Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0642/14
Data do Acordão:11/12/2014
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CT
Relator:ASCENSÃO LOPES
Descritores:DERROGAÇÃO DO SIGILO BANCÁRIO
FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO
Sumário:I - As decisões da administração tributária de aceder a informações ou documentos bancários sem o consentimento do seu titular devem ser fundamentadas com expressa menção dos motivos concretos que as justificam - artigo 63.º-B, n.º 4, da Lei Geral Tributária.
II - Constitui motivo concreto de necessidade de acesso a informação e documentos bancários do contribuinte a variação de rendimentos constituídos por juros de depósitos que não possa ser justificada apenas com os rendimentos declarados no ano em causa.
III - A indicação pela Autoridade Tributária de uma taxa de juro “a título meramente exemplificativo” suportada em conhecimento comum e próxima da taxa de juro média praticada pelas Instituições Bancárias para a generalidade dos aforradores integra a fundamentação formal e substancial necessária e suficiente à prolação do despacho de derrogação do sigilo bancário.
Nº Convencional:JSTA00068984
Nº do Documento:SAP201411120642
Data de Entrada:06/05/2014
Recorrente:DIRGER DA AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A... E OUTRO
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC OPOS JULGADOS
Objecto:AC TCAN DE 2014/02/14 - AC TCAS PROC7264/13 DE 2014/11/30.
Decisão:PROVIDO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - PROC ESPECIAL.
Legislação Nacional:ETAF02 ART27 B.
CONST76 ART26 N1.
LGT98 ART63-B N1 B C N4 ART77 ART87 F ART89 A N3.
CPTA02 ART152.
CPA91 ART124.
CPC96 ART685-C N5.
CCIV66 ART487 N2.
L 13/02 DE 2002/02/19.
Jurisprudência Nacional:AC STAPLENO PROC01065/05 DE 2006/03/29.; AC STAPLENO PROC0452/07 DE 2007/09/26.; AC STAPLENO PROC0616/07 DE 2008/07/14.; AC STAPLENO PROC0617/08 DE 2009/05/06.; AC STAPLENO PROC019532 DE 1996/06/19.; AC STAPLENO PROC0276/05 DE 2005/05/18.; AC STA PROC01149/02 DE 2003/05/07.; AC STJ PROC87156 DE 1995/04/26.
Referência a Doutrina:JORGE DE SOUSA - CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E DE PROCESSO TRIBUTÁRIO ANOTADO E COMENTADO 5ED VOLII PÁG809 PÁG814.
LEITE DE CAMPOS, BENJAMIM RODRIGUES E JORGE DE SOUSA - LEI GERAL TRIBUTÁRIA ANOTADA E COMENTADA 4ED PÁG580.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, no Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1 – RELATÓRIO
O Director Geral da Administração Tributária e Aduaneira veio recorrer do Acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Norte (Secção de Contencioso Tributário) em 13 de Fevereiro de 2014, (cfr. fls. 192-102), por oposição com o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, proferido em 30 de janeiro de 2014 - Processo nº 7264/13.

Admitido o recurso por despacho do relator a fls. 225, foram apresentadas alegações tendentes a demonstrar a oposição entre os citados acórdãos (cfr. fls. 230 -233).
Por despacho de fls. 236 foi determinado o prosseguimento do recurso, tendo sido ordenado a notificação das partes para apresentarem alegações, nos termos do artigo 282.º nº3 do CPPT, aplicável por força do disposto no nº5 do artigo 284.º do CPPT.

