Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0604/18
Data do Acordão:07/12/2018
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ANTÓNIO PIMPÃO
Descritores:CITAÇÃO
NULIDADE
Sumário:Citado o executado em momento subsequente à penhora em termos que lhe permitiram apresentar reclamação no processo executivo, optar por pagar a quantia exequenda ou deduzir oposição à execução, não se verifica no processo executivo a nulidade insanável por falta de citação do executado a que se refere o art.º 165.º do CPPT.
Nº Convencional:JSTA00070788
Nº do Documento:SA2201807120604
Data de Entrada:06/18/2018
Recorrente:A...
Recorrido 1:AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:RECURSO JURISDICIONAL
Objecto:SENTENÇA DO TRIBUNAL TRIBUTÁRIO DE LISBOA
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:EXECUÇÃO FISCAL
Área Temática 2:NULIDADE DA CITAÇÃO
Legislação Nacional:ARTIGOS 165º, N.º 1, AL. A), 190º, N.º 6, 191º, N.º 1 E 193º, N.º 1 DO CPPT
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
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1.1. A……….., representado B……….., reclamou, no Tribunal Tributário de Lisboa, da falta de citação no âmbito do processo de execução fiscal n.º 3255201620000367, a correr termos pelo Serviço de Finanças de Lisboa 10.
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1.2. Aquele Tribunal, por despacho 06/04/2018, fls. 158/175, indeferiu liminarmente a reclamação.
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1.3. Inconformada recorreu para este Supremo Tribunal concluindo as suas alegações com o seguinte quadro conclusivo:
«I. Vem o presente recurso interposto parcialmente da sentença proferida pelo Tribunal a quo em que se julgou a reclamação do recorrente indeferida liminarmente por manifesta improcedência dos fundamentos de invalidade das duas citações do recorrente/representante fiscal nela realizadas.
II. Refere o Tribunal a quo, não obstante reconhecer as deficiências da citação feita pela recorrida, que o art. 191º nº4 manda que a invalidade só opere seus efeitos quando a citação possa prejudicar a defesa.
III. Para depois concluir que a citação do Reclamante/Recorrente feita ante-penhora, em vez do seu representante fiscal, com ou sem a utilização do endereço eletrónico, não cobra neste âmbito os foros de invalidade.
IV. A propósito da segunda citação efetuada, refere não acompanhar o Recorrente nas suas conclusões acerca desta citação, na medida em que o concreto teor do contrato de representação fiscal que celebrou com a sociedade de advogados em causa, não vincula senão as respetivas partes.
V. Referindo que, justamente, pelas mesmas razões em que fundamentou a crítica à citação ante-penhora, em razão do que seja e para o que sirva a representação fiscal oportuna e devidamente comunicada à Administração Tributária, nada conseguiu antever na citação de ilegal — além da irregularidade antes referida —, sendo, portanto, eficiente e eficaz nos termos em que foi feita.
VI. Nos termos do disposto no artº 19º, 6 da Lei Geral Tributária, os sujeitos passivos residentes no estrangeiro devem, para efeitos tributários, designar um representante fiscal com residência no território nacional
VII. Nos termos do artº 19º, 7 da LGT, com a redação que lhe foi dada pela Lei nº 82-E/2014, de 31 de dezembro, o exercício dos direitos dos sujeitos passivos perante a administração tributária, incluindo neles os de reclamação, recurso ou impugnação, dependem da nomeação prévia de um representante fiscal.
VIII. Dúvidas não pode haver acerca da obrigatoriedade de citação na pessoa do representante fiscal e de notificação ao representante fiscal de todos os factos que tivessem que ser notificados a representado.
IX. A falta de citação importa a nulidade de todo o processado posterior
X. O mesmo efeito não podem deixar de ter as notificações postais feitas em nome do representado, mesmo que no endereço do representante fiscal.
XI. A notificação da penhora foi feita no dia 27 de junho por correio enviado ao contribuinte, quando é certo que deveria ter sido enviada à representante fiscal e, como tal, tal notificação é nula.
XII. Pelo que, terá de ser considerado nulo todo o processado por falta de citação, sendo igualmente nula a notificação penhora, porque não foi feita na pessoa do representante fiscal.
