que lhe é dirigida, o que afronta o princípio da equivalência e a regra contida no n.º 1 do artigo 4.º do RGTAL, expressão do princípio constitucional da igualdade e critério material de repartição dos encargos públicos aplicáveis às taxas;

y) Concluindo-se que a Sentença a quo ofende o princípio da equivalência contido no n.º 1 do artigo 4.º do RGTAL.

Pediu fosse concedido provimento ao recurso e fosse revogada a decisão recorrida, com todas as consequências legais.

O Município de Lisboa apresentou contra-alegações, que condensou nas seguintes conclusões: (...).

1. A Recorrente pretende a apreciação, no presente, de questão nova, que não suscitou anteriormente nos autos e que, nem se dirige à douta decisão recorrida, nem é do conhecimento oficioso: a alegada ilegalidade da liquidação por violação do princípio da equivalência;

2. Visando os Recursos, por essência, o reexame de decisões anteriores e não a criação de decisões novas, a referida questão, a que a Recorrente dedica a parte c) das Alegações e as Conclusões t) a y) deverá considerar-se excluída do objeto do Recurso;

3. A Constituição da República Portuguesa consagra, para as autarquias locais, a possibilidade de disporem de poderes tributários próprios, no n.º 4 do art. 238.º, atribuindo, ainda, aos municípios, receitas tributárias próprias, no § único, do art. 254.º;

4. Os municípios têm legitimidade, não só para liquidarem e cobrarem as taxas que se encontrem previstas na lei, como é o caso da taxa devida pelo licenciamento da publicidade, como para definirem, de forma geral e abstracta, os termos em que o pretendem fazer;

5. Por seu turno, de acordo com o art. 3.º do Regime Geral das Taxas das Autarquias Locais, as taxas das autarquias locais são tributos que assentam na utilização de bens do domínio público local ou na remoção de um obstáculo jurídico ao comportamento de particulares, acrescendo, nos termos das alíneas b) e c) do art. 6.º do mesmo Diploma, que as taxas municipais incidem sobre utilidades prestadas aos particulares ou geradas pela actividade dos municípios, designadamente pela concessão de licenças e pela utilização de bens do domínio público (...) municipal;

6. De acordo com a Lei das Finanças Locais, constitui receita municipal o produto da cobrança de taxas (...) resultante da concessão de licenças (...) [cfr. alínea c) do art. 10.º], as quais podem ser criadas nos termos definidos no já mencionado Regime Geral das Taxas (cfr. n.º 1 do art. 15.º);

7. O Código da Publicidade define publicidade e considera como tal “qualquer comunicação feita por entidades de natureza pública ou privada, no âmbito de uma actividade comercial, industrial, artesanal ou liberal, com o objectivo directo ou indirecto de: a) Promover, com vista à sua comercialização ou alienação, quaisquer bens ou serviços”, não restando dúvidas quanto á natureza publicitária da tala que a Impugnante sujeitou a licenciamento, como, aliás, a mesma admite reiteradamente;

8. A afixação de mensagens publicitárias de natureza comercial, na área de cada município, depende do licenciamento prévio da Câmara Municipal respetiva, nos termos do disposto no art. 1.º, da Lei n.º 97/98, de 17 de Agosto, diploma que regula a afixação de tais mensagens e que, para além de remeter o licenciamento da publicidade para competência municipal, atribui à mesma “a definição dos critérios de licenciamento aplicáveis na área do respectivo concelho” (cfr. n.º 2 do art. 1º);

9. Habilitado por tais normas e no exercício das aludidas competências, o Município de Lisboa aprovou o Regulamento de Publicidade, publicado por intermédio do Edital n.º 35/92, de 19 de Março, com a redacção dos Editais n.º 42/95, de 25 de Abril e 53/95, publicados respectivamente nos Boletins Municipais n.º 16331, de 12/03/1992, 61, de 25/04/1995, e 66, de 30/05/1995;