O recorrente apresentou a fls. 244-249 alegação tendente a demonstrar alegada oposição de julgados, formulando as seguintes conclusões:
« a) Os dois Acórdãos em questão, o Acórdão recorrido, proferido, em 13/02/2014, nestes autos, e o Acórdão fundamento, proferido pelo TCA Sul, em 30/01/2014, no Proc° 7462/14, tendo por base situações fácticas idênticas e relativamente à mesma questão fundamental de direito, proferiram decisões opostas.
Com efeito,
b) O acórdão recorrido decidiu pela insuficiência da fundamentação do acto de derrogação do sigilo bancário, nos termos do n° 3 do artº. 63-B da LGT, que se sustentou numa taxa de juros estimada de 4% para apurar da existência injustificada de indícios de incrementos patrimoniais, para efeitos do nº 1, alínea f), do art. 87° da LGT.
c) Por seu turno, o acórdão fundamento, face a um acto de derrogação do sigilo bancário assente também na existência de indícios de incrementos patrimoniais, não justificada, ao abrigo dos mesmos preceitos legais, e por recurso, igualmente, a uma taxa estimada de juros de 4%, decidiu pela suficiência da fundamentação desse mesmo acto.
d) Os pressupostos da derrogação do sigilo bancário, ao abrigo daquele preceito legal, assentam em factos indiciários. No caso dos autos, a recorrente apresenta um aumento de mais de 90.000,00€ nos rendimentos de capitais, provenientes de juros de depósitos à ordem e a prazo, tendo a administração tributária, no apuramento de indícios de incrementos patrimoniais não justificados, aplicado uma taxa de juros estimada de 4%.
e) A taxa de juros de 4% aplicada, como consta fundamentadamente da decisão recorrida, é meramente uma estimativa, utilizada para apurar a existência de indícios da situação prevenida na alínea f) do n° 1 do art. 87° da LGT (cfr nº 1, alínea c) do art. 63-B da LGT).
f) Apenas na posse da respectiva informação bancária é que a administração tributária conhece a verdadeira situação tributária da recorrente.
g) Entre outros, refere-se o acórdão de 27/03/2014, proferido no Proc° 7462/14, do TCA Norte, o qual, sobre uma situação fáctica idêntica, a mesma questão de direito e até sobre uma fundamentação impugnatória semelhante, em que a recorrente é irmã da ora recorrida, decidiu que a decisão de derrogação do sigilo bancário pela verificação de indícios apurados por aplicação de uma taxa de juro estimada de 4%, nos termos da alínea c) do n° 1 do art. 63°-B da LGT, se revela objectiva, concreta e manifestamente suficiente.
h) A decisão proferida no acórdão recorrido fez, pois, errada interpretação e aplicação do dever de fundamentação do acto de derrogação do sigilo bancário, por aplicação de uma taxa de juro estimada de 4% no apuramento de indícios para efeitos do n.º 3 do art. 63°- 8 da LGT.
Nestes termos e nos mais de direito que Vossas Excelências doutamente suprirão, deve o presente recurso por oposição de julgados ser julgado procedente, proferindo-se Acórdão que decida no sentido preconizado no Acórdão fundamento.»
Contra alegaram os recorridos, A…………….. e B………………, concluindo da seguinte forma:
1. — Certo que existe oposição entre o Acórdão de 13.02.2014, proferido nos presentes autos, pelo TCA Norte, e o Acórdão, proferido em 30.01.2014, pelo TCA Sul, no processo n.º 7264/13.
2. — Pois, no acórdão recorrido (sic)- quereria dizer acórdão fundamento - (Proc. n.º 7264/13), foi decidido que o ato que derroga o sigilo bancário fundamentado na existência de indícios de acréscimos de património, não justificados, apurados por aplicação de uma taxa de juro anual estimada de 4%, estava, por via da aplicação deste raciocínio hipotético, por devidamente fundamentado.
3. — Quando no acórdão fundamento,(sic) - quereria dizer acórdão recorrido - proferido nos presentes autos, tal ato não estava devidamente fundamentado.
4. — Pois, existe falta de fundamentação da taxa de juro de 4% e no tempo das aplicações, pois a Autoridade Tributária jamais demonstrou no procedimento, onde se estribou, para decidir efetuar as suas contas com base na mesma, para assim com base nos rendimentos, presumir, o montante das aplicações financeiras, Art.º 77° da LGT.
5. — Existe vício de violação da lei, pois não existem indícios concretos da falta de veracidade do declarado na modelo 3 de IRS, do ano de 2011, Art.º 63°-B, n.º 1, alínea b), da LGT, pois as taxas de juros oscilaram muito, nos exercícios económicos de 2010 e 2011, cf. factos provados em E) da sentença recorrida, e que só por si isoladamente demonstram o contrário do decidido e depois com a variável do tempo, mais contrariam o sentenciado.
6. — Depois, não existem indícios de acréscimos de património não justificados, nos termos da alínea f), do Art.º 87° da LGT, o que conduz ao vício de violação da lei à alínea c), do n.º 1, do Art.º 63°-B, da LGT, pelo que na sentença, nem na decisão recorrida resultam explicitados os factos (nem os autos os comprovam, ver facto provado em E), integradores das normas previstas nas alíneas b) e c), do nº1, do art.º 63.º - B da LGT.
O EMMP pronunciou-se emitindo o seguinte parecer:
1. A existência de oposição de acórdãos depende de contradição quanto a idêntica questão fundamental de direito, no quadro de idêntica regulamentação jurídica aplicável e de idênticas situações de facto, e da decisão proferida não estar de acordo com a jurisprudência mais recentemente consolidada - arts. 284.º do C.P.P.T., 27.°, n.°1, al. b) do E.T.A.F. vigente, e art. 152°, n°5 1, al. a) e 3 do C.P.T.A. - assim, entre outros, acórdão de 26-9-07 proferido pelo Pleno no processo 0452/07, acessível em www.dgsi.pt.
2. Ora, da análise dos factos constantes dos acórdãos proferidos há elementos no sentido de ser de reconhecer da oposição de acórdãos, por serem idênticas as situações de facto e haver divergência quanto à questão fundamental de direito que consiste em saber se é possível determinar a derrogação de sigilo bancário, nos termos do art. 63. B n.º 1 al. b) da L.G.T., mediante indícios de acréscimos patrimoniais injustificados de valor superior a € 100 000, tendo o mesmo como fundamentação uma estimativa de montantes obtida a partir de juros a uma taxa anual de 4%, que ambas os casos foi reportada aos anos de 2010 e 2011.
Acresce não ser conhecida jurisprudência consolidada sobre o assunto.
E enquanto no acórdão dos autos se entendeu negativamente, no caso indicado em fundamento julgou-se em sentido positivo a tal derrogação.
Crê-se estar a razão com a decisão proferida nos presentes autos.
A dita estimativa com base na taxa anual não satisfaz as exigências de fundamentação, as quais têm ainda de ser concretamente justificadas, nos termos do art. 63.º B n.º 2, o que não se denota da decisão proferida pelo dito sr. Diretor-Geral.
3. Contudo, é ao Pleno da S.C.T. do S.T.A. que compete sobre tal proferir decisão, nos termos previstos no art. 17º nº2 do E.T.A.F. de 2002, e cumpridas que sejam as formalidades previstas nos artigos 289.º n.º 2 e segs. do C.P.P.T.