XIII. De acordo com o artº 165º do CPPT, são nulidades insanáveis em processo de execução fiscal, a falta de citação, quando possa prejudicar a defesa do interessado.
XIV. A falta de citação prejudica a defesa do interessado e não deve ser relevada apenas porque o Recorrente apresenta uma defesa, qualquer que seja a mesma.
XV. Pelo exposto, é nulo todo o processado porque nem o contribuinte nem a representante fiscal foram citados, o que constitui nulidade insanável nos termos do citado art. 165.º do CPPT e não uma mera irregularidade como entendeu o Tribunal a quo.
Nestes termos e nos melhores de Direito, deve a presente apelação ser considerada procedente, por provada, devendo a sentença ora recorrida ser revogada, nos termos preditos, assim se fazendo a costumada, JUSTIÇA.».
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1.4. Não foram apresentadas contra-alegações.
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1.5. O Ministério Público emitiu a seguinte pronúncia:
«1. Inconformado, veio o Reclamante A…………. interpor recurso jurisdicional do despacho de indeferimento liminar, proferido em 06/04/2018, pelo M.mo Juiz de Direito do Tribunal Tributário de Lisboa, que – para além do mais, que ora irreleva – julgou manifestamente improcedentes os fundamentos de invalidade das duas citações do Reclamante/representante fiscal, realizadas no âmbito do processo de execução fiscal n.º 3255201620000367, a correr termos pelo Serviço de Finanças de Lisboa 10 (assim, cfr. o despacho recorrido, constante de fls. 158 a 175 e, ainda, as alegações, ínsitas de fls. 177 a 184 do processo em suporte físico, abreviadamente, p. f.)
Examinadas a motivação do recurso e, outrossim, as respetivas conclusões, constata-se que o Recorrente veio circunscrever, expressamente, o seu objeto ao já aludido segmento decisório, vindo imputar-lhe erros de julgamento, no que concerne à interpretação e aplicação do direito, com o que, supostamente, se mostraria violado o disposto nos artigos 19.º n.os 6 e 7, da Lei Geral Tributária (LGT), na redação que lhe foi conferida pela Lei n.º 82-E/2014, de 31 de dezembro e 165.º, este último do CPPT (vide as conclusões, juntas de fls. 182 verso in fine a 184 do p. f.)
Cumpre ao Ministério Público emitir parecer sobre o mérito da pretensão recursiva do Reclamante/Recorrente, o que fará, de seguida.
2. Das conclusões alegatórias, emerge que a questão fulcral que se discute, no âmbito do presente recurso jurisdicional, prende-se com a validade ou, ao invés, a nulidade da citação do Recorrente e da notificação da penhora, por não terem sido efetuadas na pessoa da sua representante fiscal, ao abrigo dos n.os 6 e 7 do já referido artigo 19.º da LGT.
O Recorrente veio insurgir-se contra a asserção, extraída pelo julgador do Tribunal Tributário a quo, no despacho recorrido, de que os atos de citação e de notificação reclamados padecem de meras irregularidades, porquanto o Executado/Recorrente não teria sido prejudicado no seu direito de defesa.
Sucede que, na esteira da decisão recorrida, o Ministério Público não divisa que, quer a citação efetuada anteriormente à penhora, quer a realizada na sua sequência — com a omissão da menção à pessoa da representante do Executado, no envelope postal endereçado para a morada fiscal dessa representante, designada nos termos do n.º 6 do artigo 19.º da LGT – tivessem comportado qualquer prejuízo para a posição processual do Reclamante.
Na verdade, não assume relevância anulatória o facto de a primeira citação ter sido efetuada na pessoa do próprio Executado, residente no Brasil, por recurso ao sistema eletrónico de notificações ViaCTT porquanto, efetivamente, não lhe cerceou o exercício de quaisquer direitos, de harmonia com o que resulta das disposições conjugadas dos artigos 203.º, n.º 1, proémio e alínea a) e 193.º, n.º 1 e 2, ambos do CPPT.
Acresce que a segunda citação e a coeva notificação da penhora, embora endereçadas ao próprio Executado, sem a expressa indicação da identidade da sua representante fiscal, foram realizadas no domicílio fiscal desta última, uma Sociedade de Advogados.