10. As taxas concretamente aplicáveis a cada licenciamento são as estabelecidas na Tabela de Taxas e Outras Receitas Municipais (TTORM) em vigor aquando do mesmo, nos termos do art. 16.º do referido Regulamento, a qual, no caso concreto e atenta a vigência da norma transitória prevista no n.º 5, do art. 43.º, do RGTPORML, se encontra limitada pelo valor estabelecido pela TTORM/2009, acrescido de 5%;

11. O aludido Regulamento de Publicidade estabelece que, para a afixação das referidas mensagens publicitárias, em locais públicos ou privados, é sempre necessário o licenciamento prévio respectivo, uma vez que, nos termos do n.º 1 do seu art. 2º, o mesmo é aplicável a qualquer forma de publicidade de natureza comercial e a todos os suportes de afixação ou inscrição de mensagens publicitárias;

12. Ademais, encontra-se sujeita a licenciamento prévio da Câmara Municipal a afixação ou inscrição de mensagens publicitárias em bens ou espaços afectos ao domínio público, ou dele visíveis, nos termos do n.º 1 do art. 3.º, do mesmo Regulamento;

13. Do Regulamento de Publicidade, em estrita obediência aos ditames que motivaram a atribuição do licenciamento da publicidade aos municípios, constam os limites, decorrentes da Lei n.º 97/98 e que o município de Lisboa estabeleceu para o exercício de tais actividades, nos arts. 4º a 6º do mencionado Regulamento, dos quais se destacam, a título de exemplo, os atinentes à protecção da estética ou ambiente dos lugares ou da paisagem (art. 4º), ou a protecção da segurança de pessoas e bens (art. 6º);

14. A necessidade de tal protecção, imprimida pelo legislador, tem origem no facto de a publicidade ter o seu impacto no domínio público, razão pela qual é exigido o licenciamento de tal actividade, que configura assim um obstáculo real a tal actividade e resultante da lei;

15. O licenciamento e sucessivas renovações removem o obstáculo jurídico a tal atividade e permitem à Recorrente a exibição de publicidade e, consequentemente, o uso privativo do domínio público municipal, em determinados termos, definidos naqueles;

16. No art. 4.º da LGT, sob a epígrafe “pressupostos dos tributos” estabelece-se que “as taxas assentam na prestação concreta de um serviço público, na utilização de um bem do domínio público ou na remoção de um obstáculo jurídico ao comportamento dos particulares”, sendo identificadas três tipos de situações que podem, alternativa e legitimamente, dar origem à liquidação e cobrança de taxas; o tributo ora em causa configura um deles, pois é liquidado e cobrado como contrapartida pela renovação de licença/remoção de um obstáculo jurídico ao comportamento dos particulares;

17. A tese que a Recorre te advoga é que, a proceder, redundaria na inconstitucionalidade, por via da clara violação dos poderes tributários e regulamentares, atribuídos pelos arts. 238.º, n.º 4 e 241.º da Constituição da República Portuguesa aos municípios, bem como da respectiva autonomia financeira, igualmente consagrada na Lei Fundamental, o que desde já se argui;

18. A liquidação da taxa impugnada é perfeitamente válida e eficaz, actuando a CML no exercício de competências que lhe são constitucional e legalmente atribuídas, em consonância com o conceito de taxa adoptado pelo legislador ordinário e de harmonia com regulamentos municipais aprovados na sequência de lei habilitante;

19. A interpretação que se pugna tem acolhimento unânime na Jurisprudência dos Tribunais Superiores, de que é exemplo o Acórdão n.º 177/2010 do Tribunal Constitucional, que a ditou e que vem sendo acompanhado pelos restantes Tribunais, Superiores e de primeira instância, à semelhança do que aconteceu, e bem, na douta Decisão objecto do presente Recurso (vd., ademais, os doutos Acórdãos do STA de 08/06/2011 – Proc. n.º 300/11 – de 05/02/2015 – Proc. n.º 333/14 – ou de 19/06/2016, proferido no Processo n.º 1393/13);