Os Juízes Conselheiros desta secção do contencioso Tributário do STA tiveram vista dos autos.

2 – FUNDAMENTAÇÃO

Com interesse para a decisão foram dados como provados os seguintes factos:

A) No acórdão recorrido:
A) Ao abrigo da ordem de serviço 01201300588 os Serviços de Divisão de Inspeção Tributária da D. F de Viseu iniciaram ação inspetiva à Recorrente A…………….., cfr.. folha 1 da informação de 3 paginas que, instruída com dois anexos (fls. 5 a 7 destes autos,), estribaram a decisão nestes autos recorrida, elementos aqui dada por reproduzida o mesmo se dizendo dos demais documentos infra referidos;
B) Em sede da aludida inspeção apurou-se:
“As obrigações declarativas do SP em causa mostram-se cumpridas.

2 DESCRIÇÃO DOS MOTIVOS QUE JUSTIFICAM O PEDIDO DE AUTORIZAÇÃO PARA ACESSO A INFORMAÇÃO BANCÁRIA DO SUJEITO
Nos últimos anos (a título exemplificativo apresentam-se os dados dos últimos 4 anos) os titulares de rendimentos do agregado familiar do SP (A………………. e B…………………) declararam os seguintes rendimentos sujeitos a IRS:




ANO
2008
2009
2010
2011
RENDIMENTOS LÍQUIDOS
45 329,30
45 122,82
43 568,75
42 234,78



Além dos rendimentos atrás referenciados; em 2010 e 2011, os titulares de rendimentos do agregado obtiveram os seguintes rendimentos provenientes de juros de depósitos à ordem e a prazo, que foram sujeitos a retenção na fonte a título definitivo.
Respetivamente, num total de 6 58 216,11 e 6 148 683,37, ambos rendimentos brutos, sendo que de 2010 para 2011 se verificou um acréscimo total de € 90 467,16.
O acréscimo de rendimentos de capitais obtidos em 2011 relativamente a 2010 representa, a uma taxa de juro meramente exemplificativa de 4%, um acréscimo do montante de capital investido de € 2 261 679,00 (€ 90 467,16/4%).
Não obstante o descrito os rendimentos declarados nos últimos anos pelos SPs não justificam o aparente acréscimo de património evidenciado em 2011.
Para apurar da eventual existência de acréscimos injustificados o SP foi questionado sobre se autorizava a AT a consultar/aceder às suas contas respondeu negativamente argumentando que não lhe foi explicada em termos legais a razão da devassa.
Face ao anteriormente exposto...
2.1 Existência de indícios concretos da falta de veracidade do declarado no modelo 3 de IRS...

O aparente acréscimo do património não é justificado pelos rendimentos declarados pelos SPs em 2011 (rendimentos líquidos de € 41 234,78), o que indicia falta de veracidade do declarado.
2.2. Existência de indícios de acréscimos de património não justificados, nos termos da al. j) do artigo 87° da LGT, na medida em que o aparente acréscimo de património, de valor superior a € 100 000,00, se verifica simultaneamente com uma divergência com os rendimentos declarados.
E com base em tais fatos conclui a AT existir fundamento para a derrogação do sigilo bancário, nos termos das als. b) e c) do n° 1 do art 63° B da LGT, vide fls. 1 e 2 da já aludida informação, informação das modelo 39 a fls. 7; fatos que não foram contrariados pelos Recorrentes;
C) A Recorrente, sendo esclarecida de que a diligência em causa se inseria no âmbito do processo inspetivo 01201300588, foi inquirida, em 10-09-2013, sobre se autorizava a Aut. Tributária a consultar/aceder a todas as contas bancárias existentes na ……… e Banco …………. SA, tendo dito que não autorizava “porque é legítimo não dar acesso às contas bancária e jamais lhe foi explicada em termos legais a razão da devassa” cfr doc. de fls. 7 verso;
D) cinco meses antes os Recorrentes foram notificados do “dever de cooperação e de apresentação de documentos comprovativos dos rendimentos auferidos “ao que responderam dizendo, para além do mais, que as aplicações financeiras tem origens em exercícios económicos anteriores a 2009 pelo que não se apura direta ou indirectamente acréscimo patrimonial superior a € 100 000,00 em 2011, vide fls. 8 a 11;
E) As taxas de juro bancários — Empréstimos e depósitos entre Agosto de 2008 e Agosto de 2013, de acordo com fonte do Banco de Portugal apresentaram a expressão constante dos gráficos que constituem fls.12;
E) A decisão de que estes autos constituem o recurso foi proferida pelo Diretor Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira em 25 09 2013 e comunicada aos Recorrentes através de carta registada expedida em 2013-10-08, cfr. doc. de fls. 4;
G) O recurso que deu origem aos presentes autos foi apresentado em 17 de outubro de 2013, vide carimbo aposto a fls. 2.