Assim sendo, em concreto, inexistiu qualquer prejuízo para a defesa do Recorrente, se, como ocorreu in casu, a correspondência foi recebida e a Sociedade de Advogados pôde, de facto, aceder ao conteúdo desses atos e, daí, assumir em pleno os seus poderes de representação.
Com efeito, nos termos das disposições conjugadas do n.º 6 do artigo 190.º e da alínea a) do n.º 1 do artigo 165.º, ambos do CPPT, só ocorre falta de citação, fulminada com a nulidade, quando o respetivo destinatário alegue e demonstre que não chegou a ter conhecimento do ato por motivo que lhe não foi imputável.
Em adição, da mencionada alínea a), emerge que a nulidade derivada da falta de citação só se verifica se, e quando, possa prejudicar a defesa do interessado.
Ora, no caso dos autos, nem o Reclamante alegou que só por esse facto não lançou mão aos meios processuais ao seu dispor, nem, do mesmo modo, se provou que essa omissão tivesse causado qualquer prejuízo na sua esfera jurídica.
Destarte, com essa omissão no ato de citação, arguido de nulidade, não ficaram minimamente coartados, ou sequer beliscados, os legítimos direitos da Recorrente a uma eficaz e cabal defesa.
Assim, como se refere no acórdão deste Colendo STA, tirado em 10/04/2002, no Recurso n.º 026503, à face do n.º 4 do artigo 198.º do anterior CPC, correspondente ao artigo 191.º do CPC de 2013, “(...) para existir nulidade não é exigível ao citado que alegue e prove a existência de um concreto prejuízo para a sua defesa, bastando que se apure que, no caso, não é de afastar a possibilidade de ter ocorrido tal prejuízo.
No entanto, em face das razões de economia e de aproveitamento dos atos processuais que estão subjacentes ao regime de relevância de irregularidades de citação previsto naquele n.º 4 do art. 198.º do C.P.C., o que relevará não será uma mera possibilidade abstrata de prejuízo, a apreciar em face do tipo de falta praticada na efetivação da citação, mas sim a possibilidade de a falta ter prejudicado o citado no exercício dos seus direitos processuais. (…)” (Disponível in www.dgsi.pt tal como os demais a citar, de futuro.)
E, no mesmo sentido trilharam os doutos Acórdãos deste Colendo STA, maxime, de 19/07/2016, no Processo n.º 0808/16 (Aí se firmou que “Só a «falta de citação» e não também a «nulidade de citação» é enquadrável na al a) do n.º 1 do art. / 165.º do CPPT e só aquela (falta de citação) pode constituir nulidade insanável do processo de execução fiscal”.), de 12/09/2012, no Processo n.º 0884/12 (Impressivamente, nos termos do citado douto aresto, “O que releva para efeito de saber se deve ser atendida a arguição de nulidade é a possibilidade de prejuízo para a defesa do executado e não a existência de um prejuízo efetivo, pelo que uma vez apurada essa possibilidade de prejuízo passa a competir à exequente demonstrar factos que permitam concluir que o prejuízo acabou por não ocorrer”.) e de 05/07/2017, no Processo n.º 0721/15 (Do respetivo sumário, emerge que “A não observância das formalidades prescritas no antigo 190 do CPPT na citação, constitui nulidade insanável em processo de execução fiscal quando possa prejudicar a defesa do interessado (aI. b) do n.º 1 do art. 165.º do CPPT), a qual pode ser arguida em qualquer estado do processo, enquanto não deva considerar-se sanada e conhecida oficiosamente (cfr. n.º 4 do art. 165.º do CPPT, bem como n° 1 e 2 do art. 198º do CPC).” (o realce é nosso).).
De resto, em prol deste tratamento como mera irregularidade, chamamos à colação o douto aresto deste Colendo STA, de 18/01/2017, no âmbito do Processo n.º 01295/16, onde se enfatizou que “não tendo embora a reclamada sido citada para o processo executivo, como devia, no momento subsequente à instauração do processo executivo, foi citada para esse processo, em momento tardio embora, no ato subsequente à penhora em termos que lhe permitiram apresentar reclamação no processo executivo o que é indício de, então estar em condições de decidir, também, se deveria pagar o montante exequendo ou deduzir oposição à execução. Não se verifica, pois, no processo executivo a nulidade insanável por falta de citação do executado a que se refere o art.º 165.º do Código de Processo e Procedimento Tributário por estar indemonstrado que a deficiente citação, pelo menos em termos da sua inserção temporal, haja prejudicado a defesa da interessada, constatando apenas uma irregularidade processual que apesar da sua ocorrência, cumpriu os desígnios fundamentais da citação permitindo ao contribuinte conhecer a amplitude do processo executivo e contra ele lançar dos meios de defesa que considerou melhor assegurarem os seus direitos”.