20. Não reveste a natureza de imposto a quantia cuja cobrança coerciva a Recorrente questiona nos autos, uma vez que a mesma constitui contrapartida da renovação da licença de publicidade (v.g., remoção de obstáculo jurídico à actuação do particular) e consequente fruição do espaço público que, por via dela, é facultada à Recorrente;

21. A liquidação cuja legalidade a Recorrente pretende questionar nos autos foi praticada de acordo com lei habilitante expressa, no pleno uso das competências atribuídas por lei aos municípios e de acordo com a forma prevista na lei para o efeito, não padecendo de vício ou irregularidade, sendo plenamente válidos e exigíveis e improcedendo, pois, na sua totalidade os argumentos invocados pela Recorrente, devendo manter-se a douta Sentença objecto do presente;

22. Só a renovação do licenciamento (de exibição de publicidade) para o ano de 2011 habilitou a Recorrente a manter exibição de publicidade, naquele período, usufruindo, assim, em pleno, da contrapartida/sinalagma exigido pelo conceito de taxa e correspondente, reitera-se, à remoção do obstáculo jurídico que impedia aquela exibição, no referido período;

23. Sem prescindir quanto à invocada inadmissibilidade, a liquidação impugnada respeita o princípio da equivalência, estando conforme com as disposições legais aplicáveis e inexistindo qualquer desproporção intolerável que possa questionar a sua proporcionalidade e que a Recorrente, aliás, nem sequer invoca.

1.1. Remetidos os autos a este tribunal, foi ordenada a abertura de vista ao Ministério Público.

O Ex.mo Sr. Procurador-Geral Adjunto lavrou douto parecer onde assinalou que a questão da violação do princípio da equivalência é questão “nova” e não deve, por isso, ser conhecida no presente recurso. No mais, concluiu que, «à luz da doutrina atualmente sustentada pelo Tribunal Constitucional, mesmo nos casos de “renovação automática” do licenciamento de afixação de publicidade, como é o caso dos autos, a relação tributária continua a caracterizar-se pela bilateralidade ou sinalagmaticidade própria da figura da taxa» e que, por conseguinte, o presente recurso não merece provimento.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.



2. Dos fundamentos de facto

O tribunal de primeira instância julgou provados os seguintes factos: «(...)

a) Foi liquidado pela Câmara Municipal de Lisboa, à ora impugnante A……. - Publicidade na Companhia B……… S.A., o montante de € 126.995,41 (cento e vinte e seis mil, novecentos e noventa e cinco euros e quarenta e um cêntimos), a título de taxas devidas, pela renovação, para o ano de 2011, do licenciamento da publicidade instalada em espaços publicitários pertencentes à Companhia de B………, colocados em meios de transporte colectivos da cidade de Lisboa, cuja data limite de pagamento voluntário se completava em 31/03/2011 - liquidação junta a fls. 28 e segs. dos autos, cujo conteúdo aqui se dá por reproduzida

b) O valor em causa foi liquidado a várias viaturas de transporte colectivo, de cuja concessão a impugnante é titular - melhor identificadas na relação junta de fls. 30 a fls. 36 dos autos, cujo conteúdo aqui se dá por reproduzido para todos os legais efeitos.

c) O montante global da liquidação, identificado em a), foi apurado de acordo com o disposto no artigo 16.º, n.º1 do Regulamento de Publicidade em vigor, constante do Edital n.º 35/92, com as alterações introduzidas pelos Editais n.ºs 42/95 e 53/95,em conjugação com o estabelecido no ponto n.º 4.1.9. da Tabela de Taxas e outras Receitas Municipais do ano de 2011, publicada no 3.º Suplemento ao Boletim Municipal n.º 883, de 20/01, anexo ao Regulamento Geral de Taxas, Preços e Outras Receitas Municipais, publicado no DR., II Série, n.º 84 de 30 de Abril de 2010 - análise e leitura da referida legislação, cuja cópia se encontra junta ao PA, apenso aos autos e informação prestada em sede da reclamação graciosa, junta de fls. 18 e segs. dos autos, cujo conteúdo aqui se dá por reproduzido.