B) No acórdão fundamento
1-Após consulta da declaração modelo 39 no sistema informático, a A.T. verificou que relativamente aos sujeitos passivos, ora reclamantes, foram declarados na referida participação, rendimentos de tipo 3 (inclui fundamentalmente juros de depósitos), nos montantes constantes do seguinte quadro (cfr. relatório junto ao processo administrativo apenso):

2009 2010 2011
Impugnante A 30.464,16 21.157,64 49.423,00
Impugnante B 18.256,80 15.318,82 25.272,58
Totais 48.720,96 36.476,46 74.695,58

2-Os sujeitos passivos foram notificados, através do ofício nº.551, para prestar esclarecimentos relativamente à fonte de rendimentos que viabilizaram os investimentos efectuados (cfr. relatório junto ao processo administrativo apenso);
3-Responderam em 11/02/2013 que o capital proveio dos rendimentos do trabalho por si declarados nas declarações de I.R.S., herança por morte dos pais do sujeito passivo A (o pai faleceu em 1989 e a mãe em 2003) e da venda de um apartamento há 10/12 anos.
4-Informam ainda que o sujeito passivo A, no âmbito da sua profissão contacta diariamente com diversas instituições bancárias, o que lhe possibilita negociar os investimentos bancários e as taxas de remuneração (cfr. relatório junto ao processo administrativo apenso);
5-Não autorizam a A.T. a aceder à sua informação bancária (cfr. relatório junto ao processo administrativo apenso);
6-Através do sistema informático, verificou a A.T. que os sujeitos passivos na declaração modelo 3 de I.R.S. relativa ao ano de 2001, declararam a venda de um imóvel pelo valor de € 86.292,04 (cfr. relatório junto ao processo administrativo apenso);
7-Desde o ano de 2001 os sujeitos passivos declararam os seguintes rendimentos coletáveis em sede de I.R.S. (cfr. relatório junto ao processo administrativo apenso):

Anos Rendimento Coletável
2001 65.617,10
2002 43.074,66
2003 43.459,84
2004 45.209,91
2005 51.656,93
2006 63.897,47
2007 57.745 78
2008 60.204,82
2009 63.341,35
2010 75.846,66
2011 80.150,07
Total 650.204,59

8-Para identificar os contribuintes incumpridores em situações potencialmente reveladoras de omissão de rendimentos, a A.T. recorreu aos seguintes critérios (cfr. relatório junto ao processo administrativo apenso):
a. Para os rendimentos declarados com o código 3, nos anos de 2010 e 2011, foi estimada uma taxa de juro implícita de 4%, determinando-se assim o capital investido nos dois anos, e confirmar se de um ano para o outro houve acréscimo de património não justificado.
b. A capacidade normal de poupança do agregado não poderá ser superior ao dobro do seu rendimento global.
9-Com o referido pressuposto o capital investido no ano de 2010 teria sido de € 911.911,50 (36.476,46/4%) e o capital investido no ano de 2011 teria sido de € 1.867.389,50 (74.695,58/4%), tudo conforme consta do relatório junto ao processo administrativo apenso;
10-Assim, considerou a A.T. estar perante um aumento do capital investido do ano de 2010 para o ano de 2011 no montante de € 955.478,00 (1.867.389,50 - 911.911,50) para uma capacidade de poupança estimada de € 160.300,14 (80.150,07x2), tudo conforme consta do relatório junto ao processo administrativo apenso;
11-O que demonstra a existência de um acréscimo de património superior a € 100.000,00, verificado simultaneamente com a existência de uma divergência não justificada com os rendimentos declarados (cfr. relatório junto ao processo administrativo apenso);
12-Pelo que foi proposta a derrogação do sigilo bancário, ao abrigo do nº.4, do artigo 63-B, da L.G.T., relativamente aos anos de 2010 e 2011, por se encontrarem preenchidos os pressupostos previstos na alínea c), do nº.1, do artigo 63-B, da L.G.T. (cfr. relatório junto ao processo administrativo apenso);
13-Por despacho do Exmo. Sr. Director-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira foi autorizado que “...funcionários da inspeção Tributária, devidamente credenciados, possam aceder directamente a todas as contas e documentos bancários existentes nas instituições bancárias, em sociedades financeiras ou instituições de crédito portuguesas, de que sejam titulares os sujeitos passivos … (...) e … , (...) relativamente aos anos de 2010 e 2011...”. (cfr. documento junto a fls.8 dos presentes autos);
14-Os recorrentes foram notificados por ofício nº. 2126, de 10/4/2013, da decisão que autorizou o acesso aos documentos bancários necessários para apurar a realidade da situação tributária relativa aos anos de 2010 e 2011, nos termos das alíneas c), do nº.1, do artigo 63-B, da L.G.T. (cfr. documento junto a fls.7 dos presentes autos cujo conteúdo se dá por reproduzido);
15-O qual foi recebido em 15/4/2013 (cfr. documento junto ao processo administrativo apenso);
16-A petição inicial foi remetida por correio registado endereçado a este T.A.F. em 25/4/2013 (cfr. documentos juntos a fls. 21 e 70 dos presentes autos cujo conteúdo se dá por reproduzido);
17-Em 2011 os impugnantes receberam ainda a quantia de € 25.000,00 a título de indemnização pelo dinheiro depositado no ………… (cfr. documentos juntos a fls.16 e 17 dos presentes autos cujo conteúdo se dá por reproduzido).

3 – DO DIREITO
A questão que se coloca nos presentes autos é a de saber se é possível determinar a derrogação de sigilo bancário, nos termos do art. 63. B n.º 1 al. b) e c) da L.G.T., mediante indícios de acréscimos patrimoniais injustificados de valor superior a € 100 000, tendo o mesmo como fundamentação uma estimativa de montantes obtida a partir de juros a uma taxa anual de 4%, que ambas os casos foi reportada aos anos de 2010 e 2011.