A ser assim, como de facto é, o Ministério Público propende no sentido de que o despacho de indeferimento liminar em crise não merece censura, por banda deste Colendo Supremo Tribunal Administrativo ad quem.
3. Nos termos e com os fundamentos acima sucintamente explanados, o Ministério Público emite o parecer de que deverá ser negado total provimento ao presente recurso jurisdicional, mantendo-se, pois inteiramente, o despacho de indeferimento liminar recorrido.»
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1.6. Sem vistos, dada a natureza urgente do processo, cumpre decidir.
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2. O despacho recorrido, fls. 151 e ss, tem o seguinte teor:
«II
Na informação lavrada pelo Órgão de Execução Fiscal ao abrigo do disposto no art.277º nº 2, a contrario, do Código de Procedimento e de Processo Tributário, de fls. 110-111, de realmente (ou só eventualmente) relevante refere-se, em suma, que:
. o Reclamante aderiu em 17 de janeiro de 2012 ao sistema de notificações eletrónicas, designado por ViaCTT;
. em 5 de junho de 2012 o Reclamante nomeou a sua representação fiscal em Portugal;
. este processo foi instaurado em 24 de março de 2015;
. em 22 de outubro de 2015 o Reclamante alterou o seu domicílio fiscal [para a Rua ………., em Lisboa], passando a ser diverso do da sua representação fiscal [Rua ……….., em Lisboa], como até aí e – se bem se alcança perceber – desde 12 de junho de 2014 (com a alteração introduzida através da emissão/renovação do Cartão de Cidadão do Reclamante);
. a “primeira citação” do Reclamante, «é evidente» [sic] foi entregue na sua caixa postal eletrónica em 30 de março de 2015, considerando-se citado a 24 de abril de 2015;
. a citação do Reclamante após penhora foi rececionada na morada do seu representante em 28 de julho de 2016;
. no dia 20 de dezembro de 2016 o Reclamante procedeu ao pagamento integral voluntário, após aplicação da penhora em causa, no valor remanescente de €26.557,09, ao abrigo do regime especial instituído pelo Decreto-Lei 67/2016 de 30 de novembro, o designado PERES;
. o processo identifica o endereço situado na Rua ………., em Lisboa, não como morada do Reclamante, mas sim como seu domicílio fiscal e do seu representante fiscal em Portugal;
. a lei não obriga à citação prévia à penhora (que neste caso teve lugar), mas sim à posterior a penhora;
. a arguição da nulidade da citação não é matéria de Reclamação;
. nada impedia fosse pedida certidão dos fundamentos de facto e de direito da liquidação.
O Órgão de Execução Fiscal manteve «o ato reclamado», sob a delimitação feita na informação, acabada de sumariar, entendido como sendo apenas a penhora, por despacho de 9 de fevereiro último.
III
Em razão do que acima se escreveu a bold, houve-se por bem notificar o Reclamante para dizer se mantinha a Reclamação.
Aproveitou o Reclamante o ensejo para fazer como que uma reiterada alegação, idêntica à da sua petição, mais rejeitando, desta feita portanto em face do teor da informação em que assenta a decisão de manutenção dos autos do Órgão de Execução Fiscal —, que algum dia tivesse recebido uma qualquer citação eletrónica, reafirmando a final, em suma, a sua pretensão de que sejam conhecidas as invalidades assacadas aos atos.»