d) Para o apuramento da liquidação id. em a) foi ainda relevante a norma transitória prevista no n.º5 do artigo 43.º do referido Regulamento, nos termos do qual o valor da taxa de publicidade durante o ano de 2011, é o valor da taxa devido ao abrigo da TTORM do ano de 2009, acrescida de 5% - Análise da referida legislação e informação prestada em sede de Reclamação Graciosa, junta de fls, 18 e segs. dos autos, cujo conteúdo aqui se dá por reproduzido.

e) Os veículos identificados em b), fazem parte do património da impugnante - facto admitido por acordo das partes.



3. Dos fundamentos de Direito

3.1. Vem o presente recurso interposto da douta sentença do Tribunal Tributário de Lisboa, na parte em que concluiu que os artigos 3.º e 16.º do Regulamento de Publicidade do Município de Lisboa [“RPML”] e o artigo 29.º, n.º 5, alínea a), da Tabela das Taxas e Outras Receitas do Município de Lisboa de 2009 [“TTORML”] não padeciam de inconstitucionalidade orgânica (ponto 5.2. daquele aresto) e na parte em que concluiu que as taxas cobradas para o ano de 2011, não violavam o conceito jurídico de taxa previsto na lei (seu ponto 5.3.).

Com o assim decidido não se conforma a Recorrente por entender que a sentença recorrida padece de erro de julgamento.

Erro na interpretação e aplicação do conceito constitucional de «taxa», por entender que dele deriva que o tributo respeitante à renovação automática do licenciamento de publicidade tem a natureza de um imposto e que, por conseguinte, os supra indicados dispositivos regulamentares padecem de inconstitucionalidade orgânica, à luz dos artigos 103.º, n.ºs 2 e 3 e 165.º, n.º 1, alínea i) da Constituição da República Portuguesa [alínea “a)” das alegações de recurso e conclusões “a)” a “p)”].

Erro na interpretação e aplicação do conceito jurídico de «taxa» previsto na lei (designadamente no artigo 4.º, n.º 2, da Lei Geral Tributária), por entender que é patente a inexistência de bilateralidade/sinalagmaticidade da um tributo que não toma por pressuposto qualquer atividade por parte da Câmara Municipal de Lisboa [alínea “b)” das alegações de recurso e conclusões “q)” a “s)”].

Erro na interpretação e aplicação do artigo 4.º, n.º 1, do Regime Geral das Taxas das Autarquias Locais [“RGTAL”], por entender que o tributo impugnado não visa a compensação de custos efetivamente provocados pelo sujeito passivo nem a remuneração do valor de uma prestação que lhe é dirigida, o que afronta o princípio da equivalência que aquele dispositivo legal consagra e que exprime o princípio constitucional da igualdade [alínea “c)” das alegações de recurso e conclusões “t)” a “y)”].

Nas contra-alegações, o Recorrido Município contrapôs que a questão colocada na alínea “c)” das alegações do recurso e nas conclusões “t)” a “y)” é questão nova, visto que o vício não foi invocado perante o tribunal recorrido. E que o recurso não serve para apreciar questões novas, mas para reapreciar uma decisão judicial.

No mesmo sentido se pronunciou o Ex.mo Sr. Procurador-Geral Adjunto no seu douto parecer, anotando que a questão da violação do princípio da equivalência previsto no artigo 4.º, n.º 1, do RGTAL não foi minimamente aflorada na sentença recorrida e que o recurso tem por finalidade a correção dos erros que lhe são imputados, relativos a questões que foram colocadas, com exceção das que são do conhecimento oficioso.