Previamente, porém, impõe-se averiguar da verificação no caso concreto dos requisitos de admissibilidade do recurso por oposição de acórdãos
Vem a recorrente interpor o presente recurso do acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte (Secção de Contencioso Tributário) de 13 de Fevereiro de 2014, (cfr. fls. 192-102), por estar em oposição com o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, proferido em 30 de janeiro de 2014 – Processo nº 7264/13.
Não obstante o Relator do acórdão recorrido ter proferido despacho em que reconhece a alegada oposição de acórdãos, importa reapreciar se a mesma se verifica, já que tal decisão, como vem sendo jurisprudência pacífica e reiterada deste Supremo Tribunal (vide, entre outros, o Acórdão de 7 de Maio de 2003, rec. n.º 1149/02), não só não faz caso julgado, como não impede ou desobriga o Tribunal de recurso de a apreciar (cfr. art. 685.º-C, n.º 5 do Código de Processo Civil - CPC) – cfr. também neste sentido JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário: Anotado e Comentado, volume II, 5.ª ed., Lisboa, Áreas Editora, 2007, p. 814 (nota 15 ao art. 284.º do CPPT).
O presente processo iniciou-se no ano de 2013, pelo que lhe é aplicável o regime legal resultante do ETAF de 2002, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, e 4.º, n.º 2, da Lei n.º 13/2002 de 19 de Fevereiro, na redacção que lhe foi conferida pela Lei n.º 107-D/2003 de 31 de Dezembro.
Assim, a admissibilidade dos recursos por oposição de acórdãos, tendo em conta o regime previsto nos artigos 27.º, alínea b) do ETAF e 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), depende de existir contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão invocado como fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito.
Como já entendeu o Pleno da Secção do Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal Administrativo (Acórdão de 29 de Março de 2006, rec. n.º 1065/05), relativamente à caracterização da questão fundamental sobre a qual deve existir contradição de julgados, devem adoptar-se os critérios já firmados no domínio do ETAF de 1984 e da LPTA, para detectar a existência de uma contradição:
- identidade da questão de direito sobre que recaíram os acórdãos em confronto, que supõe estar-se perante uma situação de facto substancialmente idêntica;
- que não tenha havido alteração substancial na regulamentação jurídica;
- que se tenha perfilhado, nos dois arestos, solução oposta;
- a oposição deverá decorrer de decisões expressas, não bastando a pronúncia implícita ou a mera consideração colateral, tecida no âmbito da apreciação de questão distinta (Acórdãos do Pleno desta Secção do STA de 26 de Setembro de 2007, 14 de Julho de 2008 e de 6 de Maio de 2009, recursos números 452/07, 616/07 e 617/08, respectivamente).
A alteração substancial da regulamentação jurídica relevante para afastar a existência de oposição de julgados verifica-se «sempre que as eventuais modificações legislativas possam servir de base a diferentes argumentos que possam ser valorados para determinação da solução jurídica» (v. Acórdãos do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do STA de 19 de Junho de 1996 e de 18 de Maio de 2005, proferidos nos recursos números 19532 e 276/05, respectivamente).
Por outro lado, a oposição de soluções jurídicas pressupõe identidade substancial das situações fácticas, entendida esta não como uma total identidade dos factos mas apenas como a sua subsunção às mesmas normas legais (cfr. JORGE LOPES DE SOUSA, op. cit., p. 809 e o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 26 de Abril de 1995, proferido no recurso n.º 87156).
Vejamos, então, se tais pressupostos se verificam.
A questão que constitui o objecto do presente recurso, como se disse, prende-se com a determinação da derrogação de sigilo bancário, nos termos do art. 63. B n.º 1 als. b) e c) da L.G.T., mediante indícios de acréscimos patrimoniais injustificados de valor superior a € 100 000, tendo o mesmo como fundamentação uma estimativa de montantes obtida a partir de juros a uma taxa anual de 4%, que ambas os casos foi reportada aos anos de 2010 e 2011.
Defende o Excelentíssimo Procurador Geral Adjunto junto deste Tribunal que as situações de facto verificadas nos acórdãos recorrido e fundamento integram oposição de acórdãos no que também estão de acordo a recorrente e os recorridos.
Cremos que ocorre a referida oposição, quer porque a situação fáctica é idêntica, ressalvada a especificidade de cada caso (deixando-se a anotação de que a identidade substancial das situações fácticas que se exige, pode ser entendida não como uma total identidade dos factos mas apenas como a sua subsunção às mesmas normas legais, como supra se destacou) quer porque o quadro jurídico também o é por não ter havido alteração substancial na regulamentação jurídica;