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3.1. Entendeu a sentença recorrida, no seu ponto IV, indeferir liminarmente aquilo que na petição transcende as questões em torno da citação e da penhora, por erro na forma que emerge desse maius — por isso insuscetível de convolação alguma, nos termos do art.98º n.ºs 1 e 4 do Código de Procedimento e de Processo Tributário —, tendo presente o disposto nos arts. 97º n.º 1 corpo e, designadamente, as alíneas a) e o), 99ºss., 203º-204º nº 1 corpo e, designadamente, alíneas c) e g) e 276ºss., a contrario citados, todos do Código de Procedimento e de Processo Tributário, esses fundamentos outros e correlativos pedidos, conquanto mais ou menos explícitos, tendo ainda presente o disposto nos arts. 200º n.º 2 e 590º nº 1 do Código de Processo Civil, sob remissão do art. 2º corpo e alínea e) do Código de Procedimento e de Processo Tributário e atento o seu citado art. 276º.
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3.2. Entendeu a mesma sentença, no ponto VI, indeferir liminarmente por manifesta improcedência dos fundamentos de invalidade da penhora levada a cabo, desde logo por sua superveniente extinção, por aplicação do produto com comportamento paralelo, concordante, do Reclamante.
Afirma, ainda, que sobre a penhora efetuada, quanto ao seu excesso, por confronto com a quantia exequenda apenas há a dizer duas coisas. Uma, a de que se o Reclamante a argui de excessiva, certo é que para extinção da execução, nomeadamente para o integral pagamento da quantia exequenda nestes autos necessário foi que o Reclamante entregasse ainda, a 20 de dezembro de 2016, a quantia de €26.557,09 — o que fez ao abrigo do regime especial instituído pelo Decreto-Lei 67/2016 de 30 de novembro, o designado PERES — para com o montante penhorado se perfazer uma quantia igual à dívida exequenda aqui (e acrescido e custas, supõe-se). Ora, se assim é, não se alcança qual seja o arguido excesso de penhora, pois que para a extinção da dívida, mesmo que com acrescido e custas, o Reclamante teve ainda de providenciar pelo pagamento de quase outro tanto.
Refere que como quer que seja, vista a penhora em causa da perspetiva isolada deste processo, em face do seu montante [€30.100,09] e perante o montante da quantia exequenda e acrescido [€30.245,81, à data da citação/notificação da penhora], forçoso é concluir que a penhora efetuada nestes autos, enquanto para eles levada a cabo, não foi além do legalmente consentido, designadamente pelo artigo 217º do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
Acrescenta que ao prevalecer-se da aplicação do produto da penhora reclamada (sem que como dito haja notícia de que tal ato tenha sido reclamado), com concordante pagamento, no mais, do que por aquele não era satisfeito, tal configura neste incidente reclamatório uma dissolução do objeto reclamado — a penhora. O que implica haver desde então uma impossibilidade superveniente desta instância reclamatória, nesta parte, já que não mais subsiste o ato que vinha posto em xeque, prejudicando do mesmo passo o conhecimento da questão que lhe estava associada, o que nos termos do art. 277º corpo e alínea e) do Código de Processo Civil, sob a citada remissão do disposto no art. 2º corpo e alínea e) do Código de Procedimento e de Processo Tributário, corresponde a uma causa de extinção superveniente da presente instância.
Concluiu que, sem necessidade de outras considerações, quanto à penhora, a Reclamação surge igualmente como manifestamente improcedente, nos termos do 590º nº 1 do Código de Processo Civil, sob a já invocada remissão para ele do art. 2º corpo e alínea e) do Código de Procedimento e de Processo Tributário, por impossibilidade superveniente por carência de objeto.
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3.3. A sentença recorrida indeferiu, ainda, no seu ponto V, liminarmente a reclamação ao abrigo do disposto no art.590º nº 1 do Código de Processo Civil, sob a já invocada remissão para ele do art. 2º corpo e alínea e) do Código de Procedimento e de Processo Tributário por manifesta improcedência dos fundamentos de invalidade das duas citações do reclamante e representante fiscal, realizadas na execução fiscal.
E apenas vem questionado, no presente recurso, este segmento decisório não se discutindo no presente recurso o decidido e referido nos anteriores pontos 3.1. e 3.2.
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3.4. A sentença recorrida equacionou como questões a decidir, na parte relevante para o presente recurso, as de saber se a primeira citação deveria ter sido feita como foi, ao executado, na pendência da representação fiscal, e se a segunda devia ter sido feita, como foi, sem qualquer menção à representação fiscal, como se de uma normal correspondência dirigida ao próprio Reclamante se tratasse.