Cumpre decidir esta questão prévia, anotando-se que na delimitação do objeto do recurso é uma tarefa prévia que se impõe a qualquer tribunal de recurso e em todos os processos e sobre a qual, por isso, não se figura necessário ouvir previamente as partes.

Tem-se entendido que as questões de inconstitucionalidade são do conhecimento oficioso de qualquer tribunal e que os interessados podem invoca-la pela primeira vez em qualquer via de recurso ordinário que a decisão admita, não havendo que considerá-la uma questão nova se for suscitada pela primeira vez em alegações do recurso para o Supremo Tribunal Administrativo. Trata-se de um entendimento que a jurisprudência vem extraindo do artigo 204.º da Constituição da República Portuguesa (vd. por todos, o acórdão do Tribunal Constitucional n.º 637/99 e jurisprudência ali indicada).

Só que a questão suscitada da alínea “c)” das alegações de recurso e conclusões “t)” a “y)” (identificada sob a epígrafe «Da violação do princípio da equivalência») não é uma questão de inconstitucionalidade, mas de ilegalidade. O que aqui está em causa não é a desconformidade de qualquer norma com algum comando constitucional, mas a alegada desconformidade do ato impugnado com um comando infraconstitucional. No caso, o artigo 4.º, n.º 1, do RGTAL.

É certo que o princípio da equivalência tem sido considerado um princípio estruturante aplicável às taxas e contribuições e um corolário dos princípios constitucionais da igualdade e da proporcionalidade, quando aplicados a estes tributos. Poderia, então, defender-se que, ao convocar o artigo 4.º do RGTAL o Recorrente estaria, afinal, a apelar para estes princípios constitucionais.

Deve, porém, contrapor-se desde já que as disposições regulamentares em que se fundou o ato impugnado para a fixação do quantum do tributo não foram convocadas para impugnação e, por isso, o tribunal recorrido nunca foi chamado a aplica-las. Saliente-se que de parte alguma da petição inicial se extrai alguma questão relacionada com a quantificação do tributo.

Ora, o tribunal de recurso só teria que apreciar oficiosamente questões de inconstitucionalidade respeitantes a normas aplicadas na sentença recorrida, isto é, a normas que o tribunal recorrido tenha apreciado ou aplicado ao decidir da legalidade do ato impugnado.

De todo o exposto deriva que o Recorrido e o Ministério Público têm razão e que a questão identificada sob a epígrafe «Da violação do princípio da equivalência» é uma questão nova e que não pode ser aqui apreciada.

Razão porque se decide não tomar dela conhecimento.

3.2. A questão fundamental a decidir no presente recurso é a de saber o tributo cobrado pelo Município de Lisboa a coberto dos artigos 3.º e 16.º do RPML e 29.º, n.º 5, alínea a), da TTORML, respeitante à renovação do licenciamento de publicidade, deve ser qualificado como uma taxa ou como um imposto.

Decidiu o Tribunal Tributário de Lisboa, ora recorrido, que esse tributo tinha a natureza de taxa, valendo-se da fundamentação constante do acórdão do Tribunal Constitucional de 5 de maio de 2010, tirado em plenário, a que foi atribuído o n.º 177/2010, e bem assim da jurisprudência firmada em diversos acórdãos deste Supremo Tribunal, de que destaca o acórdão de 8 de junho de 2011, tirado no processo n.º 300/11, que transcreve parcialmente.

Não se conforma a Recorrente com o assim decidido, por entender que esta jurisprudência não se aplica ao caso.

E não se aplica ao caso – no entendimento da Recorrente – porque, ao contrário do que ali sucedia, não há aqui que pressupor alguma atividade de reavaliação das condições legais de licenciamento, porque a renovação das licenças concedidas é automática. Sendo, assim, patente que a taxa da renovação da licença em questão não tem subjacente uma contraprestação efetiva e individualizada da parte do Município. E que, por conseguinte, o tributo respetivo não tem natureza bilateral.