Não obstante no acórdão recorrido (com um voto de vencido) decidiu-se que a mera referenciação de uma taxa de juro de 4% não cumpre o dever de fundamentação formal do acto tributário o que determinou a anulação da decisão do Director Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira de 25/09/2013 que autorizou o acesso às contas bancárias identificadas nos autos e de que são titulares os contribuintes recorrentes enquanto que no acórdão fundamento aceitando-se a referenciação da mesma taxa de juro de 4% se concluiu, após análise em concreto dos rendimentos declarados e investidos pelos contribuintes nos anos de 2010 e 2011, que a Administração Tributária demonstrou suficiente e fundadamente os indícios de acréscimo patrimonial não justificado, de valor superior a 100.000, pelo que se entendeu assistir à Administração tributária o direito de aceder às informações bancárias dos contribuintes recorrentes.
Ora, assim sendo, há, efectivamente, oposição de julgados justificativa da admissibilidade do presente recurso, até porque a qualificação dada à fundamentação efectuada pela AT (o acórdão recorrido qualificou-a de fundamentação formal) não tem só por si a virtualidade de alterar a identidade da questão de direito em causa. Acresce que no caso dos autos o acórdão recorrido acabou por emitir um juízo de valor sobre a suficiência da indicação do critério da taxa de 4% anual e por isso entrou no domínio da fundamentação substancial. Por tudo e concordando com todos os intervenientes no processo entende-se que ocorre oposição de julgados pelo que haverá que conhecer do mérito.
Do Mérito:
Vejamos:
O art. 63ºB da LGT permite o acesso da administração tributária a informações ou documentos bancários sem dependência do consentimento do titular dos elementos protegidos.
Mas o nº 4 refere que as decisões devem ser fundamentadas com expressa menção dos motivos concretos que as justificam e, notificadas aos interessados no prazo de 30 dias após a sua emissão sendo tal competência cometida ao Director-geral sem possibilidade de delegação.
Esta exigência justifica-se desde logo porque o legislador eliminou o direito de audiência prévia do interessado. Mas mais, estando em causa uma compressão do direito à reserva da vida privada, consagrado no art. 26º, nº1, da CRP, este direito pode ser comprometido irremediavelmente se para além de não haver lugar a audiência prévia, não for dado cumprimento integral ao estabelecido no nº 4 do art. 63º-B da LGT. As exigências ali estabelecidas têm de ser entendidas como cautelares em face do melindre da matéria e pressupõem uma ponderação aturada por parte do dirigente máximo que tem de fundamentar a decisão e levá-la ao conhecimento do destinatário com vista a este poder aferir da razoabilidade das razões da quebra do sigilo bancário e se a decisão foi praticada por quem é competente para tal.
Assim, afigura-se que este procedimento especial (decisão fundamentada notificada ao Contribuinte num dado prazo) constitui um reduto último de defesa do direito à reserva da vida privada dos contribuintes.
Nas palavras de JORGE DE SOUSA e outros, p. 580 (LGT- comentada e Anotada) o direito à intimidade da vida privada é normalmente gravemente afectado pela derrogação do sigilo bancário.
E, sendo certo que nos nºs. 1 e 2 do artº 63º-B da Lei Geral Tributária, na redacção actualmente vigente, se prevêem situações em que a administração tributária pode aceder directamente à totalidade dos documentos cobertos pelo sigilo bancário, independentemente de autorização do tribunal ou do interessado, a actuação da Administração Tributária deverá limitar-se ao que for necessário para obtenção dos fins em vista, como impõe o princípio da proporcionalidade, que deve nortear a sua actuação (Cf., neste sentido, Diogo Leite de Campos, Benjamim da Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, Lei Geral Tributária Anotada, 4ª edição, pag. 569.)
Acresce que, dado o especial relevo dos interesses em causa, nomeadamente a falada possibilidade de restrição de direitos individuais, consagrados constitucionalmente, nomeadamente o já referido direito à intimidade privada (artº 26º, nº 1 da Constituição da República), a Lei Geral Tributária é a nosso ver particularmente exigente na definição dos pressupostos do acesso a informações e documentos bancário por parte da Administração Tributária, exigindo-se por isso a falada fundamentação com expressa menção dos motivos que justificam a decisão de derrogação do sigilo bancário cujos pressupostos assentam em factos indiciários.
No caso dos autos está em causa a validade da fundamentação do acto que determinou o acesso à conta bancária dos contribuintes e é imprescindível que nos atenhamos antes de mais nos princípios norteadores do levantamento do sigilo bancário.
Estando em causa, como vimos, um direito fundamental com consagração constitucional ainda assim tal direito não é irrestrito ou absoluto, podendo ser sujeito a restrições ou condicionamentos, desde que salvaguardado o conteúdo essencial do direito.
Por essa razão, o legislador é particularmente exigente na definição dos pressupostos do acesso à informação bancária dos sujeitos passivos por parte da Administração, exigindo-se a referida fundamentação com expressa menção dos motivos que justificam a decisão de derrogação do sigilo bancário.