E neste âmbito afirmou a sentença recorrida que decorre do disposto no art.19º n.ºs 1 e 2 da Lei Geral Tributária que o domicílio fiscal das pessoas singulares é o local da sua residência habitual, podendo integrar a caixa postal eletrónica, conforme definido pelo serviço público respetivo.
Que se residentes no estrangeiro, as pessoas singulares têm o dever de nomear um representante fiscal em Portugal, artigo 19º n.º 6, sob pena de não poderem exercer os seus direitos perante a Administração Tributária e, inclusive, os de atuarem processualmente, citado artigo 19º n.º 7.
Que, nos termos do artigo 19º n.º 7, o representante fiscal, uma vez designado tem poderes de atuação em nome do representado, contribuinte residente no estrangeiro.
Que, por isso, uma citação ante-penhora tem necessariamente de ser feita na pessoa do representante fiscal oportuna e devidamente designado e comunicado à Administração Tributária — sem prejuízo de, paralelamente, para o que serviria de mero aviso informativo, ser o próprio citado via eletrónica, como é dito ter sido feito.
Que à imposição legal de designação de representante corresponderá uma simétrica capacidade de atuação, em seu nome, pelo seu representante.
Que tendo presente tanto a natureza como a função do que seja a citação na execução fiscal, tal como descrita nos arts.189º n.º 1 e 190º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, como a função do representante fiscal, a atuação do visado, residente no estrangeiro, é nesse mesmo contexto necessariamente atuada por aquele, pelo que não faz sentido algum citar um quando será o outro que terá de atuar perante a citação.
Que necessário é que seja o representante a ser citado, em nome do representado.
Que no âmbito da execução fiscal aquela citação não é determinante dos prazos de intervenção/reação do executado, arts.203º n.º 1 corpo e alínea a) e 193º n.º 2, posto que a citação postal que aqui teve lugar não é uma citação pessoal, na expressão legal, art. 191º n.º 4, ex vi do seu nº 2, versus art. 192º nº 1, ambos também do Código de Procedimento e de Processo Tributário, quedando não só os atos executivos ablativos como os de satisfação da dívida no âmbito executivo sempre dependentes da citação pessoal a que se refere o art. 193º nº 2, ainda que a citação não pessoal não obste se proceda à penhora, como explicitamente decorre desse art. 193º nº 1.
Que a citação do reclamante ante-penhora, em vez do seu representante fiscal, com ou sem a utilização do endereço eletrónico, não cobra neste âmbito os foros de invalidade que, liminarmente apreciando, se intuiria dela decorreria, tendo como consequência a sua nulidade e a anulação do processado posterior dela dependente, porque não contende em rigor com a defesa, como no direito comum em que, ou há ou não há citação antes de penhora.
Que relativamente à citação pós-penhora que foi dirigida ao domicílio fiscal do representante fiscal embora seja incompreensível que não exista uma qualquer menção, na parte exterior do sobrescrito, à representação fiscal do Reclamante, em vez de nomear apenas o próprio Reclamante, certo é que tal correspondência, mesmo cerrada, evidenciava à saciedade tratar-se de uma citação sob registo e aviso, para uma execução fiscal.
Que o sentido da correspondência era, no contexto referido, inequívoco sobre a função e sentido do seu direcionamento àquele endereço [do representante], mesmo se, como dito, ele fosse também o do Reclamante.
Que sendo aquela correspondência expressamente referida como uma citação em que o Reclamante vem expressamente indicado como o citando, forçoso é ter de reconhecer que, para o representante fiscal, o sentido e a função de uma tal correspondência (para mais tratando-se de uma sociedade de advogados!...) mesmo cerrada, era unívoco e inequívoco.
Que por ser o representante fiscal o recetor de uma tal correspondência, no âmbito da sua representação cumpria-lhe desempenhar essas suas funções, por exemplo abri-la, ficar a par do seu conteúdo e, em articulação com o representado, se necessário ou como convencionado, providenciar pelos comportamentos entendidos apropriados e adequados, ou atuar de um qualquer outro modo, desde que compatível com as suas funções de representação fiscal, o que seria obviamente admissível, uma vez mais desde que se cumprisse a função básica de receção e representação legalmente exigida, a de comunicar a receção e eventualmente atuar depois, em correspondência com as instruções recebidas.