A título preliminar, deve observar-se que a Recorrente conclui que a renovação das licenças de publicidade concedidas pelo Município de Lisboa é automática, não porque isso derive da factualidade dada como assente, mas porque o regulamento de publicidade o prevê.

Ou seja, a Recorrente pretende que não existiu nenhuma atividade de reavaliação das condições de licenciamento da parte do Município porque o artigo 20.º do Regulamento de Publicidade estabelece que a licença de publicidade se remova automática e sucessivamente, salvo comunicação prévia do particular ou da edilidade em sentido contrário.

Sucede que do facto de o Regulamento de Publicidade prever que a licença de publicidade de renova automática e sucessivamente não deriva que não exista nenhuma atividade administrativa no período do licenciamento, designadamente a atividade administrativa de fiscalização do cumprimento dos deveres específicos a que se subordina a atividade publicitária.

Deriva apenas que a renovação da licença não depende de nenhum procedimento administrativo especificamente dirigido a autorizar a atividade publicitária para o período correspondente. Ou seja, nenhuma nova decisão de licenciamento.

Ora, como refere o acórdão do Tribunal Constitucional supra indicado, a emissão da licença de publicidade dá origem a uma relação jurídica entre a edilidade e o obrigado tributário distinta da que intercede com a generalidade dos obrigados tributários, no quadro da qual a entidade emitente assume a obrigação de suportar a atividade licenciada e de simultaneamente se assegurar que a fruição do espaço público se contem nos seus limites legais, isto é, dentro dos critérios legais que abrangem não apenas o ato de licenciamento da publicidade, mas também o exercício da atividade licenciada – cfr. o artigo 4.º da lei n.º 97/88, de 17 de agosto. Esta relação jurídica, de natureza bilateral, permanece enquanto durar o licenciamento e atravessa os sucessivos períodos de renovação da licença.

Subjacente a este entendimento está – naturalmente - a ideia de que o pressuposto constitucional das taxas de licença não se esgota no ato de licenciamento, isto é, na atividade administrativa dirigida especificamente à decisão de licenciar, abrangendo também a relação duradoura que se estabelece entre a edilidade e o requerente e que é desencadeada por essa decisão. E que a prestação de um serviço público pressuposta no conceito constitucional da taxa pode ser presumida a partir de um dever legal específico e permanente de fiscalização da atividade licenciada. Como de resto, o Tribunal Constitucional admitiu expressamente, ainda que a propósito de outro tributo (cfr. o acórdão de 1 de abril de 2014, também tirado em plenário – n.º 316/2014).

E, embora possa ser discutível este entendimento, designadamente por erodir o sinalagma inerente ao conceito de taxa que só a atividade administrativa efetivamente prestada e dirigida ao sujeito passivo permite focalizar, a verdade é que a última palavra na definição e interpretação dos conceitos constitucionais pertence aquele Tribunal, devendo este Supremo Tribunal conformar as suas decisões com as respetivas orientações jurisprudenciais, quando esteja em causa a aplicação de preceitos e de princípios constitucionais.

Mas não é só por aqui que não pode dar-se razão à Recorrente: é que decorre também daquela jurisprudência do Tribunal Constitucional e do acórdão n.º 177/2010 em particular «que a mera inação administrativa em face de uma atividade que interfere no gozo de determinados bens públicos – como o ambiente, o urbanismo, o ordenamento do território ou a gestão do tráfego – possa consubstanciar uma contrapartida da respetiva tributação, satisfazendo o requisito, essencial ao conceito de taxa, de bilateralidade ou comutatividade» (citação extraída do acórdão do mesmo Tribunal de 20 de março de 2019 – n.º 181/2019 – ponto 7.º).