Sobre o dever de fundamentação:
A Administração tem o dever de fundamentar os actos que afectem os direitos ou legítimos interesses dos administrados, em harmonia com o princípio plasmado no art. 268º da CRP e acolhido nos arts. 124º do CPA e 77º da LGT. E como a doutrina e a jurisprudência têm vindo exaustivamente a repetir, a fundamentação há-de ser expressa, através duma exposição sucinta dos fundamentos de facto e de direito da decisão; clara, permitindo que, através dos seus termos, se apreendam com precisão os factos e o direito com base nos quais se decide; suficiente, possibilitando ao contribuinte um conhecimento concreto da motivação do acto; e congruente, de modo que a decisão constitua a conclusão lógica e necessária dos motivos invocados como sua justificação.
Assim, a fundamentação deve ser entendida como a obrigação de enunciar expressamente (de modo directo ou por remissão) os motivos de facto e de direito que determinaram o agente ou órgão decisor, esclarecendo o seu destinatário das razões que o motivaram e do porquê do sentido decisório, visando proporcionar ao administrado o conhecimento do itinerário cognoscitivo e valorativo do acto.
Deste modo, o acto só estará fundamentado quando o administrado, colocado na posição de um destinatário normal - o bonus pater familiae de que fala o artigo 487º, nº 2, do Código Civil – possa ficar a conhecer as razões factuais e jurídicas que estão na sua génese, de modo a permitir-lhe optar, de forma esclarecida, entre a aceitação do acto ou o accionamento dos meios legais de impugnação.
A fundamentação pode, no entanto, assumir duas modalidades: a fundamentação em sentido formal, traduzida na exigência de indicação de factos que levaram a Administração a decidir em determinado sentido e que deve ser suficiente, clara e congruente de modo a poder ser entendida pelo administrado de modo a que este se possa defender; e a fundamentação em sentido substancial que tem já a ver com o mérito da decisão e com a legalidade "stricto sensu" do próprio acto.
A fundamentação, apresentada pela Administração Tributária, constante da alínea B) do probatório do acórdão recorrido, pela sua clareza e congruência satisfaz a nosso ver, desde logo do ponto de vista formal, a exigência legal de fundamentação do acto tributário. E satisfaz também do ponto de vista substancial como deixaremos expresso infra.
Na verdade, indicam-se factos que indiciam a obtenção de rendimentos (acréscimos patrimoniais não justificados de valor superior a 100.000 Euros) ocorridos no exercício que mediou entre 2010 e 2011 ou pelo menos indiciam falta de veracidade do declarado. E, a contribuinte tudo entendeu perfeitamente pois que na sua petição inicial nos articulados 16 e segs contraria em substância a consideração da referida taxa de 4%.
Assim, consideramos que, verdadeiramente, o que se questiona nos autos é saber se a fundamentação invocada é válida do ponto de vista substancial, (tal como o entendeu o voto de vencido aposto no acórdão ora recorrido e a nosso ver analisou o acórdão fundamento (que decidiu que o ato de derrogação do sigilo bancário fundamentado na existência de indícios de acréscimos de património, não justificados, apurados por aplicação de uma taxa de juro anual estimada de 4%, estava, por via da aplicação deste raciocínio hipotético, devidamente fundamentado) e acabou por analisar também o acórdão recorrido) isto é, se os factos invocados pela Administração Tributária são suficientes para que se decida pelo levantamento do sigilo bancário. E, a razão nuclear apresentada pelos recorrentes é a sua discordância com o critério utilizado consistente na consideração de uma taxa de juro utilizada pela Administração Tributária, “a título meramente exemplificativo” de 4% para a partir daí e conhecendo o valor do acréscimo de rendimentos de capitais obtidos em 2011 relativamente a 2010 obter o valor do acréscimo de capital investido que se considerou ser de 2.261 679,00 Euros.
Importa, pois, verificar se a consideração desta taxa exemplificativa de 4% para o ano de 2011 é aceitável para fundamentar formal e substancialmente o levantamento do sigilo bancário.
Para o acórdão recorrido não o é, não cumprindo o dever de fundamentação (que qualificou de formal) do acto tributário, não dando o autor do acto as razões em que se fundou para determinar aquele valor (de 4%) e não outro sustentando esta conclusão na afirmação de que:
(…) “Ora, olhando para a decisão de autorização para acesso a informação bancária nos termos do art. 63.º-B, n.º 4, da LGT, aqui em causa, o que vemos é que a Administração Tributária se limitou a erigir um pressuposto/factor para determinar um acréscimo patrimonial presumido (a partir dos montantes aplicados em depósitos bancários e sujeitos à respectiva taxa liberatória nos anos de 2010 e 2011): a taxa de juro de 4%. Porém, para além de referir que se trata de uma taxa “meramente exemplificativa”, nada mais disse.