Que é esta citação eficiente e eficaz nos termos em que foi feita.
Que o conteúdo desta citação — que como vimos já é também a notificação de uma penhora —, além da descrição da penhora [de €30.100,09], em valores mobiliários à guarda do Novo Banco, S. A., [pertença do Reclamante, portanto] e respetiva data, 12 de julho de 2016, ela identifica o processo e a data da sua emissão, 23 de julho de 2016, e autoria (por chancela e indicação da categoria profissional), o Reclamante, a dívida exequenda, como sendo €28.033,13, proveniente de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares de 2013, embora também com a referência a imposto conta corrente [de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, portanto], e mais refere o documento de origem, da liquidação do tributo, e aquele da certidão de dívida na base da execução, bem como o termo do prazo de pagamento voluntário da dívida [implicitamente: terminado a 5 de março de 2015, porque no dia seguinte começaram a vencer-se os juros de mora], o seu montante até então [€ 1.639,1928] e, ainda, quais as custas da execução.
Que são aí comunicados os modos de pagamento possíveis, prazos para os requerer e modo e meios de reação à execução e à penhora, sempre com indicação das normas legais aplicáveis.
Que não se vê onde nem porquê tal ato compósito [porque simultaneamente uma citação e uma notificação da penhora, como já acima referido] se afaste do disposto, maxime, nos arts.190º n.os 1-6 e 163º nº 1 corpo e alíneas a) c), d) e e), como manda o art. 190º n.º1, ou que não observe o descrito no nº 2 deste último.
Que tal ato é o correto e não enferma de irregularidade ou ilegalidade alguma.
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3.5. Em síntese entendeu a sentença recorrida que a citação do reclamante anterior à penhora, no âmbito da execução fiscal, em face do valor desta, não é determinante dos prazos de intervenção ou reação do executado, pois que não é uma citação pessoal e não obsta a que se proceda à penhora nos termos do artigo 193º nº 1 do CPPT.
Entendeu também que esta citação do reclamante anterior à penhora, em vez do seu representante fiscal, com ou sem a utilização do endereço eletrónico, não é inválida e não tem como consequência a nulidade ou a anulação do processado posterior dela dependente, porque não contende em rigor com a defesa, como no direito comum.
Entendeu, ainda, a mesma sentença recorrida, no que se refere à citação posterior à penhora que foi dirigida ao domicílio fiscal do representante fiscal que é a mesma eficiente e eficaz nos termos em que foi feita pois que tal ato compósito, simultaneamente uma citação e uma notificação da penhora, é correto e não enferma de irregularidade ou ilegalidade alguma.
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3.6. Questiona o recorrente, no presente recurso, apenas a parte da sentença recorrida que indeferiu liminarmente a reclamação “por manifesta improcedência dos fundamentos de invalidade das duas citações do Reclamante/representante fiscal nela realizadas” imputando-lhe erros de julgamento, no que concerne à interpretação e aplicação do direito, com o que se mostrariam violados os artigos 19.º n.ºs 6 e 7, da Lei Geral Tributária (LGT) e 165.º do CPPT.
Segundo o recorrente a falta de citação importa a nulidade de todo o processado posterior e o mesmo efeito não podem deixar de ter as notificações postais feitas em nome do representado, mesmo que no endereço do representante fiscal.
Ainda segundo o recorrente a notificação da penhora por correio enviado ao contribuinte deveria ter sido enviada à representante fiscal pelo que tal notificação é nula devendo, por isso, considerar-se nulo todo o processado por falta de citação.
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3.7. Importa, por isso, determinar se as citações, tal como são referidas no probatório,
. a “primeira citação” do Reclamante, «é evidente» [sic] foi entregue na sua caixa postal eletrónica em 30 de março de 2015, considerando-se citado a 24 de abril de 2015;
. a citação do Reclamante após penhora foi rececionada na morada do seu representante em 28 de julho de 2016;
sofrem dos vícios que o recorrente lhes imputa.
A quantia exequenda a que se referem os presentes autos não excede 500 unidades de conta pelo que a citação efetua-se mediante via postal simples, nos termos do artigo 191º 1 do CPPT.