Ou seja, ao contrário do que pretende a Recorrente, não decorre do mero facto de o Município não realizar atividade alguma no ato de renovação das licenças que não exista o pressuposto de facto das taxas. Porque o pressuposto de facto das taxas devidas pela remoção de um obstáculo jurídico não é – na linha do ali decidido – constituído especificamente pela atividade administrativa dirigida a essa remoção. E a prestação concreta e individualizada de que é beneficiário o sujeito passivo não é o ato administrativo correspondente, mas a prestação de “deixar fazer”, a concessão na interferência do gozo do bem público correspondente.

Como se resume no acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo de 8 de junho de 2011 (no processo n.º 300/11, num segmento não transcrito na sentença recorrida, mas que vem ao caso) «o anunciante ganha título para uma activa e particular fruição, em termos comunicacionais, do espaço ambiental, necessária à realização da utilidade individual procurada, a qual não se confunde com o gozo passivo desse espaço, ao alcance da generalidade dos cidadãos (…). Em exclusivo proveito próprio, um sujeito privado – o anunciante – introduz, através da atividade publicitária, mudanças qualitativas na perceção e no gozo do espaço público por parte de todos os que nele se movem, “moldando-o”, em função do seu interesse. A constituição da obrigação passiva de se conformar com essa influência modeladora é justamente a contrapartida específica que dá causa ao pagamento da taxa, estruturando, em termos bilaterais, a relação estabelecida com o obrigado tributário».

Decorre do exposto que, ao contrário do que pretende a Recorrente, o Tribunal recorrido não interpretou erradamente a jurisprudência dos tribunais superiores, nem a aplicou erradamente ao caso. Inversamente, o sentido do ali decidido pode e deve ser convocado para a decisão os autos, por corresponder ao entendimento firmado e reiterado na jurisprudência mais recente e ser transponível para o caso.

Entendimento que deve ser aqui reafirmado, tendo em vista uma resposta uniformizada à questão subjacente e tendo em conta que a douta argumentação produzida pela Recorrente não justifica a sua revisão.

Pelo que o recurso não merece provimento por aqui.

3.3. A última questão a decidir nos autos consiste em saber se o tribunal de primeira instância incorreu em erro de julgamento ao concluir que não foi violado o conceito jurídico de taxa previsto na lei, por falta de bilateralidade [alínea “b)” das alegações de recurso e conclusões “q)” a “s)”].

A primeira observação a fazer a este propósito é a seguinte: esta questão só tem autonomia em relação à apreciada no ponto anterior no pressuposto de que esteja aqui em causa apenas o conceito infraconstitucional de taxa. Isto é, de que está em discussão apenas saber se pode haver uma taxa devida pela remoção de um obstáculo jurídico que não tenha por pressuposto uma prestação administrativa dirigida especificamente ao licenciamento da atividade relativamente proibida.

Assim, na parte do doutamente alegado que aqui recupera as considerações relativas à interpretação e aplicação inconstitucionais do RPML e do artigo 4.º, n.º 2, da Lei Geral Tributária, o Supremo Tribunal Administrativo não tem nada a acrescentar ao que foi referido no ponto anterior e limita-se, assim, a remeter para o sobredito.

A questão que aqui importa analisar cinge-se, por isso, a saber se as taxas devidas pelas designadas prestações de «deixar fazer» cabem no conceito infraconstitucional das taxas de licença ou, não cabendo, podem, ainda assim, ser consideradas legais.

Dizendo de outro modo: saber se o regulamento municipal, na parte respetiva, se conforma com a lei ordinária e com o artigo 4.º, n.º 2, da Lei Geral Tributária em particular.

Também aqui há uma observação preliminar a fazer: os pressupostos dos tributos lançados pelas autarquias locais não são estabelecidos pelo artigo 4.º, n.º 2, da Lei Geral Tributária.

Isto sucede porque a própria Lei Geral Tributária ressalva da sua aplicação o regime geral das taxas que conste de lei especial – n.º 3 do artigo 3.º daquela Lei. E no caso existe lei especial, o RGTAL. Às relações jurídicas tributárias geradoras da obrigação de pagamento de taxas às autarquias locais, a Lei Geral Tributária aplica-se apenas supletivamente, por força do disposto na alínea b) do artigo 2.º do RGTAL.