Mais, nada se diz para “justificar” a aplicação dessa taxa de 4% em 2010 e em 2011 (para efeitos de comparação), sendo que, por um lado, como alegam os Recorrentes, num exercício abstracto, se num dado ano, as taxas de juro médias forem de 2% e noutro ano de 4%, é por demais evidente, que o rendimento antes do efeito fiscal, duplica, sem variar o capital investido. E, por outro lado, a experiência demonstra à abundância que a estrutura dos produtos bancários é complexa, com existência de períodos temporais, mais ou menos curtos, remunerados a taxas de juro diferentes e em regra crescentes, dependendo a taxa de juro contratada não só do montante aplicado (capital), mas também de outros factores como o prazo, a periodicidade e tipo de remuneração (fixa ou indexada), a modalidade de vencimento dos juros (capitalização ou não), bem como do perfil do cliente.

Subsiste, pois, a dúvida, para os Recorrentes, e também para este tribunal, que não alcança a razão de assim se ter procedido, sendo essencial que tal se entendesse sob pena de frustrar-se a finalidade, pelo menos a “endógena”, pela qual a Constituição e a lei tributária impõem à Administração Pública o dever de fundamentação das suas decisões.

E o provado em E) supra, independentemente, sublinha-se, de o despacho recorrido em momento algum remeter para quaisquer taxas médias ou ponderadas extraídas de elementos estatísticos oficiais, não colide com a conclusão acabada de alcançar. Com efeito, as taxas de juro referenciadas nesse facto (por remissão para o mapa extraído do site do Banco de Portugal), respeitam a taxas de juro bancárias sobre novas operações de empréstimos e depósitos, nada aí se adiantado sobre rendibilidades históricas (taxas anualizadas)”.(…)

Porém, salvo o devido respeito não podemos concordar.
Primeiro, a taxa de juro indicada pela AT a “título meramente exemplificativo” (o que temos de sublinhar e destacar) significa que a Administração Tributária recorreu a uma variável desconhecida ou a um raciocínio hipotéticos que temos de aceitar como possível já que não tendo ainda obtido/efectuado o acesso à informação bancária não podia conhecer em concreto a taxa de juro contratualizada pelos contribuintes ou os tipos de produtos depositados, a qual, como bem se observa no acórdão recorrido, é variável de cliente para cliente. Trata-se de admitir a demonstração de elementos indiciadores necessários à verificação posterior do facto tributário. Ainda que se corra o risco de este raciocínio hipotético conter alguma margem de indeterminação, por natureza, é de admitir desde que sustentado em regras da experiência comum ou elementos factuais ou técnico-cientificos.
E, de facto, a consideração desta taxa acaba por ter proximidade com os valores de taxas indicados pelo Banco de Portugal para depósitos de particulares no ano de 2011, com prazo acordado até um ano, (vide doc. 4 junto com a P.I. a fls. 12 dos autos) a que se refere o ponto E) do probatório; sendo também do conhecimento comum dos cidadãos e, por dever de ofício, da Autoridade Tributária que a obtenção de uma taxa de 4% naquele ano junto da banca era considerada uma taxa aceitável por inexistência para a maioria dos aforradores de ofertas melhores. E, de outro modo considerando: mesmo que os contribuintes/recorrentes fossem clientes muito especiais das instituições financeiras onde detinham os seus capitais depositados e mesmo que tivessem contratualizada uma taxa muitas vezes superior à considerada pela AT, ou que a mesma taxa fosse variável, ainda assim sempre seria de considerar um acréscimo de capital depositado muitíssimo superior ao rendimento declarado no ano de 2011 (que foi apenas de 41.274,78 Eur) pois que a administração tributária constatou que entre 2010 e 2011 os rendimentos brutos de juros de depósitos à ordem e a prazo auferidos pelos contribuintes aumentou 90.467,16 Euros uma vez que os rendimentos brutos de capitais no ano de 2010 foram de 58.216,11 Euros enquanto que no ano de 2011 os mesmos rendimentos foram de 148.583,27 Euros.
Assim, para este mesmo período temporal a A. Fiscal calculou que os rendimentos de capital dos contribuintes ora recorridos em 2011 (juros) correspondiam a capital investido de € 2.261.679,00 e daí ter considerado:
“Existência de indícios de acréscimos de património não justificados, nos termos da al. f) do artigo 87º da LGT, na medida em que o aparente acréscimo de património, de valor superior a 100.000 Eur., se verifica simultaneamente com uma divergência com os rendimentos declarados. Estes factos concretamente identificados, constituem fundamento para a derrogação do sigilo bancário, nos termos da al. b) e al. c) do nº 1 do artº 63º B da LGT”.

Cabia aos contribuintes ora recorridos a comprovação de que correspondem à verdade os rendimentos declarados e de que outra é a fonte das manifestações de fortuna ou do acréscimo de património em causa (cfr. artº.89-A, nº.3, da L.G.T.).
Mas não fizeram tal prova como também o não fizeram na situação analisada pelo acórdão fundamento o que é ali destacado.
Com estes considerandos, no caso presente, emerge clara e expressamente do teor do despacho ora sindicado e informação que o suporta que o mesmo apresenta a fundamentação formal e substancial exigível não incorrendo por isso em vício de violação de lei quer se considere que o caso é enquadrável na al. b) quer na al. c) do artigo 63-B da LGT. Por outro lado, verificam-se todos os pressupostos da derrogação do sigilo bancário ao abrigo do preceito acabado de citar da LGT. Houve uma acção de inspecção tributária; foram recolhidos indícios de incumprimento de deveres declarativos de rendimentos obtidos pelos contribuintes e a diligência de derrogação do sigilo mostra-se necessária, proporcional e adequada ao apuramento da situação tributária.
Assim, será de julgar verificada a oposição de acórdãos e revogar o acórdão recorrido que entendeu não fundamentado o despacho recorrido.

4- DECISÃO

Face ao exposto, acordam os Juízes do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em, julgando verificada a invocada oposição de acórdãos, dar provimento ao recurso, revogar o acórdão recorrido e, confirmando a decisão proferida em 1ª instância que confirmou a decisão do Exmo Director Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira de acesso directo à informação bancária dos contribuintes ora recorridos.

Custas pelos contribuintes ora recorridos, que contra-alegaram neste Supremo Tribunal.

Lisboa, 12 de Novembro de 2014. – José da Ascensão Nunes Lopes (relator) – Francisco António Pedrosa de Areal RothesPedro Manuel Dias DelgadoAna Paula Fonseca LoboJorge Miguel Barroso de Aragão SeiaJosé Maria da Fonseca CarvalhoDulce Manuel da Conceição NetoJoaquim Casimiro GonçalvesIsabel Cristina Mota Marques da Silva.