E como afirmou a sentença recorrida tal citação, anterior à penhora não é determinante dos prazos de intervenção ou reação do executado, pois que não é uma citação pessoal e não obsta a que se proceda à penhora nos termos do artigo 193º nº 1 do CPPT.
Concorda-se, por isso, ainda, com a mesma sentença recorrida quando afirma que esta citação do reclamante anterior à penhora, em vez do seu representante fiscal, com ou sem a utilização do endereço eletrónico, não é inválida e não tem como consequência a nulidade ou a anulação do processado posterior dela dependente, porque não contende em rigor com a sua defesa.

Acompanha-se também a sentença recorrida, no que se refere à citação posterior à penhora que foi dirigida ao domicílio fiscal do representante fiscal sendo a mesma eficiente e eficaz nos termos em que foi feita pois que tal ato “compósito”, simultaneamente uma citação e uma notificação da penhora, é correto e não enferma de irregularidade ou ilegalidade alguma.
Concorda-se também com o MP quando afirma que estas citações não comportam qualquer prejuízo para a posição processual do recorrente.
Com efeito a citação posterior à penhora ainda que dirigida ao executado, sem a indicação da identidade do representante fiscal, foram realizadas no domicílio fiscal do representante que é uma sociedade de advogados.
Daí que se possa concluir que não existiu, no caso dos autos, qualquer prejuízo para a defesa do executado pois que a correspondência foi recebida e o representante pôde aceder ao conteúdo dessa citação que passou a poder assumir os seus poderes de representação que lhe haviam sido conferidos.
Na verdade estabelecem os artigos 190.º nº 6 e 165.º 1 a), do CPPT que só ocorre falta de citação, geradora de nulidade, quando o destinatário alegue e demonstre que não chegou a ter conhecimento do ato por motivo que lhe não seja imputável.
Acresce que, nos termos da mesma alínea a), só é nulidade insanável, em processo de execução fiscal, a falta de citação, quando, possa prejudicar a defesa do interessado.
Conforme refere o MP no caso dos autos, nem o reclamante alegou que só por esse facto não lançou mão aos meios processuais ao seu dispor, nem, do mesmo modo, se provou que essa omissão tivesse causado qualquer prejuízo na sua esfera jurídica.
Acompanha-se, ainda, o MP quando afirma que, ainda que se esteja perante uma mera irregularidade, será de acompanhar o acórdão deste STA, de 18/01/2017, Processo n.º 01295/16, onde se afirmou o seguinte:
“… não tendo embora a reclamada sido citada para o processo executivo, como devia, no momento subsequente à instauração do processo executivo, foi citada para esse processo, em momento tardio embora, no ato subsequente à penhora em termos que lhe permitiram apresentar reclamação no processo executivo o que é indício de, então estar em condições de decidir, também, se deveria pagar o montante exequendo ou deduzir oposição à execução. Não se verifica, pois, no processo executivo a nulidade insanável por falta de citação do executado a que se refere o art.º 165.º do Código de Processo e Procedimento Tributário por estar indemonstrado que a deficiente citação, pelo menos em termos da sua inserção temporal, haja prejudicado a defesa da interessada, constatando apenas uma irregularidade processual que apesar da sua ocorrência, cumpriu os desígnios fundamentais da citação permitindo ao contribuinte conhecer a amplitude do processo executivo e contra ele lançar dos meios de defesa que considerou melhor assegurarem os seus direitos”.
Face ao exposto é de concluir que o despacho de indeferimento liminar em apreciação não merece censura pelo que deve negar-se provimento ao presente recurso jurisdicional sendo de manter o despacho de indeferimento liminar em apreciação.
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Citado o executado em momento subsequente à penhora em termos que lhe permitiram apresentar reclamação no processo executivo, optar por pagar a quantia exequenda ou deduzir oposição à execução, não se verifica no processo executivo a nulidade insanável por falta de citação do executado a que se refere o art.º 165.º do CPPT.
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4. Termos em que acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso e confirmar a decisão recorrida.
Custas pela recorrente.
Lisboa, 12 de julho de 2018. – António Pimpão (relator) – Francisco Rothes – Isabel Marques da Silva.