Ora, embora o artigo 3.º do RGTAL recupere para as taxas das autarquias locais os mesmos pressupostos que a Lei Geral Tributária prevê, este dispositivo não pode deixar de ser conjugado com o seu artigo 6.º. Do qual deriva que as taxas embora tenham como pressuposto certas prestações públicas das autarquias locais, incidem sobre utilidades de que os munícipes ou outros sejam causadores ou beneficiários.

Esta diferenciação entre pressuposto e incidência autoriza a que se considere que as taxas municipais não incidem necessariamente sobre o ato que consubstancia a remoção de um obstáculo jurídico ao comportamento de particulares (o ato de licenciar a atividade relativamente proibida), embora tomem como pressuposto que esse serviço, essa utilização ou a licença existam.

Ou seja, que o pressuposto das taxas locais previsto no artigo 3.º não é causa da tributação, mas condição da tributação; algo que a tributação municipal pressupõe, mas que não é determinado por ela.

E sucede também que o artigo 6.º, n.º 2, do RGTAL permite que as taxas municipais incidam sobre a realização de atividades dos particulares geradoras de impacto ambiental negativo. Ou seja, que tenham por objeto a utilidade obtida com a especial utilização ou a especial utilidade na utilização de bens públicos imateriais que careçam de proteção por essa especial utilização ser, em si mesma, geradora de riscos (reais ou potenciais) ou de incómodos públicos.

E isso significa, na prática, que – do ponto de vista do legislador ordinário – deve ser essa utilização dos denominados bens públicos imateriais (e não o ato de licenciamento) o elemento central que releva para o estabelecimento da relação comutativa entre o Município e o utilizador e, por conseguinte, para a qualificação destes tributos como taxas.

Do exposto deriva que a Recorrente não tem razão quando reconduz o elemento material da incidência das taxas de publicidade, aquando da renovação da licença respetiva, a uma atividade de reavaliação da verificação dos pressupostos que determinaram o seu licenciamento. Pelo menos, não é isso que resulta da lei infraconstitucional aplicável.

É claro que esta interpretação coloca novos problemas e desafios, quer no plano do controlo da legitimidade da proibição relativa (que deve passar pela definição de uma política pública de proteção dos bens ou interesses protegidos, no plano municipal), quer na determinação do valor da prestação pública a relevar para a determinação do valor da taxa. Mas estas são questões que não vêm colocadas ou não foram oportunamente colocadas perante o tribunal recorrido (cfr. ponto 3.1. supra) e que, por isso, não podem ser agora apreciadas.

Pelo que o recurso não merece provimento.



4. Conclusões


4.1. A questão de saber se a renovação da taxa de publicidade cobrada por um município viola o princípio da equivalência consagrado no artigo 4.º do RGTAL não é do conhecimento oficioso e, não tendo sido invocada junto do tribunal recorrido, não pode ser conhecida em via de recurso;


4.2. Do facto de o regulamento de publicidade municipal prever que o licenciamento da publicidade se renova automaticamente não deriva que o tributo cobrado aquando da renovação não tenha caráter bilateral, sinalagmático ou comutativo nem resulta, por conseguinte, que o tributo respetivo tenha a natureza de um imposto;


4.3. Do artigo 6.º do RGTAL deriva que o elemento material da incidência das taxas de publicidade, aquando da renovação da licença respetiva, não se reconduz a uma atividade de reavaliação da verificação dos pressupostos que determinaram o seu licenciamento.



5. Decisão

Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam os juízes da Secção Tributária deste Tribunal em negar provimento ao recurso.

Custas pela Recorrente.

D.n.

Lisboa, 14 de Outubro de 2020. – Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos (relator) – Gustavo André Simões Lopes Courinha – Anabela Ferreira Alves e Russo.